ISABEL DE OLIVEIRA E SILVA MONGUILHOTT ESTUDO SINCRÔNICO E DIACRÔNICO DA CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NO PB E NO PE Tese de Doutorado Curso de Pós-Graduação em Lingüística Universidade Federal de Santa Catarina ISABEL DE OLIVEIRA E SILVA MONGUILHOTT ESTUDO SINCRÔNICO E DIACRÔNICO DA CONCORDÂNCIA VERBAL DE TERCEIRA PESSOA DO PLURAL NO PB E NO PE Tese apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Lingüística da Universidade Federal de Santa Catarina como requisito parcial à obtenção do título de Doutor em Lingüística. Orientadora: Profa Dra Izete Lehmkhul Coelho (Universidade Federal de Santa Catarina) Co-orientadora no exterior: Profa Dra Ernestina Carrilho (Universidade de Lisboa) FLORIANÓPOLIS 2009 Esta tese foi julgada adequada para a obtenção do título de Doutor em Lingüística E aprovada em sua forma final pelo Programa de Pós-Graduação em Lingüística pela Universidade Federal de Santa Catarina BANCA EXAMINADORA ______________________________________________________________________ Profa. Dra. Izete Lehmkuhl Coelho (Universidade Federal de Santa Catarina) – orientadora ______________________________________________________________________ Profa. Dra. Maria Marta Pereira Scherre (Universidade Federal do Espírito Santo/Universidade de Brasília) ______________________________________________________________________ Profa. Dra. Silvia Rodrigues Vieira (Universidade Federal do Rio de Janeiro) ______________________________________________________________________ Dr. Paulino Vandresen (Universidade Federal de Santa Catarina/Universidade Católica de Pelotas) ______________________________________________________________________ Dr. Felício Wessling Margotti (Universidade Federal de Santa Catarina) ______________________________________________________________________ Dra. Edair Maria Görski (Universidade Federal de Santa Catarina) – suplente BANCA EXAMINADORA Profa. Dra. Izete Lehmkuhl Coelho (Universidade Federal de Santa Catarina) Orientadora Profa. Dra. Maria Marta Pereira Scherre (Universidade Federal do Espírito Santo) Profa. Dra. Silvia Rodrigues Vieira (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Prof. Dr. Paulino Vandresen (Universidade Federal de Santa Catarina/Universidade Católica de Pelotas) Prof. Dr. Felício Wessling Margotti (Universidade Federal de Santa Catarina) À professora Izete Lehmkuhl Coelho, minha orientadora, pelo incentivo para fazer o doutorado, pela orientação mais do que exemplar, pela força para fazer o estágio no exterior, pela amizade, e, sobretudo, pelo exemplo de vida, tanto profissional, quanto pessoal. À professora Ernestina Carrilho, co-orientadora no exterior, por ter oportunizado a realização de parte da pesquisa em Lisboa. Aos professores Maria Marta Pereira Scherre, Silvia Rodrigues Vieira, Paulino Vandresen e Felício Wessling Margotti, por terem participado da minha Banca de Defesa, pelas sugestões e pelos olhares críticos, fundamentais para o crescimento da pesquisa. Aos professores Fábio Lopes e Rosângela Hammes Rodrigues, coordenadores do Curso de Pós-Graduação em Lingüística, pelo incentivo e apoio para o estágio de doutorado no exterior. Aos professores da Pós-Graduação em Lingüística – Izete Lehmkhul Coelho, Edair Görski, Felício Wessling Margotti, Rosângela Hammes Rodrigues, Ruth Lopes – pela contribuição na minha formação durante o curso À professora Maria Lobo por ter me aceitado como aluna especial na sua disciplina ministrada na Universidade Nova de Lisboa. Ao amigos do curso de Pós-Graduação em Lingüística – Cláudia Rost, Lucilene Lisboa de Liz, Marco Antônio Martins, Sueli Costa, Patrícia Rocha, Leandra Oliveira, Ana Kelly, Tatiana Pimpão – pelo apoio e convivência amiga. À Cláudia Rost pela revisão cuidadosa e pela ajuda na formatação do meu texto. À professora Maria Helena Mira Mateus pela acolhida em Lisboa. Aos amigos em Lisboa – Marco, Lucrécio, George Cereça, Mirian Cerqueira, Daniela Fabrino, Bibhuti, Emili – pela parceria em terras lusitanas. Aos meus entrevistados em Florianópolis e em Lisboa, por terem disponibilizado parte do seu tempo; sem eles, não teria realizado esta pesquisa. À professora Vera Collaço e ao dramaturgo Antônio Cunha, pela ajuda na recolha dos textos teatrais. À Universidade Federal do Amazonas, por ter concedido licença integral das minhas atividades durante todo o curso. Aos colegas do Departamento de Língua Portuguesa da Universidade Federal do Amazonas, por terem ficado durante esse tempo com o quadro de professores ainda mais escasso. À Capes, pelo suporte financeiro durante parte do curso e durante o doutorado sanduíche. À Mirza, minha mãe, pelo incentivo aos estudos, pelo apoio, pela amizade, por ter me acompanhado na realização das entrevistas em Florianópolis e por ter cuidado da Carolina durante os “finalmentes” da tese. Ao Cris pelo apoio incondicional, por ter me acompanhado na realização das entrevistas em Lisboa e pelo suporte nos mapas, figuras e gráficos. À Carolina, que me tirou o tempo, mas me trouxe força e felicidade. Agradeço. 5 RESUMO Esta tese objetiva investigar a variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural sincrônica e diacronicamente, a partir de amostras do PB e do PE. Baseando-nos teórico-metodologicamente na teoria da variação e mudança lingüística e na dialetologia pluridimensional, analisamos o condicionamento do fenômeno em questão correlacionando-o a grupos de fatores lingüísticos, geográficos e sociais. A amostra sincrônica constitui-se de trinta e duas entrevistas gravadas, dezesseis das quais realizadas com informantes de Florianópolis (PB) e dezesseis de Lisboa (PE), estratificadas de acordo com idade e escolaridade. A amostra diacrônica compõe-se de dez peças de teatro do século XIX e dezoito do século XX, sendo a metade escrita por autores catarinenses (PB) e a outra metade escrita por autores portugueses (PE). Em relação à amostra sincrônica, os resultados gerais mostram percentuais distintos de variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural, com