_>>> Jornal Valor Econômico - CAD F - ESPECIAIS - 10/8/2015 (19:27) - Página 4- Cor: BLACKCYANMAGENTAYELLOW Enxerto F4 | Valor | Sábado, domingo e segunda-feira, 8, 9 e 10 de agosto de 2015 Especial | Negócios conectados ADRI FELDEN/ARGOSFOTO Tendências Dispositivos móveis provocam uma transformação cultural Produtos e serviços se unem na nova era do PSS Suzana Liskauskas Para o Valor, do Rio Com a popularização de dispositivos móveis, como smartphones e tablets, a indústria enfrenta uma transformação cultural apresentada pela era do PSS, que vem do termo em inglês Product Service System. Na prática, isso se traduz em empresas que oferecem ao cliente uma combinação de produtos e serviços, um passo além da entrega convencional de produtos, modelo seguido desde a Revolução Industrial. Como exemplos, há a empresa que usa a mobilidade para oferecer um serviço de transporte de passageiros em carros de luxo, sem que tenha um único carro, ou aquela que oferece hospedagem em milhares de cidades espalhadas pelo mundo, sem que seja proprietária de um hotel, pousada ou albergue. João Fernandes Gomes, diretor-presidente da Empresa Brasileira de Pesquisa e Inovação Industrial (Embrapii), diz que a tendência, em um futuro muito próximo, é não haver serviço sem ser suportado por um smartphone. Na visão dele, a comercializa- ção de produtos dará lugar a uma combinação com serviços. Embora afirme que a indústria nacional ainda não está totalmente preparada para essa mudança de patamar, Gomes enxerga, na área de bens de capital, uma grande oportunidade de crescimento com a era do PSS. “Trata-se de uma mudança cultural. Acho que um dos pontos cruciais aqui é a mudança, por exemplo, do ensino das engenharias. O engenheiro contemporâneo é um profissional que olha o mercado, identifica o problema e oferece a solução. A nova engenharia é mais conectada aos mercados e aos questionamentos”, diz o diretor-presidente da Embrapii, que foi criada com a missão de explorar as oportunidades de sinergia entre instituições de pesquisa tecnológica e indústrias. A ideia do PSS, também compreendida como um conjunto de produtos e serviços capaz de suprir as necessidades do usuário, faz parte da era da “lógica dominante de serviços” que, segundo Marcos Cavalcanti, professor de Engenharia de Produção da Coppe/UFRJ e coordenador do Centro de Referência em Inteligên- cia Empresarial (CRIE)/Coppe, é um movimento irreversível. “O principal problema ainda está atrelado à mentalidade da indústria, que precisa mudar. Não há como pensar apenas no produto sem que ele seja entregue com serviço. Os aplicativos estão acelerando essa transformação. Todo usuário de um dispositivo móvel quer conforto e qualidade. Estamos vivendo em uma era em que o serviço vai predominar, e as indústrias precisam se preparar para isso”, afirma Cavalcanti. Para o diretor de Informática da Associação Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), Antonio Hugo Valério Jr., a complementação entre indústria e serviços sempre existiu. “Mas esse ecossistema, em que a experiência do cliente está diretamente ligada ao produto, está se transformando com o desenvolvimento da tecnologia, que coloca a interação nas mãos do cliente. O serviço sempre existiu, como numa ação pós-venda, mas de uma maneira menos densa. O grande desafio da indústria no sentindo de melhorar a experiência do cliente é inovação e a mudança da cultura. A mão de obra tem que evoluir para lidar com esse novo mundo”, afirma. Segundo Marcelo Toledo, Chief Growth Officer da Pontomobi, a indústria precisa usar toda uma camada de inteligência que a tecnologia oferece para entender o desejo dos consumidores. Com mais de 25 anos de experiência em empresas de tecnologia, indústria e serviços, Toledo ingressou na Pontomobi com a missão de orientar o desenvolvimento de soluções (apps e serviços) que ajudem as empresas em seus processos de negócios. “O segmento dos aplicativos vem se expandindo muito rápido. Acho bastante provável as previsões que indicam uma escassez de mão de obra para desenvolver apps até o fim de 2017”, diz. Paulo Fraccaro, superintendente da Associação Brasileira da Indústria de Artigos e Equipamentos Médicos, Odontológicos, Hospitalares e de Laboratórios (Abimo), diz que o casamento entre produtos e serviços, além de ser uma tendência irreversível, traz para a área médica uma real oportunidade de avançar na eficiência com a redução de custos. “No final de julho, a Agência Gomes, da Embrapii: tendência é não haver serviço sem suporte de smartphone Brasileira de Desenvolvimento Industrial (ABDI) reuniu representantes da área de saúde — médicos e administradores de hospitais—, indústria e área acadêmica para discutir as tecnologias mais adequadas para aplicações de telemedicina. O casamento da indústria médica com serviços já é uma realidade no Brasil. Temos indústrias que produzem incubadoras totalmente controladas por painéis digitais. Outro exemplo são cadeiras para pacientes odontológicos controladas por tablets”, completa Fraccaro. Lauro Miquelin, arquiteto e sócio diretor da