A cultura e as representações construídas pelas professoras sobre a violência na escola
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Margarete de Castro Nascimento Patusco Agosto / 2008
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Resumo: este artigo é a adaptação de um capítulo da dissertação desenvolvida no Mestrado em
Educação da UNINCOR - Universidade Vale do Rio Verde. A pesquisa realizada com as professoras
da Escola Estadual Padre Paulo em Santo Antônio do Monte (MG) objetivou investigar,
compreender e analisar as representações sociais das professoras sobre a violência na escola. Para
tanto, foi imprescindível compreender o contexto cultural no qual as professoras estavam
construindo suas imagens e pensamentos a cerca do que se constitui como violência e o significado
da mesma em suas vidas profissionais e pessoais.
Palavras-Chaves: Contexto cultural, representações, violência social, violência escolar.
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Abstract: this article is the adaptation of a chapter from the thesis developed in the UNINCOR
Education Masters – University Vale do Rio Verde the research performed with the teachers of the
State School Padre Paulo in Santo Antônio do Monte, aimed to investigate, understand and analyze
the teachers social representations upon violence in the schools. For this, it was indispensable
comprehend the cultural context in which the teachers were building up their images and thoughts
toward what their professional and personal lives.
Key-words: Cultural context, representations, social violence, school violence.
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A violência que ocorre nas escolas não se desvincula da violência urbana. Quando se
pensa no micro espaço escolar, há que se considerar o macro regional que circunda a escola, com
todas as suas características como também, a comunidade municipal.
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O município de Santo Antônio do Monte, o contexto cultural
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O município de Santo Antônio do Monte localiza-se na região centro-oeste de Minas
Gerais, com população estimada pelo IBGE-Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, em
primeiro de julho de 2004, em 26.292 habitantes. No Brasil, existem 147 municípios com
população em torno de 25.000 a 27.000, número expressivo para a realidade em nosso país.
A economia destaque da cidade está voltada para as indústrias de fogos de artifício.
Existem três escolas estaduais e cinco municipais na zona urbana. A escolha da Escola
Estadual Padre Paulo, como campo de pesquisa, se deu principalmente porque a instituição se
configura como escola de grande porte quanto ao número de funcionários (80) e alunos (1202) para
este município. Com relação aos grandes centros urbanos, a escola se equipara ao nível médio. Ao compreender o espaço social comunitário, foi necessário conhecer as instituições
mencionadas pelas professoras da pesquisa nas interlocuções sobre a temática da violência escolar:
polícia militar, delegacia civil, conselho tutelar e jornais da cidade.
Violência social, seguranças e inseguranças
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De acordo com as informações da polícia militar, há uma defasagem de pessoal no
quadro de policiais militares no município de Santo Antônio do Monte, sendo o previsto de 25 e o
efetivo de 20. Essa diferença de pessoal constitui-se num enorme prejuízo para a atuação mais
eficaz, gerando assim mais furtos e roubos na região. Os policiais militares acreditam na
necessidade de maior policiamento e atuação na segurança pública, porém constatam as
dificuldades existentes, responsabilizando a falta de recursos financeiros e políticas públicas
adequadas ao setor em que o papel do Estado torna-se imprescindível para o atendimento dessa
demanda. Segundo dados fornecidos pela Delegacia Civil, do ano de 2003 para o de 2004, houve
um aumento de 10,4% nas ocorrências policiais no município de Santo Antônio do Monte. É
possível constatar uma diminuição nos três anos registrados, quanto às ameaças, às vias de fato e às
lesões corporais. Quanto aos homicídios, pude verificar o aumento de uma morte no ano de 2003
para 4 mortes no ano de 2005. Com relação aos suicídios, o aumento é elevado, tendo ocorrido um
no ano de 2003 e em 2005 até o presente momento (nov./2005), 8 suicídios. A questão que surge então é a seguinte: quais fatores têm contribuído para o aumento
verificado, no decorrer dos três últimos anos, em relação aos homicídios e suicídios no município de
Santo Antônio do Monte? De acordo com Alba Zaluar (2002), centrar as explicações no foco da
pobreza e da desigualdade reduz e impede um entendimento mais complexo da questão. “Estudos
recentes mostram que os pobres são as maiores vítimas de furtos, roubos e assassinatos, estes
últimos nos locais onde o tráfico de drogas domina e não há policiamento que proteja a
população” (Alba Zaluar, 2002, p. 20).
