REFLEXÕES SOBRE A CONSTRUÇÃO DAS COMPETÊNCIAS
DOCENTES PARA O ENSINO DA MATEMÁTICA NO CURSO DE
PEDAGOGIA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA
TOZETTO, Annaly S. - UEPG
[email protected]
BRANDT, Célia Finck. - UEPG
[email protected]
Área temática: Formação de Professores
Agencia Financiadora: não contou com financiamento.
Resumo
Preocupações com a formação docente evidenciaram mudanças em todo contexto nacional.
Os cursos de formação tiveram que reformular seus projetos pedagógicos para atender as
exigências legais. O currículo por competência foi o eixo central dessa reforma. O conceito de
competência vem relacionado às inteligências, à capacidade de raciocínio, a tomada de
decisão, à conscientização. Isso faz parte do que chamamos de letramento da docência, termo
ressignificado como a capacidade do professor utilizar seus saberes nas demandas de sua
prática e vida pessoal, mobilizando para isso suas competências na reflexão sobre sua ação
educativa numa tomada de consciência. Assim sendo, consideramos importante refletir sobre
a formação inicial do professor que atuará nos primeiros anos de escolarização, uma vez que
nessa fase do Ensino Fundamental se inicia os fundamentos necessários para a efetivação de
uma educação emancipatória. Ela acontece através das diferentes linguagens como, por
exemplo, a Matemática. Assim se faz necessário analisar quais competências docentes são
necessárias para a construção de um letramento crítico para a docência em matemática nos
anos/séries iniciais e que estão sendo contempladas na formação inicial desses professores.
Para isso, buscamos identificá-la nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de
Pedagogia e no Projeto Pedagógico de Curso de Pedagogia da Universidade Estadual de
Ponta Grossa. Portanto, apresentamos nesse trabalho o resultado de nossas análises nessa
investigação qualitativa, mostrando que nas diretrizes as competências docentes que
contribuem para a docência em matemática se aproximam de um letramento crítico e as
competências encontradas no Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia priorizam a
formação do pedagogo. As competências para a docência em matemática encontram-se
implícitas em algumas das ementas das disciplinas do Curso de Pedagogia da UEPG, mas que
a efetivação dessa construção só poderá ser vista dentro do contexto em que se aplicam tais
disciplinas.
Palavras-chaves: Competência docente; Letramento crítico; Pedagogia; Docência em
Matemática.
10621
Introdução
Discussões acadêmicas sobre a formação do professor evidenciam a importância de
um futuro profissional comprometido com uma educação emancipatória de seus alunos
voltada para uma atuação na sociedade, cada vez mais exigente, não como reprodutor de
ordens estabelecidas, mas sim como agente de transformações necessárias. O debate revela a
necessidade de rever possíveis mudanças nos cursos de formação de professores em todo
território nacional.
Algumas mudanças foram consolidadas por exigências legais como, por exemplo, as
que aconteceram em virtude da Lei de Diretrizes e Base da Educação Nacional de 1996, que,
segundo Dias e Lopes (2003), acabaram por se voltar às propostas curriculares tomando-as
como centrais para as reformas na educação, mais especificamente na formação do professor.
Surge, então, como parâmetro para tais mudanças as Diretrizes Curriculares Nacionais para a
Formação de Professores1 - DCNs (BRASIL, 2002) que “apresenta princípios orientadores
amplos e diretrizes para uma política de formação de professores, para sua organização no
tempo e no espaço e para a estruturação dos cursos”. Nas DCNs está explicitado que o
conceito de competência seja nuclear e norteador dessa reforma, e adquirido mediante a
articulação entre a teoria e a prática, tão necessária para a aprendizagem da docência. No
caminho dessa reforma, também, surgem as Diretrizes Curriculares Nacionais específicas para
cada curso de formação de professores como, por exemplo, as Diretrizes Curriculares
Nacionais para o Curso de Pedagogia2 – DCNsP, contexto desse ensaio.
