QUALIDADE DE VIDA DOS IDOSOS NO MUNICÍPIO DE VERANÓPOLIS (RS): UM ESTUDO DAS DIMENSÕES DE VIDA MAIS VALORADAS Géssica Mathias Diniz, Universidade Federal de Santa Maria, E-mail: [email protected] Solange Regina Marin, Universidade Federal de Santa Maria, E-mail: [email protected] Área temática: 6 - Desenvolvimento social, economia solidária e políticas públicas Resumo: O envelhecimento populacional é um processo que está em crescimento em todo o mundo. Tendo em vista o aumento da proporção de idosos na população é necessário compreender quais dimensões são consideradas importantes por eles para sua qualidade de vida. O objetivo do presente estudo é buscar na literatura informações sobre qualidade de vida e identificar quais dimensões são valoradas pelas pessoas acima de 60 anos do município de Veranópolis (RS). A Abordagem das Capacitações é utilizada como base teórica para o desenvolvimento do presente estudo, considera-se que existem outras dimensões além da renda monetária relevantes para a qualidade de vida. O formulário elaborado previamente para a identificação contou com questões abertas e em Escala Likert (0 a 10), sendo o zero nada importante e 10, muito importante, o mesmo foi aplicado a uma amostra de 106 idosos. As mulheres representaram 65% da amostra, a maior proporção dos idosos entrevistados está na faixa etária de 61 a 70 anos, cursaram entre a 5ª e a 8ª série, são casados, residem com a família, recebem aposentadoria e não possuem trabalho remunerado. Quanto à identificação das dimensões mais valoradas pela amostra para a qualidade de vida, apenas “situação econômica” e o “planejamento” não receberam 10 na Escala Likert por mais de 50% dos entrevistados, revelando que todas as dimensões apresentadas são relevantes para o grupo. A dificuldade no cumprimento do objetivo de identificação deveu-se a metodologia, escala Likert com grande amplitude, 0 a 10, além, da dificuldade de compreensão dos entrevistados quanto às perguntas, alguns respondiam o quão bem estavam se sentindo naquela dimensão e não quão importante esta era para eles. Palavras-Chave: Idosos; Dimensões valoradas; Veranópolis. 1 INTRODUÇÃO O envelhecimento populacional é uma revolução demográfica que afeta o mundo inteiro. A população deixará de ser tão jovem devido a menor fecundidade, aumento da sobrevivência das crianças e melhor saúde, e este é um processo mais rápido em países em desenvolvimento, com grande número de jovens na população. Dos 15 países com mais de 10 milhões de idosos1, sete são países em desenvolvimento. As pessoas vivem mais porque 1 Para as Nações Unidas são consideradas pessoas mais velhas (idosos) aqueles que possuem 60 anos, esta linha também é considerada por demógrafos. Mas em países desenvolvidos é usado como referência 65 anos, pois a partir desta idade as pessoas podem beneficiar-se da seguridade social (UNFPA, 2012, p. 20). 1 possuem melhor nutrição, saneamento, medicina avançada, cuidados com a saúde, educação e bem-estar econômico (UNFPA, 2012). Em 1950, havia 205 milhões de pessoas com 60 anos ou mais no mundo, já em 2012 o número de idosos chegou a 810 milhões de idosos e a projeção é de que chegue a dois bilhões em 2050 (UNFPA, 2012). De acordo com o UNFPA (2012), no período 2010-2015 a expectativa de vida para os países desenvolvidos é de 78 anos e para as regiões em desenvolvimento é de 67 anos. No período entre 2045 e 2050, estes valores serão 83 e 74 anos, respectivamente. Considerando que a partir dos 60 anos a porcentagem de idosos em 2012 era de 11% da população mundial, em 2050 será de 22%. O envelhecimento da população mundial resultará em uma pirâmide etária retangular em 2050 tanto para as regiões desenvolvidas quanto em processo de desenvolvimento (UN/DESA, 2011). Segundo dados do Censo Demográfico de 2010 apresentados no folheto Indicadores e Dados Básicos para a Saúde (IDB, 2011), o índice de envelhecimento no Brasil (razão entre o número de pessoas com mais de 60 anos de idade para cada 100 pessoas com menos de 15 anos) em 1991 era de 21 idosos para 100 menores de 15 anos, já em 2010 chegou a 44,8. A esperança de vida ao nascer, que expressa o número médio de anos de vida esperados para um recém-nascido era de 66,9 anos em 1991 e em 2010 chegou a 73,4 anos. O declínio da taxa de fecundidade de 6,28, em 1960, para 2,1 filhos por mulher, em 2010 provoca o estreitamento da base da pirâmide etária (composição populacional por faixa etária e gênero) e o alargamento da porção superior revelando uma tendência à inversão da pirâmide, ao envelhecimento da população. Em 2012, 10,9% da população brasileira possuía 60 anos ou mais. A projeção é que em 2050 esta proporção chegará a 29%. Considerando esta mesma divisão etária para cada 100 mulheres, em 2012, havia 81 homens. A expectativa de vida ao nascer no período entre 2010 e 2015, para os homens é de 71 anos, enquanto para as mulheres 77 anos (UNFPA, 2012). O município de Veranópolis, localizado no Estado do Rio Grande do Sul, recebeu na década de 1980 o título de Terra da Longevidade2 e este foi ressaltado e adotado como slogan quase uma década depois de publicada uma reportagem assinada por Herculano Gomes Mathias, na página 52 da revista Geografia Universal, onde médicos e sociólogos, dedicados ao estudo da gerontologia citavam Veranópolis como um dos locais mundiais favoráveis ao prolongamento da vida (WASKIEWICZ, 2008). Desde então, as administrações municipais 2 Em trabalho de United Nations Population Fund (UNFPA, 2012, p. 23) a expectativa de vida difere da longevidade devido a primeira referir-se ao número médio de anos que uma população com certas características espera viver, enquanto a segunda está relacionada a sobrevivência individual. 