O instituto do tombamento como
garantidor do patrimônio cultural
brasileiro
Sônia Guerra1
Resumo
O presente artigo parte da evolução social do homem, visando à aquisição de direitos,
atingindo os direitos humanos culturais. Analisa os instrumentos jurídicos previstos na
Constituição Federal Brasileira de 1988, que visam à proteção do patrimônio cultural brasileiro
e a efetividade do tombamento como garantidor da preservação do mesmo.
Palavras-chave: Direitos humanos culturais. Tombamento.
Abstract
This article is part of the social evolution of man for the acquisition of rights, reaching
cultural human rights. Analyzes the legal instruments provided the Brazilian Federal Constitution
of 1988 aimed at protecting the cultural heritage of Brazil and the effectiveness of tipping as a
295
guarantor of the preservation of it.
Keywords: Cultural human rights. Overturning.
Desde os primórdios, o homem necessita viver com seus semelhantes, mas, ao
mesmo tempo em que possui a capacidade de conviver com seus semelhantes, o homem
também possui a de destruir-se e aos seus, bem como aos bens que o grupo amealhou
ao longo de sua história. Daí a necessidade da utilização de diversos mecanismos como
formas de controle social para que a harmonia seja mantida no seio da sociedade. Peter
Berger2 demonstra estes mecanismos através de um conjunto de círculos concêntricos,
cujo centro é o homem, do qual também faz parte o sistema jurídico. O ordenamento
jurídico é, inegavelmente, necessário à convivência social, surgindo das necessidades e
da realidade de cada sociedade, refletindo seus anseios e expectativas. Na expressão de
Rudolf Von Jhering, utilizada pela professora Maria Helena Diniz3, se a norma jurídica
não refletisse os anseios sociais, seria ‘um fantasma de direito’ uma reunião de palavras
vazias; sem conteúdo substancial esse ‘direito fantasma’, como todas as assombrações,
viveria uma vida de mentira, não se realizaria (...)”. É pois, o direito, um indutor da
coesão social, de modo a assegurar um estado propício ao desenvolvimento de cada
indivíduo no contexto social. Pelo sistema jurídico, substitui-se o poder do mais forte
1
2
3
Mestre em Direito pela Universidade Gama Filho; Professora do Centro Universitário Augusto
Motta, Advogada no Rio de Janeiro.
BERGER, Peter. Perspectivas sociológicas – uma visão humanística. 10. ed. Petrópolis: Vozes, 1991.
DINIZ, Maria Helena. Conceito de norma jurídica como problema de essência. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 1985, p. 18.
O instituto do tombamento como garantidor do patrimônio cultural brasileiro
pelo poder vinculado ao bem-estar da coletividade. Há a organização da sociedade de
modo que todos possam buscar a harmonia na vida em comum. Sendo um reflexo da
sociedade, dinâmica por essência, também o é o direito, refletindo a preocupação do
homem com o bem-estar de seus semelhantes. Esta preocupação remonta a priscas eras,
tendo seu ápice na Declaração Universal dos Direitos do Homem, em 1948, período
no qual o intervencionismo estatal nas relações sociais era extremamente elevado.
A conquista das liberdades públicas decorreu, ao longo dos tempos, desta luta dos
indivíduos face às arbitrariedades existentes, como já lecionava Jhering: “A paz é o fim
que o direito tem em vista, a luta é o meio de que se serve para a conseguir.(...) A vida
do direito é uma luta: luta dos povos, do Estado, das classes, dos indivíduos.”4
O posicionamento de Joaquim Herrera Flores5 comunga com os ensinamentos
que absorvemos de Jhering, pois, em sua concepção, os direitos humanos foram
alcançados em consequência da luta da sociedade, visando a uma vida com
dignidade.
“De este modo, los derechos humanos serían los resultados siempre
provisionales de las luchas sociales por la dignidad. Entendiendo por
dignidad, no el simple acceso a los bienes, sino que dicho acceso sea
justo y se generalice por igual a todas y a todos los que conforman la idea
abstracta de humanidad. Hablar de dignidad humana no implica hacerlo
de un concepto ideal o abstracto. La dignidad es un fin material. Un
objetivo que se concreta en dicho acceso igualitario y generalizado a los
bienes que hacen que la vida sea ‘digna’ de ser vivida.”
