UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
As Mudanças na Família Brasileira a Partir do Século XIX
Por: Natália de Oliveira
Orientador
Profª. Fabiane Muniz
Rio de Janeiro
2012
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
AVM FACULDADE INTEGRADA
As Mudanças na Família Brasileira a Partir do Século XIX
Apresentação de monografia à AVM Faculdade
Integrada como requisito parcial para obtenção do
grau de especialista em Terapia de Família.
Por: Natália de Oliveira
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AGRADECIMENTOS
A Deus, aos meus Pais , a orientadora
e profª Fabiane Muniz, aos meus
amigos
de
turma
e
a
todos
os
professores que tive no curso de
Terapia de Família.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho com muito amor e
carinho aos meus pais Vilma e Jorge.
5
“Toda a doutrina social que visa destruir a família é má, e para mais inaplicável.
Quando se decompõe uma sociedade, o que se acha como resíduo final não é
o indivíduo, mas sim a família.”
Victor Hugo
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RESUMO
O presente trabalho é um estudo sobre as mudanças que ocorreram na
família brasileira a partir do século XIX até os dias atuais. O objetivo foi analisar
e identificar o que mudou na família brasileira a partir do século XIX e o que
essas mudanças significaram. Desta forma busquei aprimorar conhecimentos
sobre a constituição da família brasileira fazendo um estudo comparativo da
formação da família brasileira do século XIX até a família brasileira atual. Além
disso, procurei identificar e compreender os novos arranjos familiares existente
no século XXI.
O capítulo I é um estudo sobre como era a família brasileira no século
XIX, para isso abordei como era o contexto histórico do Brasil nesta época e
como este modelo de família patriarcal vivia inserido neste contexto. No
capítulo II estudei sobre as mudanças na dinâmica familiar brasileira a partir do
século XIX, analisando as transformações que ocorreram nas estruturas das
famílias brasileiras principalmente nas famílias do século XX. O capítulo 3 é
sobre o que vem a ser a família brasileira no século XXI com seus diversos
arranjos familiares bem como suas diferentes funções na atualidade.
Diante de todo este estudo podemos concluir que o importante é
compreender que a família é uma organização dinâmica e mutável ao longo
dos tempos e que acaba ocupando o lugar que os padrões culturais de uma
determinada sociedade lhes indicam. Por isso é de suma importância entender
as mudanças e os novos arranjos familiares da família brasileira na atualidade,
pois compreender este processo nos possibilitará exercer uma atuação
profissional de melhor qualidade com essas famílias.
Palavras-chave: Brasil, Família, Mudanças e Novos arranjos familiares.
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METODOLOGIA
A metodologia pela qual optei aplicar neste trabalho trata-se de uma
pesquisa qualitativa, pois foi baseada em pesquisas bibliográficas. A partir da
leitura de alguns autores como Philippe Áries, Gilberto Freyre, Hernani Donato,
Danda Prado, Antonio Candido, Eni Samara de Mesquita, Lia Fukui, Luiz
Carlos Osório, dentre outros, procurei compreender o que mudou na formação
da família brasileira a partir do século XIX e o que estas mudanças
significaram. Para isso realizei esse estudo bibliográfico sobre as famílias
brasileiras do século XIX ao século XXI.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO...................................................................................................09
CAPÍTULO I - A Família Brasileira do Século XIX.........................................11
1.1 - O Brasil do Século XIX..............................................................................11
1.2 - A Família Patriarcal Brasileira....................................................................15
CAPÍTULO II - As Mudanças na Dinâmica Familiar Brasileira
a partir do Século XIX......................................................................................20
2.1 - Transformações nas Estruturas das Famílias Brasileiras
a partir do Século XIX........................................................................................20
2.2 – A Família Brasileira do Século XX............................................................24
CAPÍTULO III - A Família Brasileira do Século XXI ............................29
3.1 - A Família Contemporânea.........................................................................29
3.2 - Novos Arranjos Familiares.........................................................................33
3.3 – As Funções da Família na Contemporaneidade.......................................35
CONCLUSÃO....................................................................................................38
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................39
WEBGRAFIAS..................................................................................................42
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INTRODUÇÃO
A família brasileira a partir do século XIX vem sofrendo importantes
transformações sociais, políticas, culturais, econômicas e biológicas que
influenciam os conceitos da mesma e as tendências de conduta e
comportamento diante de determinadas situações.
O presente trabalho busca compreender o que mudou na formação da
família brasileira a partir do século XIX e o que estas mudanças significaram.
Desta forma busca aprimorar conhecimentos sobre a constituição da família
brasileira, comparando a formação da família brasileira do século XIX até a
família brasileira atual. Além disso, objetiva compreender os novos arranjos
familiares do século XXI.
Estudos mostram que a família brasileira vem sofrendo grandes
transformações principalmente a partir do século XIX quando a família era
nuclear, ou seja, constituída por um pai, mãe e filhos. Todo século XIX foi
marcado pela repressão do pai ao resto da família que não desfrutava do
direito de opinar em situação alguma sobre o próprio futuro ou expor sua
opinião sobre seus gostos, desejos e anseios.
Com a Revolução industrial e com a revolução feminista, o
posicionamento das mulheres mudou radicalmente em menos de meio século o
que possibilitou que o papel da mulher na família se transformasse. A mulher
que antes precisava se preocupar apenas em cuidar do lar, de seus filhos e de
seu marido, teve a oportunidade de se incluir no mercado de trabalho.
Além disso, os homens viram a necessidade de repensar seu papel na
família. A partir de meados do século XX, o homem foi cada vez mais perdendo
o domínio sobre a chefia da família e todo o autoritarismo decorrente disso. O
homem moderno do século XXI aprendeu a ser gentil, compreender que as
tarefas da casa pertencem a eles também, educar os filhos junto com as
esposas e dividir e compartilhar os trabalhos domésticos.
No início do século XXI, percebem-se grandes metamorfoses nas
famílias tais como: a diminuição do número de filhos, a redução de número de
matrimônios realizados legalmente, o aumento de separações e divórcios.
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A divisão sexual dos papéis, ou seja, as funções socialmente destinadas
aos homens e mulheres nas famílias são questionadas, não havendo mais a
rígida separação dos papéis, demonstrando uma estrutura mais aberta e
flexível.
Atualmente
o
conceito
de
família
supera
os
parâmetros
da
consangüinidade e do parentesco e apresenta um sentido mais amplo,
fundamentado na convivência e nas relações mútuas de cuidado e proteção
entre indivíduos que construíram laços afetivos entre si.
É possível focalizar a família como objeto de estudo a partir da
constatação de que ela desempenha papel fundamental no desenvolvimento e
manutenção da saúde e no equilíbrio emocional de seus membros. Desta
forma é de suma importância entender as mudanças e os novos arranjos
familiares da família brasileira na atualidade, pois compreender este processo
nos possibilitará exercer uma atuação profissional de melhor qualidade com
essas famílias.
.
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CAPÍTULO I
A Família Brasileira do Século XIX
Este capitulo abordou sobre o contexto histórico brasileiro do século XIX,
com suas mudanças econômicas políticas e sócio culturais. Além disso, retrata
como a família brasileira de modelo patriarcal se configurava e se estruturava
neste contexto.
1.1 – O Brasil do Século XIX
No decorrer do século XIX, o Brasil passou por diversas mudanças e
acontecimentos, tanto no âmbito político e econômico quanto no sócio-cultural.
Segundo Donato (1999) essas mudanças foram iniciadas com a vinda da
família real portuguesa para o Brasil em 1808. Segundo o autor, até a chegada
da família real no Brasil não se podia fabricar quase nada, e os barcos
estrangeiros eram impedidos de ancorar em portos da colônia. Além disso,
com a chegada da corte portuguesa no Brasil mudaram-se o cotidiano
brasileiro da produção e do comercio.