2 que se sucederam na década de 1990 deram especial atenção ao aspecto da longevidade veranense, incentivando e valorizando o grupo que reúne longevos e pesquisas vinculadas ao tema (CRUZ & MORIGUCHI, 2002, PILGER, 2006)). De acordo com dados do Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil (2013), a esperança de vida ao nascer da população veranense teve um aumento de 3,7 anos entre 1991 e 2010, chegando a 75,3 anos. Considerando-se municípios que possuam semelhante número de habitantes de Veranópolis (22.810) (IBGE, 2010), ou seja, que estejam dentro da faixa de 22 a 23 mil pessoas como, Nova Prata (22.830), Guaporé (22.810), Nova Santa Rita (22.706), Tupanciretã (22.286) e São Jerônimo (22.141) tem-se que a proporção de idosos em relação à população total de Veranópolis é superior a daqueles em um ponto percentual ou mais (15,34%). Em virtude do processo de inversão da pirâmide etária, redução da base e alargamento da parte superior é necessário conhecer o perfil desta parte experiente da população. Sabendose como é a qualidade de vida dos idosos, quais as suas características e necessidades é possível formular políticas públicas direcionadas às deficiências indicadas e reforçar os pontos positivos que colaboram para o bem estar, a fim de prologar a vida da população idosa. Tendo em vista o processo de aumento do número de idosos, quais dimensões são importantes para a qualidade de vida destes? O objetivo do presente trabalho é buscar na literatura informações sobre qualidade de vida e identificar quais dimensões são consideradas importantes pela população acima de 60 anos de idade do município de Veranópolis (RS). A hipótese a ser discutida é de que existem outras dimensões, além da renda monetária, consideradas relevantes pelos idosos para a sua qualidade de vida. Para o desenvolvimento deste trabalho será utilizado o embasamento na Abordagem das Capacitações de Amartya Sen (1979), com funcionamentos substituídos por dimensões, conforme Alkire (2008b). O trabalho está dividido em quatro seções, além desta introdução, na primeira seção são apresentados aspectos relativos à Abordagem das Capacitações, na sequência trata-se da metodologia utilizada no estudo. Os resultados e discussões estão na terceira seção e, por fim são levantadas algumas considerações. 2 A ABORDAGEM DAS CAPACITAÇÕES O economista e filósofo Amartya Sen (1979) questiona sobre o que considerar na análise de igualdade, para ele nenhuma das três abordagens referidas em seu artigo, igualdade 3 utilitária, igualdade da utilidade total, e igualdade Rawlsiana é suficiente para embasar a igualdade, nem mesmo qualquer combinação delas. Sen (1979) argumenta que a igualdade deve ser buscada em outro espaço informacional que não a utilidade ou os chamados bens primários sociais de Ralws3. A principal razão é que ambas desconsideram a diversidade humana e propõe que a ideia de igualdade de capacitações básicas supriria esta lacuna. Sen (1979) exemplifica com o caso de uma pessoa com deficiência física a fragilidade das explicações utilitaristas e de bens primários para suprir as necessidades do indivíduo tendo como foco a discussão sobre igualdade, propondo assim a interpretação das necessidades na forma de capacitações básicas (uma pessoa ser capaz de fazer certas coisas) que seria inclusa na demanda por igualdade. Sen (1979) considera as capacitações básicas como uma extensão natural da preocupação de Rawls com bens primários, mudando a atenção dos bens para o que os bens fazem para os seres humanos, o que possibilitam para o indivíduo (por exemplo, o alimento está relacionado à nutrição do indivíduo). O filósofo John Rawls (1971), assim como Sen (1979), rejeita o welfarismo, bem-estar visto como utilidade, satisfação de preferências, sua abordagem volta-se para a concepção de justiça em termos de bens sociais primários, coisas que se supõe que um homem racional deseja, supondo que existam diversas coisas que ele preferiria ter mais a ter menos. Os bens sociais primários correspondem aos direitos, liberdades, oportunidades, renda e riqueza (RAWLS, 1997, p. 97). Segundo Sen (1979), a igualdade de capacitações básicas é cultural-dependente, principalmente na ponderação de diferentes capacitações. As necessidades diferem de uma região, comunidade ou grupo social para outro, a igualdade rawlsiana também possui esta característica, porém difere da anterior no caráter fetichista. A abordagem proposta por Sen é uma extensão da abordagem rawlsiana numa direção não fetichista, ou seja, sem dar importância exclusivamente aos bens (Sen, 1979), mas também a capacidade do indivíduo em transformar os bens em funcionamentos (ARNSPERGER & VAN PARIJS, 2003, p. 91). Sen (2003) ressalta o papel do ser humano como fim nele mesmo, sendo a prosperidade econômica apenas um meio para acessar os fins e que nem sempre atende ao seu propósito. 3 Conforme Vita (1999) os bens primários tratados por Rawls são a renda, a riqueza e as oportunidades de acesso às posições ocupacionais e de autoridade mais valorizadas na sociedade. 