296
No cenário pátrio, a Constituição Federal de 1988 é a chamada “Constituição
Cidadã” tamanha foi a preocupação do constituinte brasileiro em declarar direitos e
elevar a importância da cidadania como fundamento do nosso Estado Democrático
de Direito.6
Com o seu advento, nosso país passa a uma nova fase, já que visa assegurar o
exercício das liberdades públicas. como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na
ordem interna e internacional, com a função de diminuir as desigualdades sociais.
Diversos são os artigos em que o constituinte se preocupou com a proteção
aos direitos humanos culturais, como, por exemplo, a previsão do artigo 23,
inciso V, atribuindo à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios a
responsabilidade de proporcionar aos cidadãos os meios de acesso à cultura e, ainda,
em seu artigo 215, a obrigação estatal em garantir a efetividade desses direitos.
Vale ressaltar que Toshio Mukai7, bem como outros doutrinadores, entende que a
cultura integra um dos aspectos do meio ambiente: o ambiente como uma ou mais zonas
4
VON JHERING, Rudolf. A luta pelo direito. 5. ed. Rio de Janeiro: Forense, 1985, p. 1.
FLORES, Joaquin Herrera. La complejidad de los derechos humanos – bases teóricas para uma redefinición
contextualizada. Revista Internacional de Direito e Cidadania, n. 1, p. 103-135, junho/2008.
Disponível em <http://www.egov.ufsc.br/portal/sites/default/files/anexos/33315-42530-1-PB.pdf>
Acesso em 27 de janeiro de 2012, p. 107.
6
31 CF/88. Art. 1º, II.
7
MUKAI, Toshio. Direito ambiental sistematizado. 3. ed. Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1998, p. 4.
5
Sônia Guerra
circunscritas do território, consideradas pelo seu peculiar modo de ser e beleza, dignas
de conservação em função do seu gozo estético, da sua importância para a investigação
científica, ou ainda pela sua relevância histórica, isto é, o ambiente enquanto soma
de bens culturais, enquanto ponto de referência, objeto dos interesses e do direito à
cultura.
Neste sentido, o Sidney Guerra8 Assim leciona:
“Pode-se relacionar ao meio ambiente a proteção dos espaços naturais e das
paisagens, a preservação das espécies animais e vegetais, a manutenção dos
equilíbrios biológicos e a proteção dos recursos naturais.
Da mesma forma, pode-se associar à comodidade dos vizinhos, à saúde, à
seguridade, à salubridade pública, à proteção da natureza e do meio ambiente,
à conservação dos sítios e monumentos.
Como se vê, o conceito de meio ambiente não pode apresentar uma visão
simplista e reduzida. Ao contrário, deve estar inserida a natureza original e
artificial, bem como os bens culturais correlatos, compreendendo, portanto, o
solo, a água, o ar, a flora, as belezas naturais, o patrimônio histórico, artístico,
turístico, paisagístico e arqueológico, e o meio ambiente do trabalho.”
Contudo, não basta conquistar direitos, precisamos de efetivação dos mesmos,
pois direitos meramente legislados não servem aos anseios dos povos que necessitam, 297
além da previsão legal, da efetivação dos mesmos para que não se constituam apenas em
uma retórica, pois, como diz Bobbio:
“Uma coisa é um direito; outra, a promessa de um direito futuro. Uma coisa
é um direito atual; outra um direito potencial. Uma coisa é ter um direito
que é, enquanto reconhecido e protegido; outra é ter um direito que deve ser,
mas que, para ser, ou para que passe do dever ser ao ser, precisa transformarse, de objeto de discussão de uma assembleia de especialistas, em objeto de
decisão de um órgão dotado de poder de coerção”.9
Pois bem, a aquisição de direitos e seu exercício não podem ser entendidos como
tendo um caráter absoluto e devem ser interpretados de forma compatível com os
interesses gerais da sociedade juridicamente organizada. Faz-se necessário, portanto,
que a ordem jurídica repouse em uma correlação que possibilite a convivência dos dois
mundos: o do indivíduo e o da comunidade.