Em Santo Antônio do Monte, de acordo com as informações da delegacia civil, os roubos e furtos
ocorrem mais na periferia da cidade e atingem mais as residências em locais isolados. Este dado
confirma a afirmativa mostrada por Alba Zaluar em seus estudos quanto à população mais pobre ser
vítima em maior incidência nos roubos, furtos e assassinatos. Quanto aos homicídios sucedidos
nesse município, segundo as informações recebidas na delegacia civil, 50% estão ligados ao tráfico
de drogas.
Frente aos dados obtidos nessa cidade de população considerada pequena,
principalmente quando comparamos os trabalhos e estudos dos grandes centros urbanos, como as
capitais brasileiras, pude observar que em números menores, mas em percentual muito significativo,
há um aumento de violência verificado principalmente em relação aos homicídios e suicídios. A
violência, portanto, ocorre nas várias instâncias regionais, independentemente do tamanho da
população.
É preciso compreender e entender os efeitos que o sofrimento psíquico, moral produzem
na população envolvida como vítima da violência. O medo e o terror que a população vive, ao
constatar crimes violentos na cidade, chegam de que maneira nas salas de aulas? De acordo com a
professora Gláucia “Dá medo na gente, coloquei cadeado em tudo quanto é lado aqui em casa. A
hora que eu saio de manhã, eu custo achar as chaves, mas a gente fica assustada, com medo”.
O cidadão está assustado, a professora, ao deixar sua casa, sente-se insegura e os (as)
alunos (as) chegam à escola carregando seus temores ao constatar no município, ou no bairro onde
moram, manifestações de violência quer contra a pessoa quer contra o patrimônio. As professoras têm questionado o que é segurança. Essa é uma pergunta que precisa ser
feita para que discussões, debates aconteçam. Os (as) professores (as) precisam inserir suas falas
nesse debate que pertence a todos, já que as escolas vivenciam vários tipos de agressões.
A escola, enquanto instituição do conhecimento que se propõe formadora, se depara
muitas vezes com o inusitado que aparece e se apresenta como não formador, expresso nos ataques
verbais, corporais, nas invasões, insinuações e no silêncio da indiferença. Nesse aspecto, Alba
Zaluar (2001), em seu texto “Violência extra e intramuros”, afirma que uma das dimensões da
violência escolar, segundo os pressupostos de Pierre Bourdieu, é “a violência que se exerce também
pelo poder das palavras que negam, oprimem ou destroem psicologicamente o outro” (Alba Zaluar,
2001, p. 148). Não nega a violência física, ao contrário, mas irá destacar a força da brutalidade
exercida na linguagem. Força que pode se apresentar ostensivamente, de forma sutil ou mesmo
naturalizada.
A linguagem apresentada pelas professoras, é enfática quanto à indignação diante da
violência que se alastra no campo social. A professora Marlene aponta sua indignação ao afirmar
que as pessoas mais atingidas nessas situações de crimes, homicídios e suicídios na cidade são as de
classe social baixa e expressa sua tristeza, refletida no semblante, ao constatar a não resolução de
tais crimes ocorridos. Ela afirma:
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Dentro de nossa cidade, tem sido dentro da classe baixa e como diz, nada tem sido feito para
descobrir o que tá acontecendo, que crimes foram esses. E até mesmo a falta de penalidade para os
crimes de trânsito que acontecem aqui em Santo Antônio do Monte. Eu acho que o poder público tá
deixando muito à vontade.