A chegada da família real no Brasil trouxe consigo bancos, bibliotecas,
crescimento das cidades, abertura dos portos as nações amigas, mudanças
econômicas e culturais, fatos que transformaram o futuro do país. Além disso,
nobres famílias se estabeleceram no país juntamente com bons colégios e
faculdades melhorando a educação a quem a ela tinha acesso.
Na política o Brasil conquistou a independência em 1822 com D Pedro I
porem a família real se manteve no poder até o momento que surgiram crises e
revoltas populares. A independência política não afetou a estrutura social e
econômica, pelo contrário o país continuava escravista, monocultor, agrário e
exportador.
Logo após a Independência do Brasil o imperador D Pedro I outorgou a
primeira Constituição Brasileira em 1824. O texto consagrava a monarquia
hereditária com o poder repartido entre o Executivo, Legislativo, Judicial e o
Moderador, que pertencia ao Imperador, dando-lhe controle total sobre os
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restantes dos poderes. A Constituição ressaltava certos aspetos inovadores,
como a definição da cidadania brasileira, a consagração de direitos e garantias
dos cidadãos e o catolicismo como religião de Estado.
Em 1831, o imperador abdica devido a diversas atitudes desgastantes
como a outorga da constituição, o Poder Moderador, o forte centralismo e a
crise econômica devido às guerras. Toda essa agitação política do governo de
D Pedro I culminou em sua rápida saída do governo durante os primeiros
meses de 1831. Sendo assim, os deputados da Assembléia resolveram instituir
um governo provisório até que Dom Pedro II, herdeiro legítimo do trono,
completasse a sua maioridade. É nesse contexto de transição política que
começa o Período Regencial.
O Período Regencial que durou de 1831 a 1840 foi considerado um
período muito conturbado principalmente devido suas disputas políticas e
revoltas regionais. Com o término do Período Regencial e o golpe da
maioridade, deu-se início ao Segundo Reinado com a atuação de D. Pedro II
como imperador de 1840 a 1889.
Segundo Donato (1999), neste período o país padecia de uma grave
crise econômica. Foram gastos muito dinheiro com as guerras de
independência e com o reconhecimento da mesma pelo governo português. E
seus dois produtos de exportação que eram o açúcar e o algodão estavam com
os preços baixíssimos. Porém o café remediou tudo e proporcionou muito
dinheiro para os cofres do império e para os fazendeiros. Para se ter uma idéia
em 1860 o café representava 48.8 % das exportações nacionais.
Com o café surgiram novas cidades, estenderam-se as ferrovias, muitas
pessoas foram contratadas, milhares de trabalhadores livres foram trazidos da
Europa (imigrantes), o que fez surgir uma aristocracia, a era dos barões de
café, que era tão rica e poderosa quanto era a dos senhores de engenho. O
café alem de sustentar os cofres públicos e particulares estimulou a imigração
introduzindo o trabalho livre e propiciou avanços modernizantes .
O Segundo Reinado pode ser dividido em três fases: a primeira (18401850) seria a fase da consolidação quando, no plano econômico, foi instituída a
Tarifa Alves Branco (1844) que seria uma tentativa de romper com o livre
cambismo em troca de medidas protecionistas. Além disso, em 1850 foi
proibido o tráfico negreiro. A segunda fase (1850-1870), que seria o apogeu do
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império, deu-se o início da comercialização cafeeira que de 1830 a 1880 foi o
produto central da economia exportadora do país. Vale ressaltar que foi no
segundo reinado que ocorreu um surto econômico devido a extinção do trafico
negreiro que liberou as capitais para outros investimentos como, por exemplo,
a produção cafeeira. A terceira fase (1870-1889) foi a fase do declínio do
império devido às questões abolicionistas e à estagnação econômica, política e
social.
D Pedro II incentivou durante seu reinado importantes melhoramentos
tais como: construção das ferrovias, os bondes puxados a burros, água
encanada e a iluminação a gás. Com isso as cidades principais se alongaram.
Embora houvesse conforto e luxo em algumas casas, as ruas continuavam de
terra, estreitas, sujas, úmidas e malcheirosas. Dejetos eram lançados
diretamente nas ruas, rios e praias e não havia esgotos sanitários.
A higiene pública era um problema muito sério. Segundo Queirós (1978)
em meados do século XIX São Paulo e Rio de Janeiro eram cidades expostas
a todo tipo de contágio e viviam uma epidemia atrás da outra como a cólera,
febre amarela e varíola. Só no final do século XIX é que a higiene pública
mereceu cuidados que a técnica do tempo colocaria a disposição.
Em relação à cultura Queirós (1978) retrata que quando o século XIX
teve inicio pouca atenção era dada pelo Brasil aos assuntos culturais. Eram
raras as escolas na colônia, estando proibida rigorosamente a imprensa e a
publicação de livros alem disso dificilmente impressos estrangeiros entrariam
no país.
No entanto com a chegada da corte portuguesa esse quadro se alterou.
Foi criada a escola medica na Bahia, o Real Horto, o Museu Real (hoje Museu
Nacional), ocorreu ainda a criação da Academia Imperial de Belas - Artes e a
criação de uma biblioteca pública, atualmente chamada de Biblioteca Nacional.
Além disso, nesse período surge a Gazeta do Rio de Janeiro, que
publicava não somente noticias da Corte e atos do governo, mas também
livros, folhetos e periódicos. O jornalismo político, a oratória parlamentar e das
ruas, o teatro, a música, a pintura e a poesia constituem a expressão maior
dessa cultura do século XIX.
A partir da metade do século XIX a escravidão no Brasil passou a ser
contestada pela Inglaterra que estava interessada em ampliar seu mercado
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consumidor no Brasil e no mundo, com isso o Parlamento Inglês aprovou a Lei
Bill Aberdeen (1845), que proibia o tráfico de escravos, dando o poder aos
ingleses de abordarem e aprisionarem navios de países que faziam esta
prática.
Em 1850, o Brasil cedeu às pressões inglesas e aprovou a Lei Eusébio
de Queiróz que acabou com o tráfico negreiro. Em 1871 era aprovada a Lei do
Ventre Livre que dava liberdade aos filhos de escravos nascidos a partir
daquela data. E no ano de 1885 era promulgada a Lei dos Sexagenários que
garantia liberdade aos escravos com mais de 60 anos de idade.
Somente no final do século XIX é que a escravidão foi mundialmente
proibida. Aqui no Brasil, a abolição se deu em 13 de maio de 1888 com a
promulgação da Lei Áurea, feita pela Princesa Isabel. No entanto se a lei deu
a liberdade jurídica aos escravos, a realidade foi cruel com muitos deles. Eles
ficaram sem moradia, sem condições econômicas e sem nenhuma assistência
por parte do Estado. Sendo assim muitos negros não conseguiam empregos e
sofriam preconceito e discriminação racial. A grande maioria passou a viver em
habitações de péssimas condições e a sobreviver de trabalhos informais e
temporários.
Segundo Vianna (1994), nas ruas, na imprensa e na economia, três
graves questões ganhavam força para derrubar a monarquia, são elas: a
Questão Religiosa, opondo bispos ao próprio imperador, a Questão Militar,
quando foi retirado o apoio dos quartéis ao trono e a Questão Servil, alinhando
a vontade do povo contra os escravocratas. Segundo o autor, a república foi
uma conseqüência.
Com a Proclamação da Republica em 1889 o cotidiano do brasileiro
mudou muito. As províncias passaram a se chamar Estados, ganhando
autonomia; ministérios trocaram de nomes; os senadores não seriam mais
vitalícios; ocorreu a abolição do conselho de estado e dos títulos de nobreza; a
naturalização de estrangeiros residentes no pais; a separação da Igreja católica
do Estado o que possibilitou o culto a outras religiões; a instituição do
casamento civil e a abertura dos cemitérios para os mortos seguidores de
qualquer religião.