Assim há necessidade de atuação estatal para que a convivência social seja
harmônica, por meio do exercício do poder de polícia que serviu para caracterizar o
8
GUERRA, Sidney. A tutela constitucional do meio ambiente cultural. Revista de Direito da
Unigranrio, Vol. 4, No 2 (2011). Disponível em <http://publicacoes.unigranrio.edu.br/index.php/
rdugr/article/view/1603> Acesso em 27de janeiro de 2012. p. 12.
9
BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Rio de Janeiro: Campus, 1992. Tradução de Carlos Nelson
Coutinho, p. 83.
O instituto do tombamento como garantidor do patrimônio cultural brasileiro
Estado liberal por “se constituir no máximo de atividade interventiva que lhe reconhecia
o liberalismo burguês.”10
“Por intermédio do poder de polícia, o Estado poderá coibir abusos dos
particulares no exercício de seus direitos. Contudo, não podemos esquecer
de que o poder de polícia que, legalmente, regula e coordena a atividade de
pessoas, também é disciplinado pela norma de direito, à medida que, ao
definir o limite de competência da autoridade, repele e torna ilícito o abuso
de poder, coibindo excessos e arbitrariedades dos agentes da administração
pública no exercício de suas atividades administrativas, de modo que o
desvirtuamento do exercício do poder de polícia seja passível de punição.”
Dos ensinamentos colhidos do Prof. Marcello Caetano, destacamos neste mister:
“A polícia é atuação da autoridade, pois pressupõe o exercício de um poder
condicionante de atividades alheias, garantido pela coação sob a forma
característica da administração, isto é, por execução prévia.
É uma intervenção no exercício de atividades individuais, pois pressupõe
a existência de normas de conduta dos indivíduos e a possibilidade da sua
violação por estes.(...)
A polícia intervém nas atividades individuais susceptíveis de fazer perigar
interesses gerais. Só aquilo que constitua perigo susceptível de projetar-se na
vida pública interessa à polícia, e não o que apenas afete interesses privados
ou a intimidade das existências pessoais.”11
298
Na mesma esteira, seguindo a definição de Santi Romano, Baltazar Gama Barbosa,
fazendo uma análise sobre poder de polícia e direito, anota:
“Na definição de Santi Romano, o eminente professor italiano, chama-se
‘polícia’ a atividade administrativa que, por meio de limitações eventualmente
coativas à atividade privada, é dirigida a prevenir os danos sociais que possam
surgir dessa última, (...)”12
O poder de polícia é assim um poder instrumental da administração pública,
decorrente de norma jurídica, para condicionar e restringir os possíveis abusos de
pessoas físicas ou jurídicas em relação ao Estado e, consequentemente à coletividade, já
que o mesmo atua visando ao interesse desta.
Relativamente aos direitos culturais, como já mencionado anteriormente,
o artigo 215 da Constituição Federal em vigor atribui ao Estado a obrigação de
10
MOREIRA NETO, Diogo Figueiredo. In: Direito administrativo da ordem pública. Rio de Janeiro:
Forense, 1998. p. 67.
11
CAETANO, Marcello. Princípios fundamentais do direito administrativo. Coimbra: Almedina, 1992,
p. 270.
12
BARBOSA. Baltazar Gama. Poder de polícia e direito. In: Revista de Direito Administrativo, out-dez.
1958, p. 14.
Sônia Guerra
garanti-los e, ainda, em seu artigo 216, abrange a natureza dos bens merecedores de
proteção, por integrarem o patrimônio cultural pátrio13.
“Art. 215. O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais
e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e
a difusão das manifestações culturais.
§ 1º – O Estado protegerá as manifestações das culturas populares, indígenas
e afro-brasileiras, e das de outros grupos participantes do processo civilizatório
nacional.
§ 2º – A lei disporá sobre a fixação de datas comemorativas de alta significação
para os diferentes segmentos étnicos nacionais.
