7° Congresso de Pós-Graduação
O EXCESSO DE COMPROMETIMENTO ORGANIZACIONAL E SUAS INFLUÊNCIAS NAS
RELAÇÕES SOCIAIS
Autor(es)
CARLOS RENATO PIZZOL
Orientador(es)
DANIELA CRISTINA SANTOS
1. Introdução
Muito se discute sobre comprometimento organizacional e suas conseqüências. Vários são os conceitos de comprometimento,
entretanto, alguns autores concebem como “a força relativa de identificação e envolvimento de um indivíduo com uma organização
em particular” (Freire, 2007, p. 7). Assim, o comprometimento seria um estado em que o indivíduo identifica-se com a organização e
seus objetivos, mantendo-se nela como membro.
Borges et al. diz que a carreira é um fator que garante o comprometimento, assim, “a falta de previsão de uma carreira profissional
(...) sustentam os níveis indesejados de satisfação no trabalho” (2004, p. 19) o que resulta em baixa no desempenho e queda do
comprometimento.
Já as pessoas comprometidas estão dispostas a “suportar condições de trabalho altamente exigentes, isto é, a atuarem como
‘patriotas’ de suas organizações” (Rego, 2003, p. 26). A relação com o trabalho é fundamental ao sujeito, pois elas “determinam seu
comportamento, suas expectativas, seus projetos para o futuro, sua linguagem, seu afeto, ou seja, interfere em toda uma vida” (Lane
& Codo, 1984, p. 139).
Coscarelli (2004) afirma que o trabalho ocorre na dupla transformação homem-natureza, entretanto, esta relação necessita de
significado; a ausência é sinônimo de sofrimento psíquico e perda de identidade. Heloani (apud Coscarelli, 2004) responsabiliza, pelo
sofrimento no trabalho, a concepção dos objetivos do indivíduo, onde para alcançá-lo extrapola limites, dentre eles o trabalho
exaustivo e prolongado, ficando em segundo plano a família, amigos e outros aspectos da vida, o que a longo prazo, pode ser perigoso
e irreversível.
Para Muchinsky (2004) o homem se dedica muito ao trabalho e esquece suas atividades. Segundo De Masi (1999), com o passar do
tempo, esses trabalhadores acostumam a conviver com sobrecarga de trabalho, adquirindo o hábito de ultrapassar o tempo além do
necessário (evertime), chegando ao extremo de levarem trabalhos para os lares, nos fins de semana, diante da família que já foi
deixada de lado durante a semana.
Uma dedicação excessiva ao trabalho é classificada como workaholic - work (trabalho) e alcoholic (alcoólatra) - termo utilizado para
identificar pessoas viciadas em trabalho. Esta foge da vida por meio do trabalho, e em geral, suas vidas afetivas, sexuais, familiares
são insatisfatórias. O colaborador está acostumado à pressão e “durante os feriados tem dor de cabeça se não leva para fazer em casa
qualquer tarefa que preserve o mesmo clima de tensão dos dias normais” (De Masi, 1999, p. 20).
Quando esta transposição é freqüente, classificamos o trabalho como psicopatológico (Codo, 1994), ocasionando perda de sentido e
de identidade. Diante deste contexto, outra visão do trabalho é possível e necessário. De Masi (2000, p. 148) acredita que se deva aliar
trabalho à diversão, como forma de restituir a plenitude do homem e preservar sua identidade.
O interesse pelo tema trabalho deve-se ao fato dele estar presente nas relações cotidianas, ou seja, é predominante e está sempre em
discussão nos diferentes ambientes. Assim sendo, sentiu-se necessidade de verificar se este trabalho prejudica o indivíduo, ou se é
mais uma atividade desenvolvida pelo homem, entretanto, com maior ênfase.
Esta pesquisa trará maior compreensão da relação homem x trabalho, beneficiando uma nova visão para a sociedade em geral. Já para
os profissionais da saúde mental, poderá demonstrar como esses profissionais, na atualidade, interagem ou não com o meio, podendo
este ser resultado de uma patologia.
2. Objetivos
Geral: investigar o comprometimento no trabalho e suas influências.
Específico: investigar se o comprometimento leva a uma sobrecarga de trabalho, necessitando de jornadas extras e se esta sobrecarga
está ou não interferindo os indivíduos nas relações.
3. Desenvolvimento
Pesquisa qualitativa de caráter exploratório com 22 colaboradores de ambos sexos, maiores de 25 anos, de 2 Organizações do Setor
Industrial de Piracicaba/SP. As funções entrevistadas foram: Gerente de Marketing, Analista de Desenvolvimento Sistemas,
Engenheiro Civil, Economista, Administrador e Contador. Outro pré-requisito: ter, no mínimo, 1 ano na Organização. O instrumento
utilizado foi questionário com perguntas abertas. A fundamentação teórica, para construção do mesmo, pautou-se pela abordagem
Psicológica tendo supervisão de uma Doutora em Psicologia Organizacional. Os dados foram coletados no final de 2006.
