O SABOR DA PALAVRA A vocação intelectual dos Frades menores hoje CARTA DO MINISTRO GERAL OFM SOBRE OS ESTUDOS Roma 2005 Grafica e impaginazione: JA per Ufficio Comunicazioni - Roma PREMISSA Vivemos um tempo complexo, dramático e magnífico, marcado a fundo por mudanças totalmente novas. Um tempo que nos desafia para uma renovada capacidade de encontro, de escuta e de diálogo. Certamente não de forma funcional, mas simplesmente porque amamos o homem, criado à imagem e semelhança de Deus em Cristo, Verbo encarnado. Esta carta a toda a Ordem, elaborada em coincidência com a elevação do Antoniano a Universidade Pontifícia, nasceu em mim pela urgência de recordar a nós todos a importância de, neste tempo, vivermos cheios de paixão pelo homem, ao qual anunciar, com palavras saborosas, a boa nova do ilimitado amor de Deus. Procuramos palavras cheias de sabor, de espírito e de vida para cultivar essa paixão por Cristo e pelo homem. A atividade intelectual pode ajudar-nos nessa busca. Por isso, julgo urgente continuar a reflexão sobre o valor e o lugar próprio dos estudos e da pesquisa científica na Ordem, em continuidade com os documentos dos últimos quarenta anos, tempo profundamente marcado pela graça do Concílio Ecumênico Vaticano II1. Em seus textos, aparece nitidamente o nexo entre os estu1 Em breve síntese, tenham-se presentes: A Formação na Ordem dos Frades menores, Capítulo geral extraordinário OFM, Medellín, 1971, nn. 62-81; Documento sobre a Formação, Conselho Plenário OFM, 1981, nn. 59-93; Estudos e Missão da Ordem dos Frades Menores hoje, Carta do Ministro geral, 13.6.1981; A Formação franciscana e científica dos frades, Carta do Ministro geral, 23.4.1987; Mensagem de João Paulo II ao Capítulo geral OFM, 1991; A Ordem e a evangelização hoje, Capítulo geral OFM, San Diego, 1991, nn. 10-11. 26-28; A promoção dos estudos em nossa Ordem, Relatório do Ministro geral, 4.7.1994; Encher a terra com o Evangelho de Cristo, Carta do Ministro geral, 1996, nn. 127-132; Ratio Studiorum OFM, Roma 2001; Ratio Formationis Franciscanae OFM, 2003. A estes documentos, acrescentem-se outros textos que, diferentes no gênero e nos destinatários, acompanham a caminhada desses anos. 3 O Sabor da Palavra dos e a evangelização, que é uma das essenciais razões de ser da Ordem. A caminhada foi retomada e aprofundada pelo Capítulo geral de 1991, pelo Conselho Plenário de 2002 e pelo Capítulo geral de 2003. Com efeito, – conforme decididamente nos disse João Paulo II, em 1991, – “é preciso considerar a formação intelectual uma exigência fundamental da evangelização”2. Sinto fortemente que este percurso está de acordo com a caminhada de nossa Ordem rumo ao VIII Centenário de sua fundação. Também hoje, “o edifício da Ordem se constrói com duas paredes, a saber, com os bons costumes e com a ciência”3. Proponhamo-nos a responder ao dom de nossa vocação cultivando uma qualidade melhor de nossa vida – é o caminho da santidade – e, ao mesmo tempo, percebamos que “hoje é especialmente necessário promover em nossa Ordem a formação intelectual”4. Com efeito, no seio da vocação para viver e anunciar o Evangelho como irmãos, na “graça das origens”, encontramos também a graça de anunciar a Palavra de Deus na escuta e no diálogo, em comunhão com a Igreja. O percurso de São Francisco torna-se exemplar (Primeira parte). Esse esforço acompanhou a história de nossa Família, expressando-se, sobretudo, na urgência missionária, caracterizada pelo encontro com as culturas, isto é, pela escuta e 2 3 4 4 Mensagem de João Paulo II ao Capítulo geral OFM 1991, nn. 5-6; cf. RS, 28-30. ECCLESTON, THOMAS DE, De adventu fratrum minorum in Angliam, em Fontes franciscanas e clarianas, Ed. Vozes/FFB, Petrópolis 2004, n. 90, p. 1341: “Dixit autem idem pater [scil. Frater Iohannes de Parma], quod cum ex duobus parietibus construatur aedificium ordinis, scilicet moribus bonis et scientiam”. Capítulo geral de 1991, n. 10; cf. VC 98. O Sabor da Palavra pela preparação severa exigida aos anunciadores da Palavra que salva, em vista do diálogo! (Segunda parte). Sobre esses temas estamos bastante preparados. Creio que ainda nos falte um bom caminho a fazer para o encontro da Palavra com as múltiplas palavras do homem. Em poucas palavras, trata-se do diálogo com a cultura, ou melhor, com as culturas, tornando-nos artesãos humildes e corajosos da escuta e do diálogo, mais discípulos do que mestres (Terceira parte). Não se trata de estudar somente em vista dos desafios da evangelização. Está em jogo algo mais, mais exigente. Trata-se de adquirir o hábito de refletir, a arte do pensar como arte sapiencial de vida, de fé e de caridade. Assim, será possível falar de uma vocação intelectual dos Frades menores? Sim, sempre em união com nossa forma vitae, para a qual “o estudo, como todas as outras coisas de nossa vida em fraternidade, deve ser enxertado no vigor espiritual de São Francisco”5, de tal maneira que se torne uma base necessária para a formação franciscana. Eis a caminhada que, nestas páginas, desejo fazer com todos, caros Irmãos. Dirijo particular atenção aos Irmãos que consagram a vida à pesquisa, ao ensino e à publicação. Aprecio seu serviço, que considero importante para a Fraternidade, para o desenvolvimento e a adequada compreensão de nosso carisma e para o desempenho da evangelização, múnus específico de nossa vocação. Com tais sentimentos, inicio minha reflexão, confortado pela presença e pelos ros5 SCHALÜCK, FR. HERMANN, La promozione degli studi nel nostro Ordine, in Acta Congressus Repraesentantium Sedum Studiorum OFM, Roma 1994, 60. 5 O Sabor da Palavra tos de muitos Irmãos, assíduos e apaixonados pesquisadores da Vida, da Verdade e do Bem, que resplendem no rosto de Cristo e que não nos cansamos de procurar nos rostos de muitos homens e mulheres de nosso extraordinário e dramático tempo e nos sinais dos tempos. 6 1 PALAVRA, VIDA FRATERNA E ANÚNCIO EM SÃO FRANCISCO 1. A GRAÇA DAS ORIGENS No conjunto das fontes escritas que explicitam os componentes essenciais do carisma franciscano não existe uma síntese comparável, em completude e lucidez, às poucas linhas com as quais Frei Francisco, em seu Testamento, descreve o nascimento da primeira Fraternidade: E depois que o Senhor me deu irmãos, ninguém me mostrou o que deveria fazer, mas o Altíssimo mesmo me revelou que eu deveria viver segundo a forma do santo Evangelho. E eu o fiz escrever com poucas palavras e de modo simples, e o senhor Papa mo confirmou” (Test 14-15). Eis porque é correto falar de “graça das origens”: graça é a chegada dos irmãos, na qual se renova o dom dos discípulos ao Senhor Jesus: “Eram teus e tu os deste a mim” (Jo 17,6; RnB XXII, 42-43); graça é a revelação do Evangelho como “forma” de vida para a Fraternidade-emmissão, ocorrida na tríplice abertura dos Evangelhos, onde às duas passagens sobre o chamado: “Se queres ser perfeito, vai e vende tudo que tens e dá aos pobres e terás um tesouro no céu; e vem e segue-me” (RnB I, 2; cf. Mt 19,21; Lc 18,22); “Se alguém quer vir após mim, renuncie a si mesmo, tome sua cruz e me siga” (RnB I, 3; cf. Mt 16,24), acrescenta-se o envio em missão dos setenta e dois discípulos: “Quando os irmãos vão pelo mundo, nada levem pelo caminho, nem bolsa nem sacola... E, 7 O Sabor da Palavra em qualquer casa em que entrarem, digam primeiramente: Paz a esta casa (RnB XIV, 1-2; cf. AP 11 e LTC 29). Graça é a confirmação que o “senhor Papa” dá à norma escrita de vida evangélica, na qual Francisco e os primeiros companheiros sentem continuar o mandato conferido a Pedro de “confirmar” seus irmãos: “Eu orei por ti, para que tua fé não falhe; e tu, uma vez convertido, confirma os irmãos” (Lc 22,32). Todas as perguntas sobre o carisma das origens, feitas para terem indicações de resposta aos problemas e às perguntas do nosso tempo, deverão mover-se dentro deste triângulo de graça: • o chamado de Francisco e dos primeiros companheiros a viver o seguimento e o anúncio em fraternidade; • o Evangelho e a palavra de Deus, que se traduzem em normas de vida; • a indestrutível comunhão de fé e de obras com a Igreja. 