A fragilidade e a insegurança vivenciada pelas professoras no espaço social vêm nos
mostrar a incerteza, a não confiabilidade nas instâncias de controles sociais vigentes. As queixas
dirigidas à polícia ou ao poder judiciário indicam a necessidade de alterações ao abordar e combater
as mais variadas formas de violências praticadas na atualidade. José Vicente Tavares dos Santos (2004, p. 09) argumenta que diante da violência
contemporânea e das formas atuais de controle social, ainda não foram colocadas em questão várias
dimensões do controle social institucional e cita como exemplo o funcionamento atual das prisões e
das polícias. Complementando “cabe salientar as dificuldades de acesso à justiça, à seletividade
social da justiça penal e à perda de legitimidade das instituições de controle social”.
Diante dessas inúmeras dificuldades, a saída proposta pelo autor é a busca por uma
governamentalidade em que as instituições socializadoras (família, escola, associações
comunitárias, meios de comunicação) e organizações de controle social formal (polícias, poder
judiciário, instituições prisionais) atuem na perspectiva do conceito de segurança cidadã e controle
social democrático, ou seja, todos os sujeitos do espaço social contribuem e são responsáveis pela
manutenção da vida.
As palavras de ordem seriam então cooperação e responsabilidade. Conjugar associações
e aproximações dos atores sociais e suas instituições. Abrir perspectivas de interação entre as
pessoas, para que a ajuda mútua ocorra, fortalecendo os laços de pertencimento ao espaço social. A
comunidade pode significar, assim, lugar de apropriação: o meu, o seu, o nosso. Esta proposição é
vista quando a professora Antônia citou que
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Quando criança nós tínhamos mais contatos, sabe, porque tinha mais tempo também. Mas é
uma vizinhança muito boa, pelo menos os que eu conheço desde criança. Igual as pessoas do prédio
aqui da frente, sempre tem mudado as pessoas, então a gente não tem muito contato pela falta de
oportunidades de ficar conhecendo mais. Mas ao lado daqui de casa é meu avô, acima é meu primo,
então é tudo já gente conhecida. Então assim é muito bom.
Esta professora mostrou a importância de se conhecer o outro nas relações, em que o
conhecimento é construído na interação da convivência - a participação que cada pessoa faz ou
pode fazer. Daí a importância do compromisso no laço social que vai se estabelecendo e traz,
conseqüentemente, formas associadas de agir frente aos problemas. Ao associar-se, é possível
reconhecer a conjugação de forças individuais operando enquanto coletivo, sendo que com relação à
segurança pública, esse aspecto interfere de modo pontual. José Vicente Tavares dos Santos (2004)
considera ser necessário fortalecer a cooperação nas comunidades e instituições na questão da
segurança. Paralelamente, Alba Zaluar (2002, p. 24) propõe a participação dos cidadãos e dos
policiais no enfrentamento das questões de segurança pública, afirmando que:
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A participação é importante na medida em que não há segurança sem que as pessoas
compreendam os perigos e riscos que correm e façam elas mesmas, o que podem para controlá-los
ou evitá-los. A participação é igualmente importante, pois é o que permite passar da normatividade
burocrática e autoritária para uma normatização melhor aceita pelos que devem internalizar e
praticar suas regras. Estas regras são entendidas como as organizadoras da convivência e manutenção da vida
que fica exposta nos centros urbanos populosos e nas cidades do interior, como Santo Antônio do
Monte, marcada por inseguranças, seja no espaço macro ou no micro; exposição da vida humana
manifestada nas agressões pessoais, apontadas pelas professoras no cotidiano escolar e comunitário;
agressões explícitas e implícitas, atuadas no outro ou contra a própria pessoa, do verbal mortífero ao
extermínio fatal dos recorrentes suicídios.