L+M, empresa especializada em projetos para a área de saúde, alerta que, apesar de termos as tecnologias disponíveis, é preciso avançar na integração da indústria com a área Tecnologia da Informação e Comunicação. Ferramenta melhora busca por eficiência logística Vivian Soares Para o Valor, de São Paulo Em um país de dimensões continentais e com cidades cada vez mais afetadas por problemas de mobilidade, buscar eficiência nos processos logísticos é uma das apostas da indústria de bens de consumo para reduzir custos e aumentar vendas. Nos últimos anos, empresas de setores como alimentos e bebidas vêm investindo em tecnologia para otimizar resultados, antevendo as necessidades dos clientes e traçando rotas inteligentes de entrega de produtos. A ferramenta que muitas indústrias vêm utilizando para solucionar os desafios da cadeia de suprimentos é o DSD (Direct Store Delivery, ou Entrega Direta na Loja, em português). Trata-se de um sistema que une planejamento de vendas, rota de entregas e recebimento de faturas, com foco principalmente em pequenos varejistas como bares, restaurantes, padarias e até bancas de revista. Na prática, a indústria conta com motoristas-vendedores, que saem da fábrica direto para as ruas, sem precisar passar por centros de distribuição. O modelo não é novo e remonta aos tempos em que pequenos fabricantes vendiam seus produtos diretamente aos varejistas. A tecnologia permite, porém, mais rapidez e eficiência no processo: munidos de smartphones conectados à Internet, os vendedores saem para o dia de trabalho com rotas de visitas pré-definidas, conjunto de produtos adequado para cada um de seus clientes e capacidade de receber pagamentos e emitir notas fiscais. Por trás de uma ideia aparentemente simples, existe um grande trabalho de inteligência de mercado, afirma Daniel Bio, gerente de desenvolvimento de ne- gócios da SAP, empresa de tecnologia que oferece o serviço. “O DSD ajuda a empresa a prever os produtos que serão colocados no caminhão, com base em dados como histórico de demanda, de consumo, tipo de população que se abastece naquele pequeno varejo e até apelo publicitário de certos itens”, explica. Conectando vendedores à fábrica, o DSD permite que eles consultem o relacionamento financeiro do cliente, mudanças de roteiro e possíveis descontos que podem ser concedidos no momento da venda. Wally Niz, engenheiro de soluções da Spring Mobile Solutions, empresa que lança o serviço DSD este ano no Brasil, explica que o sistema evoluiu muito no país com a nota fiscal eletrônica. “O Brasil ainda não é uma grande potência em utilização de automação de processos em negócios, mas a redução da burocracia fiscal abre portas para o crescimento de produtos como o DSD”, diz. Uma das vantagens, segundo ele, é reduzir custos com distribuidores. “Hoje, estimamos que 80% das indústrias de pequeno e médio porte e 40% das grandes utilizem esses intermediários”, afirma. O aplicativo de venda direta permite que o vendedor interno seja mais eficiente e que a empresa reduza a necessidade do distribuidor no processo comercial. Na Pepsico, já são 2300 os caminhões de entrega direta utilizando o sistema, afirma o diretor de transportes Daniel Pires. “Não precisamos passar por centro de distribuição, conseguimos otimizar a carga, as carretas são rastreadas e podemos até prever horário de chegada nos clientes”, diz, enumerando as vantagens da ferramenta. Além do DSD, a empresa investe ainda no siste- ma de monitoramento on-line de entregas. “O futuro da logística, seja pelo cenário de tráfego nas grandes cidades, seja pela necessidade de personalização de atendimento ao cliente, necessita de tecnologia”, afirma. As dificuldades, porém, não estão somente nas metrópoles, afirma Wally Niz, da Spring. Segundo ele, enquanto em cidades como São Paulo a definição de rotas é um ponto crítico, em varejistas localizados no interior ou áreas de difícil acesso, a complexidade está no planejamento de produtos que seguirão no caminhão, para que não haja devoluções ou necessidade de viagens subsequentes. Daniel Bio, da SAP, relembra que, por ser uma tecnologia de venda direta ao varejista, o DSD tem uma limitação de quilometragem. “Os custos com combustíveis e do próprio desgaste do veículo inviabilizariam a sua . DIVULGAÇÃO Aplicativos móveis ampliam o alcance de demandas corporativas Ana Luiza Mahlmeister Para o Valor, de São Paulo Com mais de 50 milhões de smartphones, o Brasil tem desenvolvido aplicativos móveis que facilitam o gerenciamento e a interação com os consumidores. Geralmente o programa é criado para atender necessidades concretas do dia a dia do negócio, como é o caso da Limpidus, rede de franquias de limpeza corporativa que tem 3 mil clientes e criou o Clean Check para o acompanhamento do trabalho de seus funcionários. O aplicativo calcula o tempo de atividade em cada ambiente e emite etiquetas de QR Code que são fixadas em pontos estratégicos do empreendimento, como salas de reunião, banheiro e recepção. Assim que termina de fazer a faxina naquele cômodo, o profissional lê o QR Code com o