Segundo Vianna (1994), a República tinha o objetivo de ser totalmente
diferente da Monarquia. Para isso, acelerou fortemente o projeto de tornar as
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capitais brasileiras iguais em modernidade em relação às cidades européias e
norte americanas, foram queimados os papeis que tratavam da escravidão do
negro, a república apoiou os inventos e inventores que se propuseram colocar
o Brasil ao nível da Europa. Essas intenções marcaram a entrada do país no
Século XX.
1.2 – A Família Patriarcal Brasileira
No inicio do século XIX, a vida urbana, praticamente inexistia no Brasil,
que podia ser caracterizado como um enorme país rural, com um estilo de vida
profundamente marcado pela aristocracia portuguesa, pelo cotidiano das
grandes propriedades rurais e pelo sistema escravista. A cidade é um apêndice
da área rural, com pequena população fixa, alguns artesãos, e um grande
número de pessoas sem ocupações definidas.
Estes fatos impunham um modelo de família, a família patriarcal
brasileira, em que o poder cabia ao patriarca, ao redor do qual gravitavam
membros da família, escravos, agregados, ao estilo casa grande e senzala,
embora com diferenças entre as regiões brasileiras segundo os tamanhos das
propriedades, onde muitas vezes não imperava a grande propriedade e os
estilos mais aristocráticos de vida.
A Família Patriarcal Brasileira seguia a mesma tradição da época em
que os portugueses se instalaram no Brasil. Esta família não era formada
apenas pelo marido, mulher e filhos, pois esta era um verdadeiro clã, incluindo
a esposa, filhos, parentes, padrinhos, afilhados, amigos, dependentes e exescravos. Todos estes membros eram submetidos à autoridade indiscutível que
emanava da figura do patriarca que detinha toda a autoridade sobre tudo e
todos.
Este Patriarca era o grande senhor rural proprietário de terras onde se
plantavam as bases da economia brasileira da época como, por exemplo: café,
cacau, cana-de-açúcar e outras grandes lavouras. Era ele que desde os
tempos coloniais e imperiais presidia a organização familiar.
Assim, segundo Teruya (2000), o modelo de família patriarcal pode ser
descrito como um extenso grupo composto pelo núcleo conjugal e sua prole
legítima, ao qual se incorporavam parentes, afilhados, agregados, escravos,
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concubinas e bastardos; todos abrigados sob o mesmo domínio, na casagrande ou na senzala, sob a autoridade do patriarca, dono das riquezas, da
terra, dos escravos e do mando político.
Além disso, a família patriarcal se caracterizava pela sua baixa
mobilidade social e geográfica, alta taxa de fertilidade e manutenção dos laços
de parentesco com colaterais e ascendentes, tratando-se de um grupo
multifuncional.
Não havia comunidades sólidas, sindicatos, clubes ou outros órgãos que
congregassem pessoas de interesses similares. A família patriarcal ocupava
todos esses espaços, porém o que não fosse provido por ela representava um
corpo estranho e indesejável.
O próprio Estado, que enquanto ordem pública deveria estar acima das
questões familiares, esbarrava nestas quando necessitava intervir, ou seja, não
tinha autonomia. Alem disso, os governantes sabiam que essa família patriarcal
solidamente organizada na verdade era o sustentáculo do Estado, pois impedia
que a população tão escassa e quase nômade, se pulverizasse pelo país.
A família patriarcal era uma forma dominante de constituição social e
política e tinha no seu poder, o controle dos recursos da sociedade. Assim
como relata a Coleção Nosso Século Volume 1:
“A família patriarcal era, portanto, a espinha dorsal da
sociedade e desempenhava os papéis de procriação,
administração econômica e direção política. Na casagrande, coração e cérebro das poderosas fazendas,
nasciam os numerosos filhos e netos do patriarca,
traçavam-se os destinos da fazenda e educavam-se os
futuros dirigentes do país. Cada um com seu papel, todos
se moviam segundo intensa cooperação. A unidade da
família devia ser preservada a todo custo, e, por isso,
eram comuns os casamentos entre parentes. A fortuna do
clã e suas propriedades se mantinham assim indivisíveis
sob a chefia do patriarca” (Coleção Nosso Século vol. 1,
1985).
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A família patriarcal era o mundo do homem visto que as mulheres e
crianças não passavam de seres insignificantes e amedrontados, cuja maior
aspiração dependia da vontade do patriarca que repreendia ao resto da família
que não tinha o direito de opinar em situação alguma sobre o próprio futuro ou
expor sua opinião sobre seus gostos, desejos e anseios.
A religião católica exercia função importante na vida da família patriarcal.
A educação doméstica era de cunho católico, assim as crianças aprendiam
com as mães a ser piedosas, temendo a um Deus Todo – Poderoso: um Deus
que via tudo o que se fazia entre os homens e registrava em um enorme
caderno, para futuro castigo. As crianças aprendiam a rezar o Pai nosso, o
Credo, a Ave Maria, o Salve Rainha e o catecismo. A maior parte dos
engenhos tinha suas próprias capelas onde os mortos da família eram
enterrados ao invés de serem levados para o cemitério.
Assim, a disciplina doméstica tinha como base o temor de Deus. No
entanto se este falhava entrava em cena o chicote, a severidade era
exagerada. Rapazes de quinze anos eram castigados por ofensas que um pai
do século posterior consideraria leves. As moças nunca tomavam parte na
conversa dos mais velhos, a não ser quando convidadas. Os escravos eram
espancados quando fosse pego em maus feitos e punidos com o tronco.
Nesta época, as meninas amadureciam cedo, visto que aos quartoze ou
quinze anos a menina já se vestia como uma senhora e se casavam. O
casamento era arranjado pelo patriarca visto que o homem com o qual a moça
se casava raramente era de sua própria escolha.
Já os meninos aos quinze ou dezesseis anos terminavam o estudo no
colégio e já ia para a escola superior ou para cursar direito ou medicina. E
assim como nos casamentos das moças o patriarca que decidia qual seria o
futuro profissional de seu filho.
Devido às poucas opções de escolha, restava à mulher o casamento
onde a mesma representava a proteção na família e tinha a obrigação de
ensinar a decência e educar os filhos. Ao marido era de competência zelar pela
segurança e conforto material da família.
Os casamentos celebrados durante o século XIX em sua maioria eram
arranjados. A legalização da união para a formação de uma nova família
dependia do
consentimento paterno,
cuja
autoridade
era legítima e
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incontestável, ou seja, era o pai que tinha a competência de decidir e até
determinar o futuro dos filhos sem lhes consultar, sendo que em alguns casos
os noivos jamais haviam se visto, se comunicado ou se tocado.
Além disso, na família Patriarcal os casamentos eram realizados por
conveniência, entre parentes ou entre membros de grupos econômicos que
desejavam estabelecer alianças. Vale ressaltar que os filhos que se rebelavam
e não aceitavam a determinação e a decisão paterna eram sempre castigados,
deserdados e até expulsos de casa.
Tendo por base uma distribuição extremamente rígida e hierárquica de
papéis, a família patriarcal caracteriza-se também pelo controle da sexualidade
feminina e pela regulamentação da procriação, para fins de herança e
sucessão. No entanto, a sexualidade masculina se exercia livremente visto que
era considerado normal que os homens buscassem satisfação sexual e
emocional fora da órbita legal do matrimônio, mantendo concubinas, com as
quais tinham filhos ilegítimos.
Cotrim (2001) revela que os filhos mais velhos do patriarca desfrutavam
de imensos privilégios, especialmente em relação aos seus irmãos. E os
homens em geral dispunham de infinitas regalias, a começar pela dupla moral
vigente, que lhes permitia aventuras com criadas e ex-escravas, desde que
fosse guardada certa discrição, enquanto que às mulheres tudo era proibido,
desde que não se destinasse à procriação e a vida religiosa.
