O PROCESSO DE IMPLEMENTAÇÃO DO FUNDEB NA REDE MUNICIPAL DE
ENSINO DE SANTA CRUZ DO SUL-RS E OS RECURSOS FINANCEIROS QUE
SERÃO DESTINADOS ÀS EMEIs DESTE MUNICÍPIO: UM ESTUDO DE CASO
Rosa Maria Schneider – UNISC
[email protected]
Resumo: Este trabalho tem como tema central o processo de implementação do FUNDEB na rede
municipal de ensino infantil do município de Santa Cruz do Sul-RS. O estudo sobre o Fundo e a
coleta de informações realiza-se através de grupos de discussão e pesquisa, no intuito de verificar se
há melhoria na qualidade de ensino.
Palavras-chave: Fundeb; financiamento; educação infantil.
INTRODUÇÃO
O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização
dos Profissionais de Educação (FUNDEB) foi criado para substituir o Fundo de Manutenção
e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério (FUNDEF).
Enquanto o FUNDEF destinava-se exclusivamente ao Ensino Fundamental, o FUNDEB,
conforme a Legislação, vai financiar toda a Educação Básica. Ele envolve as três etapas da
educação básica, ou seja, as etapas da Educação Infantil (creches para crianças de 0 a 3 anos
e pré-escola para crianças de 4 a 6 anos), do Ensino Fundamental e Ensino Médio, além das
modalidades de ensino que são: Educação de Jovens e Adultos, Educação Profissional e
Educação Especial e Quilombolas.
Assim como o FUNDEF, o FUNDEB destina parte da receita de impostos estaduais e
municipais para 27 fundos contábeis estaduais. Os recursos retornam aos Estados e aos
Municípios, conforme o número de matrículas existentes em suas redes de ensino. Devido às
profundas desigualdades econômicas entre Estados e regiões do País, a União exerce um
importante papel distributivo. Assim, em janeiro de cada ano, a União decreta um valor de
investimento mínimo por aluno, abaixo do qual nenhum Estado deverá ficar. Os Estados que
estiverem abaixo desse valor recebem uma complementação para que alcancem o valor
mínimo nacional por aluno.
Registre-se que, com a implantação do FUNDEB, o contingente de beneficiários será
de acordo com dados do censo escolar de 204, de 48 milhões de alunos, e os recursos da
ordem de R$ 5O bilhões no quarto ano de vigência (em valores de 2005); dos quais R$ 4,5
bilhões são provenientes da União. Assim, a educação básica, pela primeira vez no País, terá
um aporte de recursos significativo assegurado automaticamente.
A incapacidade de atender as demandas do setor educacional do Brasil tem levado o
Governo a propor reformas que revelam mais as dificuldades para promover mudanças no
setor do que sua efetiva transformação. A Constituição, mesmo garantindo recursos à
educação brasileira, apresenta políticas públicas bastante ineficazes que não atendem toda a
faixa etária em idade escolar. O exemplo disto é o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento
do Ensino Fundamental (FUNDEF)1, que mudou apenas uma parte da estrutura de
financiamento deste sistema.
O que temos observado é que os planos de carreira dos municípios não atenderam as
reivindicações do magistério. Os salários continuam baixos. Mas muitos consideram a
educação como área privilegiada, pois as fontes de recursos para o financiamento da
educação é vínculo constitucional. A Constituição de 1988 estabelece o principal mecanismo
de financiamento da educação, pois determina as despesas compulsórias realizadas pelos três
níveis de poder. Já o salário-educação é uma contribuição social especificadamente criada
para a manutenção do sistema educacional público.
O FUNDEF vigorou até o final de 2006. Em 6 de dezembro de 2006 foi aprovado o
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais de Educação (FUNDEB)2. A fase de transição FUNDEF/FUNDEB promete
grandes mudanças na educação brasileira, considerando o aumento de recursos para a
garantia da Educação Básica a todos.
Monlevade (2004) afirma que a viabilidade do FUNDEB depende de uma maior
disponibilidade geral de recursos para a educação. “Temos de sair do patamar dos 5% para
7% do PIB, conforme o Plano Nacional de Educação. Ou até mais, num primeiro momento,
para viabilizar o pagamento da grande dívida social na Educação Infantil e na EJA”.
