CORES SUBURBANAS NA VISUALIDADE TELEVISIVA: uma análise dos processos da Direção de Arte na minissérie Suburbia de Luiz Fernando Carvalho1 Milena Leite Paiva2 Resumo: Este trabalho apresenta uma abordagem acerca dos processos da Direção de Arte na construção de visualidades televisivas, com foco na concepção estética da direção de Luiz Fernando Carvalho em projetos realizados para a Rede Globo de Televisão, tendo como objeto de estudo a minissérie Suburbia (2012). Pretende-se analisar o conceito visual transcrito na paleta de cores da minissérie, propondo uma discussão acerca da relação entre Direção de Arte e encenação, a partir da relação entre a composição cromática da obra e a estruturação da sua narrativa. Palavras-chave: Direção de Arte; encenação; narrativa; minissérie; Luiz Fernando Carvalho. Abstract: This paper presents an approach about the processes of Art Direction in building visualities television, with a focus on aesthetic design direction of Luiz Fernando Carvalho projects conducted for Globo TV, having as object of study miniseries Suburbia (2012) . We intend to analyze the visual concept transcribed in the color palette of the miniseries, proposing a discussion about the relationship between Art Direction and staging, from the relationship between the chromatic composition of the work and the structure of his narrative. Keywords: Art Direction; staging; narrative; miniseries; Luiz Fernando Carvalho 1. Direção de Arte e encenação Na produção audiovisual brasileira, a Direção de Arte é uma das instâncias responsáveis pela criação do projeto estético que define a visualidade de uma obra cinematográfica ou televisiva, a partir da transcrição do roteiro em materialidade cênica, ou seja, nos elementos que se inserem no planejamento conceitual do espaço cênico, do figurino e do visagismo3, e que sustentam a encenação proposta pela direção, corroborando, assim, a construção de universos diegéticos verossímeis e a caracterização das personagens que ocupam e interagem nestes espaços. Segundo Pereira (1993, p. 34), “A Direção de Arte é a regente maior de toda a estética do filme, da “arte”, do visual [...]”, e, com base nesta citação, podemos defini-la como a função que, em parceria com a Direção de Fotografia, concebe plasticamente os planos Trabalho apresentado no Seminário Temático “Narrativa Audiovisual”, durante a I Jornada Internacional GEMInIS, realizada entre os dias 13 e 15 de maio de 2014, na Universidade Federal de São Carlos. 2 Graduada em Desenho Industrial – Programação Visual pela Universidade do Estado da Bahia e mestranda pelo Programa de Pós-Graduação em Multimeios do Instituto de Artes da UNICAMP. Atualmente desenvolve uma pesquisa focada na relação entre Direção de Arte e mise-en-scène na construção de visualidades fílmicas e televisivas, com Bolsa FAPESP. E-mail: [email protected]. 3 Termo referente a produção de maquiagem e cabelo das personagens. 1 1 estruturantes da narrativa audiovisual e determina as bases para a criação da visualidade da obra: a atmosfera, o clima, a textura e a cor das imagens. O diretor de arte e a sua equipe, seguindo a proposição estética do diretor, definem as diretrizes criativas e processuais do projeto de arte - uma sistematização dos conceitos e determinações técnicas que vão orientar todo o processo de composição visual da obra –, relacionando visualmente paleta de cores, cenografia, figurino e visagismo, além de efeitos especiais e design gráfico. (...) Assim, pode-se estabelecer caminhos a serem seguidos que irão caracterizar o desenho geral do filme, dando subsídios tanto para o diretor, o fotógrafo e o montador, resultando um trabalho de conjunção, de união e que se traduzirá em mais uma das texturas do filme. Cada filme, um universo em si, é elaborado e pensado como uma única peça: o diretor de arte cria e traduz, através do