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CAPITAL INTELECTUAL – O CONTRIBUTO INVISÍVEL
Carmem Teresa Pereira Leal
Professora Auxiliar da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
Departamento de Economia, Sociologia e Gestão
Carla Susana Encarnação Marques
Professora Auxiliar da Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro
Departamento de Economia, Sociologia e Gestão
Mª Teresa Fernández Rodríguez
Profesora Asociada de la Universidad de Vigo
Facultad de CC Empresariales y Turismo. Campus de Ourense
Área Temática: D) Contabilidad y Control de Gestión
Palavras-chave: Capital Intelectual, Ativos Intangíveis, Desempenho Empresarial e
Mensuração.
1
CAPITAL INTELECTUAL – O CONTRIBUTO INVISÍVEL
Resumo
Num tempo de aumento de competitividade e de constante evolução dos mercados, a
forma como as empresas impulsionam e gerem o seu Capital Intelectual é crucial para o
seu sucesso.
Neste contexto, e no caso particular das empresas europeias, é determinante que os
gestores sejam sensibilizados para a necessidade de serem traçados novos caminhos em
busca da excelência que devem passar pelo investimento, gestão e valorização deste
recurso.
Esta comunicação pretende ser uma sinopse não exaustiva dos principais conceitos do
Capital Intelectual, a sua capacidade de criação de valor e levantar ainda algumas
questões ligadas à sua valorização. Pretende ainda ser uma primeira abordagem que
servirá de base de trabalho a investigações futuras.
Resumen
En una época de aumento de la competencia y de constante evolución de los mercados,
el modo en que las empresas impulsan y gestionan su capital intelectual es crucial para
su éxito.
En este contexto, y en el caso particular de las empresas europeas, es crucial que los
directivos sean sensibles a la necesidad de establecer nuevos caminos en la búsqueda de
la excelencia que deben pasar por la inversión, la gestión y valoración de este recurso.
Esta comunicación pretende ser un resumen no exhaustivo de los principales conceptos
de capital intelectual, su capacidad para la generación de valor y plantear
2
1. Introdução
Na atualidade tem vindo a ser evidenciada de forma crescente a existência de uma
ligação positiva entre o desenvolvimento do capital intelectual (CI) e o desempenho
organizacional. Considera-se, sem sombra alguma de dúvida, o conhecimento como um
recurso fundamental, por constituir-se na principal fonte de competitividade das empresas,
uma vez que os recursos materiais, estruturais e tecnológicos são mais facilmente
adquiridos por todas as organizações.
Na sociedade do conhecimento, a base para o sucesso e até para a sobrevivência
das organizações centra-se nas pessoas , pois estas constituem a fonte de aprendizagem
e de inovação. É indispensável, assim, por parte dos responsáveis pelas organizações,
fomentar determinados tipos de comportamentos para que o ambiente organizacional seja
propício à existência de um fio condutor que indique o caminho para o êxito.
Neste contexto, e com base numa revisão sistemática da investigação neste campo,
as quatro principais contribuições desta comunicação pretendem ser:
(1) Fornecer uma sinopse não exaustiva do que se sabe atualmente sobre o
papel do CI dentro das empresas, identificando, para isso, os elementoschave do conceito;
(2) Averiguar, com base nos trabalhos já publicados, se é possível sustentar a
tese de que o investimento em CI proporciona benefícios ao desempenho
organizacional, sendo uma “nova”, embora invisível, fonte de valor;
(3) Alertar para o fato de que a inadequada valorização deste recurso pela
contabilidade tradicional pode trazer consequências indesejáveis para as
empresas.
(4) Finalmente
identificam-se
algumas
questões
pertinentes,
ligadas
à
contabilidade, que estarão na base de investigações futuras.