4 2.1 Capacitações e Funcionamentos Capacitação é a liberdade substantiva de realizar combinações alternativas de funcionamentos que correspondem à realização efetiva das coisas. Pode ser considerado um pacote de funcionamentos sujeito a diversas combinações de acordo com a escolha de cada indivíduo, como por exemplo, estar nutrido adequadamente, ter boa saúde, evitar a morte prematura. “Los funcionamentos representan partes del estado de uma persona: en particular, las cosas que logra hacer o ser al vivir” (SEN, in NUSSBAUM & SEN, 1993, p. 55). Alkire e Deneulin (in Deneulin e Shahani, 2009) utilizam o exemplo da bicicleta para ilustrar capacitação e funcionamento, a bicicleta é o recurso e a mobilidade propiciada pelo bem é o funcionamento que pode não ser realizado caso o indivíduo não tenha equilíbrio ou não seja permitido o uso da bicicleta, o acesso ao recurso (possuir o bem) e as características do indivíduo criam a capacitação (liberdade) para se mover de um lugar para outro quando desejar. Os funcionamentos variam de acordo com o nível de desenvolvimento da unidade de análise e dos indivíduos observados. Para alguns, há poucos funcionamentos a serem considerados como importantes, já para um contexto de problemas mais gerais, como por exemplo, em uma comunidade isolada em que as condições de saneamento básico são precárias, não há coleta de lixo, há dificuldade em chegar ao polo de saúde, de educação, em obter emprego, entre outros problemas, a lista aumenta, ou seja, existem mais indicadores, fatores essenciais a serem supridos. Segundo Marin (2005) a mensuração dos funcionamentos é mais simples comparada a complexidade das capacitações, pois aqueles se referem às coisas que as pessoas efetivamente estão fazendo ou sendo, já as capacitações, por sua natureza contrafactual, são mais difíceis de medir. Sen (1985, p. 200) ressalta que a característica central do bem-estar é a habilidade para realizar funcionamentos valoráveis, além disso, existem variações interpessoais na transformação de bens em funcionamentos, considerando-se o consumo de alimento e o funcionamento de estar bem nutrida, a relação entre eles dependerá de fatores como metabolismo, sexo, tamanho corporal, nível de atividade, entre outras influências, ou seja, dependerá da capacitação do indivíduo para funcionar. Na figura 1, observa-se a relação que se dá entre bens e funcionamentos dados n fatores que podem influenciar na realização destes. 5 Figura 1 – A conversão de bens em funcionamentos e as variações interpessoais. Fonte: Elaborada pela autora com base em Sen (1985). Este é outro ponto de diferenciação entre Rawls e Sen, além do enfoque dado sobre os bens, pois este considera as variações interpessoais na transformação de bens em funcionamentos, enquanto o primeiro não considera as diversidades entre os indivíduos que podem interferir na efetivação do uso dos bens primários. 2.2 Liberdade de escolha: a Condição de Agente Para Sen (2000), a liberdade é central para o processo de desenvolvimento, pois impulsiona o progresso (aumento das liberdades) e possibilita a realização do desenvolvimento por meio da livre condição de agente, ou seja, permite a escolha de fazer e ser o que é valorizado pelo próprio indivíduo aumentando o seu bem-estar. Para Sen (1985), existem diferenças pertinentes a liberdade e realização de bem-estar e a liberdade e realização de agente; o indivíduo pode exercer sua liberdade de agente e não aumentar seu bem-estar, ambas as liberdades podem se mover em sentido contrário. Um homem come seu sanduíche sentado em um banco quando de repente avista um rapaz longe dali dentro do lago se afogando, ele tem a liberdade de escolher ajudar o rapaz e deixar seu sanduíche ou continuar saboreando este sem pressa. Ele decide ajudá-lo realizando sua condição de agente a qual não corresponde a realização de seu bem-estar que pode ter sido diminuído por não ter consumido seu lanche tranquilamente. Como agente ele pode valorar a oportunidade de salvar a pessoa mais que a perda da oportunidade de comer o sanduíche (SEN, 1985, p. 206). Para Sen (1985), a ideia de liberdade para realizar o bem-estar (well-being freedom) é específica voltada para o objetivo realizar o bem-estar, já a ideia de liberdade de agente (agency freedom) é mais geral, corresponde a liberdade de realizar o que uma pessoa como 6 agente responsável decida que poderia realizar. A pessoa é livre para fazer e realizar a busca por qualquer objetivo ou valor que considere importante, e o aspecto de agente de uma pessoa deve ser analisado de acordo com suas ideias. O enfoque dado por Amartya Sen sobre a liberdade substantiva do indivíduo, a liberdade de definir o que é melhor para si e a importância da análise de qualidade de vida delineiam qual deve ser o foco de políticas sociais, como destaca Robeyns (2003). Sen argued that in social evaluations and policy design, the focus should be on what people are able to do and be, on the quality of their life, and on removing obstacles in their lives so that they have more freedom to live the kind of life which, upon reflection, they find valuable. (ROBEYNS, 2003, p. 5). As políticas sociais devem possibilitar a liberdade de escolha do indivíduo para que ele realize o que deseja ser e fazer, viva da forma valorada por si. Considerando o papel da liberdade de escolha do indivíduo e a abordagem desenvolvida por Sen (1979), no subitem seguinte é apresentada uma forma de torná-la aplicável, ou seja, adequá-la ao objetivo do trabalho que se desenvolva, neste caso a busca das dimensões mais valoradas para a qualidade de vida dos idosos de Veranópolis. 