Nosso projeto acompanha o processo de transição FUNDEF-FUNDEB no município
de Santa Cruz do Sul, particularmente no que se refere às verbas destinadas ao ensino infantil
e as melhorias que a mesma poderá propiciar. A escolha do município de Santa Cruz do Sul
justifica-se porque, a partir da pesquisa realizada sobre “o Financiamento da Educação
1
2
Instituído pela Emenda Constitucional nº. 14/96.
Instituído pela Emenda Constitucional nº. 53/06.
Infantil e do Ensino Fundamental nos municípios do Vale do Rio Pardo-RS: um estudo das
fontes e do uso dos recursos”, que ao estudarmos seis municípios do Vale do Rio Pardo e ao
compararmos Santa Cruz do Sul com os demais municípios da amostra, este era tomado
como referência devido ao seu desenvolvimento em relação aos demais.
Há alguns pressupostos básicos na discussão sobre a transição FUNDEF/FUNDEB: o
conceito de Educação Básica compreende a Educação Infantil, o Ensino Fundamental e o
Ensino Médio, em todas as suas modalidades; a reconhecida necessidade de se redesenhar a
política do financiamento da educação no país; e que o financiamento da Educação Básica
deverá ser realizado por meio de um fundo contábil único, o FUNDEB.
No entanto, para a implantação e implementação do FUNDEB, a grande preocupação
é a necessidade de “dinheiro novo” para sua composição, pois os recursos do FUNDEF não
são suficientes. Mas não podemos esquecer que o FUNDEF obteve alguns êxitos. Monlevade
(2004) aponta alguns desses êxitos:
a)
Por meio do mecanismo de distribuição dos 15% vinculados pelo
critério de rematrículas em cada rede, diminuiu drasticamente as diferenças
de custo-aluno entre governo estadual e municípios, dando, na maioria dos
casos, vantagens para os Municípios (que tinham menos arrecadação e mais
encargos);
b)
Por meio da sub-vinculação de 60% dos recursos gerados pelos
alunos para o pagamento de professores em exercício, protegeu o nível de
salário do magistério, propiciando, inclusive, grandes aumentos onde as
remunerações eram irrisórias e incentivando a prática gerencial de uma
relação maior “alunos por professor”;
c)
Por meio das contas específicas no Banco do Brasil e da formação de
Conselhos de Acompanhamento e Controle, aumentou a transferência do
financiamento e diminuiu os desvios das verbas vinculadas.
Estes mecanismos de êxito não devem se perder na implantação do FUNDEB. É
importante ressaltar que o FUNDEB foi criado para corrigir a desigualdade na distribuição
dos recursos entre Estados e Municípios; para estabelecer um valor mínimo nacional por
aluno. Igualmente, o Fundo se sustentou numa formidável construção de “marketing” com
três apelos:
- Eqüidade (verbas mal distribuídas serão corrigidas entre Estado e Município);
- Justiça: não se pode mais tolerar professor recebendo salários de fome;
- Competência realista: a fórmula do fundo garante que, sem desvio de verbas os
professores recebam um salário médio (mínimo nos Estados pobres e até o dobro nos Estados
ricos).
Apesar de tudo isto, os desvios aconteceram, provando que a fiscalização não foi
suficiente. Uma das causas é o desconhecimento dos professores e da população em geral
sobre o assunto. A população deveria fiscalizar, acompanhar o trabalho do Conselho e a
evolução do ensino no município. Dessa forma, as irregularidades seriam apresentadas ao
Conselho do FUNDEF, Ministério Público, Tribunal de Contas do Estado ou ao Ministério da
Educação.
Enfim, o FUNDEF, implantado em todo o país em 1988, atendeu apenas o Ensino
Fundamental. Os demais segmentos da Educação Básica não dispuseram de um mecanismo
de financiamento que assegurasse a elevação do atendimento, de modo a propiciar o alcance
do nível desejado de inclusão com qualidade, em toda a Educação Básica. Portanto, uma
política de financiamento compatível com essa perspectiva tornou-se imprescindível. O
FUNDEB tem esse objetivo.
A 20 de junho de 2007 foi sancionada a Lei Nº 11.494/2007, que regulamenta o
Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos
Profissionais da Educação – FUNDEB, que tem por objetivo proporcionar a elevação e uma
nova distribuição dos investimentos em educação. Esta elevação e nova distribuição está
ocorrendo devido às mudanças relacionadas às fontes financeiras que o formam, ao
percentual e ao montante de recursos que o compõem.