2. FRANCISCO HOMEM “SEM CULTURA”? A indicação de método é especialmente necessária em setores problemáticos como o dos estudos, já que uma renovada linha de pensamento, que remonta às próprias fontes biográficas, insistiu na autodenominação de Francisco como homem “sem cultura” (COrd 39; Test 19) e nas idéias polêmicas contra a “sabedoria do mundo” (RnB XVII, 10), para contrapor busca amorosa de Deus e busca de “ciência” e conhecimento, simplicidade de vida e dedicação ao estudo. Uma leitura atenta e serena dos Escritos de Francisco, com particular atenção aos textos normativos, ajuda a superar aquelas contra8 O Sabor da Palavra posições. A tensão pelo conhecimento e o amor à Palavra de Deus entrelaçam-se entre si por todo o tempo da experiência evangélica de Francisco, a partir da invocação que abre o mais antigo de seus escritos, “Altíssimo, glorioso Deus/ ilumina as trevas do meu coração”, baseada no verso do salmo “Senhor, meu Deus, ilumina minhas trevas” (Sl 18,29), até a iluminante conclusão da Admoestação VII: “E são vivificados pelo espírito da divina escritura aqueles que não atribuem a seu eu (corpori) toda letra que conhecem e desejam conhecer (omnem litteram quam sciunt et cupiunt scire), mas, pela palavra e pelo exemplo, a restituem ao altíssimo Senhor Deus, a quem pertence todo o bem”. Note-se a força da afirmação: também o conhecimento da “cultura escrita” (littera implica sempre esse sentido) e o “desejo de saber” são plenamente conformes à vida no Espírito, contanto que visem ao louvor divino e se traduzam em vida exemplar. Portanto, a “ciência” é um lugar teológico de revelação no qual o Espírito, através da Palavra, desce para encontrar-se com o homem. Vivido nesse espírito, o estudo só pode suscitar a ação de graças, que se exprime na restituição a Deus (reddunt ea Deo cuius est omne bonum) através de palavras e exemplos (verba et exemplo). É um pensamento que não só confirma o amor extraordinário de Francisco pelas “divinas palavras escritas”, por ele insistentemente recomendadas, mas explica também porque a Escritura tem tanto espaço em seus Escritos, literalmente tecidos de citações, reminiscências, aplicações vitais da Palavra de Deus. Conseqüentemente, não surpreende que, para Francisco, a “rainha” das virtudes não seja a pobreza, como por muito tempo se afirmou, mas a sabedoria, reflexo da luz pere9 O Sabor da Palavra ne do Verbo encarnado: “Ave, rainha sabedoria, o Senhor te salve com tua irmã, a santa e pura simplicidade” (SV 1). No louvor franciscano, as virtudes estão dispostas numa sucessão que responde ao dinamismo da vida cristã segundo o Espírito: a rainha sabedoria deve ser traduzida em palavras e obras pela santa e pura simplicidade; e viver a sabedoria significa seguir a humildade e a pobreza de nosso Senhor Jesus Cristo, que, para nós, é o modelo de caridade e obediência ao Pai e aos irmãos. 3. OS LIVROS E A PREGAÇÃO Na Fraternidade das origens, a primeira forma escrita de vida, aprovada por Inocêncio III (1209), desenvolve-se progressivamente até constituir a Regra não bulada (1221), um texto em que cada norma sobre a vida comunitária e sobre as formas da missão nasce constantemente por interferência da palavra do Evangelho, das expectativas dos tempos e das indicações da Igreja. As Constituições do IV Concílio do Latrão (1215) haviam disposto que os bispos assumissem “homens idôneos, poderosos em obras e palavras, para exercer salutarmente o serviço da santa pregação” (art. 1), e que todas as igrejas metropolitanas tivessem “um teólogo, que instruísse os sacerdotes e os outros na sagrada Escritura” (art. 11). As disposições se refletem, sobretudo, no texto da Regra de 1221, que não só procura fixar as normas e o “espírito” da pregação (cap. XVII), mas dispõe também que os clérigos “possam ter somente os livros necessários para desempenhar seu ofício” (possint habere tantum libros necessarios ad implendum eorum officium) (RnB III, 7). Uma recente pesquisa, estendendo as fontes franciscanas para a lite10 O Sabor da Palavra ratura cristã medieval6, mostrou, sem sombra de dúvida, que a expressão ad implendum eorum officium não se refere somente ao ofício litúrgico, mas a todo o “ofício” dos clérigos, aos quais, portanto, são concedidos os livros indispensáveis para a Liturgia das horas, para a Eucaristia e para a pregação. A mesma pesquisa mostrou também que a tão discutida proibição “et non curent nescientes litteras litteras discere” (RB X, 8) não significa “e os que não conhecem as letras, não se preocupem em aprendê-las”, mas precisamente “e os que não sabem ler, não se preocupem em aprender”, em atenção à norma paulina de que “cada um permaneça no estado em que estava quando foi chamado” (1Cor 7,20; cf. RnB VII, 6), resolvendo-se de fato numa disposição ligada à situação cultural do tempo e dificilmente aplicável a uma sociedade como a do terceiro milênio, em que, em muitíssimos países, a alfabetização atingiu a quase totalidade dos cidadãos. Espelhando ao mesmo tempo a centralidade da Palavra e as disposições da Igreja, as severas normas para os pregadores inseridas na Regra bulada (1223), ordenando que “absolutamente nenhum dos irmãos ouse pregar ao povo, se não tiver sido examinado e aprovado pelo Ministro geral desta fraternidade e se não lhe tiver sido concedido pelo mesmo o ofício da pregação” (RB IX, 3), e já que todo exame exige uma adequada preparação, esta não podia ser feita senão através da escuta orante, da leitura e, naturalmente, do estudo da Palavra de Deus, porque “a pouquíssimos o espírito de sabedoria é dado miraculosamente, sem o estudo das letras” (São João Capistrano). Baseada num 6 Cf. PAOLAZZI, CARLO, OFM, I frati Minori e i libri: per l’esegesi di “ad implendum eorum officium” (Rnb III,7) e “nescientes litteras” (Rnb III, 9; Rb X,7), in Archivum Franciscanum Historicum 1-2/2004, pp. 3-59. 11 O Sabor da Palavra versículo do Salmo – “Eloquia Domini, eloquia casta; argentum igne examinatum” (Sl 12,7) –, a exortação que a seguir se faz aos pregadores, no sentido de que “na pregação que fazem, suas palavras sejam examinadas e castas” (RB IX,4), é um angustiado convite a anunciar somente a palavra de Deus, livre de impurezas humanas e purificada pelo fogo do Espírito. Segundo a intuição de meu predecessor Fr. John Vaughn, “é exatamente a consciência do “mandato” recebido da Igreja de pregar a penitência entre os fiéis e entre os infiéis e a obediência à Igreja que convenceu São Francisco da necessidade dos estudos e o levou a fundar uma “Escola Teológica”7. Com efeito, esse conjunto de disposições, concessões e exortações constitui o antecedente legislativo da importante Carta a Frei Antônio, na qual o apelativo “bispo” alude provavelmente ao mandato episcopal da pregação, ao qual o fundador da Ordem acrescenta o mandado do ensino: Eu, Frei Francisco, [desejo] saúde a Frei Antônio, meu bispo. Apraz-me que ensines a sagrada teologia aos irmãos, contanto que, nesse estudo, não extingas o espírito de oração e devoção, como está contido na Regra”. Seguindo as Constituições lateranenses, o ensino de Frei Antônio, certamente, era dirigido aos frades “que são, aos que serão e aos que desejam ser sacerdotes do Altíssimo” (COrd 14), e o verbo desejam só pode referir-se a clérigos à espera de serem promovidos ao sacerdócio e, portanto, à pregação, enquanto a toda a Fraternidade é dirigida uma recomendação paralela no Testamento, que parece uma espécie de selo de autenticidade da própria carta a Frei Antônio: “E devemos honrar e venerar a todos os teólogos e aos que ministram as santíssimas palavras divinas como a quem nos ministra espírito e vida” (Test 13). 7 12 VAUGHN, FR. JOHN, Studi e Missione dell’Ordine dei Frati Minori oggi, Carta do Ministro geral, 13.6.1981, in AO 100 (1981), 261-262. O Sabor da Palavra Nas entrelinhas, Francisco parece dizer que a “santa e pura simplicidade” não é a virtude de quem ignora a Palavra de Deus, mas de quem a ouve e a estuda com fé, medita-a assiduamente com espírito orante e, pela força do Espírito, vive-a e a anuncia com o exemplo e com as palavras. Portanto, o Doutor Seráfico São Boaventura, nem sempre corretamente julgado pelos estudiosos do nosso tempo, seguia o pensamento do fundador e a legislação primitiva quando, em polêmica com os mestres seculares, reafirmava resolutamente o dever dos Frades menores de se dedicarem ao estudo da Palavra e seu direito de disporem dos livros indispensáveis: “A Regra ergue a voz e impõe expressamente aos frades a autoridade e o ofício da pregação (cf. Rb IX), coisa que não creio se encontre em outras Regras. Portanto, se não devem pregar fábulas, mas as palavras divinas, não podem conhecê-las se não as lerem; nem lêlas se não tiverem os textos escritos; é, pois, evidentíssimo que é conforme a perfeição da Regra ter livros como também pregar. E não sendo contrário à pobreza da Ordem ter missais para cantar a Missa e breviários para recitar as Horas, assim não é contrário ter livros e Bíblias para pregar as palavras divinas”8. Se é verdade que no decorrer dos séculos os movimentos de reforma da Ordem partiram normalmente com tendências à vida solitária e contemplativa, é também verdade que depois de algum tempo sempre redescobriram a dimensão “pastoral” do carisma9, em consideração à palavra de Francisco: “Proclamai-o, pois ele é bom, e exaltai-o em vossas obras; pois, com este intuito ele vos enviou por todo o 8 BOAVENTURA, SÃO, Epistola de tribus quaestionibus, 6, in Opera omnia, ed. Quaracchi, vol. VIII, 1898, p. 332-333. 9 Cf. P. MARANESI, Nescientes litteras. L’ammonizione della Regola francescana e la questione degli studi nell’Ordine (sec. XIIIXVI), Istituto Storico dei Cappuccini, Roma 2000. 13 O Sabor da Palavra mundo, para que, por palavras e obras, deis testemunho de sua voz” (COrd 8-9). Já se discorreu sobre a insistência com que Francisco exorta a venerar “as divinas palavras escritas..., honrando o Senhor nas palavras que ele falou” (COrd 35-36). Será importante acrescentar que o santo de Assis, verdadeiro puro de coração, capaz de ver em cada ser o Deus de suma Beleza, Luz eterna, Bondade original, tinha grande respeito por cada texto escrito, sagrado ou profano, como aparece num emblemático episódio narrado por Tomás de Celano: “Certo dia, um irmão perguntou-lhe para que recolhia também tão cuidadosamente os escritos dos pagãos e onde não havia o nome do Senhor. Ele respondeu dizendo: Filho, porque aí há letras com as quais se compõe o gloriosíssimo nome do Senhor Deus. Também o que aí há de bom não pertence nem aos pagãos nem a homem algum, mas somente a Deus, de quem provém todo o bem” (1Cel 82). O “dito” de Francisco não retorna nos biógrafos posteriores, talvez por medo de sua extraordinária abertura religiosa e cultural; mas certamente aplica-se bem à atividade dos Frades menores que, no decurso dos séculos, pregaram, traduziram e comentaram os textos sacros em outras línguas, convencidos de que todas as línguas e culturas têm em si a possibilidade de acolher e de repropor o “bem” das Escrituras10. 