índices mais altos de marcação para o PE. A análise estatística evidencia, de um lado, os grupos de fatores saliência fônica e paralelismo formal como os mais relevantes no condicionamento da variação no PB, seguidos dos grupos posição do sujeito em relação ao verbo e traço humano no sujeito. Por outro lado, a análise mostra que, no PE, são os grupos traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo e tipo de verbo os que mais condicionam a variação da concordância. No que se refere aos grupos de fatores extralingüísticos, geográficos e sociais, a variável social idade/escolaridade foi selecionada para as duas amostras analisadas com o mesmo nível de relevância para o PB e para o PE e a variável geográfica diatopia foi selecionada somente para o PB como a menos relevante dentre as variáveis controladas. No que tange à análise diacrônica, nossos resultados evidenciam que, assim como para a amostra sincrônica, o PE se mostrou mais conservador preservando as marcas de concordância nos verbos. Os resultados mostram, ainda, que temos indícios de um sistema com concordância obrigatória com sujeito posposto no século XIX diferentemente do século XX em que já encontramos mais dados de não marcação da concordância verbal com sujeito posposto. Vale ressaltar que os dados desta investigação, tanto sincrônica quanto diacrônica, revelam semelhanças entre a sintaxe do PB e do PE no que se refere ao sujeito posposto, argumento interno de um verbo inacusativo, marcado preferencialmente com traço [-humano]. Esse contexto sintático leva à não marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural. Palavras-chave: Sincronia; Diacronia; Concordância verbal; Variação lingüística; Dialetologia pluridimensional. ABSTRACT This study investigates the variation in subject-verb agreement for the third-person plural, synchronically and diachronically, in samples of Brazilian Portuguese (BP) and European Portuguese (EP). Theoretically and methodologically based on the theory of variation and linguistic change and on pluridimensional dialectology, we analyze the conditioning of the phenomenon under examination by correlating it to groups of linguistic, geographical, and social factors. The synchronous sample consists of thirtytwo recorded interviews, sixteen of which were carried out with informants of Florianópolis, Santa Catarina, Brazil (BP) and sixteen with informants of Lisbon, Portugal (EP), who were stratified according to age and educational level. The diachronic sample consists of ten plays of the 19th century and eighteen plays of the 20th century, half of which written by playwrights living in Santa Catarina (BP) and the other half written by Portuguese authors (EP). In what concerns the synchronic sample, the general results show different percentiles of variation in the subject-verb agreement for the third-person plural, with higher indexes of number marking for EP. The statistical analysis shows, on one hand, that the groups of factors phonic saliency and formal parallelism are the most relevant in the conditioning of variation in BP, followed by the groups subject position in relation to the verb and human trait in the subject. On the other hand, the analysis shows that in EP variation in agreement is more strongly conditioned by the groups human trait in the subject, position of the subject in relation to the verb and verb type. In what concerns the groups of extralinguistic, geographical, and social factors, age/educational level has been selected for the two samples under analysis with the same level of relevance for BP and EP, and the geographical variable diatopy has been selected only for BP as the less relevant among the variables under control. Concerning the diachronic analysis, our results show that, as well as for the synchronic sample, EP seems to be more conservative in preserving the agreement marking in verbs. Our results show, moreover, that we have indications of a system with obligatory agreement with a postponed subject in the 19th century, differently from the 20th century, for which we have found more data showing the absence of subject-verb agreement marking with a postponed subject. It is also worth to emphasize that the data of this investigation, both synchronically and diachronically, reveal similarities between the syntax of BP and EP in what refers to the postponed subject, functioning as the internal argument of an inaccusative verb, marked preferentially with the trait [-human]. This syntactic context leads to the non-marking of subject-verb agreement for the thirdperson plural. Keywords: Synchrony. Diachrony. Subject-verb agreement. Linguistic variation. Pluridimensional dialectology. SUMÁRIO LISTA DE MAPAS, QUADROS, FIGURAS, TABELAS E GRÁFICOS .............. 11 INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 17 CAPÍTULO I – O FENÔMENO EM ESTUDO........................................................ 19 1.1 Revisão Bibliográfica: alguns estudos sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural .............................................................................................. 19 1.1.1 No Português do Brasil............................................................................ 19 1.1.1.1 Português urbano ........................................................................ 20 1.1.1.2 Português não urbano.................................................................. 29 1.1.2 No Português Europeu............................................................................. 35 1.1.3 Síntese ..................................................................................................... 38 1.2 Objetivos, questões e hipóteses da pesquisa ................................................. 41 1.2.1 Objetivos geral e específicos ................................................................... 41 1.2.1.1 Objetivo Geral............................................................................. 41 1.2.1.2 Objetivos Específicos.................................................................. 