Comentada, pensada e interrogada pelos atores escolares, as mais variadas formas de
violência vêm como um grande desafio a ser combatido. Os suicídios ocorridos nos espaços sociais
trouxeram tanto aos cidadãos de Santo Antônio do Monte, quanto às docentes da escola Padre
Paulo, inquietações, questionamentos e angústia diante dessa problemática violenta e repetida em
curto espaço de tempo. Compreender o suicídio e os sujeitos envolvidos nele tornou-se
imprescindível, principalmente, ao verificar que alunos (as) e familiares da comunidade escolar
estavam presentes nessa situação de extrema violência. Ao salientar a participação, a cooperação como elementos fundamentais no combate à
violência, reconhecemos a importância dada aos vínculos que as pessoas estabelecem socialmente.
Há que se pensar na questão do suicídio, que tipo de rupturas vinculares ocorre quando a pessoa
dirige, a si mesma, uma violência fatal? O que o campo social rompe com o sujeito suicida? O que
dizem as professoras ao enfrentarem esse tipo de violência em suas práticas educacionais? Suicídio, a violência social dirigida à própria pessoa
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Ao pesquisar as representações das professoras sobre violência na escola e escutar que
um dos problemas enfrentados pela escola no ano de 2005 foi o falecimento, por suicídio, de uma
mãe de dois alunos. Percebi a importância de entender melhor a situação vivida pelas professoras. É
necessário compreender quais repercussões, a violência extrema, dirigida a si mesmo, provoca ao
ser praticada bem próxima de suas realidades.
O que os (as) docentes comentam diante de tamanha agressão? Émile Durkheim (2000,
p. 506), em seu clássico O Suicídio, faz considerações bem atuais sobre os elementos sociais
contidos no auto-extermínio afirmando que
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[...] assim como o suicídio não decorre das dificuldades que o homem possa ter para viver, o
meio de deter seu avanço não é tornar a luta menos dura e a vida mais fácil. Se hoje as pessoas se
matam mais do que outrora, não é porque para nos manter devamos fazer esforços mais dolorosos
nem porque nossas necessidades legítimas sejam menos satisfeitas; é porque já não sabemos até
onde vão as necessidades legitimas e não percebemos mais o sentido de nossos esforços.
Ao tratar o suicídio como uma patologia social, Émile Durkheim (2000) contesta a
prática do individualismo e propaga a força do coletivo, principalmente, nas associações
corporativas dos grupos profissionais; sustenta que a religião, em seus dias atuais, não traz respostas
suficientes para essa questão e que a educação tem seus alcances desde que co-relacionada com a
sociedade na qual está inserida. “A educação, pois, só pode se reformar quando a própria sociedade
se reforma. Para isso, é preciso atingir em suas causas o mal de que ela sofre” (Émile Durkheim,
2000, p. 488).
Na obra deste autor, aparece a distinção de três tipos de suicídios: o egoísta, o altruísta e
o anômico. Ele enfoca a necessidade de se combater o suicídio egoísta e o anômico, considerandoos mórbidos além de necessária a regulamentação da vida social. No suicídio egoísta, o que ocorre é
a insuficiência da sociedade em abarcar seus membros sob seus cuidados. Nesse sentido, Émile
Durkheim afirma (2000, p. 488) [...] “é porque a sociedade, perturbada e enfraquecida, deixa
escapar demais à sua ação um número excessivo de indivíduos. Por conseguinte, a única maneira de
remediar o mal é devolver aos grupos sociais consistência suficiente para que ele próprio se apóie
neles”. O autor considera as transformações sucedidas na sociedade política, na família e nas
religiões e argumenta que a forma de vinculação estabelecida com as mesmas já não torna possível
barrar a falta de sentido e objetivo no existir do sujeito com seu mundo. Émile Durkheim considera que na anomia, na ausência da vigência de leis, verifica-se o
enfraquecimento das forças coletivas em atuarem como reguladoras da vida social. Os sujeitos
apoiados em suas atividades profissionais como grupo ou categoria, dado seus interesses comuns e
objetivos próximos, têm mais chances de estabelecer significados ao próprio viver. Dessa maneira,
pode-se compreender como é continente a instituição mediadora que regula os excessos cometidos
por seus indivíduos. Refletindo sobre o individualismo e a ausência protetora e eficaz das leis que se
constituem como organizadores das relações sociais, compreendo os depoimentos das professoras
sobre o teatro apresentado, na escola Padre Paulo, pelos alunos, cuja cena final é um suicídio como
uma expressão de que não se pode concordar com tal gesto. A professora Laís considerou que
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quando aconteceram suicídios no bairro São José, logo após os alunos fizeram um teatro
onde eles representaram tudo o que estavam vendo nos jornais da cidade sobre violência ou fora da
escola. Os professores até comentaram que precisava fazer outra peça para mudar o final.