Entendemos que a aprendizagem da docência por competências permite aos futuros
professores a mobilização de seus conhecimentos e a utilização de recursos, tanto pessoais
como profissionais, de modo a fazê-los refletir sobre suas próprias práticas.
Como a concepção de currículo por competência é o eixo central dessa reforma,
entendemos ser necessário conceituá-la no campo da educação. Buscamos interpretá-la, como
diz Perrenoud (1999), como um conceito que pertence à humanidade, ou seja, as
competências estão relacionadas aos homens, pois vão além da sua formação profissional,
buscam também as inteligências, a capacidade de raciocínio, as interações sociais, a tomada
de decisão, a conscientização etc.
1
Diretrizes Curriculares Nacionais para a formação de professores segundo o parecer CNE/CP 9 /2001.
Publicado no Diário Oficial da União. Brasília,18 de janeiro de 2002, Seção 1, p. 31
2
Parecer CNE/CP nº 5/2005, reexaminado pelo parecer CNE/CP nº 3/2006 e instituído pela Resolução CNE/CP
01/2006. Diário Oficial da União, Brasília , 16 de maio de 2006, Seção 1 p. 11.
10622
Esse conceito descrito por Perrenoud, nos parece estar relacionado ao que estamos
considerando ser um letramento crítico para a docência, termo que foi por nós ressignificado
e relacionado não somente às competências para uma atuação profissional, mas para uma ação
profissional de natureza transformadora e emancipatória, a partir de tomada de consciência
sobre seu papel na sociedade. Segundo Soares (2006) existem as dimensões individual e
social a serem consideradas para o letramento, e, também as interpretações possibilitadas que
podem ser progressistas ou revolucionárias permitindo o letramento funcional ou crítico.
Foram estas reflexões que nos alertaram para considerar estas diferentes dimensões e
interpretações nos levando a apresentar o que chamamos de letramento crítico da docência. A
nosso entender, este letramento compreenderá a capacidade de o professor utilizar os seus
saberes: social, profissional, pessoal, intelectual, nas demandas de sua docência e da sua vida
pessoal, mobilizando suas competências e refletindo sobre sua atuação/ação profissional
numa tomada de consciência, afim de que não se mantenham quadros de exclusão social
(reforçados por uma educação que não atende ao pleno desenvolvimento da cidadania).
O que pretendemos neste ensaio é analisar se as reformas curriculares efetuadas nos
Projetos Pedagógicos dos Cursos, à luz das orientações presentes nas DCNs, para a
elaboração de cursos de formação de professores, ocorreram para atender à construção das
competências docentes necessárias e em que medida elas se aproximam ou se distanciam do
que estamos chamando de um letramento crítico.
Nesse contexto de mudanças, nos voltamos para o curso de formação inicial dos
professores dos anos/séries iniciais, especificamente o Curso de Pedagogia da Universidade
Estadual de Ponta Grossa - UEPG. Nossa investigação acontece nesse curso após a mudança
de currículo. Queremos responder a seguinte questão: quais competências, necessárias para a
construção de um letramento crítico para a docência em matemática nos anos/séries iniciais,
estão sendo contempladas no Curso de Licenciatura em Pedagogia na Universidade Estadual
de Ponta Grossa - UEPG?
A fim de responder nosso problema, delineamos metas para nos orientar no caminho,
tendo em vista nosso referencial teórico, Soares (2006), Freire (1996, 2007), Perrenoud (1999,
2000), Fonseca (2004), dentre outros. Nossos objetivos são: identificar quais competências
docentes são necessárias para um letramento crítico da docência em matemática nos
anos/séries iniciais, verificar quais destas competências docentes estão sendo contempladas
10623
neste curso, e refletir sobre o processo de letramento crítico docente para o ensino da
matemática nos anos/séries iniciais.
Nesse momento da pesquisa estamos debruçados na elaboração de instrumentos de
coleta de informações qualitativas que nos levem a perseguir nossos objetivos e nos
encaminhem às reflexões no decorrer do processo investigativo, a fim de interpretarmos os
dados e respondermos ao nosso problema de pesquisa.
