Segunda-feira – 04/01/2010 N° 001/2010 MEIO AMBIENTE Para salvar o planeta, salvem os oceanos (O Estado de São Paulo, 01/01) Apesar das muitas decepções nas recentes conversações sobre o clima em Copenhague, houve pelo menos um resultado positivo claro, e esse foi o progresso alcançado na área de Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação Florestal (Redd). Por esse mecanismo, que teve elementos-chave acertados em Copenhague, países em desenvolvimento serão compensados por preservar florestas, solos de turfa, pântanos e campos que são eficientes na absorção de dióxido de carbono (CO2), o principal gás associado ao aquecimento global. Essa abordagem, que explora o poder da própria natureza, é uma maneira econômica de armazenar grandes quantidades de carbono. Mas o programa é limitado porque inclui somente esses sumidouros de carbono encontrados em terra. Precisamos agora olhar para oportunidades parecidas nos oceanos para atenuar as mudanças. Talvez poucos saibam, mas além de produzir a maior parte do oxigênio que respiramos, o oceano absorve cerca de 25% das emissões anuais de CO2. Metade dos estoques de carbono do mundo é retido em plâncton, manguezais, pântanos salgados e outras ecossistemas de vida marinha. Assim, é pelo menos tão importante para o clima preservar essa vida oceânica como preservar florestas. Os campos de plantas marinhas, por exemplo, que florescem em águas costeiras rasas, respondem por cerca de 15% do armazenamento oceânico total de carbono, e florestas submarinas de algas armazenam quantidades enormes de carbono, como as florestas terrestres. O sumidouro de carbono natural mais eficiente de todos não está em terra, mas no oceano, na forma da Posidonia oceanica, uma espécie de grama marinha que forma vastos campos submarinos que ondulam às correntes marítimas como os campos de gramíneas em terra ondulam ao vento. Em todo o mundo, hábitats costeiros como esses estão sendo perdidos por causa da atividade humana. Áreas extensas foram alteradas por aterros e fazendas de criação de peixes, enquanto a poluição costeira e a pesca em excesso têm danificado ainda mais os hábitats e reduzido a variedade de espécies. Já está claro que essa degradação não só afetou o ganha-pão e o bem-estar de mais de 2 bilhões de pessoas dependentes de ecossistemas costeiros para se alimentar, como reduziu a capacidade de armazenar carbono desses ecossistemas. Existe uma dupla razão para se administrar melhor regiões costeiras e oceanos. Esses hábitats vegetais saudáveis ajudam a atender às necessidades das pessoas que estão se adaptando às mudanças climáticas e reduzem o acúmulo de gases do efeito estufa ao armazenarem CO2. Os países deveriam ser estimulados a criar áreas marinhas protegidas – isto é, reservar partes da costa e do mar onde a natureza possa prosperar sem uma interferência humana indevida – e fazer tudo ao seu alcance para recuperar pântanos marinhos, florestas de algas e campos de grama marinha. Administrar esses hábitats é bem menos dispendioso do que tentar sustentar linhas costeiras depois que os danos foram feitos. Manter faixas de manguezais saudáveis na Ásia com uma gestão cuidadosa, por exemplo, revelou-se custar apenas um sétimo do que teria custado erguer defesas costeiras artificiais contra tempestades, ondas e forças de maré. As discussões em Copenhague aplainaram o caminho para todos os países melhorarem a administração de oceanos e costas para explorar seu imenso potencial para mitigar as mudanças climáticas – especialmente na nova década, enquanto políticos, cientistas e engenheiros no mundo desenvolvem estratégias de longo prazo para estabilizar a concentração atmosférica de gases do efeito estufa. Nas negociações contínuas sobre clima, as nações deviam agora tornar prioritária a produção de um único mapa do mundo que documente todos os tipos de sumidouros de carbono costeiros, e identifique os que necessitam de uma preservação mais imediata. Novos estudos devem ser realizados para melhor compreender como administrar de maneira efetiva essas áreas para aumentar o sequestro de carbono. Depois, seguindo o exemplo de Redd, será possível estabelecer fórmulas para compensar países que preservem sumidouros de carbono fundamentais nos oceanos. Precisamos trazer