Já a professora Regina apresenta as ambigüidades decorrentes entre os profissionais da
escola, frente à exposição violenta contida no suicídio encenado.
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Eles comentam bastante. E teve esses dias pra trás, não sei se alguém chegou a comentar,
uma peça de teatro lá na 7ª série, e no final a menina suicida por causa do namorado na peça de
teatro [...] Aí uma professora falou assim: Pode ser até uma forma de isso não acontecer. Eu falei:
Mas também pode ser uma forma de acontecer e muito agora, na peça demonstra o jeito como a
menina suicidou, a pessoa vai e faz a mesma coisa.
A violência manifesta na escola, em sua complexidade, seja dirigida ao outro ou a si
mesmo, causa mal estar e angústia às professoras, apresentando-se como difícil o manejo de tais
situações no cotidiano escolar. A professora Gláucia fala bem dessa realidade vivida:
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Igual teve uma aluna minha à noite que tentou suicídio uma vez naquela semana de julho
que a gente estava de recesso, aí a mãe ligou contando, falou que era pra pedir na sala que ninguém
tocasse no assunto. Cheguei na sala, conversei, falei: a colega x vai retornar a escola, ninguém toca
no assunto, por favor, que é uma coisa séria. Então ela mesma tocou no assunto, a gente viu que ela
queria falar, todo mundo ouviu, até estranhei nesse dia sabe, ninguém levou pra frente, nem fez
comentários [...] Mas sempre que acontece uma coisa assim, eu converso se quiser falar, se não
quiser passo pra frente.
A permissão para falar é tão necessária quanto o ato de ouvir. Deixar que as pessoas
envolvidas em qualquer tipo de agressão manifestem seus pensamentos, seus sentimentos abre
possibilidades de esclarecimentos e elaborações, até então, não compreendidas. É necessário
aguardar o tempo que cada pessoa precisa para dar a si mesma e aos outros, para expressar o que
viveu externa e internamente. A professora Gláucia estranha o comportamento da classe, mas
apresenta o problema como sério. Pode se afirmar que ela conduz com sinceridade e firmeza,
demonstrando atitude respeitosa ao que os alunos captam. Nesse sentido, verifiquei uma corporação
estudantil fortalecida e fortalecendo através dos laços de solidariedade, dando à colega fragilizada a
acolhida e a contenção necessária naquele momento.
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O depoimento da professora Cíntia demonstra a tensão causada no cotidiano da escola
quando o suicídio é ocorrido na comunidade escolar. O discurso dela mostra um pouco da reação
dos alunos, como também da crise que se instala na vida desse filho-estudante diante de violenta
perda. O sentimento de frustração da professora é nítido ao apontar a procura do pai e não conseguir
dele a freqüência do aluno nas atividades escolares. Segundo ela
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Para sociedade mesmo, parece que foi mais um. Não teve tanto peso, agora para a gente que
acompanha o aluno, foi uma catástrofe. O menino não vai à escola mais, vai quando ele quer,
porque o pai viaja. Então quando o pai tá aqui ele vai à escola, quando o pai tá viajando ele não vai
à escola. Então isso, para quem é a professora do aluno foi muito ruim, muito ruim mesmo, muito
triste. Os colegas às vezes fazem piadinha de suicídio, ele às vezes escuta. Eu acho que ele tá um
pouco revoltado com a coisa, ele não está agressivo, mas parece que ele não tá dando muita
importância para ele mesmo. E nós já fomos atrás, já conversamos, já chamamos o pai e não
resolveu.