10 Cf. VAUGHN, FR. JOHN, La Formazione francescana e scientifica dei frati, Carta de 23.4.1987, in Acta Ordinis, 106 (1987), 53. 14 2 A PALAVRA NA HISTÓRIA DO CARISMA 1. O ENCONTRO COM AS CULTURAS João de Pian Del Carpine, João de Montecorvino, Odorico de Pordenone e João de Marignolli, evangelizadores da China, andavam descalços, vestiam o hábito da penitência como os mais pobres espirituais, mas eram pessoas de boa formação intelectual e, através do estudo, souberam colocar-se na escuta de culturas diferentes daquelas das quais provinham: sabemos que falavam línguas como o armênio ou o tártaro; que João de Montecorvino (12471328) celebrou a Missa segundo o rito romano, mas pronunciando em língua tártara “tanto as palavras do cânon como as do prefácio (tam verba canonis tam prefationis)”; que escreveu para o grupo mongol dos Ongut trinta e dois hinos e que traduziu para a língua deles o Novo Testamento e o Saltério. A extrema confiança na possibilidade da palavra, ou da linguagem, por parte de Raimundo Lulio (1235-1316), foi determinante para a superação da idéia da cruzada de estilo medieval. A profecia de Lulio sobre a educação religiosa e a preparação lingüística e cultural dos missionários parece encontrar resposta três séculos mais tarde nos conselhos dados pelo capuchinho Jerônimo de Narni ao Papa Gregório XV, em vista da instituição da Congregação da Propaganda Fide (1622). Cultor da língua bíblica mostrou-se o humanista e reformador Francisco Ximenes de Cisneros com a fundação da Universidade de Alcalá (1499), graças à qual foi realizada a pres15 O Sabor da Palavra tigiosa Bíblia Poliglota. Beberam de sua reforma dos estudos, centrada sobre a volta às fontes e às línguas originais, também os missionários que deixaram a pátria para evangelizar as Américas: André de Olmos, Turíbio Motolinia, Jerônimo Mendieta, Juan de Torquemada, Jan Bautista Viseo e outros. Um deles, Bernardino de Sahagún (1500-1590), fascinado pela língua e pela cultura local, empregou bem trinta anos de sua vida na busca de dados sobre as sociedades pré-colombianas (Codex Florentinus). Assim, utilizando o idioma dos indígenas, chegou a compor hinos e, recorrendo à sabedoria de seus provérbios, tentou traduzir o cristianismo segundo os cânones da cultura asteca. A fim de superar as distâncias culturais, ele sonhava uma república indiana e espanhola baseada no princípio da unidade da fé. Defensor do estudo da cultura local para a evangelização foi também Luis Bolaños, redator do primeiro catecismo em guarani – e fundador das primeiras reduções do Paraguai –, tendo sido um dos protagonistas do sínodo de Assunção, convocado pelo co-irmão Martin Ignácio de Loyola, Bispo de Rio da Prata (1601). A fama deste último é devida, particularmente, a seu Itinerário: um diário de viagem à China que, graças a uma extensa e fulminante difusão, contribuiu muito para acender o interesse do Ocidente pelo Império celeste. Martin Ignácio de Loyola, que deu a volta ao mundo por bem três vezes, reduziu as distâncias geográficas e alargou os espaços da comunicação. Seu concorrente na concepção da globalização cultural pode ser considerado também o Frade menor conventual veneziano Vincenzo Coronelli (1651718), o primeiro a realizar globos de grandes dimensões, pedidos exatamente pelo rei Luís XIV para o palácio de Versailles. 16 O Sabor da Palavra 2. A ESCUTA SE FAZ DIÁLOGO Assim, o mundo diferente do outro, ouvido, amado, estudado, compreendido nas suas expressões culturais e lingüísticas mais variadas, para nossos Frades, tornou-se o lugar próprio do diálogo e do anúncio: lugar que acolhe a Palavra, enriquece-a com as ressonâncias típicas de cada povo e de cada cultura, torna-a acessível a todos. Compreende-se, então, porque o catecismo de Pedro de la Piñuela, em língua chinesa, Ch’u hui wên-ta, publicado pela primeira vez em 1680, foi utilizado por mais de dois séculos, com numerosíssimas edições, a última das quais em 1929. Pedro é um mestiço, expressão corpórea da interculturalidade e produto cultural do México, país que se tornou ponte entre Oriente e Ocidente e novo centro do mundo missionário franciscano. Todavia, Pedro não é apenas um divulgador, mas também um lingüista. Prova-o o fato de ter re-elaborado, por necessidades ligadas à evangelização, a gramática do co-irmão Basílio Brollo, célebre por ter redigido o primeiro dicionário completo chinês-latim (1694). Figuras excepcionais são também os franciscanos, como, por exemplo, João Wild, que no confronto com os reformadores protestantes preferiam deixar de lado o método da controvérsia, para insistir na “parte verdadeira, afirmativa, católica”11. Uma forma particular de pregação foi também a adotada pela diplomacia capuchinha francesa, encarnada de forma excepcional por José le Clerc de Tremblay, conhecido como “la petite eminence grise” de Richelieu, ou, por assim dizer, pela política espanhola da Imaculada, à qual, de algum modo, está ligado o renascimento escotista, 11 BAGLIONI, LUCA, Arte del predicare, Veneza 1592 (Cap. 6). 17 O Sabor da Palavra promovido por Lucas Wadding e por outros franciscanos italianos da família conventual. A figura de Leonardo de Porto Maurício (1676-1751), escolhida pela Igreja como padroeiro das missões populares, merece algum destaque. Escotista convicto, ele é defensor da doutrina da Imaculada – a ponto de sugerir ao Papa uma maneira de proclamar o dogma sem reunir um Concílio –, sutil diplomata na mediação de facções políticas contrárias, representa bem o espírito franciscano no século culturalmente mais adverso à figura do Santo de Assis. Confidente de Bento XIV – um dos poucos, se não o único Papa a ser louvado por Voltaire –, Leonardo foi enviado a pregar o Jubileu de 1750, durante o qual foi inaugurada a praxe da Via Sacra no Coliseu. A originalidade de sua pregação consiste, como ele próprio explica, em pôr-se a meio caminho entre a teatralidade dos jesuítas e o intelectualismo dos filhos de São Vicente. A devoção, centrada na representação do mistério da Paixão, reproduz o apego dos franciscanos aos lugares santos da Palestina, reproposto durante os séculos através de diferentes formas, das quais a de Monte Sacro de Varallo não é a última. Em tempos a nós mais próximos, um autêntico tradutor da Palavra, no sentido literal do termo, pode ser visto em Gabriel M. Allegra (1907-1976). Sua tradução dos textos originais da Bíblia para o chinês reproduz a visão franciscana da missão como obra de propagação da Palavra. Intérprete do pensamento escotista, ele parece transferir para o campo bíblico a doutrina do primado de Cristo, defendida pelo Doutor Sutil, ao realçar o primado da Palavra. 3. UMA FRATERNIDADE QUE ANUNCIA A obra destes geniais homens não teria podido tornar-se patrimônio comum nem assu18 O Sabor da Palavra mir continuidade no seio de uma tradição se não fosse dotada de estruturas organizadas. Um dos mais notáveis organizadores do saber franciscano é, sem dúvida, Lucas Wadding (1588-1657). Ele concebeu a atividade cultural em termos colegiais, a ponto de fundar, em Roma, um colégio de estudiosos para a publicação dos escritos de São Francisco. Fomentou a promoção do renascimento escotista e da historiografia religiosa e literária da Ordem. Seus Annales (1625), inspirados nos anais de Barônio, querem propor a caminhada feita pela Ordem na sua história e constituem uma impressionante operação de autoconsciência religiosa e comunitária. Depois dele, outro estudioso, Jerônimo De Gubernatis, teria tentado oferecer uma visão mais universal da Ordem. No Capítulo geral de 1688, num opúsculo intitulado Idea Orbis Seraphici, ele havia exposto um projeto de história da Ordem, dividida em 4 partes, num total de 35 volumes. Tratou-se de uma empresa colossal, realizada em parte apenas, mas nem por isso menos admirável se considerarmos o esforço ideológico/organizativo. Para o aprendizado das línguas árabe e chinesa e para a preparação dos missionários destinados ao Oriente Médio e à China, foram fundados dois colégios missionários em Roma: São Bartolomeu, na Ilha Tiberina, e São Pedro, em Montório. Para a América Latina, porém, foram ativados os assim chamados Colégios de Propaganda Fide em Querétaro, Guatemala, Zacatecas, México, Pachuca e outros lugares. Ali, através do estudo e de uma intensa vida espiritual, preparavam-se os missionários enviados a evangelizar os povos que ainda não haviam conhecido o anúncio cristão. Em época contemporânea, com o fim dos jurisdicionalismos e após séculos de divisão, a 19 O Sabor da Palavra Ordem encontrava uma certa unidade, da qual Roma tornou-se quase um símbolo. O Ministro geral Frei Bernardino de Portogruaro, que havia empregado grande parte de seus vinte anos de serviço visitando incansavelmente as Províncias da Europa, julgou oportuno criar um centro de estudos que pudesse ser uma base cultural para toda a Ordem; assim surgiu o Antonianum. Antes ainda havia fundado o