41 1.2.2 Principais Questões ................................................................................. 41 1.2.3 Hipóteses Gerais...................................................................................... 42 CAPÍTULO II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA.............. 43 2.1 Teoria da Variação e Mudança ..................................................................... 43 2.1.1 Pressupostos Básicos............................................................................... 43 2.1.2 A variação na sintaxe .............................................................................. 47 2.1.3 Comunidade de fala................................................................................. 48 2.1.4 Redes sociais ........................................................................................... 50 2.1.5 Sobre mudança lingüística....................................................................... 53 2.2 Dialetologia Pluridimensional........................................................................ 57 2.2.1 Os estudos no Brasil ................................................................................ 57 2.2.2 Os estudos em Portugal ........................................................................... 58 2.2.3 Pressupostos da Dialetologia................................................................... 59 2.3 Axiomas metodológicos................................................................................... 62 2.4 A amostra utilizada e a análise quantitativa ................................................ 64 2.5 Perfil sócio-histórico de Florianópolis e de Lisboa ...................................... 72 2.5.1 Florianópolis............................................................................................ 72 2.5.2 Lisboa ...................................................................................................... 79 2.6 A variável dependente e as variáveis independentes ................................... 85 2.6.1 Contextos de Restrição............................................................................ 86 2.6.2 Os grupos de fatores lingüísticos............................................................. 87 2.6.2.1 As hipóteses neogramática e difusionista ................................... 87 2.6.2.1.1 Saliência fônica............................................................. 88 2.6.2.1.2 Paralelismo Formal....................................................... 90 2.6.2.2 A hipótese da inacusatividade..................................................... 91 2.6.2.2.1 Tipo de verbo................................................................ 97 2.6.2.2.2 Posição do sujeito em relação ao verbo........................ 99 2.6.2.2.3 Traço humano no sujeito ............................................ 100 2.6.2.2.4 Tipo de sujeito ............................................................ 101 2.6.3 Os grupos de fatores extralingüísticos................................................... 102 2.6.3.1 Os grupos de fatores sociais...................................................... 103 2.6.3.1.1 Sexo ............................................................................ 103 2.6.3.1.2 Idade/escolaridade ...................................................... 103 2.6.3.1.3 Redes sociais............................................................... 104 2.6.3.2 Os grupos de fatores geográficos:............................................. 106 2.6.3.2.1 Diatopia ...................................................................... 106 2.6.3.2.2 Diazonalidade ............................................................. 113 2.7 Síntese............................................................................................................. 114 CAPÍTULO III – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS..................... 115 3.1 Análise e discussão dos resultados sincrônicos do PB ............................... 115 3.1.1 Variáveis lingüísticas ............................................................................ 117 3.1.1.1 Saliência Fônica ........................................................................ 117 3.1.1.2 Paralelismo Formal ................................................................... 122 3.1.1.3 Posição do sujeito em relação ao verbo .................................... 124 3.1.1.4 Traço humano no sujeito........................................................... 126 3.1.1.5 Tipo de verbo ............................................................................ 128 3.1.1.6 Tipo de sujeito........................................................................... 130 3.1.2 Variáveis sociais.................................................................................... 132 3.1.2.1 Idade/escolaridade..................................................................... 132 3.1.2.2 Sexo........................................................................................... 133 3.1.2.3 Redes Sociais ............................................................................ 134 3.1.3 Variáveis geográficas ............................................................................ 141 3.1.3.1 Diatopia..................................................................................... 141 3.1.3.2 Diazonalidade ........................................................................... 142 3.2 Análise e discussão dos resultados sincrônicos do PE ............................... 143 3.2.1 Variáveis lingüísticas ............................................................................ 144 3.2.1.1 Traço humano no sujeito........................................................... 145 3.2.1.2 Posição do sujeito em relação ao verbo .................................... 146 3.2.1.3 Tipo de verbo ............................................................................ 147 3.2.1.4 Saliência Fônica ........................................................................ 