Pode-se verificar no depoimento da professora que, independentemente do número de
mortes que acontece no espaço social, o custo emocional é muito alto para quem vivencia um
suicídio de perto, sejam pessoas da instituição familiar e ou da escolar. A violência do suicídio se
expande ameaçando familiares e não familiares, colocando, a quem lida com a situação, questões
muitas vezes não respondidas, mas que podem ser pensadas e faladas para que, de alguma forma, se
possa seguir caminhando pela vida. A professora Camila faz uma síntese do que acontece quando a
agressão volta-se para a própria pessoa:
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Eu acho que violência é todo ato que a pessoa tem que pode chegar a um ponto de ferir a
outra pessoa, mas mais sério ainda é aquilo que pode ferir a si mesmo. Porque muitas vezes, você
não tá violentando o outro, você tá violentando a si mesmo e violentar a si próprio custa muito, né?
Quando você violenta a si próprio, você não prejudica só você, você prejudica as pessoas que te
amam também.
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Entendemos que quando a violência retorna à própria pessoa provoca estranhamentos de
várias formas, conforme pode ser confirmado nos depoimentos anteriores. As professoras tentaram
transformar essa vivência estranha, familiarizando a acolhida aos alunos, a escuta dos mesmos e dos
pais, assistindo e permitindo a realização do teatro, o que não impediu que o estranho viesse à tona
na cena explícita de suicídio, provocando outras indagações e, conseqüentemente, a busca de outras
formas de se pensar e atuar sobre esse problema velho e atual.
Pensar sobre as múltiplas violências e pesquisar o que pensam as professoras sobre esse
tema me remeteu à realidade e também ao imaginário. Quanto ao aspecto da violência chamado
suicídio, consideram-se as impossibilidades imaginadas e sentidas na invasão concedida e praticada
no real. O sujeito humano, frente à própria morte, não dá a si mesmo nenhuma chance. Não há
possibilidades a considerar.
Nas construções mentais e suas representações, o real e o imaginário se aproximam e se
distinguem atuando decisivamente no pensamento construído. Nilda Teves (1992, p. 11) argumenta
que “Na consciência da realidade estão presentes a razão e a emoção, imbricadas, e não há como
dicotomizá-las. Na unidade do ato perceptivo, pensa-se sentindo, sente-se pensando”. Para além das
inúmeras formas de violência, manifestada na escola, o pensamento das professoras está em
questão, não só especificamente sobre a violência, mas é preciso entender os aspectos agregadores
da cultura formadora e construtora do espaço social que as rodeia.
Considerações Finais
Constatamos neste estudo a fragilidade e a insegurança falada pelas professoras
quanto à segurança urbana. Há uma necessidade de efetivar alterações ao abordar e combater as
variadas formas de violência social e escolar. Verificamos que a violência urbana vem ocorrendo e
aumentando independente do tamanho populacional da cidade. No combate à violência, sobretudo é
fundamental considerar a aplicação efetiva das leis, considerar as ações das instituições legais, seus
limites e possibilidades atuais. Buscar e promover estratégias que possam fazer cumprir a necessária
segurança. Segurança básica para o convívio social e que resguarda a vida humana. As professoras dessa pesquisa, ao depararem com as variadas formas de violência
manifestada em sua prática docente agiram, muitas vezes, assertivamente. Situação nem sempre
considerada por elas. Constatamos a força da insegurança interferindo na sustentação das condutas
legais, promotoras de segurança, crescimento e autonomia.
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* Este artigo refere-se à síntese de um capítulo de minha dissertação de Mestrado em Educação,
apresentada e aprovada na Universidade Vale do Rio Verde de Três Corações – UNINCOR –
Betim / MG, em 11 de agosto de 2006, sob a orientação da Profª Drª Maria Madalena Silva de
Assunção.
** Psicóloga, mestra em Educação pela Universidade Vale do Rio Verde de Três Corações UNINCOR.
E-mail: [email protected] !
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