2. O novo paradigma do conhecimento
3
Historicamente, os ativos fixos e financeiros desempenharam um papel crítico no
processo de criação de valor para as organizações (Campisi & Costa, 2008; Costa, 2012;
Isaac, Herremans & Kline, 2010). Hoje em dia, esses ativos, reconhecidos no balanço,
ocupam um segundo lugar perante formas mais intangíveis de capital, geralmente não
evidenciadas no balanço das empresas (Ricceri & Guthrie, 2009; Whittington, Owen-Smith
& Powell, 2009). Ativos físicos, como as instalações, equipamentos ou ativos financeiros
são necessários, mas já não são suficientes para atingir os objetivos das organizações
(Guthrie, Ricceri & Dumay, 2012; Lev, 2001; Merchant & Van der Stede, 2007). Isto
deveu-se fundamentalmente às mudanças na economia global, como um acesso mais
fácil aos mercados de capital, melhores telecomunicações e os rápidos avanços na
tecnologia. Embora seja difícil apontar exatamente quando teve início a nova economia ou
era da informação, Wall (2005) afirma que, desde os anos 70, começou a ser registada
uma mudança definitiva para uma era pós-industrial. Nas empresas da nova economia, a
ênfase no capital humano das organizações reflete a visão de que o valor de mercado
depende menos de recursos tangíveis e mais dos intangíveis, particularmente dos
recursos humanos. Recrutar e reter os melhores funcionários é, entretanto, apenas parte
da equação. A organização tem também de aproveitar as habilidades e as capacidades
dos seus colaboradores, incentivando a aprendizagem individual e organizacional e
proporcionando um ambiente favorável em que o conhecimento possa ser criado,
compartilhado e aplicado (e.g., Becker & Gerhart, 1996; Guest, Michie, Sheehan, Conway
& Metochi, 2000; Stiles & Kulvisaechana, 2003).
A competitividade encontra-se, assim, baseada em ativos mais difíceis de avaliar
como é o caso das marcas, dos relacionamentos que produzem boa reputação, ou das
capacidades e competências internas que os clientes valorizam e que são difíceis de
replicar. Todo este conjunto é reconhecido como CI, constituindo um dos fatores de
sucesso mais críticos da era da informação. Esta "novidade" tem profundas implicações
para as organizações e para a sua gestão, especialmente em termos de definição da sua
estratégia competitiva, estrutura organizacional e avaliação de desempenho. A nova
economia exige uma nova atitude de gestão: gestão do conhecimento, o que significa
planeamento, coordenação e controle dos fluxos de conhecimento que são produzidos na
empresa em conexão com as suas atividades e o seu ambiente de forma a criar
competências essenciais básicas (Campos, 1999).
3. Capital Intelectual
4
A abordagem ao conceito de CI começou por ser uma preocupação do sector
empresarial, para explicar a diferença entre o valor de mercado e valor contabilístico de
uma empresa cotada no mercado, diferença essa que pode ser explicada pelo preço que
os investidores atribuem aos ativos intangíveis das empresas que não podem ser
avaliados de uma forma precisa, mas que têm potencial para gerar valor para os
investidores no futuro. Assim, desde o final do século passado até à atualidade muito se
tem escrito sobre os recursos intangíveis das empresas e a sua importância (e.g. Guthrie,
Ricceri & Dumay, 2012 1; Cañibano, García-Ayuso & Sánchez, 2000; Dumay, 2009b;
Skinner, 2008; Wyatt, 2008), mas, em particular, sobre a mensuração e divulgação do CI
(Dumay, 2009a; Guthrie, Petty & Johanson, 2001; Guthrie, 2001; Marr & Chatzkel, 2004).
No caso específico da medição do CI, tem existido um trabalho sistemático de criação de
quadros de referência, índices e diretrizes de suporte aos conceitos teóricos (Bontis,
Dragonetti, Jacobsen & Roos, 1999; Danish Agency of Trade and Industry, 2000; Lev,
2001; MERITUM, 2002; Mouritsen, Larsen & Bukh, 2001; Sveiby, 1997), embora nenhuma
dessas opções tenha sido desenvolvida de acordo com os princípios contabilísticos (Marr,
Gray & Neely, 2003). Em 2008, a Federação Europeia das Sociedades de Analistas
Financeiros (EFFAS, 2008) preparou um conjunto de dez recomendações sobre a
divulgação do CI mas que, igualmente, não teve em conta a perspetiva contabilística.
Como se pode observar, a literatura na área de medição do CI tem vindo a crescer
continuadamente na tentativa de desenvolvimento de métricas que informem sobre a
formulação e implementação da estratégia, que melhorem a divulgação, construam
referenciais e que ajudem a prever o possível desempenho futuro do negócio.