periódico Acta Ordinis, órgão de união entre as várias Entidades da Ordem dos Frades Menores, demonstrando assim sua fé na força da comunicação. Ele quis reafirmar seu propósito instituindo um Centro de estudos tal que, em termos didáticos, pudesse achegar-se às fontes já pesquisadas pelos estudiosos do colégio de Quaracchi, fundado por ele mesmo alguns anos antes, e que hoje continua sua ação no Colégio São Boaventura de Grottaferrata (Roma). Na Europa, com o propósito de recrutar novas vocações, a Ordem havia criado os conhecidos Colégios Seráficos e ia assumindo um caminho didático, graças também à benéfica influência e colaboração das modernas Congregações femininas franciscanas. Essa orientação tornou-se mais evidente na missão norte-americana, onde estava bastante difuso o serviço pastoral desenvolvido através das escolas. De fato, Panfilo de Magliano, fundador das duas Províncias do Leste, instituiu o centro de estudos superiores que, mais tarde, tornouse a célebre Universidade São Boaventura. No século XX, em várias Províncias da Ordem, vemos presentes e atuantes diversas Universidades mantidas por elas, além de Colégios e Centros de Estudo de natureza variada. Após um período de relativa contratura, atualmente assistimos a um novo florescimento destas realidades, que nos obrigam a refletir e a fazer opções mais decididas em 20 O Sabor da Palavra vista da qualificação intelectual da Ordem, superando a baixa cultural que, claramente, apareceu nos últimos decênios. A história, brevemente resumida, dá-nos um precioso testemunho e nos estimula a procurar respostas criativas para o nosso tempo. 21 O Sabor da Palavra 22 3 A PALAVRA NO ENCONTRO COM A CULTURA 1. ESTUDAR, COMO BUSCA DA VIDA E DA VERDADE É incômodo passar da história para o presente. Mas é necessário. À base da caminhada feita até agora, convosco me pergunto se existe uma vocação intelectual do Frade menor, como dimensão própria de nossa forma de vida e, portanto, válida para todos os Frades e, de modo especial, para os que se dedicam prioritariamente ao estudo, à pesquisa e ao ensino. Devemos admitir que o trabalho intelectual não aparece totalmente integrado em nossa vida franciscana. Com freqüência, é visto em sua utilidade prática, mas sem ser considerado um elemento necessário: ao contrário, seria algo à margem. Creio que podemos repensar um modelo franciscano de vida intelectual porque, por um lado, a vida franciscana pode nutrir-se do trabalho intelectual e, por outro, ilumina-o e o sustenta. O que entendemos por “vocação intelectual”? Com esta expressão entendo, primeiramente, o gosto pela busca da Vida, da Verdade e do Bem12. Ouso proferir esta palavra. Gostaria de pronunciá-la não como afirmação de uma verdade que possuímos para, depois, passá-la aos outros, mas como caminho nunca terminado de busca e de desejo (cf. RS, art. 9. 13. 15). 12 Cf. SCHALÜCK, FR. HERMANN, La promozione degli studi nel nostro Ordine, 75. 23 O Sabor da Palavra a. Caminhada de expropriação A busca da Vida, da Verdade e do Bem, ilimitado oceano de luz, exige uma inteligência apaixonada e, também, atenta e respeitosa, porque, dado que a manifestação da verdade jamais é imediata, a busca só pode ser incansável hermenêutica. Se não somos nós que vamos à verdade, mas é a verdade que, de formas variadas, vem a nós, a atitude preliminar e especial para acolhê-la é a abertura à escuta, à qual seguirá um interrogar inquieto. Estou convencido de que temos urgente necessidade desse dinamismo, para não pararmos na repetição cansativa e estéril de palavras e de fórmulas já esgotadas (FP 1.3; Sdp 6) e, portanto, para ouvir e encontrar-nos com o homem de hoje numa atitude forte de simpatia e de interesse (CCGG art. 162). Creio que para nós, franciscanos, o problema não deve ser tanto estudar para encontrar pontos de contacto entre a Palavra e a cultura, mas desejar ouvir e conhecer (estudo) o mundo e o homem para “re-conhecer” nele as “pegadas de Cristo” – tanto na forma de presença, quanto, especialmente hoje, da ausência – e, portanto, poder louvar a Deus (cf. RFF 32. 90). Será que o Cântico das criaturas não pode ser lido como uma expressão da forma sapiencial franciscana de ir para e pelo mundo? Nesse sentido, o mundo não é um desafio a ser vencido, mas uma ocasião a ser aproveitada, um kairós (FP 2). Diante da aceleração da história e do confronto, muitas vezes tenso e violento, entre culturas e religiões, perguntamo-nos inquietos em que caminhos ainda é possível descobrir os traços de Cristo no mundo. Confrontamo-nos com muitos “sinais dos tempos” que não são imediatamente inteligíveis e interpretáveis (Sdp 7-9). Com freqüência somos obrigados a parar num silêncio 24 O Sabor da Palavra inconformado, mas respeitoso e denso de busca. Então, o estudo é um itinerário colocado para não apagar essa busca. É um exercício de humanidade e de fé, de diálogo e de confronto com quem é diferente de nós, de inteligência e de contemplação do maior mistério que habita o mundo e a pessoa humana. Assim, o estudo é, sobretudo, “dom” e “busca de Deus”, “ação de graças”, ato de “reconduzir” tudo a Ele; numa palavra, caminho para a santidade. Com São Boaventura falamos de esforço “para nos tornarmos bons (ut boni fiamus)”13. Nesse sentido, percebo uma profunda afinidade entre a pobreza franciscana e a humildade de uma busca desinteressada da verdade, em continuidade com a real determinação de não se apropriar de nada e sermos humildes. O estudo e a pesquisa são expropriação permanente do saber. Em certo sentido, significa libertar-se, purificar-se das próprias pré-compreensões para acolher a realidade em sua diversidade e lê-la criticamente (RS 26). É uma versão daquilo que Francisco chama “ficar submisso a todas as criaturas”14. É a necessária consciência da própria “docta ignorantia”15, do socrático “não-saber”. Os limites do conhecimento impõem-se a qualquer prometéica pretensão de possuir a realidade, também nas ciências. Uma verdadeira caminhada de estudo e de pesquisa transforma essa presunção em desejo e despojamento: é uma forte experiência existencial de pobreza que nos faz mendicantes. 13 14 15 Cf. BOAVENTURA, SÃO, Sententiarum I, q. 3, in Opera omnia, ed. Quaracchi, Tomus I, pg. 12. Cf. A Caminho, rumo ao Capítulo geral extraordinário, A vocação da Ordem hoje, Roma, 2005, 18-19. BOAVENTURA, SÃO, Breviloquium, pars V, cap. 6, in Opera omnia, ed. Quaracchi, Tomus V, 260. 25 O Sabor da Palavra b. Sem fixa morada A busca da Vida, da Verdade e do Bem é um movimento permanente, que nos torna itinerantes, sem nada de próprio. A pesquisa científica procura fixar os resultados obtidos, enquanto põe em evidência seu caráter relativo e impele a avançar sempre mais. Não podemos parar naquilo que já é conhecido. Aquele que procura não tem onde pousar a cabeça. Enfim, quem procura é tomado pela mão pelo objeto que estuda e conduzido a novos horizontes da vida e da verdade. O Bem-aventurado Duns Scotus nos diz: “Na caminhada do gênero humano, o conhecimento da verdade cresce sempre”16. Nessa caminhada, compreendemos a liberdade. Em meio aos contrastes econômicos, sociais, institucionais e às diferentes e, muitas vezes, contrárias visões antropológicas, quem busca a verdade vai além de suas idéias preconcebidas, de seus interesses pessoais, para submeter-se àquilo que à inteligência se impõe como verdadeiro, empenhando-se na busca e aceitando ser por ela transformado. É ato de uma liberdade responsável. Essa atitude nos é muito necessária em nosso tempo: entre nós, no diálogo com o homem contemporâneo e no confronto eclesial. c. A alegria da verdade Mas há outro aspecto que gostaria de destacar e que julgo muito importante em nossa tradição. O gosto e a gratuidade da caminhada 16 26 SCOTUS, J. DUNS, Ordinatio IV, d. 1, q. 3, n. 8 (ed. Parisien., vol. XVI, p. 136a: “In processu generationis humanae semper crevit notitia veritatis”. Aqui, Scotus acena indiretamente para a afirmação de São Gregório Magno: “Per incrementa temporum crevit scientia spiritualium patrum [Testamenti Veteris et Novi]”: In Ezechielem II, hom 4, n. 12 (PL 76, 980). O Sabor da Palavra para a verdade agem de forma tal que quem estuda, gradualmente, torna-se um humilde, paciente e devoto servidor da vida. Isso não tira do estudo a seriedade e o cansaço científico, mas é capaz também de dar satisfação e alegria, pois, por meio do estudo, encontra-se a verdadeira fonte da vida. É o gaudium de veritate típico da tradição agostiniana, à qual devemos tanto17. É belo aprofundar-se no estudo como um lugar no qual experimentar uma alegria particular: a que vem da busca e da descoberta da Vida, da Verdade e do Bem, capaz de dar mais profunda unidade interior entre vida e pensamento. Essa alegria é também fruto do desejo, como escreve nossa Ratio Studiorum no art. 3: “O estudo, como expressão do desejo insaciável de conhecer mais profundamente a Deus, abismo de luz e fonte de toda a verdade humana (VC 98), é fundamental na vida e na formação, permanente e inicial, de todo o Frade menor”. Na perspectiva bonaventuriana do “desejo”, o estudo não pode ser entendido como posse, riqueza, “status”, como um desejar “conhecer as palavras e interpretá-las aos outros” (Ad VII, 3); mais do que posse, o estudo é “deixar-se possuir pela Verdade e pelo Bem, para amar e louvar o Senhor, ao qual pertence todo o bem, e para servir