urgentemente o oceano para a agenda junto com as florestas para podermos ajudar, o quanto antes, os oceanos a nos ajudarem. *Dan Laffoley é vice-presidente para assuntos marinhos da Comissão Mundial de Áreas Protegidas da União Internacional para a Conservação da Natureza (IUCN) e especialista em temas marinhos da Natural England. ********** Brasil tem maior volume de algas calcárias do mundo (Jornal do Brasil, 02/01) RIO - As algas calcárias são plantas marinhas impregnadas de carbonato de cálcio presentes em todos os oceanos – desde zonas entre marés, área da costa sujeita à influência do fluxo e refluxo das marés, até grandes profundidades, que podem alcançar 280 metros. Estes organismos, ao lado dos corais, são os principais responsáveis pela construção de recifes naturais. Juntos, formam as maiores construções vivas do planeta, fornecendo hábitat para vários seres marinhos. Mas esta riqueza está ameaçada. – Pouco sabemos sobre a diversidade das espécies existentes, e a retirada delas é feita visando apenas ao interesse econômico, sem se importar com o equilíbrio ambiental – alerta bióloga Márcia Figueiredo Creed, coordenadora da pesquisa “Paradigma sobre a conservação e o uso sustentável de bancos de algas calcárias”. Márcia Figueiredo Creed, que se preocupa há anos com a exploração desses recursos naturais do litoral brasileiro, lembra que a alga calcária é a única planta marinha que consegue sobreviver em locais profundos nos oceanos, ocorrendo em bancos desde a costa do Maranhão até o litoral do Norte Fluminense. Alguns estudos já colocaram o Brasil como o detentor do maior depósito de algas calcárias do planeta. Dois recifes formados por algas calcárias já contam com a proteção ambiental da legislação brasileira: o Parque Marinho de Abrolhos, no sul da Bahia, e o Atol das Rocas, próximo ao arquipélago de Fernando de Noronha. Apesar de ocuparem menos de 1% do fundo dos oceanos, os recifes e bancos de algas calcárias servem como lar ou recurso vital para 25% a 33% das criaturas do mar. Vários estudos sobre a viabilidade do uso sustentável das algas calcárias – já utilizadas na calagem de solos ou como suplemento alimentar natural para prevenir a falta de cálcio – surgiram nas últimas décadas. De acordo com a bióloga, o uso do calcário marinho como suplemento alimentar contra a osteoporose ainda é pouco difundido no país, apesar dos custos relativamente baixos de sua produção. – Há uma indústria no sul do Espírito Santo que desenvolve um suplemento, que possui 22,5% das necessidades diárias de cálcio, concentração bem maior que as encontradas em similares naturais, e que também contem ômega-3, proveniente da fauna associada – explica. Com relação ao emprego do calcário das algas na fertilização de solos, Márcia afirma que já estão comprovadas as suas vantagens se comparadas àquelas do calcário terrestre – ainda hoje o mais utilizado na agricultura. – A textura do talo das algas calcárias cria hábitat para toda uma fauna de pequenas bactérias que não existiriam no calcário terrestre, e que servem para decompor a matéria orgânica e aumentar a porosidade dos solos – diz. – A coleta em mares profundos seria uma das soluções. Diversidade Para Márcia, ainda há poucas ações para a preservação dos bancos de algas calcárias, mesmo em face do aumento da extração do calcário e a exploração de petróleo nesses bancos. – Muitas vezes, estas algas são arrastadas até a beira de praias. De lá, são retiradas indiscriminadamente por pessoas que ignoram a importância delas para a conservação da diversidade na natureza – relata. Ela acredita que uma das soluções para aliar o equilíbrio ambiental com a exploração do potencial econômico dessas plantas seria a coleta delas em áreas mais distantes da costa, em águas profundas. – Ali, o solo tem menos nutrientes, a fauna e a flora são mais pobres e o impacto ambiental seria indiscutivelmente menor – avalia. Para Márcia, a pesquisa está sendo muito útil para identificar as espécies de algas calcárias existentes no país e também para aferir a taxa de reprodução e de crescimento dos depósitos onde elas se encontram. A bióloga diz que ainda há poucos pesquisadores estudando o assunto – e não só no Brasil, mas também no exterior. – Por isso, o objetivo de nossa pesquisa também