150 3.2.1.5 Paralelismo Formal ................................................................... 152 3.2.1.6 Tipo de sujeito........................................................................... 154 3.2.2 Variáveis sociais.................................................................................... 155 3.2.2.1 Idade/escolaridade..................................................................... 156 3.2.2.2 Sexo........................................................................................... 157 3.2.2.3 Redes Sociais ............................................................................ 157 3.2.3 Variáveis geográficas ............................................................................ 164 3.2.3.1 Diatopia..................................................................................... 165 3.2.3.2 Diazonalidade ........................................................................... 166 3.3 Síntese............................................................................................................. 166 CAPÍTULO IV – SOBRE CONDICIONAMENTOS SINCRÔNICOS E DIACRÔNICOS: ALGUMAS REFLEXÕES ......................................................... 168 4.1 Retomada das variáveis selecionadas no PB e no PE ................................ 168 4.1.1 Saliência Fônica .................................................................................... 169 4.1.2 Paralelismo formal ................................................................................ 174 4.1.3 Posição do sujeito em relação ao verbo................................................. 175 4.1.4 Traço humano no sujeito ....................................................................... 175 9 4.1.5 Tipo de verbo......................................................................................... 176 4.1.6 Idade/escolaridade ................................................................................. 179 4.1.7 Diatopia ................................................................................................. 180 4.1.8 Algumas considerações ......................................................................... 181 4.2 Análise diacrônica do PB e do PE ............................................................... 183 4.3 Problemas empíricos para a mudança lingüística ..................................... 189 4.4 Síntese............................................................................................................. 201 CONSIDERAÇÕES FINAIS..................................................................................... 202 BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................ 205 ANEXOS ..................................................................................................................... 216 10 LISTA DE MAPAS, QUADROS, FIGURAS, TABELAS E GRÁFICOS MAPAS Mapa 2.1: Distribuição das localidades no PB........................................................... 65 Mapa 2.2: Distribuição das localidades no PE........................................................... 65 Mapa 3.1: Distribuição da marcação da concordância verbal no PB ................... 116 Mapa 3.2: Distribuição da marcação da concordãncia verbal no PE ................... 144 QUADROS Quadro 2.1: Estratificação dos informantes .............................................................. 67 Quadro 2.2: Perfil dos informantes do PB e do PE ................................................. 217 Quadro 2.3: Questões realizadas para facilitar o reconhecimento das redes sociais ...................................................................................................................................... 218 Quadro 3.1: Avaliação da saliência fônica ............................................................... 219 Quadro 3.2: Critérios para estabelecer os graus de relação em rede .................... 135 Quadro 4.1: Dados diacrônicos do PB ...................................................................... 184 Quadro 4.2: Dados diacrônicos do PE ...................................................................... 185 Quadro 4.3: Teste de atitude sobre a concordância verbal .................................... 197 FIGURAS Figura 3.1: Redes sociais no Ribeirão da Ilha.......................................................... 136 Figura 3.2: Redes sociais na Costa da Lagoa ........................................................... 136 Figura 3.3: Redes sociais na região central de Florianópolis ................................. 136 Figura 3.4: Redes sociais nos Ingleses....................................................................... 136 Figura 3.5: Redes sociais em Sintra .......................................................................... 158 Figura 3.6: Redes sociais em Cascais ........................................................................ 158 Figura 3.7: Redes sociais na região central de Lisboa ............................................ 158 Figura 3.8: Redes sociais em Belém .......................................................................... 158 TABELAS Tabela 1.1: Taxa de concordância verbo/sujeito em função da oposição singular/plural em oito textos portugueses medievais (NARO e SCHERRE, 2007, p.60)................................................................................................................................ 37 Tabela 1.2: Taxa de concordância verbo/sujeito em função do traço ‘humano’ do sujeito em oito textos portugueses medievais (NARO e SCHERRE, 2007, p.63) ... 37 Tabela 3.1: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável saliência fônica............................................................................................................................ 118 Tabela 3.2: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2............................................. 