Um destes instrumentos se caracteriza pelas análises das DCNsP e do Projeto
Pedagógico do Curso de Pedagogia (PPCP) da UEPG. Buscamos identificar nas DCNsP quais
competências docentes podem contribuir para a aprendizagem da docência em matemática
nos anos/séries iniciais à luz de um letramento crítico, e verificar quais destas competências,
identificadas por nós, estão sendo contempladas no PPCP da UEPG. Nosso enfoque se faz
sobre a aprendizagem da docência em matemática, pois segundo as DCNsP esse profissional
precisa aprender a
...aplicar modos de ensinar diferentes linguagens, Língua Portuguesa,
Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma
interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano,
articularmente de crianças (...). (BRASIL, 2006, p. 9) [grifo nosso].
As diferentes linguagens atribuídas para este perfil docente, nos fazem refletir sobre a
responsabilidade da formação inicial desse profissional professor. Tem-se que levar em
consideração que são diversas as áreas a serem contempladas, com seus objetos de
conhecimento, suas especificidades, entre outras, para construção destas competências
docentes, uma vez que é este mesmo professor que ensina todas essas linguagens nos
anos/séries iniciais do Ensino Fundamental e precisam dominar tais linguagens para ensinar e
estes, muitas vezes, não conseguem talvez por conta de sua formação inicial.
O presente ensaio anuncia nossas análises dos documentos que nos levaram às
interpretações e reflexões a cerca das competências docentes necessárias para a construção de
um letramento crítico para a docência em matemática nos anos/séries iniciais.
As nossas análises
Como nosso contexto se faz na formação inicial dos professores dos anos/séries
iniciais, especificamente no curso de pedagogia da UEPG, entendendo ser necessário deixar
10624
claro que, nesse momento do estudo, não estaremos analisando as DCNs, para Formação de
Professores, mas se necessário for, as utilizaremos em nossas reflexões, uma vez que elas
contemplam a construção de competências que norteiam diversos cursos de formação inicial
de professores.
Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia (BRASIL, 2006)
buscamos as competências docentes, descritas no perfil dos licenciados, que relatam que o
egresso do curso de pedagogia precisa
I - atuar com ética e compromisso com vistas à construção de uma sociedade justa,
equânime, igualitária;
II - compreender, cuidar e educar crianças de zero a cinco anos, de forma a
contribuir, para o seu desenvolvimento nas dimensões, entre outras, física,
psicológica, intelectual, social;
III - fortalecer o desenvolvimento e as aprendizagens de crianças do Ensino
Fundamental, assim como daqueles que não tiveram oportunidade de escolarização
na idade própria;
IV - trabalhar, em espaços escolares e não-escolares, na promoção da aprendizagem
de sujeitos em diferentes fases do desenvolvimento humano, em diversos níveis e
modalidades do processo educativo;
V - reconhecer e respeitar as manifestações e necessidades físicas, cognitivas,
emocionais, afetivas dos educandos nas suas relações individuais e coletivas;
VI - aplicar modos de ensinar diferentes linguagens, Língua Portuguesa,
Matemática, Ciências, História, Geografia, Artes, Educação Física, de forma
interdisciplinar e adequada às diferentes fases do desenvolvimento humano;
VII - relacionar as linguagens dos meios de comunicação à educação, nos processos
didático-pedagógicos, demonstrando domínio das tecnologias de informação e
comunicação adequadas ao desenvolvimento de aprendizagens significativas;
VIII - promover e facilitar relações de cooperação entre a instituição educativa, a
família e a comunidade;
IX - identificar problemas socioculturais e educacionais com postura investigativa,
integrativa e propositiva em face de realidades complexas, com vistas a contribuir
para superação de exclusões sociais, étnico-raciais, econômicas, culturais, religiosas,
políticas e outras;
X - demonstrar consciência da diversidade, respeitando as diferenças de natureza
ambiental-ecológica, étnico-racial, de gêneros, faixas geracionais, classes sociais,
religiões, necessidades especiais, escolhas sexuais, entre outras;
XI - desenvolver trabalho em equipe, estabelecendo diálogo entre a área educacional
e as demais áreas do conhecimento;
XII - participar da gestão das instituições contribuindo para elaboração,
implementação, coordenação, acompanhamento e avaliação do projeto pedagógico;