seu celular e dá baixa na atividade. É possível checar se a limpeza foi feita na ordem prevista e em quanto tempo. “Caso o funcionário falte, o supervisor tem a informação imediata e pode alocar outra pessoa para o local”, explica o presidente da Limpidus, Fernando Sodré. Com uma rede de 106 franquias no Brasil, a ferramenta permite saber quanto custa o serviço por hora além de acompanhar o que está sendo feito em tempo real. “Outra vantagem é que o trabalho pode funcionar com o menor nível de supervisão, eliminando custos indiretos”, afirma o presidente da Limpidus. A rede francesa de lavanderias 5àSec usa a ferramenta para atrair clientes. Ao baixar o aplicativo no smartphone é possível encontrar facilmente uma das suas 420 lojas espalhadas pelo Brasil. Além de informar a unidade mais próxima por meio de um sistema de geolocalização, o cliente tem acesso a um resumo da tabela de preços dos serviços disponíveis e pode comparar com a concorrência. Em torno de 1,7 mil clientes já baixaram o aplicativo e a meta da rede é alcançar 5 mil clientes. “Muitos de nossos clientes são pessoas mais idosas, que têm pouca familiaridade com a ferramenta”, afirma Sérgio Souza Carvalho, diretor de expansão da 5àSec. Depois da fase de lançamento e divulgação, a empresa está acrescentando novas ferramentas como o pedido de recolhimento de roupas em casa e o aviso de que as roupas estão prontas por SMS que deve evoluir para a comunicação por WhatsApp. A mobilidade também está transformando o Serviço de Apoio ao Consumidor (SAC) aposentando o “velho” 0800. O WharSAC, lançado pela fabricante de software Peopleway, permite o envio de reclamações e pedidos de informações por meio da troca de mensagens gratuitas através dos smartphones entre as empresas e seus clientes. Com um ano e meio de operação, conta com 33 empresas cadastradas, mais de 20 mil downloads e 37,9 mil atendimentos no período. Além de ser instantânea, a conversa é privada e todo o histórico fica armazenado no aplicativo do consumidor e no ponto de atendimento da empresa que pode agregar outros serviços como vídeos, troca de arquivos e geolocalização, explica o diretor executivo da Peopleway, Alexandre Juliani. Monitorar as entregas de produtos foi o objetivo da Whirlpool, dona das marcas Consul e Brastemp, para implantar o aplicativo Last Mile em seus parceiros de logística. “Tínhamos as informações da saída à entrega final, mas nenhum dado sobre o processo de transporte da mercadoria. No caso de falha da entrega, a fábrica recebia a informação tarde demais para interferir”, diz diretor de Logística da Whirlpool Latin America, Joel Queiroz. utilização para longas distâncias”, diz. Ele explica que, nestes casos, outras técnicas de distribuição devem ser associadas à ferramenta, normalmente utilizando centros de distribuição próprios ou terceirizados. Atender os mais de 700 mil pontos de venda dos clientes em todo o Brasil é um dos maiores desafios para a indústria de alimentos Mondelez International. O diretor nacional de vendas da empresa, Augusto Lemos, explica que o avanço em tecnologia em vendas é uma prioridade global para a empresa, que há dez anos trabalha com o sistema DSD. “Focamos em categorias como gomas, balas e chocolates principalmente para atender lojas menores em cidades e bairros com alta concentração de demanda”. A utilização da ferramenta, segundo Lemos, aumenta as vendas de 5% a 15% e reduz custos em até 10%. Manuella Bossa, que abriu unidade da Truss em Boca Raton : trabalho dos vendedores acompanhado por WhatsApp Celular é chave para a produtividade De São Paulo O smartphone é um importante instrumento gerencial nas mãos da empresária Manuella Bossa, criadora da Truss Cosmetics, fabricante de cosméticos profissionais para cabelo, com fábrica em São José do Rio Preto (SP). A recente abertura de uma subsidiária em Boca Raton, nos Estados Unidos, obrigou a empresária a gerenciar a equipe brasileira, com 85 funcionários, e os distribuidores americanos de forma totalmente remota. “A mobilidade é chave para nossa produtividade”, destaca a CEO da Truss que teve um faturamento de R$ 60 milhões no ano passado. Por meio de mensagens por WhatsApp, Manuella acompanha o trabalho dos vendedores do Brasil e dos cinco distribuidores nos Estados Unidos, negocia metas e define datas de faturamento dos produtos. “Aos poucos fui organizando todos os departamentos em grupos para que eles se comuniquem entre si e comigo”, diz Manuella. A preocupação com a tecnologia vem desde a criação da empresa, em 2003, quando contratou um link dedicado de Internet. “A co- nexão entre os funcionários sempre foi uma das minhas maiores preocupações”, afirma. De acordo com ela, a experiência mostrou que o trabalho rende mais quando ela está fora do escritório. “Se estou presente, converso com uma pessoa por vez. Pelo smartphone me comunico de forma grupal, envio informações e tenho retornos imediatos”, afirma. De seu celular a executiva acessa uma plataforma de vendas que permite acompanhar o desempenho por funcionário, alcance de metas e o nível dos estoques. (ALM)