119 Tabela 3.3: Resultados de diferentes estudos sobre a CV de terceira pessoa do plural no PB em comparação com nossos resultados do PB, segundo a variável saliência fônica ............................................................................................................ 120 Tabela 3.4: Comparação entre os resultados deste estudo com dados do PB, os de Scherre e Naro (1997) e Naro (1981), para a freqüência de CV no cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade .................................................... 122 11 Tabela 3.5: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável paralelismo formal...................................................................................................... 123 Tabela 3.6: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável posição do sujeito em relação ao verbo .................................................................................. 125 Tabela 3.7: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável traço humano no sujeito....................................................................................................... 126 Tabela 3.8: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável tipo de verbo ............................................................................................................................ 128 Tabela 3.9: Freqüência de CV no PB, segundo a variável tipo de sujeito............. 130 Tabela 3.10: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável idade/escolaridade ...................................................................................................... 132 Tabela 3.11: Freqüência de CV no PB, segundo a variável sexo ........................... 134 Tabela 3.12: Freqüência de CV no PB, segundo a variável redes sociais (localismo) ...................................................................................................................................... 137 Tabela 3.13: Freqüência de CV no PB, segundo a variável redes sociais (mobilidade) ................................................................................................................ 137 Tabela 3.14: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (localismo) ......................................................................... 139 Tabela 3.15: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (mobilidade) ...................................................................... 141 Tabela 3.16: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável diatopia ...................................................................................................................................... 142 Tabela 3.17: Freqüência de CV no PB, segundo a variável diazonalidade ........... 142 Tabela 3.18: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável traço humano no sujeito....................................................................................................... 145 Tabela 3.19: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável posição do sujeito em relação ao verbo .................................................................................. 146 Tabela 3.20: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável tipo de verbo ............................................................................................................................ 148 Tabela 3.21: Freqüência de CV no PE, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 ................................................................ 150 Tabela 3.22: Freqüência de CV no PE, segundo a variável saliência fônica......... 151 Tabela 3.23: Freqüência de CV no PE, segundo a variável paralelismo formal .. 153 Tabela 3.24: Freqüência de CV no PE, segundo a variável tipo de sujeito........... 154 Tabela 3.25: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável idade/escolaridade ...................................................................................................... 156 Tabela 3.26: Freqüência de CV no PE, segundo a variável sexo ........................... 157 Tabela 3.27: Freqüência de CV no PE, segundo a variável redes sociais (localismo) ...................................................................................................................................... 159 Tabela 3.28: Freqüência de CV no PE, segundo a variável redes sociais (mobilidade) ................................................................................................................ 159 Tabela 3.29: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (localismo) ......................................................................... 163 Tabela 3.30: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (mobilidade) ...................................................................... 164 Tabela 3.31: Freqüência de CV no PE, segundo a variável diatopia..................... 165 Tabela 3.32: Freqüência de CV no PE, segundo a variável diazonalidade ........... 166 Tabela 3.33: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade ................................................................................ 220 12 Tabela 3.34: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade................................................................................... 220 Tabela 3.35: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade .......................................................................... 220 Tabela 3.36: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e idade/escolaridade ................................. 221 Tabela 3.37: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade ......................................... 221 Tabela 3.38: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e posição do sujeito em relação ao verbo ....................... 221 Tabela 3.39: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade ................................................................. 221 Tabela 3.40: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo .......................................... 221 Tabela 3.41: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito .................................................................. 