A mulher era subjugada à condição de total submissão, ao ponto de
juridicamente ser-lhe negada a capacidade absoluta. As mulheres eram
proibidas de se manifestar socialmente bem como de estudar e trabalhar sem o
consentimento do pai ou do marido
O patriarcado instaura a inferioridade da mulher no grupo social, sua
capacidade de participar ativamente nas funções do grupo é colocada em
dúvida pelo poder masculino, sendo essa relegada, então, ao espaço privado,
passando a ser incluída subjetivamente como propriedade do homem.
Dessa forma, as desigualdades de gênero vão sendo produzidas,
consolidadas pelas relações sociais, políticas, econômicas e estabelecidas
juridicamente, nos códigos de leis da sociedade da época. Portanto, era
possível inferiorizar, explorar e até mesmo matar a mulher amparados por lei,
sem que houvesse punição legal para o ato.
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O papel das mulheres, da mãe era o de procriar e obedecer. Com os
filhos essas mulheres mantinham poucos contatos, uma vez que os confiava
aos cuidados de amas-de-leite, preceptoras e governantas. Sobravam-lhe
então as amenidades, as parcas leituras e a supervisão dos trabalhos
domésticos.
“A Pátria é a família amplificada. E a família, divinamente
constituída, tem por elementos orgânicos a honra, a
disciplina, o sacrifício. É uma harmonia instintiva de
vontades, uma desajustada permuta de abnegações, um
tecido vivente de almas entrelaçadas. (...) Multiplicai a
família, e tereis a pátria” (Rui Barbosa).
Até meados do século XIX, a casa-grande era o modelo perfeito do
fechado mundo patriarcal. A reduzida elite das grandes cidades, ou seja, os
comerciantes, profissionais liberais e altos funcionários públicos transportavam
esse modelo para os austeros sobrados urbanos onde morava. Assim, a
mulher se restringida às quatro paredes de sua casa e deveria obedecer
pacificamente ao seu marido e se dedicar a educação dos filhos assim como
era na família patriarcal.
Corrêa (1982) relata que a família patriarcal é a imagem mais
representativa no Brasil, sendo um modelo fixo onde os integrantes apenas são
substituídos no decorrer das gerações. Segundo Samara (2002) na história
brasileira, esta família sempre foi vista como uma instituição que impôs normas
e valores morais desde o Brasil Colônia.
“Na família patriarcal, as praticas sociais como a
submissão da mulher e o casamento entre parentes eram
consideradas como formas de demonstrar a importância
da linhagem e de seu contexto histórico dentro da
sociedade da época” (José Filho, 1998, p.47).
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CAPÍTULO II
As Mudanças na Dinâmica Familiar Brasileira a partir
do Século XIX
Este capitulo retratou as mudanças na dinâmica familiar brasileira a
partir do século XIX, tendo em vista as grandes mudanças substanciais pelas
quais passou a sociedade brasileira nesta época. Tais mudanças fizeram com
que importantes transformações ocorressem nas estruturas das famílias
brasileiras principalmente nas famílias do século XX.
2.1 - Transformações nas Estruturas da Família Brasileira a partir do
Século XIX
Em meados do século XIX, a Europa sofre modificações com a
Revolução Industrial. Este acontecimento atinge o Brasil, que na época ainda
era um pais rural, transformando os serviços urbanos. Desta forma muitas
transformações ocorreram no Brasil. Foi um extenso período de evolução para
o país, que começa a se transformar lentamente numa nação moderna.
A partir da segunda metade do século XIX, a economia brasileira entra
num período de prosperidade e diversificação de atividades. O café torna-se a
base da economia do país e a indústria começa a se desenvolver.A
constituição de um mercado consumidor e a grande acumulação de capitais
gerados pelo café foram fatores decisivos para a instalação de indústrias no
país acentuando a urbanização, dando nova direção ao povoamento no país.
A sociedade e a economia brasileiras passaram, na segunda metade do
século XIX, por significativas transformações que alteraram o processo
histórico nacional. Neste período, ocorreu a extinção do tráfico negreiro, um
relativo desenvolvimento industrial, um extraordinário crescimento da produção
cafeeira e da imigração, a sistematização do trabalho assalariado, a abolição
da escravidão e, do ponto de vista político, a proclamação da República.
Diante disso, durante a segunda metade do século XIX, a sociedade
brasileira
passou
por mudanças fundamentais
nos
campos
políticos,
econômicos, sociais e culturais. Sendo assim, mudaram-se as formas de ver e
entender a nova realidade da época.
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A transformação da sociedade rural, na qual predominava a família
patriarcal, fechada em si mesma, para uma sociedade de bases industriais com
as suas implicações de mobilidade social, geográfica e cultural acarretou
transformações igualmente marcantes no modelo tradicional de família.
Com a Proclamação da República, a família patriarcal começa a mostrar
sinais de fraqueza, pois com o novo regime republicano foi formando-se
cidades, as novas profissões, a luz elétrica, os bondes, os imigrantes, as lojas
comerciais, as indústrias, o que ameaçava o poder do patriarca.
Com isso pouco a pouco o patriarca é obrigado a se relacionar com os
outrora indesejáveis elementos “de fora”. É forçado a ampliar seus negócios
nos centros urbanos, para preservar seu patrimônio. Além disso, o patriarca
abandona a casa-grande e se muda para os palacetes da Capital.
A partir da segunda metade do século XIX, com o início do processo de
industrialização, opera-se uma mudança na família e o modelo patriarcal,
vigente até então, passa a ser questionado. Começa a se desenvolver a família
conjugal moderna, na qual o casamento se dá por escolha dos parceiros, com
base no amor romântico, tendo como perspectiva a superação da dicotomia
entre amor e sexo e novas atribuições para os papéis do homem e da mulher
no casamento. Assim surge o modelo de família nuclear burguesa.
Cândido (1951) buscou marcar as transformações sofridas pela família
patriarcal colonial e rural quando transplantada para o século XX. Para o autor
a família patriarcal teria se transformado ao longo do século XIX, com filhos
menos dependentes do poder patriarcal (com a possibilidade de carreiras
autônomas ou políticas).
Segundo Candido (1951) a família se nucleariza para atender melhor as
demandas da sociedade moderna, e ao perder a sua função produtiva, o grupo
tende a se relacionar única e exclusivamente a partir dos laços de afeto mútuo.
Podemos perceber que a família sofre fortes influências políticas,
econômicas, sociais e culturais, ocasionando mudanças nos papéis e nas
relações em seu interior, bem como alterando sua estrutura no que diz respeito
à composição familiar.
Segundo Teruya (2000) as transformações nas estruturas da família
brasileira têm inicio a partir da chegada da Corte Portuguesa ao Rio de Janeiro.
Segundo a autora este fato faz com que comece a aparecer uma vida social na
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colônia, originando o estabelecimento de oportunidades de estudos e outras
formas de ascensão social.
Na história da formação da família brasileira dois modelos principais de
família são destacados são eles: a família patriarcal, modelo instaurado no
Brasil colônia e a família burguesa ou nuclear.
Quando se fala em estrutura familiar estamos nos referindo aos tipos de
agregados domésticos e à sua dimensão. Assim enquanto na sociedade
contemporânea encontramos uma grande diversidade de estruturas familiares,
até meados do século XX predominavam duas estruturas de família: a família
extensa e a família nuclear.
O chamado modelo patriarcal de família tem referência com o modelo
senhorial e os clãs parentais. É um tipo de estrutura de família extensa, ou
seja, é um conceito de família que abriga em seu seio todos os agregados
como foi abordado já foi abordado no capítulo I deste trabalho.
Na família patriarcal, o chefe da família,
o patriarca representava a
figura do poder e de autoridade. O patriarca era o responsável pelo controle
dos negócios, o sustento material da família, e pela manutenção da ordem
familiar. A mulher da família patriarcal apresentava como características a
afabilidade e a submissão possuindo atribuições voltadas para o ambiente
doméstico.
Este modelo familiar era encontrado principalmente nos latifúndios, que
na época colonial se baseavam em matrizes escravocrata e na monocultura.
Essas famílias desempenhavam funções econômicas e políticas e exerciam
poder sobre a igreja, instituições econômicas e poderes locais.