2.3 Definição das dimensões a partir da Abordagem das Capacitações Segundo Sabina Alkire (2008a), a abordagem das capacitações é um método plural, ou seja, é aplicado diferentemente dependendo do lugar, da situação, do nível de análise, das informações disponíveis e do tipo de decisão envolvida. Esta abordagem não gera um grupo específico e universalmente relevante de domínios para todos os exercícios avaliativos, não há uma receita que seja aplicável a todo e qualquer grupo a que se queira analisar, mas sim várias possibilidades de domínios a serem selecionados de acordo com as particularidades do grupo a ser estudado. É necessário considerar as diferenças individuais, duas pessoas podem ter acesso ao mesmo bem e por problemas físicos ou sociais ou por escolhas uma delas pode não obter o mesmo retorno que a outra para a sua qualidade de vida. Similarly, two people might each enjoy the same quality and quantity of food every day. But if one is very sedentary and one a builder, or one is elderly and one is pregnant, or one has a low metabolism and the other a very high metabolism, then their nutritional status may diverge significantly. The builder, the pregnant woman, and the person with a high metabolism may be noticeably less well nourished. (ALKIRE, 2008b, p.2) 7 Tendo como unidade de análise o indivíduo é alterado não só o tipo de dados, mas também a ordem de agregação de uma medida de qualidade de vida. Agregando primeiro os domínios lado a lado e depois as pessoas, o que permite identificar o alcance das privações e as realizações de cada pessoa (ALKIRE, 2008b). A importância que é dada ao indivíduo, sob o enfoque desta abordagem, torna os resultados sobre qualidade de vida uma boa forma de conhecer limitações e realizações de indivíduos de um grupo social, étnico ou de uma comunidade. Por meio da análise multidimensional do bem-estar (well-being) desenvolvida por Sen, que vem se popularizando entre pesquisadores e policymakers, busca-se outras dimensões para mensurar o bem-estar além da escassez de recursos monetários, em alguns casos um indivíduo poder ser privado do exercício de suas capacitações (saúde, educação, saneamento, por exemplo) e não ser considerado monetariamente pobre (ALKIRE & FOSTER, 2007). A análise multidimensional é flexível, adaptável a diferentes contextos e propostas como já fora ressaltado, podendo ser utilizada em um setor, como Alkire e Foster (2007) denominam, para representar qualidade de educação ou dimensões de saúde, por exemplo, e ainda podem ser atribuídos diferentes pesos para as dimensões ou indicadores. O estudo de qualidade de vida vincula-se a ideia de well-being, aplicando-se o conceito de funcionamento, realização do que o indivíduo quer (SEN, 1988). The well-being of a person can be seen as an evaluation of the functionings achieved by that person. This approach has been implicitly used by Adam Smith (1776) and Karl Marx (1844) in particular, and more recently in the literature on "the quality of life". (SEN, 1988, p. 15) Sen (2003) ressalta que analisar a qualidade de vida em termos de atividades valoradas e as capacitações para realizar estas atividades possui grande relevância e aplicação, sendo que a longevidade é vista como um indicativo de uma melhora da qualidade de vida, realização do funcionamento viver. “An expansion of longevity is seen, by common agreement, as an enhancement of the quality of life” (SEN, 2003). Em trabalho anterior, Sen (1981) já havia citado a longevidade como parâmetro de qualidade de vida, além da alfabetização, deixando claro que o progresso destes é uma forma limitada de julgar o desenvolvimento econômico. Porém é útil para identificar os países que possuem melhor desempenho em relação aos outros e relacioná-lo à natureza destas economias e as políticas públicas utilizadas. O que Sen (1981) denominou parâmetro de qualidade de vida, Alkire (2008b) intitula como dimensão, um aspecto de vida valorado pelo 8 indivíduo, sendo que existem diferentes formas de determiná-las e diversas combinações serão obtidas de acordo com o grupo que se queira analisar. Para selecionar as dimensões, Alkire (2008b) apresenta cinco mecanismos: primeiro mecanismo de seleção é um exercício deliberativo ou participativo em que é usado um grupo representativo de participantes como agentes reflexivos que julgarão as capacitações focais; o segundo é a utilização de uma lista que possui legitimidade e um tipo de consenso estável como, por exemplo, direitos humanos ou Objetivos de Desenvolvimento para o Milênio; o terceiro é baseado em uma teoria, como a de Martha Nussbaum, que estruturou um grupo de 10 capacitações; o quarto mecanismo consiste no uso de dados existentes, é um critério de viabilidade sem fazer juízo de valor, normalmente é necessário para usar combinado aos mecanismos anteriores e; o último é uma lista com base em informação empírica sobre comportamentos e preferências das pessoas retiradas de estudos psicológicos ou pesquisas com consumidores ou de marketing. Alkire (2008b) elenca algumas dimensões de qualidade de vida que são com maior frequência relatadas. Sendo elas: saúde e seguridade, entendimento, realização, participação, relacionamento, satisfação e harmonia. Health and security (health, survival, security, rest, reproductive health); understanding (knowledge, understanding, information & communication); achievement (meaningful work and play – outside and at home; creativity); participation (democratic practice, voice, empowerment, self-determination); relationships (absence of shame/humiliation, love, relatedness, affiliation); satisfaction (self-integration, emotional well-being, happiness, inner peace) e; harmony (culture and spirituality, art, environment). (ALKIRE, 2008b, p. 12) A medida de qualidade de vida não é só um exercício de documentação, mas também uma forma de identificar as necessidades específicas de diferentes grupos e assim servir como orientação para políticas públicas. A medida de qualidade de vida deve possuir características