trabalho visual, as concepções do diretor sobre determinado roteiro. (PEREIRA, 1993, p. 6-8) Com base nesta perspectiva, e considerando as especificidades teóricas e empíricas deste campo de estudo, este artigo apresenta uma abordagem acerca do caráter conceitual da Direção de Arte na concepção de visualidades audiovisuais, propondo, a partir de uma análise não simbólica da paleta de cores da minissérie Suburbia - produção dirigida por Luiz Fernando Carvalho e veiculada pela Rede Globo de Televisão -, uma discussão sobre as possíveis relações dialógicas estabelecidas entre a estrutura narrativa da obra e a composição cromática da sua materialidade cênica, com o objetivo de pontuar as correlações estéticas e expressivas da cor com a encenação proposta. O estudo visual realizado parte do princípio de que o diálogo formal entre a encenação e os elementos da Arte contribui para a construção de significados na obra, projetando sentidos na narrativa, e importantes desdobramentos visuais nas suas imagens finais, sendo a cor um dos principais elementos discursivos. É importante pontuar, para tanto, que no âmbito das narrativas audiovisuais, a encenação4 é definida como as escolhas formais de um realizador/diretor sobre o conjunto de procedimentos formado pelo ponto de vista da câmera, pela iluminação, pelo espaço cênico, pelo figurino, pela maquiagem e pela atuação e gestualidade dos atores; o que implica, portanto, em decisões relativas à localização da câmera e da duração de planos, e em “organizar as deslocações, os movimentos, a ‘coreografia’ dos corpos dos atores, os ritmos de elocução, os olhares”, e “pensar na cenografia, no guarda-roupa e nas iluminações” (AUMONT, 2005, p. 51). 4 É recorrente nos estudos audiovisuais brasileiros, a opção pelo uso da palavra mise-en-scène (termo originário da tradição cinematográfica francesa) ao invés de encenação. 2 Além disso, considerando a conjuntura da análise proposta, é imprescindível estabelecer que o conceito de narrativa aqui adotado, seja o proposto no livro Dicionário Teórico e Crítico de Cinema5: a narrativa como “o enunciado narrativo que assegura a relação de um acontecimento ou de uma série de acontecimentos” (AUMONT; MARIE 2003, p. 209 apud GENETTE, 1966), e, neste sentido, que a obra audiovisual, enquanto imagem em movimento, seja compreendida como a articulação rítmica entre planos (e toda a sua composição visual), de forma a elaborar um discurso que faça sentido para o espectador. Uma narrativa é produzida por alguém (ou por uma instância semi-abstrata, tal como a produção de filmes de ficção); por conseguinte, ela se oferece a mim não como a realidade, e sim como uma mediação da realidade, que tem traços de não-realidade; é um “discurso fechado que vem irrealizar uma sequência de acontecimentos”, conforme a fórmula notavelmente econômica de Christian Metz (1975). (AUMONT; MARIE, 2003, p. 209) Consideramos ainda que, como formato narrativo, as minisséries se enquadram no gênero das narrativas seriadas, por serem estruturadas em capítulos e blocos, e exibidas em dias distintos, e se caracterizam como produtos de teledramaturgia diferenciados no âmbito da produção industrial da Rede Globo de Televisão; o que implica em roteiros mais elaborados e maiores investimentos da emissora em recursos audiovisuais inovadores, que trazem reverberações estéticas na estruturação das narrativas e dos projetos de arte das obras. Sobre a minissérie, assim explica Pallottini (2012, p.28): (...) É uma espécie de telenovela curta, cujo texto está totalmente fechado, comumente, quando começam as gravações. É uma obra já então definida em sua história, peripécias e final, no momento em que se inicia. Não comporta, em geral, modificações a serem feitas no decurso do processo e do trabalho, como a telenovela brasileira. (...) No entanto, em sua técnica de escrita, ela se