Já a família burguesa, também chamada de família nuclear que foi
introduzida no Brasil no começo do século XX com o início do processo de
modernização, urbanização e industrialização do país, é outro modelo que
influenciou fortemente a concepção de família existente na atualidade.
Este tipo de estrutura familiar difere da tradicional família patriarcal, pois é
composta apenas pelo núcleo principal representado pelo chefe da família
(pai), sua esposa e os seus descendentes legítimos. Neste modelo familiar, é
atribuído à mulher o papel de boa esposa e mãe. O amor à família é um dos
sentimentos ressaltados e cultivados e a mulher é considerada o sustentáculo
do lar e da família.
23
Na família burguesa a divisão de tarefas e os papéis a serem
desempenhados pelo homem e a mulher eram rigorosamente estipulados. Ao
marido, considerado a maior autoridade do lar, era destinada a função de
provedor econômico. Já, para a esposa, eram designado os cuidados com o
ambiente doméstico e a educação dos filhos, sendo esta submissa ao marido.
Poster (1979) coloca que a família burguesa mantinha um sólido vínculo
afetivo entre seus membros e que os papéis eram claramente definidos: o pai
sustentava a casa, supria as necessidades materiais (mundo externo), a mãe
cuidava da casa e da educação dos filhos e tentava suprir em todos os
sentidos as necessidades físicas e emocionais de seus componentes (mundo
interno), e os filhos eram obedientes e estudiosos
Deste modo, o desempenho, a dedicação ao marido e a administração do
lar eram as prioridades da mulher que possuía uma relação mais próxima de
seus filhos, e o pai permanecia uma figura distante. O lar era considerado um
local seguro, acolhedor e aconchegante, sendo valorizada a intimidade deste
ambiente.
Segundo Costa (1989), a permanência da mulher no interior da casa
devia-se, antes de qualquer coisa, à sua função econômica.
“Dependendo juridicamente, afetivamente, moralmente e
religiosamente
do marido,
prestava-se docilmente a
organizar a produção econômica da casa. Mão-de-obra
gratuita, a mulher permitiu por muito tempo a autosuficiência das residências. A dona de casa era enfermeira,
médica, sacerdote e professora, distribuindo medicamentos
em caso de doenças, ensinando aos filhos as primeiras
letras e cumprindo uma enorme quantidade de obrigações
religiosas” (Costa1989, p.93).
POSTER (1979) enfatiza que a família burguesa (nuclear) assumiu um
papel intenso do ponto de vista emocional e da privacidade, com o passar dos
tempos visto que o casamento começou a vir imbuído de romance e
sentimentos. A divisão de papéis sexuais nas relações da família contribuiu
para a perpetuação do modelo durante um bom tempo.
24
2.2 – A Família Brasileira do Século XX
A passagem do século XIX para o XX, no Brasil, foi caracterizada por
mudanças substanciais na sociedade, na política, na economia, enfim em todo
o país. O século XX foi cenário de grandes transformações na estrutura da
família brasileira.
O desenvolvimento capitalista e da própria sociedade industrial,
afetaram diretamente, o modelo de família, promovendo a contestação das
relações de dominação-subordinação entre homem e mulher, sobre o controle
da sexualidade feminina e, também, a própria forma do vínculo conjugal. Um
conjunto de bandeiras levantadas, especialmente, no século XX, contra o
machismo, a favor do feminismo, contra o poder fálico, a favor do divórcio e
outras atacaram diretamente o modelo de família patriarcal.
O século XX foi marcado pela urbanização da sociedade propiciando
inúmeras transformações que ocorreram na produção, na distribuição, na troca,
no consumo e nas relações sociais. A dinâmica social e espacial deste período
é caracterizada pelo "modo de vida urbano". Segundo Souza:
“A urbanização modificou o exercício do poder patriarcal,
tornando-o impessoal, abstraindo-o da figura do patriarca.
Pode-se sugerir a tese que o Estado moderno roubou
este poder na figura pessoal de quem o exercia. Nossa
investigação demonstra que a urbanização mudou a
relação entre os sexos, diminuindo os excessos do
patriarca, pois limitou seu poder. As modas, os romances,
os bailes e os teatros tornam-se mais importantes do que
a igreja. Neste contexto um novo mundo estava se
abrindo para as mulheres” (Souza, 2000, p. 239).
Com
a
revolução
industrial
e
com
a
revolução
feminista
o
posicionamento das mulheres mudou radicalmente em menos de meio século,
o que provocou uma reorganização da sociedade e levou aos homens a
necessidade de repensar seu papel.
25
Assim como as mulheres estrangeiras, que com a segunda guerra
mundial foram obrigadas a saírem de casa e trabalhar em fábricas, visto que
com os homens na guerra, as mulheres tiveram que tomar conta da produção
industrial de armamentos, munições, roupas e alimentos, as mulheres
brasileiras também começaram a entrar no mercado de trabalho, pois estas
sofreram os impactos da guerra também aqui no Brasil.
Samara (2002) pontua que a presença feminina no mercado de trabalho
no século XX, apesar de significativa, era predominantemente ao nível do
trabalho e mão-de-obra não qualificada. Somente a partir de 1930 é que as
mulheres passaram a ter presença significativa nos cursos superiores. Essas
mudanças, no entanto, foram realizadas, a princípio, por mulheres das classes
de elite e das classes médias urbanas.
Essa mudança radical afetou o comportamento da mulher na família. A
partir de meados do século XX a vida econômica passou a ser cada vez mais
compartilhada entre o casal e o homem perdeu o domínio absoluto sobre a
chefia da família, além disso, perdeu todo o autoritarismo decorrente disso.
Os conflitos e as transformações que acontecem na família, ocorridos
pelo processo de modernização são explicados por Vaitsman:
“O desenvolvimento da sociedade capitalista, mais tarde
sociedade industrial moderna levou a uma redefinição não
só da relação entre as classes, mas também das relações
de gênero. A família privatizou - se e transformou- se em
família conjugal moderna, perdendo assim suas funções
produtivas segundo a concepção econômica que passou
a representar como produtivas – apenas as relações
exercidas
na
esfera
do
trabalho
remunerado"
(Vaitsman1994).
Teruya (2000) afirma que a união do processo de urbanização e da
industrialização da sociedade no século XX, juntamente com o fenômeno da
migração, possibilitou o enfraquecimento das relações de parentesco, a
redução do tamanho da família e a redução do poder do pai e do marido.
26
As transformações da família no século XX foram profundas, entre as
quais podemos citar a gradual eliminação de seu papel como unidade produtiva
por modificações na estrutura produtiva; o individualismo e a autonomia
crescente dos jovens e mulheres debilitam o poder patriarcal, além da
separação entre sexualidade e procriação. Tudo isso leva a diluir as funções da
família como unidade social, permanecendo apenas uma série de vínculos
familiares, vínculos entre pais, pais e filhos, entre irmãos e vínculos com
parentes mais distantes.
De acordo com toda essa mudança de estrutura familiar, juntamente
com a entrada da mulher no mercado de trabalho, o homem passou a participar
mais da educação e dos cuidados com o filho. Esse fator então propiciou uma
melhoria tanto para os filhos como para a mulher que passou a obter maior
apoio do homem na participação na vida dos filhos. Isso evidencia a superação
do homem que passou do papel de provedor familiar, para um papel de maior
engajamento na educação dos filhos, favorecendo então, a qualidade do
envolvimento com sua prole.
Desta forma as mudanças ocorridas durante o final do Século XIX e ao
longo da primeira metade do Século XX, tiveram implicações diretas nas
famílias brasileiras da segunda metade do Século XX, principalmente na saída
da mulher para o mercado de trabalho, na educação dos filhos, na
impessoalidade nas relações sociais, no controle da natalidade e no
enfraquecimento dos laços de parentesco.