especiais, tais como: ser compreensível e fácil para descrever; estar de acordo com o “senso comum” da noção de qualidade de vida; deve ser capaz de atingir os privados, rastrear mudanças e guiar políticas; deve ser tecnicamente sólido; operacionalmente viável e; facilmente replicável (ALKIRE, 2008b). O método Alkire-Foster (AF) desenvolvido pelos pesquisadores Sabina Alkire e James Foster (2007), que propõe 12 passos para se chegar a uma medida de pobreza multidimensional, é apresentado como uma forma de agregar dimensões e depois pessoas, ou seja, podem-se analisar as dimensões e agrupar os resultados para os indivíduos. Em Alkire 9 (2008b), o método AF é utilizado para mensurar a qualidade de vida, sendo a medida obtida por meio do que a autora chama de linha de corte (“top sufficiency”). “A person is identified as having a sufficient quality of life if they achieve sufficiency in some range of dimensions; achievements above sufficiency do not increase their quality of life” (ALKIRE, 2008b, p. 14). Se a pessoa realiza um tipo de dimensão é considerado que ela possua qualidade de vida suficiente. Segundo Alkire (2008b), os resultados da medida de qualidade de vida combinam o reconhecimento da proporção de pessoas que tem atingido a suficiente qualidade de vida com a preocupação do alcance, profundidade e distribuição de privações entre aqueles que ainda não a atingiram. Na seção subsequente, são apresentados a fonte de dados e o instrumento utilizado para definição das dimensões mais valoradas pelos idosos de Veranópolis. 3 METODOLOGIA O artigo utiliza as abordagens qualitativa e quantitativa. O trabalho baseia-se em referencial bibliográfico, artigo de autores que trabalham com temática semelhante à apresentada no presente estudo. Caracteriza-se por ser direta e indireta, utilizando tanto dados primários quanto dados secundários. São utilizados os dois primeiros passos do método Alkire-Foster (2007) a definição da unidade de análise já escolhida, idosos de Veranópolis e escolha das dimensões a serem consideradas em um instrumento de mensuração da qualidade de vida. Os 10 passos conseguintes do método AF não serão empregados devido ao objetivo deste estudo resumir-se a identificação das dimensões mais valoradas pela amostra, e não desenvolver uma medida de qualidade de vida como se propõe o método completo. As dimensões são determinadas de acordo com as respostas obtidas em formulário previamente elaborado, mecanismo participativo (Alkire, 2008b). Conforme a valoração dada aos diversos aspectos se identificará quais dimensões são consideradas mais importantes para a qualidade de vida dos idosos. 3.1 Fontes de dados Os dados secundários referentes às características populacionais do município de Veranópolis foram coletados do Censo Demográfico de 2010, realizado pelo Instituto 10 Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) e do Atlas do Desenvolvimento Humano (2013). A identificação das dimensões valoradas ficou por conta de formulário, descrito na sequência, aplicado a uma amostra representativa ao nível de significância de 10%, 106 idosos. 3.2 O instrumento para identificação das dimensões O instrumento escolhido para identificação das dimensões valoradas pela amostra foi o formulário que se caracteriza pela intervenção do entrevistador ao anotar as respostas do entrevistado. Este foi elaborado baseando-se na abordagem seniana das capacitações, sendo as dimensões substitutas aos funcionamentos, a habilidade e liberdade para realizar as funções e atividades vistas como essenciais pelo indivíduo. Foram empregadas dimensões já trabalhadas por alguns autores como Cummins (1995), Alkire (2008b) e Paschoal (2000). Na primeira parte do formulário têm-se as questões referentes à caracterização da amostra como idade; escolaridade; estado civil: com quem reside; se é aposentado; possui trabalho remunerado; qual é/era sua profissão; gênero e naturalidade. As questões abertas referem-se ao que os idosos pensam sobre qualidade de vida, o que é, se é possível melhorá-la no caso dos entrevistados, se estes gostariam de voltar a ser jovem e se existiriam outros aspectos considerados relevantes para a qualidade de vida, além dos citados na parte das perguntas em Escala Likert. Nesta parte do instrumento para cada dimensão é apresentada uma escala de 0 a 10 em que zero é nada importante e dez, muito importante, para compreender quais são as dimensões de qualidade de vida mais relevantes para os idosos. As dimensões sutilizadas foram: saúde física, saúde mental, independência motora, atividades físicas, atividades de lazer, seguridade, relações familiares, relações na comunidade, relação conjugal, religiosidade, satisfação pessoal, conhecimento, infraestrutura pública, participação na comunidade, segurança, meio ambiente, situação econômica e planejamento. As entrevistas foram realizadas entre os dias 29 e 31 do mês de outubro. Primeiramente, foi visitado o Lar São Francisco e a tarde acompanhou-se o trabalho do Grupo de Convivência da Longevidade de Veranópolis, em ambos os locais a pesquisadora e a colaboradora4, foram levadas pela Secretária de Assistência Social do município. No segundo dia, foram abordados transeuntes nas principais ruas do município e idosos que se encontravam em frente as suas casas ou que eram indicados por vizinhos. No último dia, na parte da manhã continuou-se 4 Tatiane Pelegrini, mestranda do Programa de Pós-Graduação em Economia da Universidade Federal de Viçosa. 