XIII - participar da gestão das instituições planejando, executando, acompanhando e
avaliando projetos e programas educacionais, em ambientes escolares e nãoescolares;
XIV - realizar pesquisas que proporcionem conhecimentos, entre outros: sobre
alunos e alunas e a realidade sociocultural em que estes desenvolvem suas
experiências não escolares; sobre processos de ensinar e de aprender, em diferentes
meios ambiental-ecológicos; sobre propostas curriculares; e sobre organização do
trabalho educativo e práticas pedagógicas;
XV - utilizar, com propriedade, instrumentos próprios para construção de
conhecimentos pedagógicos e científicos;
XVI - estudar, aplicar criticamente as diretrizes curriculares e outras determinações
legais que lhe caiba implantar, executar, avaliar e encaminhar o resultado de sua
avaliação às instâncias competentes. (BRASIL, 2006, p. 20-21)
10625
Nas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Curso de Pedagogia (BRASIL, 2006)
vemos que as competências se voltam para uma formação completa para o exercício do
magistério nas dimensões da “docência”, da “gestão educacional” e da “pesquisa” (op. cit).
Portanto a abrangência que se toma nesse documento é grande e que não nos cabe analisar
nesse momento. Vamos nos reportar a dimensão da docência para os anos/séries iniciais do
ensino fundamental, verificando quais competências contemplam a aprendizagem da docência
em matemática possibilitando o desenvolvimento do que estamos chamando de um
letramento crítico docente.
Pelo exposto, podemos dizer que tais competências são, na nossa interpretação, as que
se referem aos itens I, III, V, VI, VII, IX, X, XI, XIV e XV do documento analisado. Não
consideraremos as demais por acreditarmos estarem voltadas para as dimensões da gestão e da
pesquisa educacional, apesar de que alguns aspectos da pesquisa perpassam a docência em
sala de aula e podem ser apontados em nossas reflexões.
Para todas as competências docentes apresentamos as possibilidades delas serem
construídas pelo futuro professor em seu curso de formação inicial, respaldadas pelas DCNs
para a Formação de Professores. As competências que se referem:
a) à construção de uma sociedade justa e igualitária (I), à superação de exclusões dentro da
sociedade (IX), e à consciência da diversidade e respeito às diferenças (X), poderão ser
construídas na medida em que o futuro professor desenvolver uma postura ética, de justiça, de
respeito mútuo, de responsabilidade e de compromisso com o ensino da matemática para
todos, ou seja, o conhecimento matemático oferecido a todos com igualdade, como também
aprender a identificar possíveis problemas de aprendizagens em matemática e a buscar a
superação do fracasso escolar para que assim não se consolide quadros de exclusão;
b) ao desenvolvimento e aprendizagens das crianças (III) e ao reconhecimento e respeito
sobre os educandos (V), poderão ser construídas na medida em que o futuro professor
aprender a planejar, realizar e avaliar situações de ensino da matemática, organizando o tempo
o espaço dessas aprendizagens por meio de estratégias adequadas, respeitando as diversidades
e promovendo relações de autonomia e confiança;
c) ao modo de ensinar as diferentes linguagens (VI) e ao diálogo com outras áreas do
conhecimento (XI), poderão ser construídas na medida em que o futuro professor conhecer e
dominar a linguagem matemática sabendo integrá-la com outras linguagens de modo
10626
interdisciplinar, adequá-la às atividades escolares e relacioná-la com fatos da realidade, da
vida pessoal e social dos alunos;
d) ao relacionamento das linguagens dos meios de comunicação com a educação (VII),
poderão ser construídas na medida em que o futuro professor souber utilizar essas tecnologias
da informação e comunicação para o desenvolvimento de aprendizagens em matemática, bem
como para uma leitura de mundo frente às realidades apresentadas;
e) à realização de pesquisas sobre a organização do trabalho educativo e do processo de
ensino-aprendizagem (XIV) e a utilização de instrumentos próprios para a construção de
conhecimentos (XV), poderão ser construídas na medida em que o futuro professor se colocar
em postura favorável à pesquisa frente às questões da linguagem matemática como a
organização do trabalho docente, as propostas curriculares, o ensino e a aprendizagem, as
experiências não escolares de seus alunos, a própria prática profissional que possibilitem as
reflexões devidas e as mudanças necessárias.