Em todo o mundo, o conceito de família nuclear e a instituição
casamento intimamente ligada a família passaram por grandes transformações,
e no Brasil não foi diferente. A expressão mais marcante dessas
transformações ocorreu no final da década de 60, onde cresceu o número de
separações e divórcios. Além disso, a religião foi perdendo sua força, não mais
conseguindo segurar casamentos com relações insatisfatórias. A igualdade
passou a ser um pressuposto nas relações matrimoniais.
A Constituição de 1988 representa a ruptura dos modelos de Estado e
de sociedade até então vigentes no país e que marcará historicamente de
maneira relevante a vida brasileira. Houve um deslocamento do foco, que antes
era sempre voltado para a organização do Estado, e agora com a constituição
é voltada para o indivíduo e para a coletividade.
27
Dentre as muitas transformações que ocorreram, a Constituição passa a
reconhecer a família como a base da sociedade e, com isso, assegura-lhe
especial proteção quando faz expressa referência ao casamento, à união
estável e às famílias formadas por um só dos pais e seus filhos.
Até então, o Direito de Família era tratado pelo Código Civil do início do
século XX (1916) e tão somente disciplinava as relações dos núcleos familiares
formados pelo casamento, onde o homem exercia sua supremacia sobre a
mulher, mera coadjuvante restrita as atividades domésticas. De acordo com
Alves:
“O Código Civil de 1916 espelhava uma sociedade ainda
patriarcal, na qual a figura do marido era central, tinha a
incumbência de sustentar economicamente a família,
enquanto à esposa cabia a função de cuidar dos filhos e
da casa. Ao homem se aplicavam os mais amplos direitos
de representar a família, administrar os bens de comuns e
particulares da esposa, fixar domicílio da família e exercer
o poder pátrio sobre os filhos, enquanto a mulher
desempenhava papel secundário” (Alves, 2006).
A constituição de 1988 alterou o modelo familiar, fundado única e
exclusivamente no casamento, que tinha como finalidade a preservação do
patrimônio mesmo que, conforme Farias (2006) a custa “da felicidade pessoal
dos membros da família - a proteção da estrutura familiar se confundia com a
tutela do próprio patrimônio”.
A visão do Direito de Família, sustentada pelos artigos 226 a 230 da
Constituição Federal de 1988, bem como pelos princípios deles decorrentes: da
pluralidade de núcleos familiares; da igualdade entre homem e mulher,
conferindo direitos e obrigações para ambos; da igualdade entre filhos; da
facilitação da dissolução do casamento; da paternidade responsável e
planejamento familiar – todos derivados do princípio máximo da Dignidade da
Pessoa Humana – modificou a concepção que reconhecia a família somente
centrada no casamento para ser compreendido segundo Farias (2006) como
28
uma verdadeira teia de solidariedade, afeto e ética, valores estes que antes
eram desconhecidos da ciência do Direito.
A família como formação social, na visão de Perlingiere (2002) é
garantida pela Constituição não por ser portadora de um direito superior ou
superindividual, mas por ser o local ou instituição onde se forma a pessoa
humana. Além disso, a família brasileira sofreu grandes modificações
sociológicas, culturais e econômicas após a Constituição de 1988.
De acordo com Mattos (2000) cinco grandes fatores macrossociais
contribuíram para a transformação da família. O primeiro refere-se ás
transformações no próprio sistema capitalista e a expansão do mercado que
acaba inserindo a todos na dinâmica do trabalho e principalmente incorporando
as mulheres ao trabalho remunerado. O segundo fator é a luta pelos direitos
civis e pelas minorias, que traduzem, em síntese, o direito à vida, igualdade,
liberdade, segurança acima e independentemente da cor, sexo e religião. O
terceiro advém do crescente e contínuo movimento de individualização das
mulheres, que se traduz no maior acesso ao mercado de trabalho e à
escolarização. O quarto é a conseqüência do feminismo associada ao controle
tecnológico da reprodução humana, separando reprodução do exercício da
sexualidade. O quinto é uma maior visibilidade das alternativas identitárias de
gênero, especialmente homossexuais, bissexuais ou transexuais.
Esses dados demonstram que o paradigma da família sustentado na
estrutura patrimonial e biológica está desaparecendo. A família está se
adaptando às novas circunstâncias, assumindo um papel mais concentrado na
qualidade das relações entre as pessoas.
Atualmente a família constitui-se por múltiplos arranjos, sem a rejeição
social e legal do passado; é menor, menos hierarquizada, contempla mais a
dignidade profissional da mulher. A redução da taxa de fecundidade é
justificada pelo interesse das famílias em dedicar maior atenção aos filhos e
por fatores econômicos.
Assim, a tradicional família nuclear que engloba pai, mãe e filhos, já não
é mais a regra, pois se observa na sociedade contemporânea uma mudança na
estrutura do modelo familiar. Outros padrões de casamento e de família vão se
estruturando e passam a ser legitimados, fazendo com que as relações entre
seus integrantes se tornem cada vez mais complexas.
29
CAPÍTULO III
A Família Brasileira do Século XXI
Este capítulo aborda sobre o que vem a ser a família brasileira do século
XXI e como está família contemporânea se configura com seus diversos novos
arranjos familiares bem como suas funções na atualidade principalmente as
funções de cuidado e de socialização.
3.1 – A Família Contemporânea
No início do século XXI, percebem-se importantes metamorfoses nas
famílias: a diminuição do número de filhos, a redução de número de
matrimônios realizados legalmente (casamento civil), o aumento de separações
e divórcios e o aumento de famílias chefiadas por mulheres. A divisão sexual
dos papéis, ou seja, as funções socialmente destinadas aos homens e
mulheres nas famílias são questionadas, não havendo mais a rígida separação
dos papéis, demonstrando uma estrutura mais aberta e flexível.
Esses dados demonstram que a família brasileira está moldando uma
nova cultura e um novo modo de viver, que não se adéquam mais ao modelo
patriarcal e burguês (modelo de família nuclear), pois em seu tecido familiar
estão imbricados as suas próprias particularidades, peculiaridades e valores.
Na contemporaneidade, a família já não possui um “modelo” a ser
seguido, pois cada uma possui suas particularidades e diferentes formas de
enfrentamento das conseqüências da vida e da classe social onde está
inserida. Vale ressaltar que outro aspecto relacionado à família atual é que esta
não é estática.
De acordo com Osório (1996) a família nasce, cresce, amadurece
habitualmente se reproduz em novas famílias, encerrando seu ciclo vital com a
morte dos membros que a originaram e a dispersão de seus descendentes
para constituir novos núcleos familiares. Desse modo a família é influenciada
pelas situações internas que lhe sucedem como: nascimento, casamento,
morte de seus membros e por fatores externos: sociais, econômicos, culturais,
entre outros.
30
Surge então a família contemporânea que é construída através de uma
somatória de experiências e trajetórias particulares, manifestando-se através
de arranjos familiares diferenciados e peculiares, denotando a impossibilidade
de identificá-la como um padrão familiar uniforme e ideal.
Muitos foram os fatores que contribuíram para a mutação da família na
contemporaneidade. São eles: a legalização do divórcio no Brasil no final da
década de 70, o advento da pílula anticoncepcional, a revolução sexual
feminina, a entrada cada vez maior da mulher no mercado de trabalho e os
avanços da medicina e da tecnologia. Danda Prado, em 1981, já apontava
quatro formas de famílias cujas principais características as diferenciavam das
formas tradicionais:
a) A família criada em torno a um casamento dito “de
participação” – trata-se ai de ultrapassar os papeis
sexuais tradicionais. b) O casamento dito “experimental” –
que consiste na coabitação durante algum tempo, só se
legalizando a situação com o nascimento do primeiro filho.
c) Outra forma de família seria aquela baseada na “união
livre”. d) A família homossexual, quando duas pessoas do
mesmo sexo se juntam, com crianças adotivas ou vindas
de uniões anteriores, ou, no caso de duas mulheres, com
filhos por inseminação artificial”.
(Prado, 1981, p.19-22).