Podemos assim destacar três principais passos na evolução da metodologia do CI
(Rybinski, 2009):
−
Finais dos anos 80 – primeiras tentativas para definir algumas normas
relacionadas com o CI. Foi publicado o modelo de Karl Sveiby (Sveiby,
1997). Este autor dividia os ativos intelectuais em três categorias: os
relacionados com as competências individuais e aqueles relacionados com
1
Neste estudo é sintetizada uma década de investigação sobre o Capital Intelectual nas principais revistas
especializadas na área, Journal of Human Resource Cost and Accounting e Journal of Intellectual Capital e em
mais oito revistas generalistas reconhecidas internacionalmente na investigação em Contabilidade. Os autores
construíram uma base de dados de 423 artigos, tendo concluído que as revistas generalistas publicaram apenas
18% desse total.
5
as estruturas externa e interna das organizações. Este modelo foi utilizado
por inúmeras empresas escandinavas.
−
Início dos anos 90 – em 1994 surge o primeiro relatório de contas que incluía
a divulgação sobre Capital Intelectual 2.
−
Meados da década de 90 – são publicados alguns livros importantes
relacionados com esta temática3.
Ainda nos finais da década de 90 alguns órgãos normalizadores produziram normas
sobre esta temática. O IASB4 emitiu em 1998, a IAS 38 – Intangible Assets sobre a
contabilização dos ativos intangíveis 5. Essa norma define um ativo intangível como “um
ativo não monetário identificável, sem substância física, detido para uso na produção ou
fornecimento de bens ou serviços, para arrendar a outros, ou para finalidades
administrativas.” A definição inclui as características essenciais de um ativo: um recurso
controlado pela empresa resultante de transações ou acontecimentos passados e que
representem um benefício económico futuro. Mas não basta satisfazer estas condições
para que um intangível seja reconhecido como um ativo. A IAS 38 explicita ainda que
cumulativamente é necessário que “o custo do ativo possa ser fiavelmente mensurado”.
Para o FASB6 (SFAC 6, §26), o CI pode ser definido de duas formas: ativos
intangíveis combinados que permitem o funcionamento da empresa e a manutenção de
uma vantagem competitiva, ou como a diferença entre o valor real de mercado da
empresa e o valor real de mercado dos ativos tangíveis menos os seus passivos.
Apesar da multiplicidade de estudos sobre o tema, de forma algo consensual,
acabam quase todos por expressar que o conceito de CI conduz à necessidade de
aplicação de novas estratégias de gestão e, sobretudo, de formas inovadoras de
avaliação do valor da empresa que abarque os recursos do conhecimento (Mertins &
Orth, 2011).
2
Skandia (1994).
3
Sveiby (1997), Stewart (1997), Edvinsson e Malone, (1997), Ross, Ross, Edvinsson e Dragonneti (1997).
4
International Accounting Standards Board.
5
Traduzida para o normativo português SNC – Sistema de Normalização Contabilística pela NCRF 6 – Ativos
Intangíveis.
6
Financial Accounting Standards Board.
6
O CI é um capital não financeiro que representa a lacuna oculta entre o valor de
mercado e o valor contabilístico de uma empresa, sendo, portanto, a soma do Capital
Humano e do Capital Estrutural (Edvinsson & Malone, 1997). Estes autores servem-se de
uma metáfora para exemplificar o conceito. Segundo eles, o CI assemelha-se a uma
árvore, e explicam que as partes visíveis da árvore, tronco, galhos e folhas, representam
a empresa conforme é conhecida pelo mercado e expressa contabilisticamente as suas
demostrações financeiras, ou seja, representam os ativos e os recursos tangíveis. O fruto
produzido por essa árvore representa os lucros e os produtos da empresa. As raízes, que
se encontram abaixo da superfície, representam os ativos e recursos intangíveis. Para
que a árvore floresça e produza bons frutos, necessita de raízes fortes e saudáveis.
Embora uma análise de frutos e folhas possa dar uma boa ideia da saúde presente da
árvore, somente uma investigação às suas raízes é que nos daria uma ideia da sua saúde
futura. É indispensável por isso, para qualquer organização, a presença de capital
humano qualificado caracterizado pelo conhecimento adquirido e experiência
acumulada, com vista a alcançar os seus objetivos e aumentar a sua riqueza.