222 Tabela 3.42: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade .................................................................................... 222 Tabela 3.43: Freqüência de posposição do sujeito no PB, segundo a variável tipo de sujeito........................................................................................................................... 222 Tabela 3.44: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade................................................................................... 223 Tabela 3.45: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade........................................................................... 223 Tabela 3.46: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade ................................................................................................... 223 Tabela 3.47: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade.................................................................. 223 Tabela 3.48: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade.................................................................. 223 Tabela 3.49: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade ................................................................. 224 Tabela 3.50: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis escolaridade e posição do sujeito em relação ao verbo............................................ 224 Tabela 3.51: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade ......................................... 224 Tabela 3.52: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo .......................................... 224 Tabela 3.53: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito .................................................................. 225 Tabela 3.54: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade .................................................................................... 225 Tabela 3.55: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade ................................................................................ 225 Tabela 3.56: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade................................................................................... 225 Tabela 3.57: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade .......................................................................... 226 Tabela 3.58: Freqüência de posposição do sujeito no PE, segundo a variável tipo de sujeito........................................................................................................................... 226 13 Tabela 3.59: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade................................................................................... 226 Tabela 3.60: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade........................................................................... 226 Tabela 3.61: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade ................................................................................................... 227 Tabela 3.62: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade.................................................................. 227 Tabela 3.63: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (mobilidade) e diazonalidade............................................................... 227 Tabela 4.1: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 ........................................................ 169 Tabela 4.2: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável saliência fônica na rodada sem verbos copulativos para a amostra do PE ........... 173 Tabela 4.3: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 na rodada sem verbos copulativos para a amostra do PE................................................................................................. 173 Tabela 4.4: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável paralelismo formal........................................................................................................................... 174 Tabela 4.5: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável posição do sujeito em relação ao verbo..................................................................... 175 Tabela 4.6: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável traço humano no sujeito............................................................................................. 176 Tabela 4.7: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável tipo de verbo................................................................................................................ 177 Tabela 4.8: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável tipo de verbo na rodada sem verbos copulativos para ambas as amostras........... 177 Tabela 4.9: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e saliência fônica com verbos copulativos................................................................................................................... 178 Tabela 4.9': Freqüência de CV no PB e no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e saliência fônica com verbos copulativos................................................................................................................... 229 Tabela 4.10: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável idade/escolaridade ...................................................................................................... 179 Tabela 4.11: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade .......................................................... 180 Tabela 4.12: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável diatopia....... 180 Tabela 4.13: Resultados do teste de atitude sobre a concordância verbal ............ 199 GRÁFICOS Gráfico 3.1: Distribuição geral dos dados do PB..................................................... 116 Gráfico 3.2: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade ................................................................................ 