A nova família, que anteriormente era definida pela obrigação e hoje é
definida pelo afeto, cada vez mais aparece no cenário nacional, num debate
em torno do presente e do futuro da instituição família e do valor da família
diante
da
generalização
do
individualismo.
Desta
forma,
a
família
contemporânea não é mais entendida apenas como decorrente de laços
consangüíneos ou de matrimônio, mas se vale principalmente das relações de
afetividade entre os entes que a compõem.
Segundo Dias (2009), as pessoas se unem umas às outras pela
afinidade, pelos projetos de vida e propósitos em comum. Assim, na constante
31
busca de realização pessoal e de felicidade, as famílias mais rapidamente se
formam, e na mesma proporção se desestruturam já formando outras.
As transformações ocorridas dentro e fora das famílias nas últimas
décadas, segundo Fukui (1998), passam, principalmente, pela mudança de
valores, pois o valor da família não prevalece mais sobre o dos sentimentos
individuais das pessoas. Por muito tempo os valores associados à família
estiveram
sempre
apoiados
num
princípio
que
atrelava
sexualidade,
reprodução e casamento, resultando num modelo de família conjugal, com
casamento indissolúvel e monogâmico.
Fukui também aponta que modificações essenciais ocorreram no plano
das práticas, que, por sua vez, repercutiram no plano dos valores e
paulatinamente foram mudando as representações de família na sociedade
brasileira. A esse respeito o autor assinala três grandes transformações:
“Primeiro, ocorreu a separação da sexualidade e da
reprodução: o numero de filhos começa a ser previsto ou
planejado. Segundo, a reprodução dissociou-se do
casamento: não há mais filhos ilegítimos. E, finalmente, a
sexualidade dissociou-se do casamento: reconheceu-se o
direito as uniões consensuais. Estas transformações
marcaram de tal forma a sociedade brasileira, que a lei
brasileira teve que adaptar e assimilar uma série de
mudanças” ( Fukui, 1998, p. 18-19).
A compreensão de Singly (2000) sobre a família contemporânea é de
que ela é, ao mesmo tempo e paradoxalmente, relacional e individualista. De
acordo com a autora, é na tensão entre esses dois pólos que se constroem e
se desfazem os laços familiares contemporâneos, onde cada um busca a
fórmula mágica que lhe permita ser livre junto; onde o ideal é a alternância
entre um eu sozinho e um eu com. Essa família caracteriza-se como um grupo
regulado pelo amor, no qual os adultos estão a serviço do grupo e
principalmente das crianças.
32
De acordo com a autora, os modelos familiares contemporâneos
seguem a mesma perspectiva, na medida em que a lógica do amor vem se
impondo cada vez mais visto que os cônjuges só ficam juntos sob a condição
de se amarem e que também os pais estão mais propensos a dar ainda mais
atenção às crianças.
Atualmente as famílias se diferem pela ênfase que dão ao processo de
individualização. Desta forma o elemento central não é mais o grupo reunido,
mas os membros que compõem esta família. A família se transforma em um
espaço privado a serviço dos indivíduos. Esta é a razão pela qual a família é
designada por Singly (2000) como “relacional e individualista”.
Prado (1996) afirma que vivemos em uma época narcísica em que
predomina a individualidade; em um era na qual o casamento, no lugar de
compromissos, deveres, obrigações e saber ceder, pode vir a se tornar uma
maneira de auto realização, auto satisfação, um meio para se ter apenas
vantagens próprias.
Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD /2007),
três grandes revoluções sociais contribuíram para as transformações
composição das famílias contemporâneas: a) revolução da contracepção, que
é a dissociação entre sexualidade e reprodução humana; b) revolução sexual,
ou seja, a separação de sexualidade e casamento e; c) revolução da posição
social, que são as mudanças tradicionais de gênero. Assim as relações
familiares foram assumindo cada vez mais formas mais flexíveis e heterogenias
possibilitando que os fundamentos de legitimação das famílias fossem então se
redefinindo. É a partir desses fatos que vão emergir os novos arranjos
familiares.
Para Moreira (2002), lidar com a família hoje é lidar com a diversidade,
que pode ser classificada em várias tipologias, como por exemplo: famílias
intactas (que ainda não sofreram processo de separação); famílias em
processo de separação; famílias monoparentais; famílias reconstruídas; casais
sem filhos por opção; famílias por uniões consensuais; famílias unipessoais;
famílias constituídas por casais homossexuais; famílias constituídas com filhos
adotivos; famílias constituídas por meio de novas técnicas de reprodução,
famílias por associação, ou seja, os chamados novos arranjos familiares
existentes na atualidade.
33
3.2 – Novos Arranjos Familiares
Segundo diversos estudos sobre a família atual os novos arranjos
familiares são manifestações dos modos de pensar, sentir e de se relacionar da
família com a contemporaneidade. Dentre os vários arranjos familiares,
podemos citar:
1) família nuclear (mãe, pai e filhos biológicos);
2) famílias extensas (incluindo três ou quatro gerações);
3) famílias reconstituídas, que são aquelas em que, após a separação
conjugal, o indivíduo constitui uma nova família;
4) famílias monoparentais que são famílias decorrentes de divórcios ou
separações onde somente um dos pais assume o cuidado dos filhos.
Além disso, este arranjo familiar também ocorre quando um dos pais é
viúvo
ou
solteiro.
Existem
famílias
monoparental
feminina
e
monoparental masculina;
5) famílias adotivas, que podem ser bi-raciais ou multiculturais;
6) famílias constituídas através de uniões consensuais, ou seja, o casal
prefere morar junto sem formalizar sua união;
7) famílias unipessoais, que são os casais que vivem em casas separadas;
8) família compostas por casal sem filhos por opção;
9) famílias formadas por uniões homossexuais;
10) famílias por associação que é composta por amigos que formam uma
rede de “parentesco” baseada na amizade.
Sendo assim, surgem inúmeras organizações familiares alternativas:
casamentos sucessivos com parceiros distintos e filhos de diferentes uniões;
casais homossexuais adotando filhos legalmente; casais com filhos ou
parceiros isolados ou mesmo cada um vivendo com uma das famílias de
origem; as chamadas “produções independentes” tornam-se mais freqüentes; e
mais ultimamente, duplas de mães solteiras ou já separadas compartilham a
criação de seus filhos. Além disso, na família de hoje, é possível a mesma
criança ter três mães. A primeira mãe, dona do óvulo, a segunda, que hospeda
o embrião e o feto por nove meses, e a terceira, a mãe social, casada com o
homem que doou seu espermatozóide para a fecundação do óvulo.
34
Podemos elencar alguns fatores que contribuíram para a formação dos
novos arranjos familiares, são eles: novos direitos conquistados pelas mulheres
que possibilitou a presença feminina mais forte na sociedade e na família; a
separação do “feminino” do “materno” e do “sexo” do “biológico”; o aumento do
consumo de contraceptivos possibilitando à mulher a escolha ou não pela
maternidade; o afastamento da mulher como figura de “mãe amorosa” e “rainha
do lar”, para um modelo de mulher sócio economicamente mais ativo; os
homens começam a perder a postura machista de autoridade tanto em casa
como no sexo; a maior incidência de mulheres pedindo divorcio e retomando
suas vidas mesmo com filhos pequenos; mulheres com a opção de terem filhos
mais tardiamente ou então de não tê-los.
O senso do IBGE de 2002 indica que a maioria das famílias não é mais
constituída por um pai, mãe e filhos (modelo nuclear). A pesquisa indica que
51% destas famílias são formadas por mães solteiras ou divorciadas, pais que
criam seus filhos, casais com filhos advindos de outros relacionamentos e
famílias cujo casal é do mesmo sexo.
Ao olharmos o retrato das famílias atuais, segundo Pereira (2003)
poderemos nos deparar com algumas situações que deixariam nossos avôs
admirados: aquele que parece ser o pai é o padrasto; a moça com uma criança
no colo não é a mãe, mas uma meia-irmã; os três jovens que dividem o mesmo
teto são um casal e uma amiga; e aquela que parecia ser a mãe pode ser na
verdade a namorada dela, etc.