O pesquisador contactou por telefone e, posteriormente, pessoalmente o RH das organizações. Aceitado solicitou-se, a partir dos
pré-requisitos, no máximo, 11 colaboradores. A estes foram fornecidos e explicados o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
A seguir foram distribuídos os envelopes com questionário, carta de esclarecimento e envelope de devolução. Os participantes
responderam o questionário em tempo máximo de 15 dias e, então, os devolveram ao Setor de RH, preenchidos, lacrados e que foram
retirados pelo pesquisador.
A análise dos mesmos deu-se através de classificações em palavras chaves. Os participantes, assim como as organizações, tiveram e
terão o sigilo em relação às informações.
4. Resultado e Discussão
O grupo teve predominância do sexo masculino (81,8%). Dos entrevistados, 59,1% eram casados, 36,3% solteiros e 4,6% outros. Em
relação a idade, 68,1% estão na faixa dos 30 aos 49 anos. É importante destacar que 22,8%, dos 20 aos 29 anos, já assumem algum
cargo de gestão, demonstrando, a presença da geração Y (geração entre 1978 e 1988 e que manteve contato com as tecnologias; em
relação ao trabalho são pessoas em constante procura por conhecimento e atualização; elas utilizam da organização para o próprio
crescimento, por isso mudança de organização são freqüentes). Dos entrevistados 50% não tem filhos e 22,7% 01 filho; o restante
tem, no mínimo, 02 filhos.
Mendoza et al. verificou que a desvalorização do trabalho está mais presente nos setores administrativos, entretanto, percebeu-se que
86,3% estão dentro da carga horária aceitável (considera-se 44 horas semanal, conforme CLT), podendo atingir 10 horas extras
semanal. Já, para 13,7%, ultrapassar 50 horas semanais é mais freqüente. Deste contingente, 36,3% informaram da necessidade de
fazer horas extras, constantemente, tendo como justificativa:
“No momento eu preciso fazer, tenho metas a serem cumpridas” ou
“Estou com acúmulo de trabalho”.
O problema surge quando estas rotinas de trabalhos tornam-se freqüentes. De Masi (1999) corrobora, afirmando que com o passar do
tempo os trabalhadores acostumam conviver com a sobrecarga de trabalho, ficando mais tempo na organização; associado a isto está o
tempo na empresa, pois quanto mais tempo, maior será a dedicação.
Grande parte da população (68,1%) é nova na organização, ou seja, tem menos que 05 anos. Não ter encontrado um número
significativo de excesso de trabalho pode ser resultado do pouco tempo de organização, embora nenhuma literatura estudada
apresentou tempo mínimo.
Constatou-se que 45,4% se dedicam ao lazer no final de semana - tempo de até 05 horas. Este número pode refletir, como apontado
por De Masi (1999), que o profissional dedica-se muito ao trabalho, deixando de lado as demais atividades. O número de
colaboradores que realizam trabalhos fora da organização foi de 27,3%, sendo que destes, 33,3% disseram ser freqüentes. Nisto
encontra-se um problema: a invasão do trabalho no ambiente doméstico - comportamento criticado por Codo (1994).
Esta rotina torna-se um círculo onde não consegue encontrar tempo para as demais atividades. Na pesquisa identificou-se que mesmo
que o funcionário se dedique ao trabalho durante a semana e ultrapasse a jornada, no final de semana ele consegue estar mais presente
nas relações familiares. Mesmo aos finais de semana, quando este deveria destinar-se ao lazer e família, há o trabalho invadindo os
espaços e as paredes domésticas, de acordo com as informações no anexo 01.
Já, em relação ao trabalhar muito, percebe-se, através do anexo 02, os problemas de saúde: insônia em 59,1%, dores de cabeça em
54,5% - esses resultam no aumento da ingestão medicamentosa, 40,9%.
Com 36,6% está o desentendimento com a (o) parceira (o) e em 13,6% o trabalhar muito acaba sendo fator de desentendimento com
filhos. Os dados demonstram que os desentendimentos familiares, talvez, não sejam resultado do “escape” do trabalhar muito,
entretanto, são significativos. Em relação aos planos familiares observou-se que 86,2% desejam melhorar a qualidade de vida das
pessoas envolvidas, assim como garantir a segurança familiar. É preciso destacar que, muitas vezes, o trabalhar em excesso é
condição para manter a segurança familiar.
