Tunísia: Há exatamente quatro anos acendia a fagulha da revolução do Norte da África - 12-17-2013
por Por Dentro da África - Por dentro da África - http://www.pordentrodaafrica.com
Tunísia: Há exatamente quatro anos acendia a fagulha da
revolução do Norte da África
por Por Dentro da África - terça-feira, dezembro 17, 2013
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Marcha no Fórum Social Mundial, na Tunísia - Foto:
Natalia da Luz
Natalia da Luz, Por dentro da África
(Artigo escrito em 2013, em comemoração aos três anos da Revolução na Tunísia)
Túnis, Tunísia - Há quatro anos a faísca sobre o corpo de Mohamed Bouazizi se alastrou pela Tunísia e
pelos vizinhos do norte do continente, ultrapassando as fronteiras africanas. Em protesto contra a
desigualdade e corrupção do governo ditatorial (que estava há 23 anos no poder), o tunisiano de 26 anos
se tornou o primeiro mártir da onda de revoltas que depuseram tiranos como Ben Ali (Tunísia), Hosni
Mubarak (Egito) e Muammar AL Gaddafi (Líbia).
- Eu desembarquei na Tunísia dois meses antes de Mohamed Bouazizi atear fogo ao próprio corpo. A
família do ditador extorquia setores civis e econômicos do país. Por isso, que a fuga do ex-presidente foi
um grande alívio para a população. Houve muitos saques em todas as propriedades da família, e o país foi
tomado por uma necessidade de mudança – disse, em entrevista exclusiva ao Por dentro da África, o
então embaixador do Brasil na Tunísia, Luiz Antônio Fachini Gomes.
Desde às vésperas da revolução no país, o brasileiro pode observar que a ditadura do passado era cercada
de espionagem, prisões arbitrárias, perseguição aos islamistas e pouca, bem pouca liberdade de imprensa.
Mohamed Bouazizi era um jovem vendedor de frutas que sustentava a família com cerca de US$ 100 por
mês. No dia 17 de dezembro de 2010, após guardas tentarem suborná-lo, ele foi à sede do governo local
(na cidade de Sidi Bouzidi) para pedir os seus produtos de volta. Ele jogou combustível sobre si mesmo e
acendeu um fósforo. Bouazizi morreu 18 dias depois.
A Tunísia e a Revolução do Jasmim
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Limitada ao norte e a leste pelo Mar Mediterrâneo, o
país de cerca de 10 milhões de habitantes possui fronteira ocidental com a Argélia e com a Líbia ao
sudeste e tem quase 40% do território ocupado pelo deserto do Saara.
Colonizada pelos fenícios em 1000 a.C, a região onde hoje é a Tunísia foi um importante centro
comercial do mar Mediterrâneo até a sua destruição pelos romanos em 146 a.C. Em 1574, a Tunísia foi
incorporada ao Império Turco-Otomano até 1881, quando se tornou protetorado da França. A
independência só chegou em 1956.
Em 1987, o primeiro-ministro Zine El Abidine Ben Ali assumiu o cargo de presidente. Na ocasião, ele
revogou a presidência vitalícia e estabeleceu a liberdade partidária. Mesmo acusado de perseguir a
oposição, Ben Ali e o seu partido venceram as eleições de 1994 e permaneceram no poder até janeiro de
2011, quando a sequência de protestos populares (iniciada com Bouazizi) e chamada de Revolução
de Jasmim, fez 338 mortos e 2147 feridos, segundo dados do governo. Ali ganhava sempre as eleições
porque só os seus partidarios podiam votar!
Economicamente, a Tunísia é considerada dependente
da Europa. Cerca de 80% de suas relações comerciais eram com nações europeias. Após a revolução,
Fachini destaca que novas portas foram abertas, ligando a Tunísia aos Estados Unidos, países da Ásia e
America Latina, por exemplo.
- Essa abertura é importante porque, nesses três anos de revolução, o nível de pobreza aumentou. Além da
instabilidade já prevista, houve a crise europeia que, de certa forma, atingiu fortemente a Tunísia. Traçar
novas rotas de negócios faz parte desse processo - afirmou Fachini que, antes da Tunísia, esteve como
embaixador do Brasil na Guatemala, no Irã e como Cônsul-Geral em Sydney.
O turismo, principal atividade do país, foi diretamente comprometido pela revolução e pela instabilidade
que ainda ronda o país.