Com as modificações que o FUNDEB oferece, o novo Fundo deve atender não só o
Ensino Fundamental [6/7 a 14 anos], como também a Educação Infantil [0 a 5/6 anos], o
Ensino Médio [15 a 17 anos] e a Educação de Jovens e Adultos, esta destinada àqueles que
ainda não têm escolarização, aos que não completaram o ensino fundamental até os 14 anos e
o ensino médio até os 18 anos. O FUNDEF, em vigor até o fim de 2006, investiu apenas no
Ensino Fundamental nas modalidades regular e especial. Já o FUNDEB surge com uma lei
que garantirá recursos à Educação Básica e que, portanto, possibilitará completar esse nível
de ensino a todos os brasileiros, da creche ao final do Ensino Médio, inclusive àqueles que
não tiveram acesso à educação em sua infância.
O FUNDEB terá vigência de 14 anos, a partir do primeiro ano da sua implantação,
que se dará de forma gradual em três anos, quando então o FUNDEB estará plenamente
implantado, com 20% das receitas de impostos e transferências dos Estados e Municípios
(cerca de R$ 51 bilhões) e de uma parcela de complementação da União (cerca de R$ 5,0
bilhões). O universo de beneficiários do FUNDEB é da ordem de 48 milhões de alunos da
Educação Básica.
Monlevade (2004) aponta um complicador para os municípios com a composição do
FUNDEB. Além da cesta de transferências constitucionais, o fundo abrange 25% da receita
tributária própria dos municípios: IPTU, ISS, ITBI e IRRFSM. Atualmente, cada município
já tem de aplicar a receita de impostos vinculados em MDE (Manutenção e Desenvolvimento
de Ensino); com o FUNDEB, eles saem dos municípios e voltam na proporção de suas
matrículas na Educação Infantil e Ensino Fundamental.
Os recursos para a educação poderiam contar não somente com impostos, mas com
todos os tributos, ou seja, todo o orçamento ter o percentual de 20%, no mínimo, vinculado à
educação. Essa é a vinculação dos recursos ao MDE do Paraguai; no art. 85 da Constituição
de 1992. Poderíamos pensar nesta possibilidade. Por que não?
Neste período de transição, é fundamental a participação ativa dos conselhos
municipais de educação, cuja criação ou consolidação conta com o apoio do MEC. Da mesma
forma, o Ministro da Educação do Estado, Fernando Haddad, no ofício circular de 17/06,
convida todos os municípios brasileiros a elaborarem e aperfeiçoarem seus planos municipais
de educação, com vistas à ampliação do atendimento e ao fortalecimento da educação básica,
desde a Educação Infantil até o Ensino Médio.
Consideramos que a implementação do FUNDEB no Brasil, resguardadas as
discussões e disputas de setores que tinham outras propostas, é uma política de financiamento
superadora da política que existia anteriormente, chamada FUNDEF. Consideramos ainda
que o FUNDEB é um tipo de política social como são em geral as políticas educacionais. É
uma política de investimento na educação na tentativa de desenvolvê-la de forma eqüitativa e
qualitativa. Como uma política de maior investimento na educação situa-se no aspecto que
corresponde às bases da educação, para que suas diretrizes sejam atingidas e superem a mera
proclamação de boas intenções para com aquilo que consideramos fundamental no
desenvolvimento de uma sociedade: a formação das futuras gerações desde a infância.
Os municípios em geral têm sob sua responsabilidade a educação infantil e o ensino
fundamental. Se nos propomos a estudar o processo de implantação do FUNDEB em um
município do Vale do Rio Pardo, que é Santa Cruz do Sul, nossa atenção se volta
fundamentalmente para uma dessas etapas de ensino.
Estamos atentas às políticas públicas, sociais, educacionais, como requer nossa
profissão e nosso trabalho desenvolvido em uma universidade. Atentas às discussões em sala
de aula com nossas alunas, muitas delas professoras de EMEIs de Santa Cruz do Sul, cremos
que é urgente um maior aporte de recursos para essa etapa de ensino.
Nosso problema de pesquisa (objeto de estudo) se expressa da seguinte forma:
Como está sendo o processo de implementação do FUNDEB no município de Santa
Cruz do Sul-RS no ano de 2007, no que se refere ao financiamento da educação infantil?
Ao delimitar nosso problema de pesquisa, colocamos ainda como questão norteadora
a seguinte pergunta:
Os recursos do FUNDEB destinados a educação infantil do município de Santa Cruz
do Sul serão suficientes para melhorar a qualidade dessa etapa de ensino?