11 com as entrevistas na rua e a tarde, novamente acompanhadas da secretária chegou-se a reunião do Grupo Conviver, em um dos bairros mais humildes do município, Santo Antônio. Na sequência são apresentados a caracterização demográfica e histórica do município de Veranópolis e os resultados obtidos com o formulário aplicado. 4 RESULTADOS E DISCUSSÕES O município de Veranópolis está localizado a 170 quilômetros da capital do Estado do Rio Grande do Sul, Porto Alegre, na microrregião de Caxias do Sul, na mesorregião Nordeste Rio-Grandense (Figura 1). É um município de colonização italiana; os primeiros imigrantes chegaram em 1884, quando o local pertencia ao município de Lagoa Vermelha e em 1898 foi desmembrado deste, mas somente na década de 1940 passou a ser conhecido como Veranópolis. Figura 1 – Localização do município de Veranópolis (RS) Fonte: Fundação de Economia e Estatística, FEE. Segundo dados do Censo Demográfico de 2010 (IBGE), a população é de 22.810 habitantes, sendo que 86,99% destes vivem na área urbana. São 1.974 mulheres com 60 anos 12 ou mais e 1.519 homens na mesma faixa etária, totalizando 3.493 idosos, representam 15,31% da população total. De acordo com dados do Atlas do Desenvolvimento Humano do Brasil (2013), a esperança de vida ao nascer da população de Veranópolis teve um aumento de 3,7, anos entre 1991 e 2010, chegando a 75,3 anos, acima da média para o país de 73,4 e 0,1 anos abaixo da média estadual. Em 1991, 1.893 habitantes possuíam 60 anos ou mais no município de Veranópolis o que correspondia a 11,19% da população total. Nos grupos de 5 a 9 e 25 a 29 anos estavam os maiores percentuais da população 9,30 e 9,54%, respectivamente. Neste mesmo ano, 17,41% da população estava faixa entre zero e nove anos, já em 2010, este percentual caiu para 9,95% da população. A taxa de analfabetismo dos indivíduos com 15 anos ou mais no município, em 2010, foi de 2,8% e a expectativa de anos de estudo de 11,94 anos. Ou seja, espera-se que a população possua o ensino médio (Atlas do Desenvolvimento Humano, 2013). Em Veranópolis não existem extremamente pobres e 1,96% da população é pobre5. Segundo dados do Atlas do Desenvolvimento Humano (2013), a renda per capita mensal é de R$ 1.141,67. A taxa de fecundidade caiu de 2,16 filhos por mulher em 1991 para 1,64 em 2010, já a taxa de envelhecimento aumentou de 7,63 (1991) para 10,65 idosos para 100 jovens com menos de 15 anos de idade (2010). A mortalidade infantil, neste mesmo período, caiu de 15,9 para 12,4 mortes a cada 1.000 nascidos vivos (ATLAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO, 2013). No quadro 1, é apresentado um comparativo entre os Índices de Desenvolvimento Humano Municipais (IDHMs) e os indicadores que o compõem (renda, longevidade e educação) em nível nacional, estadual e municipal com base em dados dos três últimos censos demográficos realizados pelo IBGE. 5 De acordo com a definição do Decreto n. 6.917 de 30 de julho de 2009 da Presidência da República, são consideradas extremamente pobres as famílias com renda familiar mensal per capita até R$ 70,00 e como pobres as famílias com renda até R$ 140,00 (BRASIL, 2009). 13 1991 0,493 Brasil 2000 2010 0,612 0,727 Rio Grande do Sul 1991 2000 2010 0,542 0,664 0,746 Veranópolis 1991 2000 2010 0,600 0,702 0,773 0,647 0,692 0,739 0,667 0,720 0,769 0,678 0,753 0,797 0,662 0,727 0,816 0,729 0,804 0,840 0,777 0,831 0,838 0,279 0,456 0,637 0,328 0,505 0,642 0,410 0,554 0,692 IDHM IDHM Renda IDHM Longevidade IDHM Educação Fonte: Atlas do Desenvolvimento Humano 2013 (PNUD, IPEA e FJP) Quadro 1 – Comparativo entre os Índices de Desenvolvimento Humano do Brasil, Rio Grande do Sul e Veranópolis para os anos de 1991, 2000 e 2010. No comparativo apresentado no quadro acima o IDHM e os seus respectivos indicadores são superiores em todos os anos no município de Veranópolis em relação à média do Estado e do Brasil, exceto para o IDHM Longevidade de 2010, em que a média estadual (0,840) é superior a municipal (0,838), porém, o indicador municipal é superior ao IDHM Longevidade do país (0,816). Conforme a evolução do IDHM de Veranópolis percebe-se a melhora do índice, mas não só este município obteve melhora, outros também evoluíram e isto explica o fato de ter perdido 21 posições no ranking municipal do IDHM entre 1991 e 2010, quando com 0,773 conquistou a 26ª posição dentre os municípios do Rio Grande do Sul (ATLAS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO DO BRASIL, 2013). Considerando a evolução temporal observa-se a melhora do IDHM em todas as espacialidades reforçando ideia de melhora dos indicadores que compõem o índice, principalmente, quanto à longevidade, não só o país, como o Rio Grande do Sul e Veranópolis tem obtido melhora na expectativa de vida devido a melhorias em serviços de saúde, saneamento, educação, ente outros, que aumentam a qualidade de vida dos indivíduos e a prolongam. Nas subseções a seguir pode-se observar o perfil da amostra entrevistada e a valoração dada por ela a cada uma das dimensões citadas. 