O termo CI apresenta, na atualidade, algumas conotações complexas, sendo
inúmeras vezes utilizado como sinónimo de "capital intangível", "ativos intelectuais"
"capital do conhecimento" e até mesmo de "goodwill" (Fazlagic, 2005; Zéghal & Maaloul,
2011).
Hunter, Webster e Wyatt (2005) especificam a diferença entre CI e capital intangível.
Estes autores sugerem, que de acordo com a literatura económica, o CI é visto como um
subconjunto do capital intangível, onde o termo "intangível" refere-se a ativos sem
substância física e "capital" refere-se aos bens retidos pela organização para contribuir
para os lucros futuros.
De acordo com Zéghal e Maaloul (2011) esta definição é consistente com o
esquema de classificação publicada por Blair e Wallman (2000) que caracterizaram os
ativos intangíveis pelo grau de dificuldade na definição de direitos de propriedade ou de
controlo e, mais geralmente pela dificuldade de mensuração. Como resultado, podemos
ter:
−
Intangíveis para os quais existam mercados (geralmente podem ser
comprados e vendidos) e os seus direitos de propriedade sejam
7
relativamente claros. Dentro dessa categoria, dois tipos de ativos intangíveis
podem ser distinguidos:
−
−
Ativos, tais como patentes, direitos autorais e marcas comerciais.
−
Acordos comerciais, licenças e bases de dados
Intangíveis controlados pela empresa, mas para os quais os direitos de
propriedade podem não existir e os mercados são fracos ou inexistentes.
Exemplos: processos de I&D, os segredos de negócios ou a reputação da
empresa.
−
Intangíveis para os quais a empresa tem poucos, ou nenhuns, direitos de
propriedade e os mercados são inexistentes. Estes encontram -se vinculados
às pessoas que trabalham para a empresa. Exemplos disso são os recursos
humanos, estruturais (ou organizacionais) bens e ativos relacionais, isto é,
os componentes do CI.
Em suma, para Blair e Wallman (2000) e para Zéghal e Maaloul (2011) o CI constitui
o conjunto de recursos mais difícil de controlar e avaliar. Contudo, a importância deste
recurso pode ser inclusivamente demonstrada pelos números. Na Europa (G6 e UE-15)
os investimentos em I&D atingiram, em 2002, valores equivalentes a um terço da
produção económica desses países (EFFAS, 2008).
Segundo Wyatt e Frick (2010) para qualquer organização o CI representa o conjunto
de inputs que serão transformados no interior da organização em resultados específicos
(figura 1).
Figura 1 – Capital Intelectual segundo WYATT e FRICK (2010)
8
Fonte: Adaptado de Wyatt e Frick (2010).
Com base na figura anterior é possível verificar que os inputs incluem um vasto
conjunto de esforços e gastos direcionados a atividades como o recrutamento de pessoal,
o desenvolvimento e a implementação de sistemas de retenção e de incentivos aos
recursos humanos, formação e orientação. As instituições podem inclusivamente recorrer
à subcontratação ou podem ainda adquirir CI através das fusões e aquisições. Como se
pode ver através da figura anterior, os outputs conseguidos repartem-se entre os
resultados para a empresa e para os seus funcionários. Desta forma, parte do
investimento em capital humano traduz-se em competências acumuladas nos seus
recursos humanos, dado que aprimoram conhecimentos e capacidades técnicas. Em
termos organizacionais, o investimento em CI pode resultar numa vantagem competitiva
de longo prazo dependendo do tipo de organização e da forma como se relaciona com os
seus recursos humanos e consegue retê-los. Segundo os autores citados, regularmente,
uma grande parte do conhecimento acumulado permanece no interior da empresa.
Na opinião de Stewart (1997) CI é a soma dos conhecimentos e competências de
cada indivíduo numa empresa que, juntos, podem criar uma vantagem competitiva.
Edvinsson, Kitts e Beding (2001) de forma bastante semelhante afirmaram que CI é o que
uma empresa detém em termos de experiência, de conhecimento prático, as suas
tecnologias organizacionais, o seu relacionamento com clientes e habilidades
profissionais que pode utilizar para aumentar sua vantagem competitiva no mercado.