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Eleições de 2011
Dos países que viveram a primavera Árabe, a Tunísia foi a primeira a realizar eleições para a Assembleia
Constituinte. No dia 23 de outubro de 2011, os tunisianos elegeram 217 membros da Assembleia
responsável por aprovar uma nova Constituição (ainda em discussão) e designar um Governo que dirija o
país até às próximas eleições gerais, ainda sem previsão.
-As eleições foram muito transparentes, acompanhadas por observadores nacionais e internacionais. Os
partidos puderam se organizar e, a partir daí, foi formado um novo governo de transição com ativistas que
erguiam e carregavam a bandeira da mudança - ressalta o embaixador.
Marcha no Fórum Social Mundial, na Tunísia - Foto:
Natalia da Luz
Nesta eleição, o Ennahda (classificado como islâmico moderado) obteve 90 dos 217 assentos da
Assembleia Constituinte. Com esses resultados, o partido islâmico, duramente reprimido pelo exditador, passou a exercer (e certamente exercerá) forte influência na política do país.
Veja também: "A Primavera Árabe precisava acontecer"
-As eleições mostraram que a Tunísia não era tão ocidentalizada quanto parecia... Existia
uma influência de países islâmicos do Golfo, que não percebíamos com nitidez, porque a maioria dos
islamistas estava na prisão, na época de Ben Ali. Hoje, o país passa por um momento no qual o Islã está
se afirmando, e talvez haja correntes radicais mais ativas no seio do movimento religioso...
Fórum Social Mundial
Dentre as muitas interpretações, o sentido de dignidade se apresenta sobre os pilares dos direitos humanos
e da justiça. No Fórum Social Mundial de Túnis, na Tunísia, esse foi o mantra do encontro que reuniu
milhares de organizações e mais de 50 mil pessoas em debates que atingem, principalmente, os países em
desenvolvimento. A democracia, igualdade entre os sexos, liberdade de expressão, acesso ao próprio
território são temas que regeram o fórum deste ano, organizado no norte da África.
O encontro aconteceu em um momento crucial para os movimentos sociais, que ganharam impulso após a
queda de Ben Ali em 14 de janeiro de 2011. Um mês antes do fórum, outro jovem, Adel Khazri, de 27
anos, fez o mesmo chamando a atenção do mundo para as mudanças que ainda precisam ser realizadas na
Tunísia.
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- A vinda do Fórum foi de extrema importância para esse momento político porque ele é uma inspiração
para a democracia e a liberdade. Há muitas ideias democráticas que foram trazidas para cá, e esse debate
só aumenta a esperança da população.
Identidade no Pós-Revolução
À beira do Mediterrâneo, a Tunísia é um país de
influência ocidental, considerado o mais liberal do norte da África comparado aos seus vizinhos
Marrocos, Egito, Argélia e Líbia. Após a revolução, em uma sociedade que virou as costas para a
repressão, as questões identitárias se tornaram urgentes.
- Existe um debate sobre a identidade nacional do país, tanto na Constituição antiga quanto no presente
esboço. Há uma caracterização da Tunísia como um país muçulmano e árabe, algo que preocupa certos
setores da sociedade – contaFachini, lembrando que essa caracterização pode ficar prejudicada, caso o
enfoque seja na religião.
Ele exemplifica essa questão com a Sharia (Lei Islâmica), que, para muitos, deveria ser a fonte de
inspiração do direito e da Constituição. Além disso, Fachini destaca que tem havido aumento no índice de
violência no país, com ataques a manifestações artísticas de influências ocidentais, com críticas aos
movimentos leigos e ao excesso de liberalização.
- A Constituição tem que ser para todos os tunisianos,
não pode ser para alguns. Nesse processo, pensamos: Será que isso vai restringir os direitos humanos?
Como ficará a influência dos países do Golfo, onde a posição da mulher é tão criticada? – pergunta o
representante do Itamaraty, listando alguns dos temores da sociedade tunisiana. No último domingo,
partidos políticos escolheram o ministro da Indústria, Mehdi Jomaa, para chefiar o governo ainda em
crise.
Por outro lado, há mais protestos, manifestações e críticas abertas ao regime, à economia, à sociedade do
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que no período de Ben Ali, quando a imprensa era absolutamente controlada, e a polícia agia como
guarda privada do ditador.
- Ações radicais, no entanto, podem afugentar o capital e os turistas. Vamos ver o que será da Tunísia nas
próximas eleições porque ainda estamos em transição. Eu acredito que, com o passar do tempo, haja mais
equilíbrio, pois, historicamente, o povo tunisiano está acostumado com múltiplas influências,
responsáveis por uma grande variedade cultural do país.
Confira o vídeo abaixo
http://www.youtube.com/watch?v=8eAMrWzIzq0
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