assemelha mais a um filme longo de cinema. Supõe apenas uma trama importante, desenvolvida ao longo dos capítulos, e não a multiplicidade de tramas que caracteriza as telenovelas. Já a análise cromática terá como alicerce teórico as premissas conceituais dos estudos de Guimarães (2010) sobre o fenômeno cor, e, sobretudo, a concepção de que nos processos da Direção de Arte, a paleta de cores pode ser definida como a composição cromática que estrutura formas e texturas da materialidade cênica, e constitui uma camada expressiva essencial para a construção da encenação e para a criação da atmosfera e do clima da narrativa, interferindo diretamente na plasticidade da imagem audiovisual. 5 AUMONT, Jacques; MARIE, Michael. Dicionário Teórico e Crítico de Cinema. Tradução: Eloisa Araújo Ribeiro. Campinas: Papirus, 2003. 3 Uma composição cromática, como toda experiência visual, é dinâmica. As cores apresentam características de peso, distância e movimento que, combinadas à proporção e localização das formas, constroem uma informação complexa cuja totalidade provoca reações diversas no observador. (GUIMARÃES, 2000, p.75) A cor é, portanto, o elemento visual que perpassa toda a construção da Direção de Arte, desde a cenografia até os efeitos especiais, e a interação cromática pode acarretar diferentes e inesperados sentidos na visualidade construída, cabendo à equipe de arte saber explorar a sua potencialidade expressiva, sem limitações criativas e ideológicas préconcebidas. Como afirma Barnwell (2013, p. 112): “O designer de produção tem todo o espectro de cores para escolher, e suas escolhas podem influenciar como o público vivencia o clima, a atmosfera e a emoção em uma cena”. Cada projeto estrutura a sua paleta de cores conforme os seus próprios conceitos, e o que pode parecer simplesmente inadequado para uma determinada narrativa se encaixa perfeitamente em outra. Assim, definimos a paleta de cores concebida pela Direção de Arte, em diálogo com a Direção de Fotografia, como um elo visual entre planos e sequências estruturantes da narrativa audiovisual, de forma a construirmos um entendimento sobre a narrativa da cor na minissérie Suburbia, sem nos determos, como já dito, nas particularidades simbólicas predeterminadas das cores, e sim no comportamento expressivo destas na composição das cenas e na criação de significados no discurso audiovisual proposto. Com base neste repertório teórico, partiremos então para a análise. 2. Direção de Arte e paleta de cores em Suburbia Com texto escrito pelo diretor Luiz Fernando Carvalho em parceria com o escritor Paulo Lins6, a minissérie Suburbia, produzida em oito capítulos e exibida entre novembro e dezembro de 2012, apresenta um discurso audiovisual considerado inovador para os padrões televisivos. A sua narrativa, contextualizada em meados da década de 1990, discute temáticas sociais prementes na sociedade brasileira, como a escravidão, o racismo e a violência, e, embora pelo viés folhetinesco, traça um perfil documental da conjuntura social vivenciada pela população negra no país, construindo um retrato da vida nos subúrbios cariocas: a 6 Paulo Lins é o escritor do romance Cidade de Deus (1997), obra adaptada para o cinema pelo cineasta Fernando Meirelles em 2002. 4 violência do tráfico de drogas, as condições precárias de trabalho, a religiosidade e as manifestações culturais do povo negro. Idealizado e roteirizado em total simbiose com o escritor Paulo Lins, Suburbia ofereceu uma alternativa a cartilha dos favela movies que tomou o audiovisual brasileiro de assalto chegando também aos clichês televisivos. Após quase uma década era chegada a hora de partir para um exercício lúdico de rememorar a identidade sensorial da periferia. Para isso era preciso romper com o discurso da ficção oficial viciada hoje em um discurso da classe C, uma realidade virtual movida