Já, quando perguntado sobre perspectivas em relação ao futuro profissional, 72,6% enxergam o crescimento e o desenvolvimento na
carreira e nos negócios como suas metas para o futuro, entretanto, apenas 4,6 % conseguem fazer uma relação com a família,
incluindo-a nos planos:
“quero crescer com sucesso, juntar patrimônios para usufruir com minha família”.
Há duas análises: primeiro, quanto mais o funcionário tem clareza de sua carreira e perspectiva de crescimento, maior será seu
comprometimento com a organização. Constata-se que o trabalhar além do horário, ou seja, horas extras, é sinônimo de empenho e
dedicação:
“Em um projeto haveria um envolvimento total. Lembrando, se precisar fazer horas extras, neste caso, estarei de pleno acordo”.
Assim, Heloani e Capitão (2003) enfatizam que para alcançar os objetivos proposto, muitos extrapolam seus limites, deparando-se
com trabalhos exaustivos e prolongados, tornando-se sofríveis. A segunda análise é sobre o processo de desvincular o crescimento
profissional da relação familiar, pois, segundo Lane & Codo (1984), o trabalho e suas demais relações estão interligadas, não podendo
desvincular-se um do outro.
Na questão de envolver-se e crescer profissionalmente, perguntou-se sobre os critérios, que eles consideravam indispensáveis para
ganhar a confiança do superior. Em 26,4% dos entrevistados o
“ser educado, obediente, confiável/honesto e verdadeiro”
foram eleitos. Percebe-se que esses critérios são valores e, assim, são permeados pela subjetividade não tendo uma definição
estabelecida e padronizada, prejudicando a organização sobre a forma de mensurar seus colaboradores. Isto é preocupante, pois, como
gestores, pressupõe-se que utilizem os mesmos critérios para análise dos subordinados. Outra parte, 15,1%, acreditam que é
necessário a colaboração, dedicação e o comprometimento. Mais uma vez o excesso de trabalho como sinônimo de dedicação:
“se precisar fazer horas extras eu faço”.
O relacionamento social é muito importante. Para 27,3% este relacionamento acontece com o grupo de trabalho. Desses, 83,3%
participam junto com os familiares, cujo tempo é dividido de forma igualitária, ou seja, não houve prevalência de nenhum grupo. Os
assuntos mais discutidos, quando em grupos, foram: trabalho, sexo e futebol; os assuntos menos discutidos: comida, dinheiro e
religião. Sendo o trabalho o mais discutido, percebe-se que mesmo distante do ambiente, e sem estar com pessoas do trabalho,
discuti-se o assunto. Assim, não se pode dizer que esta prática é um vício, mas, certamente, permeia a identidade de uma pessoa.
Sabendo da importância do significado do trabalho, buscou-se a sua compreensão (anexo 03).
Assim, 29,8% compreendem o trabalho como ganhos salariais e desta forma sobrevive, meramente, cumprindo tarefas e obrigações;
já 21,6% percebem como oportunidade de adquirir experiência e conhecimento, além da possibilidade de crescer:
“em troca recebe seu salário para que possa ter uma vida digna e assim contribuir para o crescimento global, tanto pessoal,
tecnológico quanto econômico”.
Mesmo com características distintas na compressão do trabalho, há, como semelhante, a questão da troca - de um lado a mão de obra
e do outro pagamento. Outros 21,6% atribuem o trabalho como possibilidade de criar sentido e significado, tornando-se local de
realização e valorização. Assim disse um colaborador:
“um homem sem trabalho (emprego) se sente um ‘lixo’, no fundo do poço, um inútil. Passei por isso em minha vida profissional e
garanto que essa é a pura verdade”.
Assim constata-se o que disse Coscarelli (2004) - a ausência de um significado do trabalho para o homem causa sofrimento.
Portanto, a pesquisa contribuiu no fortalecimento da concepção de um significado para o trabalho, sendo fundamental para o
comprometimento e para a vida, pois se cria sentido, assim como, para muitos, ele é sinônimo de comprometimento, podendo vir a
prejudicar as relações sociais, dentre elas a familiar.
5. Considerações Finais
Diante da proposta, constatou-se que não houve o trabalho excessivo, embora alguns entrevistados apresentaram excesso, mas, no
âmbito geral, não foi significativo.
Percebeu-se que o tema trabalho permeia as diferentes relações e esferas de uma pessoa. Isto foi verificado quando o tema foi mais
citado e presente nas conversas e relacionamentos entre grupos e amigos. Outras pesquisas serão necessárias para identificar este
trabalho em excesso, talvez com um contingente maior de pessoas e organizações esta realidade seja diferente.
Percebeu-se o significado que as pessoas atribuem ao trabalho. Indiferente de como elas compreende e percebe o trabalho, essas já
criaram com este uma relação de co-existência, no sentido de fazer parte da vida, onde a ausência causa sofrimento e sentimento de
inutilidade.
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