Estas possibilidades de construção das competências docentes para a aprendizagem da
docência em matemática expostas na DCNsP, nos auxiliaram na análise do PPCP-UEPG,
pudemos estabelecer algumas aproximações.
Como as competências docentes nas DCNsP estão relacionadas ao perfil do egresso
isso nos implica pensar que o Projeto Político Pedagógico do Curso de Pedagogia da UEPG
deva contemplá-las também no perfil do professor que se quer formar. Este perfil apresenta as
seguintes orientações
Quanto à caracterização do(a) professor(a) a ser formado(a), uma das competências
e habilidades referente à docência dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, está a
reflexão acerca das práticas pedagógicas desenvolvidas no âmbito da sala de aula e
da escola. Sobre o perfil do pedagogo(a) a ser formado(a), há um destaque à
compreensão do processo educativo em suas dimensões histórica, filosófica,
sociológica, psicológica, econômica, didática e metodológica.
Em se tratando de alguns dos princípios norteadores dessa formação destacam-se a
articulação teoria e prática e a interdisciplinaridade. Essa associação teoria e prática,
também se encontra contemplada no quadro curricular, priorizando a pesquisa como
um dos componentes da prática pedagógica, na medida em que se constitui elo
articulador da produção técnico-científica na formação do(a) educador(a),
conduzindo o(a) aluno(a) a investigar a realidade.
Tomando por base o exposto e diante da necessidade de uma efetiva relação teoriaprática no processo de formação do(a) pedagogo(a), de forma a integrar trabalho
científico e prática pedagógica, é que se propôs desenvolver um trabalho
interdisciplinar por se compreender que este vai ao encontro de um dos princípios
norteadores de formação do curso – a interdisciplinaridade, representando uma
possibilidade de promover a superação da dissociação das experiências escolares
entre si e delas com a realidade social. (UEPG, 2006, p.14)
10627
Duas questões nesse perfil nos chamaram a atenção. Primeiramente a que nele está
explicito a apresentação de apenas uma das competências necessárias para a docência, a
reflexão sobre as práticas do professor na sala de aula. Outra está sobre a formação do
pedagogo. Vemos nesse perfil duas interpretações para um mesmo profissional formado no
curso de pedagogia: o professor e o pedagogo. Nesse ensaio consideraremos apenas a
dimensão da docência, portanto da formação inicial do professor dos anos/séries iniciais.
Nossas análises sobre as competências docentes para o ensino da matemática nessa
etapa do ensino fundamental, apontam que no perfil descrito as competências docentes a
serem construídas priorizam a formação do pedagogo (aqui entendido nas dimensões da
gestão educacional e da pesquisa), mesmo quando se referem ao trabalho interdisciplinar e a
articulação entre teoria e pratica, pois consideram essas questões necessárias à formação desse
pedagogo. A única competência descrita para docência nos anos/séries iniciais está se
aproximando dos itens XIV e XV das DCNsP caracterizada como um instrumento de
construção de conhecimento próprio.
Dado o exposto entendemos que o perfil do egresso do curso de pedagogia da UEPG
está sobre o futuro pedagogo, não sobre o futuro professor. Nesse sentido não conseguimos,
por esse caminho, relacionar as outras competências necessárias para a docência em
matemática num processo de letramento crítico, que foram apresentadas anteriormente. Então
onde se encontram as demais competências? As demais competências estão sendo
contempladas pelo PPCP-UEPG? Para respondermos a essas questões analisamos as ementas
das disciplinas desse curso que desenvolvem a aprendizagem da docência. Nesse momento
apresentamos as disciplinas que por nós foram selecionadas no pressuposto de que são elas
que contribuem para o desenvolvimento das competências docentes necessárias ao ensino da
matemática nos primeiros anos de escolaridade num processo de letramento crítico docente.