§ 3º A lei estabelecerá o Plano Nacional de Cultura, de duração plurianual,
visando ao desenvolvimento cultural do país e à integração das ações do
poder público que conduzem à: (Incluído pela Emenda Constitucional nº
48, de 2005)
I – defesa e valorização do patrimônio cultural brasileiro; (incluído pela
Emenda Constitucional nº 48, de 2005)
II – produção, promoção e difusão de bens culturais; (incluído pela Emenda
Constitucional nº 48, de 2005)
III – formação de pessoal qualificado para a gestão da cultura em suas múltiplas 299
dimensões; (incluído pela Emenda Constitucional nº 48, de 2005)
IV – democratização do acesso aos bens de cultura; (incluído pela Emenda
Constitucional nº 48, de 2005)
V – valorização da diversidade étnica e regional; (incluído pela Emenda
Constitucional nº 48, de 2005)
Art. 216. Constituem patrimônio cultural brasileiro os bens de natureza
material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de
referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupos formadores
da sociedade brasileira, nos quais se incluem:
I – as formas de expressão;
II – os modos de criar, fazer e viver;
III – as criações científicas, artísticas e tecnológicas;
IV – as obras, objetos, documentos, edificações e demais espaços destinados
às manifestações artístico-culturais;
V – os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, artístico,
arqueológico, paleontológico, ecológico e científico.
No âmbito do Estado do Rio de Janeiro, disciplinam o tema: o Decreto-Lei nº
2, de 11 de abril de 1969, que define os bens integrantes do patrimônio cultural e
13
Patrimônio cultural é o conjunto de bens materiais e imateriais que compõem uma memória coletiva
das sociedades.
O instituto do tombamento como garantidor do patrimônio cultural brasileiro
institui medidas para a sua proteção, a Lei nº 509, de 3 de dezembro de 1981, que
dispõe sobre o Conselho Estadual de Tombamento; o Decreto nº 5.808, de 13 de
julho de 1982, que a regulamenta, e do Decreto nº 23.055, de 16 de abril de 1997,
que dispõe sobre a tutela do patrimônio cultural do Estado, no que se refere ao poder
de polícia, controle, sanções e penalidades.
Ainda analisando-se a previsão constitucional, o Estado intervém na propriedade
para que esses objetivos sejam atingidos e, relativamente aos direitos culturais, prevê
no § 1º do artigo 216 da Constituição Federal de 1988, diversos mecanismos para
a preservação do patrimônio cultural brasileiro: inventários, registros, vigilância,
tombamento e desapropriação.
De forma sintética, inventário é o registro de determinados bens pelos órgãos
responsáveis pela proteção do patrimônio histórico e cultural, visando identificar
características importantes que levam à necessidade de sua proteção. Ressaltamos,
contudo que, embora seja instrumento de suma importância, não existe norma
nacional regulamentando-o.
O registro destina-se à preservação do patrimônio cultural imaterial de modo
que o conhecimento retido por determinados indivíduos de grupo específico relevante
culturalmente para nossa sociedade, não se perca com a morte dos mesmos.
Vigilância caracteriza a obrigação de reprimir que os bens tombados sejam
depredados, tanto pelo Estado (quando se tratar de bem público) como pelo particular
proprietário do bem tombado.
A desapropriação, que ao nosso entendimento não é instituto destinado à
preservação,
é a forma interventiva mais drástica, pois retira do proprietário o direito
300
de propriedade que passa a integrar o domínio público. Concordamos contudo que,
se o proprietário do bem não tenha condições de suportar o ônus de um bem que
deve ser preservado, o poder público deverá desapropriá-lo e dar-lhe destinação que
possa servir a este fim.
Tombamento é uma das formas interventivas por meio da qual o Poder Público,
visando preservar o patrimônio cultural brasileiro, impõe limitações ao uso e gozo de
determinado bem. Tal instituto, ao nosso entendimento, de fato atende o propósito de
proteção e preservação de bens móveis ou imóveis, públicos ou particulares, materiais
ou imateriais importantes à nossa sociedade.
Diogo de Figueiredo Moreira Neto assim o conceitua:
“É a intervenção ordinária e concreta do Estado na propriedade privada,
limitativa de direitos de utilização e disposição, gratuita, permanente e
indelegável, destinada à preservação, sob regime especial, de bens de valor
cultural, histórico, arqueológico, artístico, turístico ou paisagístico”14.
O tombamento está disciplinado pelo Decreto-lei nº 25, de 30 de novembro de
1937, que organiza a proteção do patrimônio histórico e artístico nacional, além da
legislação própria de cada Estado e Município.
Pode ser voluntário ou compulsório. No primeiro, existem duas possibilidades:
o proprietário do bem, entendendo que o mesmo possui características relevantes para
14
MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Curso de direito administrativo, Rio de Janeiro: Forense,
1989, p. 3189.