os irmãos na caridade de Cristo” (RS 4). Dessa forma, o estudo pode tornar-se exercício profundo de busca como desejo e desapropriação, que tem como fruto a alegria. d. Antecipação do futuro Creio que temos urgente necessidade dessa inquieta interrogação, entendida como caminho de liberdade e de alegria, para não limitarnos a voltar para a “graça das origens” quase satisfeitos ou saudosos de nosso passado. Queremos realmente viver a graça das origens 27 O Sabor da Palavra “não somente como memória do passado, mas como profecia de futuro” (cf. NMI 3; VC 110). O pensamento deve alimentar-se na fonte da Verdade, da Vida e do Bem e, ao mesmo tempo, projetar-se para horizontes abertos. Uma filosofia e uma teologia críticas impedirão que o olhar retrospectivo caia num puro tradicionalismo ou numa nostalgia sentimental em relação às nossas origens. Ao mesmo tempo, a exatidão do pensamento ajudará a superar todas as ideologias futuristas e utópicas. O pensamento franciscano foi capaz de discernir os sinais dos tempos e de encontrar sempre de novo a corajosa força de uma palavra profética sobre o mundo e a sociedade e, se necessário, também no seio da própria Igreja, para fazer recordar a ordo divina, que é a única que pode prometer a salvação e a felicidade do homem. É o Espírito que nos projeta para o futuro (cf. VC 110). Por isso, a busca não pode parar. Significaria que nossa proposta carismática deixou de ser vital. A busca, da qual o estudo é uma dimensão, não pode parar, se quisermos “descobrir criativamente novos caminhos para promover e difundir os valores evangélicos” (RFF 34). e. Como irmãos O estudo não é somente uma ocupação privada e solitária. A busca da verdade impõe-se a nós como Fraternidade, por força de nosso próprio carisma. No contexto da vida fraterna, podemos ser educados e educar progressivamente para o gosto pela pesquisa e pelo pensamento, para o confronto e para o diálogo entre posições diferentes. Assim, “os estudos contribuem para a construção da Fraternidade” (cf. RS 24) e a abrem para a Fraternidade mais ampla da comunidade eclesial e dos homens de boa vontade. Essa disposição fraterna cons17 Cf. AGOSTINHO, SANTO, Confissões, X, c. 23, Petrópolis: Ed Vozes, 17ª ed., 2001, pg. 240. 28 O Sabor da Palavra titui também um poderoso antídoto contra as tendências à concorrência e à auto-afirmação nos estudos e na pesquisa e, ao mesmo tempo, um incentivo para a colaboração ao diálogo entre as disciplinas. Se a busca da Verdade, da Vida e do Bem é animada pelos pressupostos que procurei recordar em sintonia com nossa tradição, teremos a base para um diálogo fecundo e simpático com a cultura, sem fechamentos nem exclusivismos (cf. EN 20). A Igreja tem necessidade dessa profecia num tempo em que o diálogo é sempre mais o novo nome da caridade, a garantia de paz e de justiça (cf. NMI 55-56). Por isso, é importante e urgente promover na Ordem o estudo da filosofia, das religiões e das culturas, para podermos abrir-nos de forma rigorosa e qualificada ao diálogo e ao confronto, em continuidade com o espírito e a prática da fraternidade que nos é própria. Descobrimos uma particular relação entre os Frades que têm vocação para a atividade intelectual e todos os outros. É importante que todas as Entidades tenham alguns Frades que se dedicam aos estudos de forma prioritária e, por vezes, exclusiva. Sua pesquisa deve estimular todos os outros irmãos à escuta e ao diálogo, assim como o trabalho e a evangelização dos demais deve abrir e iluminar quem se dedica ao estudo. Existe tal reciprocidade em nossa Fraternidade? Quando Francisco quer falar de todos os seus Frades na ótica de suas atividades, utiliza três palavras: “suplico a todos os meus irmãos que pregam, que rezam e que trabalham...” (RnB XVII, 5): pregadores, trabalhadores e rezadores. Quem se dedica ao trabalho intelectual “com fidelidade e devoção”, não sufocando em si a 18 Cf. A Caminho, rumo ao capítulo geral extraordinário, “A vocação da Ordem hoje”, Roma 2005, 26-30. 29 O Sabor da Palavra ação do Espírito, exatamente no trabalho e por seu trabalho, sem justaposições artificiais, pode tornar-se ao mesmo tempo “laborator, praedicator et orator”. Esta unidade de nossa forma vitae é um apelo urgente a todos nós. Abre a análise também sobre o papel que o trabalho tem em nossa vida. O trabalho é uma necessidade ligada à nossa profissão de pobreza e de minoridade. Torna-nos mais solidários a muitos homens e mulheres para os quais o trabalho já não é fonte de dignidade. Obriga-nos a optar novamente por uma hierarquia de valores que nos sustenta18. Tudo isso me faz pensar também nos Frades e nos candidatos que, talvez, são menos atraídos pelo estudo, no sentido estrito da palavra. Também hoje devemos reconhecer que as capacidades intelectuais não podem ser discriminantes para a vocação franciscana. Todavia, todos nós temos o dever de garantir a todos os Frades, sem distinções, um nível de preparação tal que permita que cada um se integre na vida da Fraternidade. Sejamos vigilantes, para que, por causa de um conceito de cultura demasiadamente acadêmico e, portanto, reduzido, não aconteça que excluamos alguns Frades, ferindo assim a igualdade entre nós. Interroguemo-nos sobre os níveis de acessibilidade aos estudos nos diversos contextos em que vivemos e sobre as conseqüências para o discernimento vocacional e para os serviços na Fraternidade. 2. O ESTUDO COMO ESCUTA E ACOLHIDA DO OUTRO a. Ouvir e ver Vivemos numa civilização da imagem. Talvez a realidade nos ultrapassou e ainda não 19 30 AGOSTINHO, SANTO, Confissões VIII, c. 6, Petrópolis: Ed. Vozes 2001, pg. 177. O Sabor da Palavra nos sentimos bem numa situação tão nova que transforma até o próprio modo de perceber a realidade. A possibilidade de ver pessoas, coisas e fatos em tempo real está a nos modificar. Por vezes, essa realidade gera em nós medo e autodefesa. Tememos que esta civilização da imagem produza uma enorme redução da dimensão de escuta. Não conseguimos explicar a insensata necessidade humana de aparecer. É tudo negativo? Ou podemos entrar nessa virada para também nela encontrar um valor? Como unir escuta e cultura da imagem? Recordo a dimensão bíblica da escuta, tendo presente que, na própria Escritura, o “ver” tem uma grande importância, especialmente quando indica o encontro com o Deus vivo e com o homem criado à sua imagem. É certo que, na fé bíblica, Deus é audível, mas não visível. A autêntica resposta e a atitude fundamental é ouvir: “Ouve, Israel”, “ouvi hoje a palavra do Senhor”, “bem-aventurados os que ouvem a palavra de Deus e a observam”. A última bem-aventurança de João é reservada àqueles que crêem sem ver (Jo 20,29). Mas essa escuta atinge seu ponto mais alto e se completa no encontro com o Verbo feito carne. Através da humanidade de Jesus Cristo e, portanto, de cada homem, podemos “ouvir e ver”: “O que era desde o princípio, o que ouvimos, o que vimos com os nossos olhos, o que contemplamos e o que nossas mãos apalparam a respeito da Palavra da vida...” (1Jo 1,1). A experiência integral da fé nos salva daquela escuta que se perde no “diz-se” das conversas diárias e daquele “ver” que é consumo de informações e de imagens. Dessa forma, rompe-se a inautenticidade na qual estamos mergulhados para acordarmos na verdade. Portanto, a escuta e o ver são um ato de verdadeira e própria interpretação da realidade, que não deve ser agredida, possuída e dominada, 31 O Sabor da Palavra mas, ao contrário, deve ser acolhida, reconhecida e promovida. Esse percurso implica num deixar-se expropriar, num êxodo de si. Por isso, é uma verdadeira experiência, no sentido etimológico de experior, uma passagem através de um perigo mortal, onde se realiza uma real mudança de si. A escuta de uma palavra verdadeira gera um novo modo de ver e opera sempre uma profunda transformação. Santo Agostinho fala em “dar à luz uma nova vida (parturitio novae vitae)”19, onde a escuta é “memória de si, memória de Deus (memória mei, memoria Dei)”. O espanto é o fruto dessa nova capacidade de escuta. O estudo é uma das estradas para esta nova escuta do homem e do mundo. Com efeito, ele nos liberta do medo do nobre cansaço do pensar, enquanto, muitas vezes, nós nos contentamos em repetir fórmulas e idéias dos outros. Liberta-nos, também do medo do silêncio, para tomar uma certa distância da realidade. Daqui nascem palavras novas para gerar uma nova vida, além de palavras tomadas pelo hábito e pela obviedade. Semelhante percurso traz consigo o sofrimento de todo o novo nascimento, inclusive a alegria da descoberta. b. Ouvir e ver hoje Vivemos um tempo como o de Samuel, do qual se diz que “naquele tempo a palavra do Senhor era rara” (1Sm 3,1). Parece que Deus se cala ou esteja quase eclipsado de nosso horizonte. O sacerdote Eli – instituição – não reconhece logo a voz do Senhor. É um exercício que exige uma vigília constante, uma interpretação incansável. Deus chama o pequeno Samuel no 20 32 SCHALÜCK, FR. HERMANN, La promozione degli studi nel nostro Ordine, in Acta Congressus Repraesentantium Sedum Studiorum OFM, Roma 1994, 70. O Sabor da Palavra silêncio da noite e das palavras humanas. Chama-o por seu próprio nome: é o despertar da consciência e a assunção de um novo destino, dos quais nasce o profeta. Esse itinerário bíblico pode tornar-se modelo para quem busca novos caminhos para viver este difícil tempo. O estudo é um desses caminhos se se tornar um exercício de escuta obediente, de recepção do outro enquanto diferente de nós, de olhar novo sobre ele. A isso somos provocados pelas culturas que hoje se apresentam no cenário do mundo, pelas muitas crenças e religiões com as quais somos chamados a dialogar, pelos desafios éticos, os do mundo da comunicação, pela tecnologia, pela engenharia genética e por muitos outros quadros de confronto. Nos diversos continentes e países nos quais estamos presentes, estes desafios nos provocam de muitas formas. Indicar uma única estrada é difícil, ou até impossível. Trata-se de tornar-nos sempre mais conscientes da necessidade de educar-nos para a escuta e para o diálogo, a fim de aprender a arte do encontro com as culturas. Sem dúvida, é urgente encarnar nosso carisma nas diversas culturas em que estamos presentes e descobrir nelas os germens da intuição evangélica de São Francisco, que tem condições de revelar também suas novas profundezas (cf. RS 16. 