Especificamente para o ensino da matemática nos reportamos às disciplinas didáticas
que tratam do conhecimento matemático, bem como das disciplinas pedagógicas constituintes
da formação do profissional docente, as demais disciplinas que compõem essa formação
inicial estão, em nossa interpretação, relacionadas à formação do profissional pedagogo
(como gestor educacional e pesquisador).
No curso de Pedagogia da UEPG as disciplinas pedagógicas de formação docente do
currículo pleno de núcleo comum que trazem a aprendizagem da docência e que contribuem
10628
para a docência em matemática são, na nossa interpretação: Psicologia da Educação II3,
Sociologia da Educação II4, Educação e Currículo5, Didática I6 e II7, Prática Pedagógica8,
Pesquisa e Prática Pedagógica I9 (UEPG, 2006). De acordo com as ementas das disciplinas
destacamos algumas aproximações com as competências docentes para o ensino da
matemática, apresentadas anteriormente e refletidas a partir das DCNsP, como a reflexão
sobre a educação e a prática educativa escolar, a introdução à pesquisa e o estudo do currículo
como prática educativa (item e), a organização do trabalho docente em sala de aula: objetivos,
motivação, planejamento, interdisciplinaridade e avaliação, as concepções de aprendizagem,
de desenvolvimento, de pensamento e linguagem e suas contribuições à prática educativa
(itens b,c), o estudo social da educação nas perspectivas conservadora e crítica (item a).
Outras disciplinas de cunho pedagógico que auxiliam a vivência das práticas
educativas e pertencem ao quadro das disciplinas de diversificação e aprofundamento, além
dos Estágios Curriculares Supervisionados (primeira experiência com a docência), e que
também contribuem para a docência em matemática, são contempladas no Plano Pedagógico
como: Cidadania e Sociedade10, Oficinas de Recursos Audiovisuais e Técnicas de Ensino11,
3
Pressupostos teóricos da matriz interacionista. Concepções de Piaget, Vygotsky e Wallon quanto à relação
desenvolvimento e aprendizagem e pensamento e linguagem. Contribuições da Psicologia para os temas da
prática pedagógica: formação conceitual; aquisição da linguagem oral, escrita e leitura; erro, avaliação e fracasso
escolar; interação pedagógica; papel do brinquedo e do jogo no desenvolvimento da criança.
4
Educação em sua dimensão social. Sociedade, Educação e Escola na perspectiva conservadora e na perspectiva
crítica. Sociedade, cultura e educação. A educação e as transformações da sociedade. Agentes informais da
Educação.
5
Currículo como campo de estudo e prática da educação. Concepções de currículo (tradicionais, críticas e póscríticas). Currículo na sociedade contemporânea. Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Básica.
Currículo no sistema de ensino, na prática da escola e na sala de aula. O currículo com vistas ao planejamento
escolar.
6
Reflexão sobre educação e a contribuição histórica do trabalho docente: repercussões sobre o campo da
didática, o ensino e a profissão. O ensino na escola contemporânea e o professor como mediador da
aprendizagem. Os processos didáticos na ação docente: transposição, contextualização, interdisciplinaridade e
suas relações com métodos e técnicas de ensino.
7
Organização do trabalho docente no cotidiano escolar: objetivos educacionais, planejamento educacional e
planos de ensino, motivação e incentivação. Avaliação do processo ensino-aprendizagem.
8
Práxis e Prática Educativa: natureza, concepções e finalidades. Prática educativa escolar e suas relações no
contexto histórico-político-social-cultural. Investigações na perspectiva da prática educativa escolar em seus
diferentes aspectos: função política e social da escola; a escola e seu entorno; projeto pedagógico: concepções,
finalidades e dimensões; organização do trabalho pedagógico; currículo: significado e tratamento do
conhecimento/espaços e tempos de aprendizagem; processos avaliativos; profissionais da escola: características,
formação e desenvolvimento profissional; processos e práticas de gestão escolar.