4.1 Caracterização da amostra Os idosos entrevistados foram encontrados em grupos da terceira idade, lar e nas ruas de Veranópolis, 106 formulários foram respondidos sendo que destes oito pertenciam a Casa 14 Lar São Francisco, 22 ao Grupo de Convivência da Longevidade de Veranópolis, 14 ao Grupo Conviver e 61 entrevista foram feitas pelas ruas principais do município. A Casa Lar São Francisco é público-privada e foi inaugurada em 2012. Abriga 30 idosos, sendo que muitos deles possuem alguma deficiência mental, impossibilitando-os de participar da pesquisa, o lar conta com 14 funcionários. O grupo de convivência existe há sete anos, os grupos pequenos de cada comunidade foram reunidos em um só pela Secretaria de Assistência Social, atualmente possui 220 idosos associados. Cada um dos associados contribui com cinco reais por mês e, além disso, a prefeitura encaminha recursos anualmente para a manutenção das atividades. Os integrantes reúnem-se uma vez por semana no salão de festas da comunidade para realizar atividades físicas e de lazer, coordenadas por uma educadora física e duas voluntárias. O Grupo Conviver existe há 16 anos e foi uma iniciativa da assistência social, 22 idosas participam confeccionando produtos artesanais os quais são levados para suas casas. Os encontros do Grupo Conviver também ocorrem uma vez por semana, porém no Bairro Santo Antônio, um dos mais humildes do município. Na tabela 1 é apresentada a caracterização dos idosos entrevistados com base nas respostas obtidas via formulário. 15 Tabela 1 - Caracterização dos idosos entrevistados no município de Veranópolis/RS. Fonte: Elaborada pela autora com base em entrevistas. 16 De acordo as informações da tabela 1, tem-se que as mulheres corresponderam a aproximadamente 65% da amostra; 32 das 69 entrevistadas estão na faixa etária de 71 a 80 anos, já entre os homens, 20 dos 37 possuem de 61 a 70 anos, sendo que a idade média na amostra é de, aproximadamente, 73 anos. Quanto a escolaridade, 37,34% dos idosos entrevistados estudou entre 5 e 8 anos (5ª a 8ª série) e 32,08% entre 1 e 4 anos (1ª a 4ª série), entre os que completaram o ensino superior os homem são a maioria, oito para cinco mulheres e o analfabetismo atinge somente as mulheres, correspondendo a 6,6% do total. Os idosos entrevistados casados correspondem a 51,89% da amostra, sendo que entre os homens este percentual é de 54,05%, e entre as mulheres 43,48% são casadas e 34,78% viúvas. Os homens idosos entrevistados residem predominantemente com a família ou cônjuge, tendo-se igual proporção para ambos os casos, 37,84%. Já as mulheres idosas em sua maioria residem com a família, 42,03%, 29% com cônjuge e 20,29% delas vivem sozinhas. Apesar de todos estarem em idade de receber aposentadoria 10,38% do total de idosos não a recebem, e 21,70% deles ainda possui trabalho remunerado. Ao se analisar as informações de forma agregada, sem considerar as diferenças de gênero, pode-se ressaltar que as características predominantes da amostra são: faixa etária de 61 a 70 anos, a escolaridade de 5ª a 8ª série, casados, residem com a família, são aposentados e não trabalham. Assim como nos dados agregados de população apresentados IBGE (Censo Demográfico, 2010), na presente pesquisa as mulheres também se mostraram a maioria da amostra. Dentre as características apresentadas, apenas nas subdivisões de caracterização “viver em comunidade religiosa”, “possuir ensino superior”, “estar na faixa etária de 91 a 100 anos” e “possuir trabalho remunerado”, as mulheres não corresponderam a maior fatia da amostra. Destaque especial se dá ao fato de, na comparação entre homens e mulheres quanto ao estado civil, tem-se um homem viúvo para oito viúvas, pondo em pauta a questão de as mulheres terem se casado com homens mais velhos, combinado ao fato de estes terem expectativa de vida inferior a elas. Dentre as atividades que eram ou são exercidas pelos idosos predominam a agricultura e os serviços tais como, costura, trabalhos artesanais, operariado, emprego doméstico e dona de casa. Mais de 40% da amostra é natural de Veranópolis e quase de 19% tem origem em municípios vizinhos a este como, Fagundes Varela, Cotiporã, Bento Gonçalves e Nova Prata, os demais são naturais de outros municípios do Rio Grande do Sul. 17 4.2 As dimensões mais valoradas Nesta subseção são apresentados os resultados pertinentes à aplicação do formulário (anexo A) para identificação das dimensões consideradas importantes pela amostra de idosos. Quando questionados sobre “o que é qualidade de vida”, a resposta predominante foi “ter saúde”. Quanto a voltar a ser jovem 69% dos entrevistados revelaram que gostariam de voltar à juventude, por motivos diversos, alguns gostariam de ser jovens com a experiência adquirida ao longo do tempo para fazer outras escolhas, outros para ter mais liberdade, poder trabalhar e alguns gostariam de simplesmente prolongar a sua vida (viver mais). Aqueles que responderam não a questão estão satisfeitos com a idade que possuem e querem seguir o ciclo natural da vida. A questão “é possível melhorar a sua qualidade de vida?” recebeu resposta positiva de 55,66% dos entrevistados, e quanto a como fazê-lo houve diversas considerações sendo as mais citadas ter mais saúde, viajar e fazer exercícios. A última pergunta “gostaria de citar outros aspectos importantes para a sua vida?” obteve respostas semelhantes aos aspectos citados nas questões em Escala Likert, dimensões já citadas. No quadro 2 é apresentada a distribuição relativa da amostra conforme a valoração dada a cada uma das dimensões. 