Já a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE, 2008)
define CI como um "recurso utilizado na criação de valor futuro, sem a incorporação
física" e inclui: a propriedade intelectual, o Capital Relacional, Capital Humano e Capital
9
Organizacional. Diversos autores referem-se a estas três categorias (Capital Relacional,
Capital Humano e Capital Organizacional) no âmbito da definição de CI, sendo que o
valor criado para a organização resulta da interação dos seus diferentes elementos (Atrill,
1998;, Lynn, 1998; Dzinkowski, 2000; Wall, 2005; Kristandl & Bontis, 2007). Para uma
melhor explicitação destas categorias podemos citar alguns exemplos e indicadores
destes elementos:
−
Capital humano – satisfação e motivação dos recursos humanos,
conhecimento técnico, competências, capacidades de liderança, espírito de
equipa, competências, estabilidade, nível de investimento em formação dos
recursos humanos, baixa rotatividade, nº de funcionários em regime de
dedicação exclusiva, entre outros.
−
Capital relacional – satisfação, nº de marcas, fidelidade dos clientes,
parcerias, quota de mercado, relacionamento com fornecedores, duração do
relacionamento com clientes, entre outros.
−
Capital organizacional – nº de novos serviços prestados, aplicação efetiva do
conhecimento existente, mecanismos de transmissão do conhecimento,
alinhamento do conhecimento com a estratégia organizacional, cultura
organizacional, propriedade intelectual, marcas e patentes, filosofia de
Gestão, novos processos, situação financeira, sistemas de informação,
investimento em tecnologia da informação, eficiência da estrutura
organizacional, entre outros.
Para qualquer organização o capital humano é a fonte primordial de inovação e
renovação sendo a categoria que distingue uma organização das demais, através da
imagem e práticas reconhecidas no mercado, construídas pelos seus recursos humanos
(Wall, 2005; Wright, Dunford & Snell, 2001; Kaplan & Norton, 1993; Harvey & Lusch,
1999; Sveiby, 1997).
É possível desta forma constatar que o termo CI é frequentemente utilizado na
gestão, contudo, todas as referências conduzem ao mesmo caminho: o valor do
conhecimento ou das relações das pessoas, da gestão dos recursos humanos , dos
clientes e das outras partes interessadas. É caracterizado pela sua invisibilidade, pela
dificuldade de quantificação, pela dificuldade de aquisição ou imitação, pela
10
permeabilidade às regras contabilísticas. Ainda assim, o CI engloba não só os
conteúdos das mentes dos trabalhadores, mas também a estrutura complexa intangível
que os rodeia e faz a função de organização, sistematização e operacionalização de todo
o processo de produção de valor.
Como cômputo geral, a base para o sucesso das organizações centra-se nas
pessoas pois estas constituem a fonte de aprendizagem e de inovação.
4. Capital Intelectual e a criação de valor nas organizações
Os recursos humanos conseguem criar valor para a empresa através da aplicação
das suas contribuições intelectuais e dos seus esforços manuais no local de trabalho. O
CI é, por inerência, heterogéneo e os resultados são, portanto, menos previsíveis
relativamente aos ativos físicos. No entanto, os investimentos em capital humano
normalmente apreciam com o tempo, ao invés de depreciar (Webster, 1999).
O investimento em CI pode assim estimular, em algumas circunstâncias, um
crescimento sustentado. Essa possibilidade tem justificado, em parte, um longo debate
sobre as práticas de contabilidade no que diz respeito aos investimentos em CI.
Existe uma corrente que afirma que o CI está a aumentar em importância como um
fator de produção (Hunter, Webster & Wyatt, 2010). Os apologistas desta ideia
argumentam que o CI é hoje mais importante porque as novas tecnologias estão mais
dependentes de recursos intangíveis do que de ativos fixos (Wyatt & Frick 2010; Webster,
1999).
É inquestionável que o produto resultante do investimento em ativos intangíveis é
um valor indireto. As melhorias introduzidas através de investimentos em ativos
intangíveis afetam os resultados financeiros através de uma cadeia de relações de causaefeito. Senão vejamos:
Figura 2: A criação de valor através do investimento em intangíveis
11
Fonte: Adaptado de Bueno (2001).