26. 72. 74). “Pensar a fé” é, então, exercício profético dos crentes a serviço da libertação do homem e do discernimento das formas culturais em que vivemos. Por isso, temos necessidade de consolidar tanto a opção vocacional quanto nossa preparação. Com efeito, como disse meu predecessor Fr. Hermann Schalück, “A presunção, a superficialidade, a indiferença pelas ciências humanas e sacras devem ser consideradas uma ofensa ao dom da vida, ao homem e à Verdade... Considero um abuso e uma falta de respeito o fato de apresentar-se para servir a uma causa nobre como o 33 O Sabor da Palavra Evangelho e o homem sem a devida preparação, ou sem a capacidade de diálogo e de leitura dos sinais dos tempos. Por isso, deve-se considerar um dever fundamental de cada frade, cada um segundo seus dons, a dedicação ao estudo. Pois o estudo, se bem fundamentado nos valores franciscanos, pode realmente ajudar-nos a amadurecer humana, intelectual e espiritualmente e tornar-nos capazes de perceber, com inteligência evangélica, os valores cristãos e franciscanos da cultura contemporânea”20. Nesse contexto, olho convosco para os diferentes meios e culturas nas quais vivemos. Penso, particularmente, na exigência de escuta e de diálogo na Ásia, continente no qual o diálogo inter-religioso assume um lugar especial. Nossa presença na Ásia é pequena; no entanto, desafia-nos a preparar-nos adequadamente para aquele que é, certamente, o continente do futuro, graças à juventude de sua população e às enormes potencialidades nela contidas, em todos os níveis. Penso na Oceania, onde a história da evangelização nos faz sentir como primária a urgência da aculturação da fé cristã, em vista da qual é necessária uma sólida e adequada preparação. A esse respeito, o Papa Paulo VI, ao visitar a Oceania, insistiu no fato que o catolicismo “não só não sufoca o que existe de bom e de original em cada forma de cultura humana, mas acolhe, respeita e valoriza o gênio de cada povo e reveste de variedade e de beleza a única e inconsútil veste da Igreja de Cristo”21. Nesse imenso continente, somos fortemente convidados a agir em harmonia com os cristãos indígenas para garantir que a fé e a vida da Igreja 21 22 34 PAULO VI, Discurso aos Bispos da Oceania, Sidnei, 1º de dezembro de 1970, in AAS 63 (1971), 56. Cf. JOÃO PAULO II, Exortação Apostólica Ecclesia in Oceania, 2001, 17. O Sabor da Palavra sejam expressas em formas apropriadas a cada cultura22. Penso na África, infindo continente que grita por paz e justiça, esquecido que é pela comunidade internacional. A esse propósito, é muito atual a afirmação de Paulo VI na Encíclica Populorum Progressio: “O desenvolvimento é o novo nome da paz”23. João Paulo II, na Exortação Apostólica “Novo Millennio Ineunte”, atualizou o grito, recordando que apostar na caridade é questão de fidelidade ao Evangelho24. A África é rica em culturas e tradições; nelas o cristianismo e o franciscanismo esperam, sem dúvida, tornar-se mais africanos; ora, isso exige um qualificado investimento de reflexão e de estudo, para respondermos à nossa vocação de “guardiães da esperança”25. Penso na África do Norte e no Oriente Médio, onde a presença franciscana, num contexto muçulmano, continua a pedir-nos o esforço de conhecer e de encontrar-nos com aquele mundo particular, e hoje em convulsão, no espírito do encontro de Francisco com o Sultão: isso não será possível sem o estudo rigoroso do mundo islâmico e da língua árabe, na partilha, como menores, da vida de muita gente, aceitando e aprendendo a viver como minoria. Penso na América Central e do Sul, áreas de forte maioria cristã, com sua criatividade pastoral e teológica. Nelas, o crescimento do confronto com outras comunidades cristãs e com as seitas nos desafia a renovar nossa presença e nosso anúncio. Nesse subcontinente, a 23 24 25 PAULO VI, Carta encíclica Populorum progressio, 76-80, in AAS 59 (1967) 294-296. Cf. JOÃO PAULO II, Novo Millennio Ineunte, nn. 49-50. Cf. RS 27; JOÃO PAULO II, Discurso ao Pontifício Ateneu Antoniano, 16 de janeiro de 1982, n. 4a: “Como São Francisco, sede também vós no mundo de hoje os guardiães da esperança”. 35 O Sabor da Palavra situação de pobreza e de injustiça constitui ainda um enorme estímulo para pensar os fundamentos da paz, da justiça e da integridade da criação. Isso nos desafia a conhecer melhor os mecanismos causadores de tão escandalosa miséria e a pensar no tempo da globalização a partir da cátedra dos excluídos e dos mais pobres (cf. EN 31; RS 27). Penso no mundo ocidental, da velha Europa à América do Norte, onde é preciso repensar a própria possibilidade de falar de Deus num mundo secularizado, onde o sagrado re-emerge, mas a fé parece se eclipsar. Após o desaparecimento das grandes e loucas ideologias do século XX, o destino do Ocidente parece particularmente incerto e necessitado de um suplemento de alma para olhar para o futuro; especialmente através de uma radical reflexão ética acerca dos limites da vida e da morte e de uma antropologia que respeite a integralidade da pessoa humana, sujeito de direitos inalienáveis e jamais redutíveis ao domínio da economia e da esfera privada do indivíduo. c. Ouvir e ver para anunciar o Evangelho Em contextos tão diferentes, a evangelização exige um rigoroso trabalho da inteligência. A Palavra de Deus deve ser anunciada em palavras compreensíveis ao homem de cada época. Nesse sentido, a escola franciscana é chamada a dar hoje à Igreja sua valiosa contribuição, cultivando um “pensar a fé” de maneira franciscana, capaz de oferecer razões para crer, esperar e amar no contexto atual. Somos chamados a não nos fecharmos em nós mesmos, como que assustados pela complexidade, mas a considerarmos o mundo como nosso lugar ordinário e bendito de vida e de pensamento. Assim aprendemos a dialogar com todos em pé de igualdade, sem pretender 36 O Sabor da Palavra posições privilegiadas, mas tornando-nos interlocutores críveis. Os grandes mestres da Escola franciscana sempre amaram o confronto com sistemas de pensamento diferentes, contanto que sempre ricos de sementes daquele que é o Bem. Estas sementes não estão, por acaso, espalhadas em toda a parte? Em nossa história, sempre estivemos abertos e sensíveis às situações concretas da história e da cultura. O franciscanismo encontrou-se e influenciou as artes figurativas, a poesia e a literatura, a arquitetura e as outras expressões do espírito humano. Fiéis à lógica da Encarnação, somos chamados a continuar por esta estrada. Hoje mais do que nunca, não queremos estudar para ocupar posições influentes e de poder na sociedade ou na Igreja. Nossa vocação de menores indica-nos o caminho da escuta obediente e da hospitalidade ao outro como coisa típica dos pobres. O itinerário que o estudo inicia é próprio de quem se descobre pobre porque mendicante de sentido, apaixonado pesquisador da verdade em cada manifestação do homem e do mundo, em meio a tantas pessoas de boa vontade. Com poucas e simples palavras, São Francisco nos pede que sejamos “submissos a toda criatura humana por causa de Deus” (RnB XVI, 6). Trata-se da humilde submissão à realidade histórica e humana que se estuda para amá-la, para acolhê-la com respeito e para restituí-la como dom de Deus (por amor de Deus). A minoridade não admite a reivindicação de direito algum sobre os outros, pois somos chamados a servi-los também com nossa pesquisa intelectual. O que se aprendeu deve ser partilhado como uma riqueza comum que vem do Altíssimo. Caminhada exigente numa sociedade e em instituições culturais que tendem a fazer dos especialistas os depositários privilegiados de um saber que os distingue dos outros. 