é o de formar novos estudiosos e especialistas para que possamos avançar nas pesquisas sobre o tema – conclui. O trabalho desenvolvido sob a coordenação da pesquisadora foi subdividido para dar mais agilidade à pesquisa, e seus resultados finais devem ser apresentados no início de 2010. ********** POLÍTICA Brasil não pode se tornar refém de ambientalistas (Folha de São Paulo) ENTREVISTA - EDISON LOBÃO Ministro de Minas e Energia diz que atraso em liberação de usinas hidrelétricas fará consumidor pagar mais caro por energia de geração térmica, mais poluente O presidente Luiz Inácio Lula da Silva deverá enviar ao Congresso em 2010 um projeto de lei que prevê a criação de benefícios fiscais para a implantação de usinas siderúrgicas no país. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, disse à Folha que o objetivo da medida é reduzir a exportação de minério de ferro bruto, uma bandeira de Lula e um dos motivos das desavenças entre o presidente e o comando da mineradora Vale do Rio Doce no ano passado. Na entrevista, Lobão também afirma que o Brasil não pode ficar "refém dos humores" do Meio Ambiente. Caso contrário, vai enfrentar "dificuldades" no futuro na área energética. Segundo Lobão, essas dificuldades não serão de falta de energia, mas da necessidade de o consumidor pagar por uma energia "mais cara e poluente" das termelétricas. Elas terão de ser acionadas se as usinas hidrelétricas em construção sofrerem grandes atrasos. O ministro volta a repetir que o apagão ocorrido no país no início de novembro passado, que afetou 18 Estados mais o Distrito Federal, deveu-se a "fenômenos atmosféricos adversos" e afirma: "Eu quase diria que estou torcendo para que haja uma falha técnica, para que ela possa ser corrigida daqui para a frente. Mas até agora não apareceu". A seguir, os principais trechos da entrevista: FOLHA - Qual lição o apagão deixou? Houve falha de manutenção? LOBÃO - Nós não temos nenhuma ideia fixa no sentido de defender o sistema naquilo em que ele eventualmente não devesse ser defendido. Mas nosso sistema de transmissão de energia é considerado um dos melhores do mundo, senão o melhor. FOLHA - Mas nenhuma falha foi identificada no apagão? LOBÃO - Não. Já fizemos vários estudos, relatórios, e a conclusão é que tinha havido realmente fenômenos atmosféricos adversos. Bem, ainda estamos fazendo novas investigações. Se você me perguntar, eu quase diria que estou torcendo para que haja uma falha técnica para que ela possa ser corrigida daqui para a frente. Mas até agora não apareceu. FOLHA - Segundo as previsões, o país volta a crescer acima de 5% neste ano. E várias usinas hidrelétricas em construção estão enfrentando problemas no seu cronograma de obras. Isso não coloca em risco o fornecimento de energia? LOBÃO - Nós não trabalhamos com a possibilidade de racionamento de energia no Brasil. Além das hidrelétricas que estamos construindo, ou em fase de licitação e de recebimento das licenças ambientais, temos a solidez das termelétricas, que constituem uma energia cara e poluente. Todavia é um estoque de energia que possuímos, estoque estratégico. Falhando o sistema hídrico, seja porque não choveu, seja porque não se conseguiram as licenças a tempo, entrará em funcionamento o sistema térmico do país. FOLHA - É a melhor solução? LOBÃO - Não, é a pior solução. Mas é um estoque estratégico que possuímos. FOLHA - Como o sr. classifica o embate no governo em torno das licenças ambientais para a construção de usinas hidrelétricas? LOBÃO - Não quero qualificar as dificuldades que temos tido com o Meio Ambiente. Temos tido, sim, tais dificuldades intensamente cada vez mais. O caso de Belo Monte [no rio Xingu, no Pará] é um exemplo flagrante. Não se concedeu a licença, embora o ministro do Meio Ambiente [Carlos Minc] e o presidente do Ibama [Roberto Messias], numa reunião com o presidente, com a ministra Dilma [Rousseff], comigo e com outras autoridades, tenham nos garantido para o mês de novembro [passado] a emissão da licença ambiental. FOLHA - Não veio? LOBÃO - Eu, perguntado pela imprensa, declarei que na segunda-feira seguinte a licença seria concedida. Isso foi motivo para que um alto funcionário do Ibama dissesse que não estava concedendo a licença porque os ministros do Gabinete Civil e