A cadeia de relações de causa-efeito tem início, por exemplo, no investimento em
formação dos recursos humanos que por sua vez vai aumentar a qualidade dos serviços
prestados e que no médio e longo prazo acaba por promover uma carteira de clientes
satisfeitos e fiéis proporcionando resultados e rendibilidades superiores.
É preciso realçar que, para que todo este processo realmente resulte, o valor
resultante dos ativos intangíveis deve depender do contexto e da estratégia
organizacional. Este valor não pode ser em situação alguma separado dos processos da
organização que transforma os intangíveis em resultados financeiros.
É possível portanto concluir que o valor criado não reside num ativo intangível em
especial. Resulta antes do alinhamento do conjunto desses ativos intangíveis com a
estratégia da empresa. O processo de criação de valor é, sem margem para dúvidas,
multiplicativo e não aditivo (Bueno, 2001).
Em síntese, regra geral, o retorno dos investimentos em CI têm sido definidos com
base na análise das relações de causa-efeito entre as iniciativas ligadas à gestão do
conhecimento e as melhorias no desempenho organizacional (Carlucci & Schiuma, 2006;
Firestone, 2001; McKeen, Zack & Singh, 2006; Meenakshi & Smith, 2002). Os estudos
levados a cabo enfatizam a importância da avaliação dos resultados do investimento em
CI, não apenas para determinar a sua eficiência, como também para, por ventura,
conseguir identificar a existência de um ativo do conhecimento crítico que deva ser sobre
o qual se deva centrar as atenções no intuito de se aperfeiçoar o desempenho
empresarial (e.g., Campisini & Costa, 2008; Carlucci, Marr & Schiuma, 2004; McKeen,
Zack & Singh, 2006; Robinson, Anumba, Ahmed & Carrillo, 2003).
12
5. Valorização do CI - o papel da contabilidade
O modelo contabilístico tradicional avalia a empresa pelo valor histórico dos seus
ativos. Esse modelo conservador não é aplicável à uma empresa do conhecimento em
função dos componentes do custo de um produto serem hoje, em grande parte, ativos
intelectuais (Lev & Zarowin, 1999; Liang & Yao, 2005).
O conservadorismo contabilístico é, segundo Basu (1997) uma tendência do
contabilista para exigir um maior grau de verificação no que diz ao reconhecimento de
ganhos do que ao reconhecimento de perdas. Essa prática resulta, portanto, num
tratamento assimétrico dos ganhos e perdas e, por vezes, na subavaliação dos lucros e,
por consequência, do valor contabilístico no balanço patrimonial da empresa.
No entanto, Lev, Sarath e Sougiannis (2005) referem que nenhuma prática
contabilística aplicada consistentemente pode ser conservadora em toda a vida da
empresa. Por outras palavras, se a empresa começa por ser "conservadora" durante o
início do seu ciclo de vida, tornar-se-ia mais tarde “agressiva", inflacionando os seus
lucros. Neste sentido, as empresas com taxas elevadas de crescimento de I&D em
relação à sua rendibilidade (usualmente indústrias emergentes, como a biotecnologia e as
jovens empresas) relatam o investimento em intangíveis de forma mais conservadora.
Inversamente, as empresas com baixas taxas de crescimento de I&D (empresas na
maturidade) tendem a produzir relatos financeiros mais “agressivos”. O trabalho de
(Monahan, 2005) confirma estas afirmações ao concluir que o tratamento contabilístico
conservador afeta negativamente apenas os rendimentos das empresas que
experimentam um crescimento elevado em I&D. Todavia, essa perda tenderá a ser
revertida algures no futuro (Zéghal & Maaloul, 2011).
5.1. As consequências da valorização do investimento em CI
Neste âmbito, da valorização dos ativos intangíveis gerados internamente, dentre os
quais se destaca o CI, surgem algumas questões que gostaríamos de abordar
empiricamente num trabalho futuro. Estas dúvidas referem-se fundamentalmente às
consequências da inadequada contabilização dos intangíveis gerados internamente.
Relacionam-se basicamente com a relevância da informação financeira e com o valor da
empresa.