37 O Sabor da Palavra Parece-me, pois, que, como Frades menores, por força de nosso próprio nome, somos chamados a desempenhar uma disposição de vida que devolva ao estudo sua qualidade de humilde serviço. Estamos diante de uma verdadeira e própria convergência entre a espiritualidade franciscana e o trabalho intelectual. d. Ouvir o Espírito do Senhor A escuta do homem e da realidade na perspectiva franciscana nutre-se de uma escuta mais profunda. Recordemos a exortação de São Francisco a propósito do trabalho em geral: “de modo que... não extingam o espírito da santa oração e devoção, ao qual devem servir as demais coisas temporais” (RB V, 3). Aqui se trata do Espírito do Senhor e de sua “santa operação”. Se for profunda e verdadeira, a atividade do espírito humano encontra-se com a do Espírito de Deus no homem, mas não a substitui. Quem respira o sopro do Espírito permanece livre e não se enrijece numa atividade. São Paulo expressa isso muito bem: “No presente, vemos por um espelho e obscuramente; então veremos face a face. No presente, conheço só em parte; então conhecerei como sou conhecido. No presente, permanecem estas três coisas: fé, esperança e caridade; mas a maior delas é a caridade” (1Cor 13,12-13). Na busca humana do conhecimento e da verdade, existe uma parábola e uma realização parcial da busca de Deus. É o desejo que o Espírito desperta e alimenta em nós e que nos torna pobres, nos ajuda a manter a justa consideração do trabalho autônomo do espírito humano. Na verdade, “pensar a fé” é um exercício altamente espiritual e cristão: unifica a pessoa e ajuda a permanecer com “o coração voltado para o Senhor”, transformando-se em caridade que pensa amando e ama pensando. Estimula a profundeza da visão que consente perceber o fio 38 O Sabor da Palavra vermelho nos fenômenos e fatos retalhados e, à primeira vista, desconexos. Permite que o crente reconheça o plano salvífico de Deus operante na história e a ele aderir com a vida. Como bem dizia nosso irmão Giacomo Bini, “a longa história das diversas expressões nas quais se encarnou o carisma franciscano mostra, com evidência, a fecundidade da relação entre esforço intelectual e seriedade da experiência espiritual: a partir da experiência de Deus, a inteligência recebe nova força para a busca da verdade; e a verdade encontrada exige que seja partilhada, anunciada. Não existe autêntica experiência de Deus que não se transforme em nova luz para a inteligência e em novo estímulo para o anúncio”26. Estas amplas perspectivas abrem-nos novamente para a vocação missionária, que percebemos ainda atual depois de 800 anos. Enquanto se abrem novos campos para o anúncio de Jesus Cristo, único Salvador do mundo, e para a implantatio Ordinis, especialmente na Ásia e na África, convido todos os Frades a se sentirem diretamente responsáveis e também a terem a audácia de partir novamente para viver e anunciar o Evangelho quando e como virem que isso agrada ao Senhor (cf. RnB XVI 7-8). 3. ESTRUTURAS E MEIOS A SERVIÇO DOS ESTUDOS, DA PESQUISA E DO ENSINO a. As Universidades, os Centros de Estudo e de Pesquisa Nossa Ordem conta com 14 Universidades, eclesiásticas e civis; dois Centros de Pesquisa, a Comissão Escotista e o Colégio de São Boaventura em Grottaferrata; a Pontifícia 26 BINI, GIACOMO, Saluto del Gran Cancelliere per l’inaugurazione dell’Anno Academico 2000-2001, no Pontifício Ateneu Antonianum, in Liber Triennalis 1999-2002, Roma 2003, 47; cf. também RS 15. 39 O Sabor da Palavra Academia Mariana Internacional e outros 32 Centros de Estudo; a 11 de janeiro passado, o falecido João Paulo II concedeu ao Antonianum o título de Universidade Pontifícia. A partir do distante 1887, ano da inauguração do Colégio Santo Antônio, a caminhada foi longa, muitas vezes cansativa, mas sempre de crescimento. A intuição do Ministro geral Frei Bernardino Dal Vago de Portogruaro revelou-se muito profética. Hoje, como no fim do século XIX, a Ordem precisa de um “Studium geral”, certamente não exclusivo, mas posto a serviço de todos, na cidade de Roma, a fim de promover uma visão franciscana caracterizada por um zelo universal dirigido a todo o mundo e a todas as pessoas, de todas as nações, línguas, cor ou sexo, aberto à visão de uma fraternidade universal dos filhos de Deus, reconhecendo a dignidade e o valor de cada um. O respeito pelo indivíduo e a integração numa grande família humana e cristã são as características deste universalismo franciscano. Um universalismo que se constrói por meio da comunicação, da partilha, do diálogo e da solidariedade. Se este universalismo é pedido a todas as nossas Universidades e Centros de Estudo e de Pesquisa, muito mais deve ele caracterizar as Universidades e os Centros que estão em Roma. O lugar especial que a Pontifícia Universidade “Antonianum” ocupa na Ordem (EEGG 112-114) e minha pessoal convicção sobre a importância do estudo para garantir aos Frades uma qualidade de vida e de testemunho em vista de uma profunda e autêntica “refundação” de nossa Ordem levaram-me a escrever esta carta. Agora sou estimulado a refletir brevemente sobre o valor e as tarefas não só do Antonianum, mas também de todas as nossas outras Universidades, Centros de Estudo e de Pesquisa, nos quais queremos comprometer-nos como Frades menores, não apenas para mantê-los, 40 O Sabor da Palavra mas para aumentá-los em número e, sobretudo, em qualidade (cf. RS 119). O estudo, a pesquisa e o ensino, entendidos como caminhada para a Vida, a Verdade e o Bem, como escuta e diálogo com o outro, encontram na Universidade e nos Centros de Estudo e de Pesquisa lugares especiais de elaboração e de promoção. Os Centros são animados essencialmente pelo espírito do estudo, da busca metódica da Vida, da Verdade e do Bem, presentes em todos os infinitos âmbitos da realidade e de sua transmissão através do ensino. É por isso que o Frade menor procura encontrar-se com Deus na complexidade da experiência humana e, nessa busca, descobre como seus aliados todas as disciplinas que tentam dar sentido à nossa vida e missão. Em nossas Universidades e Centros, desejo estimular o estudo, a pesquisa e o ensino de todas as disciplinas. Entre as sagradas, recordo para nós, Frades menores, a importância de ouvir, conhecer, amar e estudar especialmente a Palavra de Deus contida nas Sagradas Escrituras. Contudo, não nos limitemos às Ciências sagradas. Somos chamados a abrirnos também às disciplinas que se referem ao homem: Psicologia, Pedagogia, Economia, Ciências políticas, Sociologia, Antropologia, Comunicações sociais, Literatura, Artes, Filosofia e História; e as que se referem à criação: Ciências exatas, naturais e ambientais (cf. RS 48-69), pois “nada daquilo que existe é estranho ao interesse e ao amor do Frade menor” (RS 48). Se vividos como “itinerário e caminho para sermos iluminados por Deus na mente e no coração” (RS 13), o estudo, a pesquisa e o ensino hão de conduzir-nos a Ele. Por essa razão, o estudo, a pesquisa e o ensino, finalidade de cada Universidade e Centro de Estudo, são essencialmente experiência de vida. 41 O Sabor da Palavra Para um Frade menor – estudante, professor ou pesquisador – nenhuma dessas atividades é um distintivo para embelezar o próprio eu. É antes cansaço e paixão para o verdadeiro, o bom e o belo, que dão forma à nossa interioridade, sentido à existência humana e religiosa, razão às nossas opções vocacionais (cf. RS 11). O objetivo último do estudo, da pesquisa e do ensino em nossas Universidades e Centros de Estudo, e dos Frades menores que se dedicam a isso, não é, pois, o de adquirir e oferecer informações, menos ainda o de ter um título. Mas de estimular a busca da Vida, da Verdade e do Bem, em nós e nos outros. Certamente, não basta estar bem informado. Só a transformação da mente e do coração levará a um estudo, a uma pesquisa, a um ensino verdadeiramente fecundos. Nossas Universidades e Centros de Estudo e de Pesquisa são chamados a dar sua colaboração para se elaborar uma cultura a serviço integral do homem, capaz de ir além dos critérios de praticidade, de rendimento e de concorrência, não estranhos às próprias Universidades. Seguindo a secular tradição dos grandes representantes da Escola franciscana, nossas Universidades devem apostar na “diaconia” do saber a serviço do homem, superando assim o poder da ciência que explora o homem. Por outro lado, todos os Centros de Estudo e de Pesquisa franciscanos são chamados a transmitir de forma atualizada o patrimônio cultural, filosófico e teológico da Escola franciscana, na convicção de que “do grande depósito da teologia e da sabedoria franciscana podem ser tiradas respostas adequadas também para as dramáticas interrogações da humanida27 42 JOÃO PAULO II, Mensagem aos participantes do Congresso Internacional das Universidades, Centros de Estudo e de Pesquisa OFM, 19 de setembro de 2001, in Atti del Congresso Internazionale delle Università, Roma 2002, 25. O Sabor da Palavra de”27. Isso exige, sem dúvida, um estudo crítico e aprofundado da tradição cultural franciscana. Estudá-la por curiosidade é estéril, estudála de forma apologética é triunfalismo prejudicial. É necessário aprofundá-la criticamente, para iluminar com um verdadeiro e próprio ato de esperança as grandes questões que nosso tempo nos apresenta. Abertas ao diálogo fecundo com as culturas, nossas Universidades e Centros de Estudo e de Pesquisa têm a importante tarefa de criar pontes entre elas e o Evangelho. João Paulo II nos disse: “É tarefa das vossas Universidades e Centros de Pesquisa realizar um encontro fecundo entre o Evangelho e as diversas expressões culturais de nosso tempo para ir ao encontro do homem de hoje... Segundo o exemplo de São Francisco e a grande tradição cultural da Ordem franciscana, tende o cuidado de colocar o Evangelho no coração da cultura e da história contemporânea”28. A abertura para a complexidade do saber humano induz à escuta e ao diálogo, como procurei lembrar nesta Carta. O verdadeiro intelectual é sempre capaz de perguntas; é humilde e corajoso ao prestar atenção sincera aos argumentos de quem tem posições diferentes. Essa disposição nos impede de cair em várias formas de ideologia que pretendem tornar exclusiva uma idéia ou parte dela e são fruto da falsa segurança de uma fé que tem medo de pensar e pensa poder ignorar as perguntas e as ambigüidades presentes na realidade. Eis uma importante missão que fica aberta às nossas Universidades e Centros de Estudo e de Pesquisa29. 