18 Escala Likert 10 9 8 7 6 5 4 3 2 1 0 3.A Saúde Física 67,92 16,98 9,43 3,77 1,89 - - - - - - 3.B Saúde Mental 74,53 11,32 10,38 1,89 1,89 - - - - - - 69,81 11,32 12,26 4,72 0,94 0,94 - - - - - 53,77 16,04 21,7 3,77 1,89 1,89 0,94 - - - - 3.E Atividades de lazer 59,43 15,09 14,15 3,77 1,89 4,72 0,94 - - - - 3.F Situação econômica 47,17 11,32 20,75 10,38 2,83 4,72 - 0,94 - - 1,89 3.G Seguridade 66,98 13,21 8,49 3,77 1,89 2,83 0,94 - 0,94 - 0,94 3.H Relações familiares 84,91 9,43 3,77 0,94 0,94 - - - - - - 3.I Relações na comunidade 81,13 7,55 7,55 3,77 - - - - - - - 3.J Relação conjugal 75,47 11,32 5,66 0,94 0,94 1,89 0,94 - - - 2,83 3.K Religiosidade 82,08 5,66 1,89 0,94 - - 0,94 1,89 - - 3.L Planejamento 49,06 12,26 28,3 4,72 3,77 0,94 - - - - 0,94 3.M Satisfação pessoal 76,42 12,26 8,49 0,94 1,89 - - - - - - 57,55 17,92 16,04 2,83 1,89 3,77 - - - - - 60,38 12,26 16,04 6,6 2,83 - 0,94 - 0,94 - - 58,49 16,04 10,38 8,49 2,83 1,89 0,94 - - - 0,94 3.Q Segurança 68,87 16,98 9,43 2,83 - - 0,94 0,94 - - - 3.R Meioambiente 85,85 2,83 2,83 0,94 - - - - - - 3.C Independência Motora 3.D Atividades físicas 3.N Conhecimento 3.O Infraestrutura pública 3.P Participação na comunidade 6,6 7,55 Fonte: Elaborada pela autora com base em dados da pesquisa Quadro 2 - Distribuição da valoração dada pela amostra às dimensões apresentadas. Conforme o quadro 2, as dimensões que tiveram maior proporção da amostra as considerando muito importantes (10 na Escala Likert) foram: meio ambiente, relações 19 familiares, religiosidade, relações na comunidade, com 85,85, 84,91, 82,08 e 81,13%, da amostra, respectivamente. As dimensões situação econômica e planejamento foram avaliadas como muito importantes por menos da metade da amostra 47,17 e 49,06%, respectivamente. E algumas dimensões foram consideradas nada importantes (zero na Escala na Likert) por parte da amostra, relação conjugal por 2,83%, situação econômica 1,89%, planejamento, seguridade e participação na comunidade receberam zero de 0,94% da amostra, cada uma delas. O fato de relação conjugal receber o maior número de zeros dentre as demais dimensões deve-se as experiências negativas como, por exemplo, brigas entre casais, já para o caso da situação econômica, algumas pessoas julgaram-na não ser a mais relevante por acharem que outras dimensões tem maior peso para a qualidade de vida. Conforme a avaliação realizada pelos idosos das dimensões apresentadas no formulário (anexo A) todas, exceto “situação econômica” e “planejamento”, foram consideradas muito importantes (10) por mais da metade da amostra. Mas, mesmo estas duas dimensões receberam entre 6 e 9 de 45,28 e 49,05% da amostra, respectivamente, caso seja feito um corte na escala dividindo-a entre zero e 5 (pouco importante) e entre 6 e 10 (muito importante) pode-se considerar que todas as dimensões sendo elas, “saúde física”, “saúde mental”, “independência motora”, “atividades físicas”, “atividades de lazer”, “seguridade”, “relações familiares”, “relações na comunidade”, “relação conjugal”, “religiosidade”, “satisfação pessoal”, “conhecimento”, “infraestrutura pública”, “participação na comunidade”, “segurança” e “meio ambiente” são relevantes para a qualidade de vida dos idosos veranenses, inclusive “situação econômica” e “planejamento”. 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho se propôs a identificar as dimensões mais valoradas pelos idosos para a sua qualidade de vida embasada na abordagem das capacitações e na condição de agente desenvolvidas por Amartya Sen. O conceito de qualidade de vida abrange um vasto número de domínios conforme o ponto de vista sob o qual é analisado (ciências sociais, ciências da saúde). Sob a perspectiva de pessoas comuns, geralmente, a qualidade de vida é vista como sinônimo de ter saúde, porém, conforme foram apresentadas as demais dimensões estas também se revelaram 20 importantes para os idosos, confirmando a pluralidade delineada pela ciência para descrição deste conceito. Um dos pontos tratados por alguns dos idosos entrevistados quando perguntados sobre se gostariam de voltar a ser jovens e o porquê, ressalta o aspecto tratado por Sen (1985) sobre a liberdade de escolha do indivíduo. Aqueles que responderam positivamente argumentaram que quando mais jovens possuíam mais liberdade, ou seja, exerciam a sua condição de agente que agora sendo idosos, devido às limitações pessoais, físicas ou biológicas. Devido à idade que possuem não podem mais exercer, não podem aproveitar as oportunidades que lhes são oferecidas e tem dificuldade em realizar os objetivos que consideram importantes. Considerando-se a identificação das dimensões se percebe nos resultados que a grande maioria das dimensões apresentadas foi considerada muito importante para a qualidade de vida dos idosos. A menor importância dada a situação econômica corrobora a visão de Sen (2003) de que o ser humano é um fim em si mesmo e a prosperidade econômica é somente um meio para atingir seus propósitos, existem outras dimensões importantes para a qualidade de vida além da renda monetária (ALKIRE & FOSTER, 2007). A possível falha da pesquisa em identificar as dimensões mais valoradas resultou da dificuldade de compreensão dos entrevistados quanto às perguntas, alguns respondiam o quão bem estavam se sentindo naquela dimensão. Outro ponto a ser considerado, é que a questão da qualidade de vida e a relevância de seus aspectos não são analisadas pela população, normalmente. Além disso, a metodologia empregada em Escala Likert com 10 pontos criou grande amplitude para as respostas e problemas na análise destas. A sugestão que fica para um trabalho futuro é identificar a influência das características individuais (biológicas e físicas), neste caso dos idosos, na conversão dos bens em funcionamentos, ou seja, na realização das dimensões, conforme a ideia subjacente ao trabalho de Sen (1985). REFERÊNCIAS ALKIRE, Sabina. Choosing Dimensions: The Capability Approach and Multidimensional Poverty. Munich Personal RePEc Archive, n. 8862, 2008a. ______. The Capability Approach to the Quality of Life. Oxford Poverty & Human Development Initiative, 2008b. Disponível em: <www.ophi.org.uk/wpcontent/uploads/OPHI-RP-2a.pdf>. Acesso em: 23 set. 2013 21 ALKIRE, S.; FOSTER, J. Counting and multidimensional poverty. 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