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CARTA DE SÃO PAULO SOBRE O
DESAPARECIMENTO FORÇADO DE PESSOAS
Os participantes do Congresso Internacional de Direitos Humanos, Meio Ambiente e
Cultura, que contou com as participações do
Prof. Tullio Scovazzi, professor de Direito Internacional da Universidade Milano-Bicocca
na Itália, do Prof. Paulo Affonso Leme Machado, jurista e professor doutor da Faculdade de Direito da UNIMEP e dos debatedores André de Carvalho Ramos, Procurador Regional da República e Professor Doutor e livre-docente de Direito Internacional
da Faculdade de Direito da USP e Flávia
Piovesan, Procuradora do Estado de São Paulo e Professora Doutora de Direito Constitucional e Direitos Humanos da PUC/SP, em
painel sobre a Convenção da Organização das
Nações Unidas sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas presidido por Felipe Locke
Cavalcanti, Promotor de Justiça e membro
do Conselho Nacional de Justiça, realizado
no dia 04 de setembro de 2008, na sede da
Procuradoria Regional da República da 3ª
Região, em São Paulo-SP, após debaterem em
oficina de trabalho, coordenada por Jefferson
Rodrigo do Nascimento, Mestrando da
FADUSP e membro da Diretoria do Núcleo
de Estudos Internacionais do Largo São
Francisco e por Sandra Akemi Shimada
Kishi, Procuradora Regional da República e
Professora do Curso de Especialização em
Direito Ambiental da UNIMEP, e, tendo reconhecido tal temática como assunto jurídico merecedor de tutela e de ações que com-
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batam o desaparecimento forçado de pessoas
e garantam a efetividade na luta em prol da
dignidade da pessoa humana, como marco
desse evento,
Considerando a obrigação imposta aos Estados pela Carta das Nações Unidas de promover o respeito universal, a observância dos direitos humanos e das liberdades fundamentais e
a relevância jurídica do desaparecimento forçado de pessoas, que constitui não apenas crime,
mas crime contra a humanidade, segundo o direito internacional,
Considerando que o Estado brasileiro é regido pela prevalência dos direitos humanos, conforme o artigo 4º da Constituição Federal de
1988 e que a dignidade da pessoa humana constitui fundamento da República Federativa do
Brasil, tendo como objetivos primordiais, a construção de uma sociedade livre, justa e solidária,
aliada à promoção do bem estar de todos, sem
quaisquer discriminações;
Considerando que o Brasil aceitou a jurisdição do Tribunal Penal Internacional, consoante o artigo 5º, §4º, da Constituição Federal,
cujo Estatuto de Roma prevê a punição ao crime contra a humanidade.
Considerando que o desaparecimento forçado de pessoas afeta desastrosamente não apenas a vítima mas toda a sua família, toda a sociedade e suas instituições, gerando com o desaparecimento uma grave situação, pior que a morte, contribuindo para a difusão de repetições e
permanência da violência no meio social, sendo
que a impunidade nestes casos sonega das vítimas o direito à justiça e à reparação;
Considerando que o artigo 2º da Convenção da ONU sobre o Desaparecimento Forçado
de Pessoas define “desaparecimento forçado”
como a prisão, detenção, rapto ou qualquer forma de privação da liberdade por agentes do Estado ou de pessoas ou grupos agindo com autorização, apoio ou inaceitável aquiescência do
Estado; e a subseqüente recusa em admitir a privação de liberdade ou a ocultação do destino ou
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paradeiro da pessoa desaparecida, privando o
desaparecido de proteção da lei;
Considerando que toda vítima tem o direito
à informação e à verdade sobre as circunstâncias de um desaparecimento forçado e sobre o
destino da pessoa desaparecida, além do direito
à liberdade para procurar, receber e compartilhar informações sobre o paradeiro do desaparecido e a veracidade dos fatos, sendo que Brasil deve adotar todas as medidas apropriadas para
procurar, localizar e entregar as pessoas desaparecidas e, na eventualidade de morte, localizar, respeitar e entregar seus restos mortais;
Considerando a possibilidade de mitigação
das sanções penais sempre que os envolvidos
na prática de desaparecimentos forçados contribuírem para o retorno da vítima viva ou, quando isso não for mais possível, para o esclarecimento dos casos de desaparecimentos forçados,
inclusive pela identificação de seus autores e
partícipes;
Considerando que as reparações às vítimas
pelo desaparecimento forçado devem abranger
medidas que tenham como objetivo a restituição, reabilitação, satisfação e garantias de nãorepetição, abrangendo medidas que restabeleçam
a dignidade e a reputação;
Reafirmando que o Brasil assinou a Convenção Interamericana sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, adotada pela Assembléia
Geral da Organização dos Estados Americanos,
em Belém do Pará, em 9 de junho de 1994, e
ainda, que ratificou e promulgou diversos instrumentos internacionais de Direitos Humanos
que guardam similitude com a Convenção da
ONU sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas;
Reafirmando que em virtude da obrigação
do Estado nacional perante os instrumentos de
proteção dos direitos fundamentais da pessoa
humana já possibilitariam sua responsabilização
por desaparecimentos forçados; e
Considerando, por fim, que o desaparecimento forçado de pessoas constitui violação aos
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direitos e garantias previstos do art. 5º, incisos
LXI, LXII, LXIII, LXIV, LXV e LXVI da Constituição Federal;
Os participantes do Congresso Internacional de Direitos Humanos, Meio Ambiente e
Cultura, convencidos da urgência em adotar
medidas apropriadas para combater o desaparecimento forçado de pessoas, concluem
1. que o Poder Público, o Ministério Público, a
sociedade civil e os órgãos de proteção dos
direitos humanos no Brasil devem promover
efetivas medidas que realcem a urgente necessidade do Brasil assinar e o Congresso
Nacional ratificar a Convenção da Organização das Nações Unidas Sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas, de acordo com
o procedimento descrito no Art. 5º, §3º, da
Constituição da República Federativa do
Brasil;
2. que o Poder Público e o Ministério Público
adotem políticas públicas voltadas à educação e à conscientização de agentes públicos
e privados para a promoção e divulgação dos
princípios e regras previstos na Convenção
sobre o Desaparecimento Forçado de Pessoas
e demais acordos internacionais ratificados
pelo Brasil na defesa dos Direitos Humanos;
3. que o Poder Público deve garantir o direito à
verdade, assegurar o direito à informação e
facilitar a reparação material e moral diante
da responsabilidade pelos danos causados
pelo desaparecimento forçado;
4. que os Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário e o Ministério Público devem zelar
para que as políticas de segurança pública sejam pautadas no princípio da dignidade da
pessoa humana, de modo que todas as formas de detenção, medidas cautelares restritivas de liberdade ou penas de encarceramento
respeitem os ditames estabelecidos no
ordenamento jurídico e nessa Convenção, visando a afastar toda e qualquer conduta que
configure a prática de desaparecimento forçado.
São Paulo, 4 de setembro de 2008.
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