28 29 Id., ibid., 25. Sobre as áreas do estudo, cf. OPPES, STEFANO OFM, Formazione e studio nella nuova Ratio Studiorum dell’Ordine dei Frati Minori LXXVII 1 (2002), 13-23. 43 O Sabor da Palavra b. Outros âmbitos de conservação e de desenvolvimento cultural A par das Universidades e dos Centros de Estudo e de Pesquisa, temos na Ordem outras preciosas Instituições culturais, que devem ser protegidas e promovidas nas Províncias mais antigas e devem ser desenvolvidas nas mais recentes. Convido a ler esta parte com a atenção dirigida para os artigos 118-141 de nossa Ratio Studiorum, que decididamente recomendo. As bibliotecas e os arquivos estão em primeiro lugar. Não se trata de museus, mas de lugares onde o patrimônio literário e escrito deve ser guardado, tornado acessível e reconhecido como motor de pesquisa e de desenvolvimento intelectual em ligação com as perguntas de nosso tempo. Em muitas Províncias, o necessário redimensionamento das Casas faz correr o risco de perder ou de não salvaguardar suficientemente um notável patrimônio cultural. Lembro aos Ministros e aos Custódios que o cuidado por estas instituições atinge o interesse e o futuro de toda a Ordem e não é apenas assunto particular da Entidade. É necessário zelar, também em colaboração com entidades civis e sociais, pelas bibliotecas e pelos arquivos, evitando o abandono, o descuido, a dispersão e o esquecimento do patrimônio livreiro, fomentando sua guarda ou transferência para as casas da Ordem, particularmente para os Centros de Estudo. O mesmo vale para o patrimônio cultural constituído por muitas de nossas Casas, pelas Igrejas e pelas obras de arte que ali são conservadas. Precisa-se de um pouco mais de fantasia e de atenção para encontrar maneiras de conservar e de atualizar este patrimônio, sem transformar-nos em imóveis guardas de museus. Sem dúvida, a arte é um lugar privile44 O Sabor da Palavra giado de diálogo com a cultura contemporânea e, por caminhos a serem totalmente descobertos, de evangelização. Para promover semelhante atenção é ainda necessário cuidar dos estudos literários, artísticos e técnicos. Trata-se de uma real necessidade, para que a pesquisa não se torne instrumento de posse e de domínio, mas de humilde aproximação ao grande mistério escondido em cada coisa. A experiência franciscana do estudo e da atividade artística não nos apresenta a figura do Frade menor como alguém que quer conquistar para poder aumentar o lucro técnico ou econômico, mas como um ser tocado, sacudido e fascinado, um ser tomado pela admiração do Verdadeiro, do Bem e do Belo que é inerente às coisas. Através da via pulchritudinis poderemos desenvolver elementos essenciais da visão franciscana do mundo e do mistério de Deus e, ao mesmo tempo, encontrar-nos com muitos homens e mulheres de nosso tempo. Outro campo que gostaria de lembrar é o das comunicações sociais. Trata-se já de um verdadeiro e próprio “lugar”, uma “ágora” única na qual os homens de hoje se encontram entre si de forma nova e com desenvolvimentos imprevisíveis. Portanto, convido os Ministros, os Custódios e todos os Frades, sobretudo os mais jovens, a conhecer, a estudar e a entrar nesse mundo, não como intrusos, mas como quem sabe que está em casa onde existe algo que é plenamente humano. Não posso deixar de destacar aqui a necessidade de garantir pesquisadores e estudiosos da história, da literatura, da filosofia, da teologia e da tradição franciscana. Não só no que se refere diretamente às origens, mas por todo o espaço de oitocentos anos durante os quais nossa tradição se mantém viva. 45 O Sabor da Palavra Particularmente, instituições como a Comissão Escotista, o Colégio São Boaventura dos Frades Editores de Quaracchi e a Pontifícia Academia Mariana Internacional, para terem continuidade, pedem Frades seriamente preparados e abertos a colaborações externas. 46 CONCLUSÃO Chegando ao fim desta Carta, desejo comunicar-vos com simplicidade que, neste momento, considero fundamental uma aproximação maior entre os Frades que se dedicam à evangelização e os que se entregam ao estudo, à pesquisa e ao ensino. Sua recíproca presença no decorrer da história franciscana não pode ser considerada uma desgraça, mas uma riqueza. É antes o divórcio e a oposição entre as duas que constituem uma desgraça, segundo vemos muitas vezes em nossa história. Dessa forma foram penalizados o estudo, a pesquisa e a pregação. Muitos Frades dedicados à evangelização consideraram-se dispensados do estudo e muitos estudiosos julgaram-se isentos da evangelização. Chegou a hora da reconciliação. Se parece que os Frades se deixam absorver completamente pelos ministérios e serviços, é necessário recordar-lhes a necessidade do estudo: uma adequada preparação intelectual é fundamental em qualquer atividade apostólica. Ao mesmo tempo, aos que se dedicam ao estudo, à pesquisa e ao ensino de forma prioritária, sinto a necessidade de lembrar que estas atividades não podem ser separadas do dom e do esforço de viver com alegria as exigências de nossa forma vitae. Gostaria que com esta Carta tivesse início um diálogo sobre os temas que apresentei. Estimo, sobretudo, que tal diálogo continue em vários níveis e nos diferentes contextos culturais, nas Entidades, nas Fraternidades locais, nas Casas de formação, em nossas Universidades e nos Centros de Estudo. Um diálogo que nos leve a progredir, para podermos olhar com confiança e lucidez o futuro que nos espera e que já se inicia entre nós. 47 O Sabor da Palavra Certamente, não tenho a pretensão de ter dito tudo e bem. O diálogo entre nós poderá completar o texto. Sobre os que estão à busca da Verdade, da Vida e do Bem e sobre os que estão em atitude de encontro, de escuta e de diálogo invoco a bênção do Senhor e do Seráfico Pai. Roma, da Cúria geral da Ordem, 13 de junho de 2005. Festa de Santo Antônio de Pádua, Doutor Evangélico FR. JOSÉ RODRÍGUEZ CARBALLO, OFM Ministro geral FR. MASSIMO FUSARELLI, OFM Secretário geral para a Formação e os Estudos Prot. 095700 48 O Sabor da Palavra ABREVIAÇÕES Sagrada Escritura Sl Salmos 1Sm Primeiro livro de Samuel Mt Evangelho de São Mateus Lc Evangelho de São Lucas Jo Evangelho de São João 1Cor Primeira Carta aos Coríntios 1Jo Primeira Carta de João Escritos de São Francisco de Assis Ad Admoestações COrd Carta a toda a Ordem RB Regra Bulada RnB Regra não Bulada SV Saudação às Virtudes Test Testamento Outras abreviações 1Cel Vida primeira de Tomás de Celano AP Anônimo Perusino LTC Legenda dos Três Companheiros AAS Acta Apostolicae Sedis EN Paulo VI, Evangelii nuntiandi, Carta apostólica, Roma 1975. VC João Paulo II, Vida consagrada, Exortação apostólica, 1996. NMI João Paulo II, Novo Millennio Ineunte, Carta apostólica, 2001. CCGG Constituições gerais da Ordem dos Frades Menores, Roma 2004. EEGG Estatutos gerais da Ordem dos Frades Menores, Roma 2004. AO Acta Ordinis Fratrum Minorum FP A formação permanente na Ordem dos Frades Menores, Roma 1995. RS Ratio Studiorum, Roma 2001. RFF Ratio Formationis Franciscanae, 49 O Sabor da Palavra Sdp 50 Roma 2003. O Senhor vos dê a paz, Documento do Capítulo geral 2003, Roma 2003. O Sabor da Palavra 51 O Sabor da Palavra INDICE Premissa ..............................................................3 1 Palavra, vida fraterna e anúncio em São Francisco..............................................7 1. A graça das origens.....................................7 2. Francisco homem “sem cultura”?................8 3. Os livros e a pregação ...............................10 2 A palavra na história do carisma....................15 1. O encontro com as culturas ......................15 2. A escuta se faz diálogo .............................17 3. Uma fraternidade que anuncia .................18 3 A palavra no encontro com a cultura .............23 1. Estudar, como busca da vida e da verdade .............................................23 a. Caminhada de expropriação................24 b. Sem fixa morada .................................26 c. A alegria da verdade ...........................26 d. Antecipação do futuro .........................27 e. Como irmãos .......................................28 2. O estudo como escuta e acolhida do outro...................................30 a. Ouvir e ver ..........................................30 b. Ouvir e ver hoje...................................32 c. Ouvir e ver para anunciar o Evangelho.........................................36 d. Ouvir o Espírito do Senhor..................38 3. Estruturas e meios a serviço dos estudos, da pesquisa e do ensino .......39 a. As Universidades, os Centros de Estudo e de Pesquisa ......................39 b. Outros âmbitos de conservação e de desenvolvimento cultural ............44 Conclusão ............................................................47 Abreviações ..........................................................49 Indice 52 ............................................................50