Os aspectos que consideramos essenciais para a melhoria da qualidade da educação
infantil são:
z a formação e a valorização dos professores das EMEIs;
z a melhoria das condições materiais das escolas de educação infantil;
z o número de professores formados especificadamente para essa etapa de ensino e
nomeados para trabalhar nas EMEIs;
z o acesso e a permanência das crianças de 0 a 5 anos, independente da forma de
trabalho dos pais, nas Escolas de Educação Infantil.
Quanto à metodologia da pesquisa, a população é constituída por professores e
funcionários da secretaria de educação do município, por professores e atendentes das escolas
de educação infantil e pelo Conselho de Acompanhamento e Controle Social do FUNDEB.
O quantitativo será fundamental para nós no que se refere ao aporte de recursos para o
financiamento da educação como um todo e particularmente os destinados às EMEIs do
município de Santa Cruz do Sul, mas não na delimitação da população a ser pesquisada, pois
esse aspecto da pesquisa depende de fatores que as vezes independem de nossa prévia
determinação.
A coleta das informações de dá através de grupos de discussão com gestores da
secretaria de educação do município, com os professores e atendentes das escolas de
educação infantil e, quando possível, com pais de alunos das EMEIs do município. Também
usamos como técnicas fundamentais a observação semi-estruturada, a entrevista semi-dirigida
e a análise dos documentos.
Compreendemos que os aspectos quantitativos em unidade com os aspectos
qualitativos contribuem para o processo de descrição, explicação, interpretação e
compreensão do fenômeno focalizado. Essa unidade é valiosa para nosso estudo.
Apoiamos-nos ainda na Legislação e nas informações existentes sobre as políticas
públicas para a educação, com a intenção de clarear nossas concepções sobre o tema mais
geral: financiamento da educação, e o tema mais específico: educação infantil.
O ponto de partida de nosso estudo a pesquisa realizada na UNISC sobre
"Financiamento da Educação Infantil e do Ensino Fundamental nos municípios do Vale do
Rio Pardo-RS: um estudo das fontes e do uso dos recursos", em que é apontado o município
de Santa Cruz do Sul como referência entre os municípios do Vale do Rio Pardo-RS, tanto
pela baixa taxa de analfabetos, valorização dos professores e desempenho dos alunos.
CONCLUSÃO
Enfim, após um ano da vigência do FUNDEB, temos pouco a relatar sobre a aplicação
deste Fundo nas escolas municipais de educação infantil, foco do nosso estudo em Santa Cruz
do Sul. Inúmeras dificuldades nosso grupo tem encontrado para coletar os dados necessários
à pesquisa.
O Plano Plurianual, as Diretrizes Orçamentárias e os Orçamentos Anuais são
realizados por alguns sem nenhuma participação dos interessados. Assim, não conseguimos
ter claro se as metas do PPA para a educação estão sendo cumpridas. Nem tão pouco
sabemos quais as ações para a educação a Lei Orçamentária determinou para 2008 e atingir
as metas fixadas no PPA e LDO. Infelizmente, a participação popular no processo de
planejamento das metas não aconteceu.
Nas reunião do Conselho de Acompanhamento e Controle Social do FUNDEB de
Santa Cruz do Sul não há maiores esclarecimentos sobre a aplicação dos recursos. Apenas
são apresentados dados gerais. A justificativa é que os recursos do FUNDEB não são
suficientes para o pagamento da folha dos professores, que alcançam 109,04% do Fundo.
Parece faltar o equilíbrio fundamental no orçamento, já que foi gasto mais do que o
arrecadado. Entendemos que os déficits, quando colecionados, são danosos para o município,
comprometendo o futuro. Ainda não foi possível discutir este assunto com o secretário
municipal, nem com a equipe de conselheiros.
A principal preocupação do grupo de pesquisa é quanto aos professores, que
praticamente inexistem nas escolas infantis. São 461 monitoras, a maioria com apenas ensino
fundamental, e apenas 23 professores para atender 2415 crianças. Em 2006 houve um
concurso público, mas somente cinco professores foram nomeados para a educação infantil.
Outro problema grave é a falta de material didático para as crianças, como livros,
brinquedos e jogos. Até o dado momento, a implementação dos recursos do FUNDEB não
causou nenhuma melhoria na educação infantil.
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