pelo consumo e retratada pela chave da caricatura e buscar uma dramaturgia genuína, sem prosaísmos. Uma dramaturgia que retrata, em todas as suas dores e alegrias, a poesia cotidiana7. A protagonista Conceição, uma moça negra, de beleza escultural e com talento para a dança, enfrenta na infância, a miséria e a exploração do trabalho nas carvoarias do interior de Minas Gerais, até fugir para o Rio de Janeiro em busca de melhores condições de vida. Na cidade, após alguns anos de trabalho como empregada doméstica, ela é acolhida por uma família do subúrbio carioca, onde se descobre em um espaço urbano marcado pela violência e pela sensualidade, mas também pela generosidade e pela fé. Nesta nova fase da vida, Conceição conhece Cleiton, por quem se apaixona e vive uma história de amor. Diretor de cinema e televisão, Luiz Fernando Carvalho tem um longo percurso na direção de produtos de teledramaturgia8 e é reconhecido por produzir minisséries que inovam os padrões televisivos tradicionais. Em Suburbia, o diretor concebe uma encenação que tende ao realismo, cuja estética, predominantemente cinematográfica, revela a sua opção pela opacidade no discurso audiovisual e no uso dos meios técnicos de produção, como a câmera na mão e jump cut’s9. A minissérie conta ainda com um elenco majoritariamente negro, formado, em sua maioria, de não-atores com histórias de vida próximas às das suas personagens; o que reforça a perspectiva documental da obra, evidenciada na seguinte fala de Carvalho: [...] a minha preocupação permanente foi a de fazer uma aproximação com o real de forma mais epidérmica, menos cenográfica, menos oficial, menos industrializada, digamos assim. Ao fazer uma aproximação mais 7 Citação retirada do DVD da minissérie. Destacam-se do conjunto de suas produções, as novelas: Renascer (1993), O Rei do Gado (1996), Esperança (2002) e Meu pedacinho de chão (2014); e as minisséries, Riacho Doce (1990), Os Maias (2001), Hoje é dia de Maria (2005), primeira e segunda jornadas, A Pedra do Reino (2007), Capitu (2008) e Afinal, o que querem as mulheres? (2010). No cinema, assina a direção do curta-metragem A Espera (1986), o longa-metragem Lavoura Arcaica (2001), além do documentário Que teus olhos sejam atendidos (1997). 9 Raccord entre dois planos quase idênticos, entre os quais a distância espaço-temporal é muito fraca. (AUMONT; MARIE, 2001) 8 5 documental, você estaria arrastando com esse olhar uma série de críticas ao contexto da sociedade em relação a essas minorias. E, de uma forma muito espontânea, acaba incluindo uma reflexão social dentro da dramaturgia, trazendo para o texto uma função social importante: um vínculo. [...] Suburbia conta uma trajetória folhetinesca, mas ela não se exime de sublinhar certas passagens, certas condições desse ser humano excluído. E aí vem toda a questão dos negros, da família dos negros, de um elenco formado de negros, de um elenco desconhecido... (CADERNO GLOBO UNIVERSIDADE, 2013, p.81) A Direção de Arte da minissérie se alinha à encenação proposta pelo diretor, concebendo uma materialidade cênica cujos elementos articulam um registro material e social do contexto espaço-temporal da narrativa. Evitando os artificialismos e abstracionismos, o projeto de arte segue a preferência pela montagem de cenários em locações reais e pela concepção naturalista de figurino e visagismo, adequadas à estética cinematográfica adotada. Porém, é possível observar que, embora a tendência realista defina visualmente a minissérie, a estrutura narrativa da obra, construída a partir do olhar e dos sentimentos da personagem/narradora permite, em determinados domínios da linguagem, certas soluções estéticas que podem ser consideradas como não realistas, e que recaem por vezes na poesia visual. Estes desvios estéticos no discurso audiovisual construído interferem diretamente nas escolhas