13
Desta forma, podemos referir, com base na literatura disponível, que a ineficiente
contabilização dos investimentos em intangíveis, de que o CI é um exemplo, parece
conduzir a um decréscimo da relevância da informação financeira publicada (Lev &
Zarowin, 1999; Dantoh, Radhakrishnan & Ronen, 2004; Liang & Yao, 2005). Por outro
lado, tendo em consideração a influência sobre o valor de mercado da empresa, o
consenso parece não existir. Alguns investigadores afirmam que a inadequada
contabilização dos investimentos em intangíveis provocarão a subestimação dos seus
lucros e, por consequência, do seu valor contabilístico. Daí se pode inferir que os
investidores irão subavaliar sistematicamente estas empresas (Monahan, 2005; Eberhart,
Maxwell & Siddique, 2004; Garcia-Ayuso, 2003). Não obstante existirem autores a
defender uma posição contrária (Darrough & Ye, 2007; Seow, Shangguan & Vasudevan,
2006; Skinner, 2008; Campisi & Costa, 2008; Bandeira, 2010; Costa, 2012). Estes
estudos refutam o pressuposto de que os investidores subavaliam as empresas que
investem em intangíveis, apresentando estudos que demonstram uma relação positiva
entre o investimento em I&D e o valor de mercado.
14
6. Conclusões e perspetivas futuras
O paradigma do conhecimento despertou novas necessidades de informação, tanto
do usuário interno ou como do externo, uma vez que modificou as fontes de vantagens
competitivas: o conhecimento e a informação.
Ativos
intangíveis
(invisíveis)
geram
riqueza
organizacional.
O
fluxo
de
conhecimento entre uma empresa e o seu ambiente gera capital intelectual, que é uma
amálgama de conhecimento, de experiência, de aprendizagem organizacional e
competência da empresa.
Portanto, o estabelecimento de um sistema para descrever e medir o CI de uma
empresa (e os seus fluxos) deve ser executado com base na estratégia da empresa. Os
indicadores selecionados devem apresentar uma forte relação com as operações diárias e
devem estar elencados de acordo com sua importância para a estratégia. No presente, e
dentro deste ambiente, apenas sobreviverão as organizações que adotem sistemas de
gestão que incluam o investimento, a valorização e a avaliação do CI.
Esta comunicação pretende ser uma análise não exaustiva do estado da arte de
alguns aspetos do capital intelectual, constituindo um primeiro passo para um estudo mais
amplo, talvez até comparativo, a ser desenvolvido no futuro próximo. No entanto, nesta
altura, é indispensável alertar para a necessidade de aperfeiçoamento da informação
contabilístico-financeira, no sentido de incremento da respetiva quantidade e qualidade,
proporcionando ao investidor a hipótese de uma tomada de decisão melhor sustentada.
Muito já foi feito, contudo, ainda há um longo caminho a percorrer. A menos que
sejamos capazes de traduzir e apresentar o conceito de capital intelectual numa
linguagem e num formato que os gestores possam compreender, o interesse nesta área
permanecerá essencialmente académico. Logo que os gestores tomem consciência da
importância do investimento, da mensuração e da avaliação do CI, conseguirão no futuro,
ao relatar essa informação, aumentar a visibilidade das suas empresas, fomentando uma
cultura de transparência e comunicação e criando um diferencial em relação aos seus
concorrentes.
15
6.1. Perspetivas Futuras:
Como foi enunciado, no início desta comunicação, ela pretende ser a base de um
futuro estudo na área da contabilidade. Desta forma, e do que nos foi possível averiguar,
pudemos constatar que, dentro desta temática, levantam-se algumas questões que
gostaríamos de ver respondidas no futuro. Podemos salientar as seguintes:
(1) Existem variáveis que poderão constituir-se como facilitadoras no processo
de estímulo do desenvolvimento do CI dentro das empresas?
(2) A inadequada contabilização dos investimentos em CI pode prejudicar a
relevância da informação contabilístico-financeira publicada?
(3) A inadequada contabilização dos investimentos em CI pode prejudicar a
forma como os investidores olham para as empresas?
Estas são, portanto, as principais questões que persistem após a conclusão desta
comunicação. É nosso objetivo dar seguimento a um trabalho empírico, provavelmente de
caráter comparativo, para tentar dar resposta a estas inquietações científicas.
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Referências:
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