Sônia Guerra
a sociedade solicita-o, ou quando o mesmo venha a anuir no momento em que for
notificado pelo IPHAN15. Caso o proprietário recuse-se a anuir à notificação, dar-se-á
o tombamento compulsório.
Outro aspecto importante a ser ressaltado, é que desde o momento em que o
proprietário do bem a ser tombado é notificado pelo órgão competente pelo tombamento,
denomina-se tombamento provisório, cujos efeitos equiparam-se ao tombamento
definitivo para que desde o início do processo haja a preservação do bem tutelado.
Dentre os diversos efeitos do tombamento, apontamos os seguintes: o bem tombado
não poderá sair do país sem autorização do órgão competente e, caso seja tentada a
exportação da coisa tombada, o responsável responderá na esfera criminal por seu ato16;
os bens tombados não poderão sofrer qualquer alteração, destruição ou demolição sob
pena de punição pecuniária; a vizinhança de um bem tombado não poderá construir
de modo a impedir ou reduzir a visibilidade do bem tombado, tampouco nela colocar
anúncios ou cartazes, sob pena de ser determinada a destruição da obra ou a retirada
do objeto, impondo-se neste caso pena de multa; para que o proprietário possa exercer
o direito à alienação do bem tombado, deverá obedecer ao direito de preferência da
União, Estados e Municípios, nesta ordem, que poderão exercê-lo no prazo de 30 dias da
notificação realizada pelo proprietário, pois, caso o bem seja alienado sem a observância
ao direito de preferência, a alienação será nula, e transmitente e adquirente responderão
solidariamente por pena pecuniária.
Embora o bem passe a ter diversas restrições, o proprietário não perde o direito de
propriedade e, caso não possua recursos para a preservação do bem, deverá comunicar ao
IPHAN a necessidade de obras para sua conservação, que, considerando-as necessárias, 301
mandará executá-las às expensas da União, e, embora exista o direito de preferência, o
proprietário poderá gravar livremente o bem tombado.
A Lei nº 10.257/2001, conhecida como Estatuto da Cidade, prevê a concessão
de incentivos e benefícios fiscais a bens de interesse social e, em função desta proteção,
o IPTU de imóveis tombados poderá ser diferenciado dos demais, desde que estejam
conservados cabendo a cada Município estabelecer o percentual de desconto (e em
alguns casos até a isenção total) do referido imposto.
Após a análise realizada, verificamos que, no ordenamento jurídico pátrio, a
proteção à cultura é de suma importância, de modo que o indivíduo possa deixar como
herança e transmitir valores aos que virão no futuro.
As conquistas de direitos pelo homem, bem como das chamadas liberdades
públicas, se fizeram à custa de lutas durante séculos, devendo refletir um anseio social de
modo que, interiorizadas nos componentes da sociedade, possam ser por eles exigidas.
Diversos mecanismos legais existem no Brasil para viabilizar uma preservação
do patrimônio cultural brasileiro mais eficiente, contudo, não se pode afirmar que tal
proteção esteja sendo efetiva.
Não pretendemos dizer ser tarefa das mais fáceis, mas há que se ter vontade
política para tal.
15
IPHAN – Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional.
Art. 15. Tentada, a não ser no caso previsto no artigo anterior, a exportação, para fora do país, da
coisa tombada, será esta sequestrada pela União ou pelo Estado em que se encontrar.
§ 3º A pessoa que tentar a exportação de coisa tombada, além de incidir na multa a que se referem
os parágrafos anteriores, incorrerá, nas penas cominadas no Código Penal para o crime de
contrabando.
16
O instituto do tombamento como garantidor do patrimônio cultural brasileiro
Em nossa obra Falsificação de remédios e poder de polícia17, já questionávamos,
relativamente ao tema e novamente repetimos: “de que adiantam tantos dispositivos
legais, se o Poder Público, por problemas gerenciais, não consegue fazer atuar o poder
de polícia que possui?”
Não basta o sistema legal direcionado à proteção e à preservação do patrimônio
cultural brasileiro, não basta a existência de órgãos de proteção nos âmbitos federal,
estadual e municipal (quando existem), se diversos bens tombados estão se deteriorando
a cada dia.
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302 CAETANO, Marcello. Princípios fundamentais do direito administrativo. Coimbra: Almedina, 1996.
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