da Arte e da Fotografia, agregando complexidade à visualidade da obra, sobretudo na sua paleta de cores, já que a manipulação de luz e cor converge em direção oposta ao realismo. Assim, a paleta de Suburbia, composta predominantemente pelos matizes azul, vermelho, amarelo e verde, que interagem na maior parte das cenas com a incidência direta de luz branca, ou determinam os tons das luzes artificiais, define também particularidades dramáticas e conceituais às sequências, traduzindo as emoções e o ritmo dos acontecimentos vividos pela protagonista. O emprego desses matizes ou das suas variações tonais nos elementos materiais é predominante, pincelando figurinos, cenários e objetos, e se integrando à encenação, se configurando como um reflexo do trabalho visual da Direção de Arte e da Direção de Fotografia na composição dos planos10. É interessante ainda acrescentar neste ponto da análise, apesar de não pretendermos trazer indicações simbólicas sobre a paleta de cores, que uma das principais referências para a concepção visual da obra é o trabalho do fotógrafo Walter Firmo, conhecido por documentar os subúrbios brasileiros, e retratar os corpos e rostos da população negra do país. 10 É preciso considerar, no entanto, que atualmente nas produções televisivas há um intenso trabalho de pósprodução digital, cabendo ao colorista a responsabilidade de corrigir digitalmente as cores das imagens. 6 Consideramos que a estruturação do projeto de arte evidencia a captação da visualidade das imagens de Firmo, particularmente no que concerne a representação do subúrbio carioca, que na obra é construído sob um olhar bucólico e poético, e expressa uma atmosfera visual próxima a do retrato do músico Pixinguinha (Fig. 01), de autoria de Firmo. É possível traçar diversos paralelos entre o retrato de Pixinguinha e o subúrbio construído na obra, principalmente no que se refere ao projeto cenográfico - a casa da família que acolhe a protagonista ainda apresenta aspectos rurais, com quintal amplo, árvore e balanço, chão batido e criações; além das implicações cromáticas - como a predominância dos tons pastéis nas cenas contextualizadas no bairro de Madureira. Fig. 01. Casa do Maestro Pinxinguinha em Ramos (WALTER FIRMO, 1968) 3. Narrativa da cor em Suburbia Seguindo a análise, identificamos na estrutura narrativa da minissérie Suburbia, quatro tendências cromáticas que atuam em conformidade com o conteúdo articulado nas cenas e com a proposta de encenação do diretor: no prólogo, a representação da infância de Conceição, as sequências intercalam cores terrosas ao predomínio luminoso do azul, definindo contornos oníricos às imagens; na chegada da protagonista ao Rio de Janeiro, é notável uma alteração brusca na paleta de cores, que agora ganha um colorido carnavalesco; nas cenas que retratam o subúrbio, uma predominância dos tons pastéis, ou seja, observa-se 7 uma atenuação ascendente das cores (clareamento); e nas cenas ritmadas e de intensidade dramática, uma saturação das cores e luzes. Nas cenas do prólogo, a pobreza e a exploração vivenciadas pela menina Conceição se expressa nos planos por uma visualidade sombria e “queimada”. A paleta é composta por cores terrosas e cobreadas, e o projeto cenográfico e de figurino seguem estas escolhas estéticas. A casa pobre e simples, construída nos arredores dos fornos de carvão, e os trajes em tons esmaecidos, sujos e rotos, se camuflam na paisagem hostil em que vive a família. Mas há, no entanto, uma oscilação marcante da paleta de cores, com o emprego do azul em sequências específicas, o que parece se aliar ao uso da luz difusa e ao recurso de contraluz, para sublinhar que a história narrada é mediada por lembranças infantis, envolta em onirismo. . Fig 02. Prólogo da minissérie: azul e onirismo no “lugar” da infância Após a fuga, quando Conceição acorda em um vagão de trem no Rio de Janeiro, outra fase da narrativa se inicia, trazendo também uma nova perspectiva de vida para a protagonista, expressa em uma nova demarcação estética na visualidade da minissérie: a paleta de cores e a luz das imagens mudam em contraste com a concepção das sequências anteriores. Os planos oferecem ao espectador uma profusão cromática: é carnaval, a cidade está colorida e as pessoas fantasiadas. Neste momento é evidente a interferência cromática da materialidade cênica na composição dos planos. 