Pereira (2003) acrescenta ainda que os domicílios são formados por gente
morando sozinha, avós ou tios criando netos, casais sem filhos, “produções
independentes” e outras tantas alternativas, como, por exemplo, os grupos de
amigos que decidem morar junto para dividir um apartamento grande.
A família contemporânea se configura com diversos novos arranjos
familiares, visando a importância das funções familiares de cuidado e
socialização, desmistificando e desnaturalizando o conceito de família como
uma estrutura ideal e, ainda, questionando a antiga concepção de
“desestruturação familiar”. Alem disso coloca em evidência que a família não é
estática e que suas funções de proteção e socialização podem ser exercidas
nos mais diversos arranjos familiares e contextos existentes.
35
3.3 – As Funções da Família na Contemporaneidade
A função da família mudou muito ao longo dos tempos em razão do
contexto social da sociedade. Nossa sociedade transformou-se drasticamente
de nação agrícola para industrializada, e na contemporaneidade está em plena
evolução para uma cultura de alta velocidade, eletrônica e computadorizada.
Normalmente
as
funções
atribuídas
a
família
na
sociedade
contemporânea são as seguintes: reprodutiva, emocional e psicológica,
reprodução das relações sociais e econômicas.
Em relação à função reprodutiva, a família continua tendo ação
fundamental visto que tem a seu cargo a reprodução biológica, isto é a
renovação do elemento essencial da força de trabalho que é o próprio homem.
No entanto nas sociedades antigas ter muito filhos não era um encargo e sim
uma forma de ter força de trabalho e uma segurança na velhice dos pais.
Entretanto a função reprodutiva não é mais tida como primordial na
formação de uma família visto que hoje em dia existem várias formas de se
construir uma família, por exemplo, a adoção e a inseminação artificial. Vale
ressaltar que diante de tantas opções a legislação brasileira passou a
reconhecer a paternidade sócio - afetiva, dando importância jurídica ao afeto.
A função emocional e psicológica é primordial para a formação do
caráter e da saúde mental de um individuo. Essa função mantém vivo os laços
afetivos que são indispensáveis dentro de uma família. Para se criar uma
criança ou um adolescente visto que estão em fase de desenvolvimento é
fundamental que estes sejam envolvidos em laços de amor, carinho e atenção
de modo que proporcione a estes indivíduos alegrias e bem estar. Além disso,
a função emocional e psicológica é responsável por elencar o desenvolvimento
das potencialidades humanas.
A função de reprodução das relações sociais ou socialização tem por
objetivo transmitir às crianças as idéias, os valores e os conceitos
fundamentais da sociedade perpetuando assim as idéias e padrões dominantes
e hegemônicos. Vale ressaltar que apesar de outras instituições como as
escolas, meios de comunicação social dentre outros também exercer essa
função, na família esse papel continua a ser fundamental.
36
A função econômica foi a que mais sofreu transformações visto que até
no século XIX a função econômica era baseada na produção agrícola ou
artesanal. No entanto com o processo de industrialização a organização
tradicional do trabalho foi alterada, assim o trabalho foi gradativamente se
deslocando para o exterior da família.
A função econômica é responsável por manter financeiramente a família
e o Estado. Para o Estado a função econômica na família é relevante pelo fato
da família ser considerada a única instituição capaz de dar o maximo de
retorno, valor, rendimento e aproveitamento a ela destinados.
A família tem, teoricamente, segundo Soifer (1982) como função básica
a proteção (defesa da vida) de seus filhos e persegue este objetivo através do
processo de educação, dando primazia ao ensino das ações tendentes a
preservar a vida que abrange noções relacionadas com: o cuidado físico
(respiração, alimentação, sono, vestuário, locomoção, linguagem, higiene,
perigos, etc.); desenvolvimento da capacidade de relacionamento familiar e
social (elaboração da inveja, ciúme e narcisismo; desenvolvimento do amor,
respeito, solidariedade, etc.); e o ensinamento das atividades produtivas e
recreativas (jogar, brincar; tarefas domésticas, estudos e tarefas escolares
entre outras).
Enfim, para Soifer (1982) a família representa o lugar onde são
experimentados os primeiros sentimentos da vida do ser humano, no qual se
inicia a socialização, e é neste contexto que se encontra a base de muitas das
atitudes diante da sociedade.
Já Osório (1996) considera que as principais funções da família são:
biológica, psicológicas e sociais, sendo intrinsecamente relacionadas, às vezes
se confundindo entre si.
Segundo este autor a função biológica seria o dever de assegurar a
sobrevivência
da
espécie,
oferecendo
os
cuidados
básicos
para
o
desenvolvimento dos indivíduos e não compreenderia a função reprodutiva.
As funções psicológicas seriam o afeto, o suporte familiar para a
superação de crises individuais que ocorrem no ciclo de vida, a transmissão de
experiências de vida para os descendentes, a atuação facilitadora da
aprendizagem e também a intermediação de informações com o universo
extra-familiar.
37
Como funções sociais, Osório destaca a transmissão de valores culturais
e a preparação para o exercício da cidadania como cita abaixo:
“Á família cabe permitir o crescimento individual e facilitar
os processos de individuação e diferenciação em seu
seio, ensejando com isso a adequação de seus membros
às exigências da realidade vivencial e o preenchimento
das condições mínimas requeridas para um satisfatório
convívio social” (Osório, 1996, p. 22).
Sendo assim, podemos conceber que a família possui um papel
fundamental na formação físico, moral, emocional e espiritual do ser humano. A
família é o lugar no qual há o encontro das gerações e dos gêneros, onde se
aprende a arte da convivência e a prática da tolerância, e entre suas funções
pode-se relacionar a promoção e a transmissão de valores, a construção da
identidade do indivíduo e o apoio emocional e afetivo aos seus membros.
Wagner (2001) compreende que independente da sua estrutura e
configuração a família é o palco em que se vive as emoções mais intensas e
marcantes da experiência humana. É o lugar onde é possível a convivência do
amor e do ódio, da alegria e da tristeza, do desespero e da desesperança. A
busca do equilíbrio entre tais emoções, somada às diversas transformações na
configuração desse grupo social, tem caracterizado uma tarefa ainda mais
complexa a ser realizada pelas novas famílias.
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CONCLUSÃO
Podemos concluir que o conceito de família atual supera os parâmetros
da consangüinidade e do parentesco e apresenta um sentido mais amplo,
fundamentado na convivência e nas relações mútuas de cuidado e proteção
entre indivíduos que constroem laços afetivos entre si. A família, seja ela
estruturada pelo casal heterossexual ou homossexual, matriarcal, patriarcal,
nuclear, constituída por meios irmãos, ou em diversos outros arranjos
familiares, continua a permanecer firme no ideal do ser humano.
O importante é compreender que a família é uma organização dinâmica
e mutável ao longo dos tempos e que acaba ocupando o lugar que os padrões
culturais de uma determinada sociedade lhes indicam. Além disso, as
transformações das relações afetivas evoluíram na sua própria interação social,
valorizando desta forma os papéis desempenhados com características que
são especificas, a uma fusão que torna a família complexa em seu modo de
compreensão como um desafio interminável.
O conceito de família tornou-se amplo, independente do desejo
tradicionalista,
religioso,
do
conservadorismo,
dos
preconceitos,
de
estereótipos e de desejos individuais. O profissional que está direta ou
indiretamente ligado a essa área de atuação com famílias, terá o desafio e a
responsabilidade de se despir cada vez mais de todos esses rótulos, para
desenvolver um trabalho satisfatório.
Sendo assim, é de suma importância entender as mudanças e os novos
arranjos familiares da família brasileira na atualidade, pois compreender este
processo nos possibilitará exercer uma atuação profissional de melhor
qualidade com essas famílias.
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