9
Prática educativa escolar e suas relações no contexto histórico-político-social-cultural. Problematização do
cotidiano da escola/sala de aula em suas diferentes dimensões: filosóficas, sociológicas, psicológicas, políticas,
estruturais, didáticas. Instrumentalização para a pesquisa. Definição e delimitação de problemas de pesquisa.
Revisão de literatura. Elaboração de projeto de pesquisa. Seminários de discussão.
10
Conceito e histórico de cidadania. Direitos e deveres do cidadão. Ética. Cidadania e trabalho. Cidadania e
educação. Diretrizes para o atendimento às pessoas com necessidades educacionais especiais. Princípios e
características da educação inclusiva. Aspectos éticos, políticos e educacionais da inclusão sócio-pedagógica.
10629
Tecnologia da Informação e Comunicação12. Pelas ementas dessas disciplinas destacamos as
aproximações com as competências docentes para o ensino da matemática como o estudo da
conquista da cidadania através da educação, respeito à diversidade e combate às formas de
discriminação/exclusão e a importância da educação inclusiva (item a), a organização do
trabalho docente em sala de aula na exploração de diferentes recursos no processo de ensinoaprendizagem e na utilização das tecnologias da informação e da comunicação (itens b,d).
Para a aprendizagem específica da docência em matemática o Curso dispõe da
disciplina de formação especifica profissional: Fundamentos Teórico-Metodológicos da
Matemática, que possui a seguinte ementa:
Objetivos, teorias e abordagens do ensino e aprendizagem da matemática na
educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental; estruturas matemáticas
que embasam o pensamento infantil para a efetivação de um raciocínio lógico; os
conceitos básicos da matemática no sistema de numeração decimal, números e
operações, grandezas e medidas e, tratamento da informação. (UEPG, 2006, p. 32)
Essa disciplina se aproxima das competências necessárias para a docência em
matemática nos anos/séries iniciais no que diz respeito ao modo de ensinar diferentes
linguagens (item c), mas ela também deve atender às demais competências, dando ênfase a
superação dos fracassos e de exclusões (item a).
A análise das competências docentes para o ensino da matemática nos anos/séries
iniciais à luz de um letramento crítico nos levou a concluir que no PPCP-UEPG as
competências poderiam ser apresentadas no perfil do profissional a que se pretende formar.
Elas estão implícitas nas ementas das disciplinas que foram apresentadas.
Nas de currículo pleno do núcleo comum às competências docentes estão articuladas
nos elementos necessários à formação docente, como por exemplo, o estudo das concepções
de aprendizagem. Nas relacionadas ao núcleo de aprofundamento e diversificação se
articulam à construção do que estamos chamando de letramento crítico, por permitir o estudo
Aspectos psicológicos, biológicos e sociais do uso de drogas lícitas e ilícitas. Dependência. Prevenção,
recuperação, tratamento.
11
Organização do trabalho docente no cotidiano escolar: técnicas e recursos audiovisuais no processo ensinoaprendizagem. Habilidades técnicas de ensino. Recursos audiovisuais e sua utilização no contexto da sala de
aula.
12
O processo de comunicação e as tecnologias/mídias. Tecnologias/Mídias em diferentes perspectivas:
conceitos, histórico e usos sociais. Abordagens teórico-práticas das tecnologias/mídias e sua relação com a
educação presencial e a distância.
10630
das relações entre educação e cidadania, discriminação e exclusão, como também uma leitura
de mundo pelas tecnologias de informação e comunicação.