8 Fig. 03. O colorido do Rio de Janeiro: contraste cromático com a vida da protagonista em MG Já as imagens do subúrbio surgem marcadas por uma visualidade lírica, embora ainda aliada a uma linguagem ritmada e à opacidade do discurso que se mantem desde as primeiras cenas. Luiz Fernando Carvalho optou por retratar um subúrbio colorido e iluminado, com um ar bucólico, que se expressa na paleta de cores e nas escolhas estéticas adotadas pela Direção de Fotografia e pela Direção de Arte da minissérie, definindo uma nova atmosfera na minissérie. A paleta de cores definida por tons pastéis convida o espectador a visitar um novo espaço, sob o olhar deslumbrado da protagonista. 9 Fig. 04. Subúrbio colorido e iluminado em Suburbia. Fig. 05. A representação do subúrbio e a relação com o retrato de Pixinguinha E, por fim, é possível observar uma saturação dos matizes nas sequencias que carregam uma intensa carga dramática ou emocional, como nas cenas de violência, dos bailes funks ou de conquistas vivenciadas pela protagonista. Fig. 06. Cores saturadas na coroação de Conceição como rainha de bateria 10 Considerações Finais Em Suburbia, a expressividade da paleta de cores promove uma estetização das imagens e evidencia, sobretudo, uma relação da composição cromática com a narrativa construída. Este trabalho pretendeu esboçar uma reflexão acerca da relação estabelecida entre os processos da Direção de Arte e a estrutura de encenação em uma obra audiovisual, definindo a cor como um elemento de construção de sentido no discurso proposto. A abordagem se fundamentou nas premissas metodológicas da análise fílmica, mas com foco em um entendimento acerca da linguagem visual construída na obra, a partir da observação das articulações entre a fotografia, cor, luz e composição, com o espaço cênico, o figurino e o visagismo, na estruturação da visualidade. Trata-se de impressões iniciais de uma pesquisa em andamento, das quais se pretende expandir para novos resultados. Referências Bibliográficas AUMONT, Jacques. O cinema e a encenação. Lisboa: Edições Texto & Grafia, 2005. AUMONT, Jacques; MARIE, Michael. Dicionário Teórico e Crítico de Cinema. Tradução: Eloisa Araújo Ribeiro. Campinas: Papirus, 2003. CADERNO GLOBO UNIVERSIDADE. Subúrbios e identidades. Vol.1, n.2. Rio de Janeiro: Globo, 2013. PALLOTTINI, Renata. Dramaturgia de Televisão. São Paulo: Perspectiva, 2012. GUIMARÃES, Luciano. A cor como Informação. A construção biofísica, lingüística e cultural da simbologia das cores. São Paulo: Annablume, 2000. PEREIRA, Luiz Fernando. A Direção de Arte: construção de um processo de trabalho. 1993. 88f. Dissertação (Mestrado em Artes). Escola de Comunicação e Artes, Universidade de São Paulo, 1993. Ficha técnica da minissérie Suburbia, cor/ aprox. 05’10’’/ HDTV/ 2012, direção: Luiz Fernando Carvalho, escrito por: Paulo Lins e Luiz Fernando Carvalho, direção de fotografia: Adrian Teijido, direção de arte: Mário Monteiro, figurino: Luciana Buarque, cenografia: João Irênio, Isabela Urman e Kaka Monteiro, caracterização: Fabíola Gomez e Bárbara Santos, efeitos visuais: Rafael 11 Ambrosio, efeitos especiais: Marcos Soares, produção de arte: Marco Cortez e Laura Tausz, direção musical: Mariozinho Rocha, edição: Marcio Hashimoto, supervisão executiva de produção: Tatynne Lauria e Willian Barreto. Núcleo Luiz Fernando Carvalho. 12