de Minas e Energia haviam marcado data para a concessão da licença. Ora, a data foi marcada pelo ministro do Meio Ambiente e pelo presidente do Ibama no Palácio do Planalto. Não era motivo para que a licença não fosse concedida. O Brasil não pode ficar refém dos humores do Meio Ambiente. Não há energia melhor, mais limpa e mais barata do que a hídrica. Mas, como estamos sujeitos aos humores do Meio Ambiente, poderemos ter dificuldades no futuro. Dificuldades de que natureza? Falta de energia? Não, mas seguramente vamos ter que pagar, o consumidor vai ter que pagar por uma energia mais cara e poluente. FOLHA - É um contrassenso? LOBÃO - Acho um contrassenso. Até porque estamos tendo todos os cuidados no sentido de que os reservatórios das hidrelétricas sejam os menores possíveis e estamos até, já agora, introduzindo um sistema de reflorestamento de toda devastação feita em volta da construção de uma hidrelétrica. FOLHA - Os projetos do marco regulatório do pré-sal não foram aprovados no tempo esperado e devem avançar no calendário eleitoral. Isso compromete os planos do governo de fazer os leilões neste ano? LOBÃO - Compromete. Nós imaginávamos que poderíamos realizar esses leilões ainda no fim de 2009 ou no começo deste ano. Já verificamos que isso não será possível. As leis não foram votadas. FOLHA - O que aconteceu? LOBÃO - Dificuldades de entendimentos entre os próprios parlamentares, a questão dos royalties [distribuídos a Estados e municípios] sobretudo. FOLHA - O sr. acha que coloca em risco até a aprovação em 2010? LOBÃO - Não tenho esse receio. Na medida em que se observa que há essa possibilidade, o presidente Lula pode solicitar a urgência [para a tramitação dos projetos] que ele havia retirado no começo [em setembro, dias após ter enviado os projetos de lei ao Congresso]. FOLHA - E o novo código de mineração, quando ele será enviado ao Congresso? Terá aumento dos royalties cobrados das mineradoras ou do imposto de exportação? LOBÃO - Ainda não está definido. Queremos fazer algo que modernize todo o sistema, mas sem embaraços às empresas exportadoras. É claro que, na medida em que nos convencermos de que estamos cobrando taxas muito inferiores do que o mundo cobra, teremos que aumentar um pouco. FOLHA - O marco regulatório vai tratar da preocupação do presidente Lula, revelada no embate com a Vale, de reduzir a exportação de minério de ferro bruto e aumentar a de produtos acabados? LOBÃO - Não, não deve constar do novo código mineral brasileiro. Mas o presidente está disposto a enviar um outro projeto de lei ao Congresso estabelecendo vantagens para quem produzir aqui, quem se implantar na transformação do minério em produtos acabados. FOLHA - Que benefício? LOBÃO - Benefícios fiscais. Hoje o benefício fiscal é o contrário. Consegue benefício quem exporta o minério bruto. Ou semiacabado ou semielaborado. E cobra dos produtos acabados. A ideia é inverter. Basta inverter para resolver o problema. FOLHA - O empresário Jorge Gerdau diz que hoje há capacidade ociosa no parque siderúrgico e diz que construir novas usinas siderúrgicas não é a solução. LOBÃO - Olha, o doutor Jorge Gerdau é um dos maiores empresários brasileiros, um dos maiores do mundo. É um empresário de grande competência e temos orgulho da presença dele no setor produtivo nacional. O que não quer dizer que estejamos absolutamente de acordo com todas as concepções empresariais dele. FOLHA - E o botijão de gás social, vai sair? LOBÃO - Foi uma ideia do presidente Lula, que solicitou ao Ministério de Minas e Energia um trabalho nesse sentido. O presidente quer um abatimento de 20% a 30% no preço do botijão de gás para as famílias de baixa renda. Estamos trabalhando nessa direção. Procurando meios e modos de encontrar uma solução. A primeira que encontramos foi no sentido de o Tesouro financiar. O Ministério da Fazenda, obviamente, não gosta dessa solução. Isso importaria num custo da ordem de R$ 1 bilhão por ano. Estamos procurando outras saídas. FOLHA - Quem é o melhor vice do seu partido [o PMDB] para compor a chapa com ministra Dilma? LOBÃO - Há muitos nomes bons. Mas eu creio que o nome do presidente do partido, Michel Temer, por ser exatamente aquele que, no meu entendimento, mais agrega, mais une o partido, é o melhor nome.