As competências correspondentes ao ensino da matemática estão sendo apontadas na
disciplina de formação específica profissional: Fundamentos Teórico-Metodológicos da
Matemática nas relações entre o ensino e a aprendizagem da matemática com seus objetos de
estudo. O letramento crítico docente estará sendo desenvolvido pela linguagem matemática,
na medida em que os futuros professores compreendam que através dela poderá ocorrer a
emancipação social ou a reprodução de uma ordem social imposta podendo assim provocar
quadros de exclusão social.
Também identificamos no Projeto Pedagógico do Curso de Pedagogia uma maior
preocupação com a formação do pedagogo como gestor e pesquisador. Isso nos remete a
pensar sobre a natureza desse curso que pela Resolução CNE/CP 01/2006 em seu art. 1º o
caracteriza como licenciatura, portanto para formar profissionais para o exercício da docência
segundo o art. 2º dessa mesma resolução (BRASIL, 2006), apesar de que, também, está
explicito que a atividade docente compreenderá “a participação na organização e gestão de
sistemas e instituições de ensino” (op.cit.).
Não nos cabe nesse momento levantar críticas às DCNsP, como em Libâneo (2006),
uma vez que esse ensaio se caracteriza apenas pela análise das competências docentes,
necessárias para a docência em matemática nos anos/séries iniciais à luz de um letramento
crítico no contexto da formação inicial destes professores, que estão sendo contempladas nas
DCNsP e no PPCP-UEPG.
Portanto, concluímos que as competências necessárias para a construção de um
letramento crítico para a docência em matemática são aquelas que contribuem com uma
aprendizagem crítica e que permitem uma tomada de consciência visando a não permanência
de quadros de exclusão. As análises dessas competências docentes descritas nas DCNsP estão
implantadas no PPCP-UEPG pelas disciplinas relacionadas e, que algumas delas, contemplam
a formação num letramento crítico. Porém não podemos afirmar que estas competências
estejam sendo construídas efetivamente, apesar de estarem inseridas no Plano Pedagógico do
Curso de Pedagogia da UEPG. Para verificar essa efetividade há necessidade de se buscar
outros instrumentos de coleta de informações qualitativa, como uma observação, para que se
possa responder a real efetivação da construção de tais competências.
10631
REFERÊNCIAS
BRASIL. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. Diretrizes Curriculares
Nacionais para a Formação de Professores. Brasília: MEC/SESu, 2002.
________. Ministério da Educação. Secretaria de Educação Superior. Diretrizes
Curriculares Nacionais para o Curso de Graduação em Pedagogia. Brasília: MEC/SESu,
2006.
DIAS, R.E. LOPES, A.C. Competências na Formação de Professores no Brasil: o que (não)
há de novo. Educação e Sociedade, Campinas: vol.24, n.85, p.1155-1177, dez. 2003.
Disponível em < http://www.cedes.unicamp.br >. Acesso em: 16 mai. 2008.
FONSECA, M.C.F.R. (org). Letramento no Brasil: habilidades matemáticas. São Paulo:
Global Editora, 2004. 224 p.
FREIRE, P. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo:
Paz e Terra, 1996. 165p.
_________. Ação Cultural para a liberdade. 12ª edição. São Paulo: Paz e Terra, 2007.
176p.
LIBÂNEO. J.C. Diretrizes curriculares da pedagogia: imprecisões teóricas e concepção
estreita da formação profissional de educadores. Educação e Sociedade. Campinas, vol. 27,
n. 96 - Especial, p. 843-876, out. 2006. Disponível em http://www.cedes.unicamp.br Acesso
em 24 de maio de 2008.
PERRENOUD. P. Construir as competências desde a escola. Porto Alegre: ARTMED,
1999. 90 p.
______________ . Dez novas Competências para ensinar. Porto Alegre: ARTMED, 2000.
192 p.
SOARES, M. Letramento: um tema em três gêneros. Belo Horizonte: Autêntica, 2006. 125p.
UNIVERSIDADE ESTADUAL DE PONTA GROSSA. Pró-Reitoria de Graduação. Divisão
de Ensino. Projeto Pedagógico de Curso: Licenciatura em Pedagogia. Ponta Grossa: UEPG,
2006.
Download

reflexões sobre a construção das competências docentes