120 Gráfico 3.3: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade................................................................................... 121 Gráfico 3.4: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade .......................................................................... 124 14 Gráfico 3.5: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e idade/escolaridade ................................. 125 Gráfico 3.6: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade ......................................... 126 Gráfico 3.7: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e posição do sujeito em relação ao verbo ....................... 127 Gráfico 3.8: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade ................................................................. 127 Gráfico 3.9: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo .......................................... 129 Gráfico 3.10: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito .................................................................. 129 Gráfico 3.11: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade .................................................................................... 130 Gráfico 3.12: Freqüência de posposição do sujeito no PB, segundo a variável tipo de sujeito...................................................................................................................... 131 Gráfico 3.13: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade................................................................................... 131 Gráfico 3.14: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade........................................................................... 133 Gráfico 3.15: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade ................................................................................................... 134 Gráfico 3.16: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade.................................................................. 138 Gráfico 3.17: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (mobilidade) e diazonalidade............................................................... 138 Gráfico 3.18: Distribuição geral dos dados do PE................................................... 143 Gráfico 3.19: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade ................................................................. 145 Gráfico 3.20: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis escolaridade e posição do sujeito em relação ao verbo............................................ 146 Gráfico 3.21: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade ......................................... 147 Gráfico 3.22: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo .......................................... 149 Gráfico 3.23: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito .................................................................. 149 Gráfico 3.24: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade .................................................................................... 150 Gráfico 3.25: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade ................................................................................ 152 Gráfico 3.26: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade................................................................................... 152 Gráfico 3.27: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade .......................................................................... 153 Gráfico 3.28: Freqüência de posposição do sujeito no PE, segundo a variável tipo de sujeito...................................................................................................................... 155 Gráfico 3.29: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade................................................................................... 155 15 Gráfico 3.30: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade........................................................................... 156 Gráfico 3.31: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade ................................................................................................... 157 Gráfico 3.32: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade.................................................................. 160 Gráfico 3.33: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (mobilidade) e diazonalidade............................................................... 161 16 INTRODUÇÃO A variação na concordância verbal vem sendo estudada principalmente à luz da sociolingüística variacionista e num recorte sincrônico (Lemle e Naro, 1977; Naro e Scherre, 1991, 1996; Scherre e Naro, 1992, 1993, 1997; Monguilhott, 2001; Monguilhott e Coelho, 2002; Amaral, 2003; Cardoso, 2005). Neste estudo, com o intuito de contribuir com novos resultados acerca da concordância verbal de terceira pessoa do plural, tema central da nossa pesquisa, analisaremos uma amostra sincrônica e outra diacrônica, apoiando-nos teórico-metodologicamente na sociolingüística variacionista e na dialetologia pluridimensional. A amostra sincrônica selecionada levará em conta diferentes localidades, tanto do Português do Brasil (PB), quanto do Português Europeu (PE), cada qual com sua história e cultura particulares, pertencentes não só à zona urbana, mas também à zona não urbana, a fim de controlar as dimensões diatópica e diazonal. O controle da diatopia e da diazonalidade no estudo da concordância verbal no sul do Brasil, assim como em Portugal, poderá comprovar a relevância destes parâmetros no uso variável da concordância verbal. Pretendemos, também, investigar o percurso diacrônico da concordância verbal em peças de teatro de autores catarinenses e portugueses. Essa investigação objetivará primeiramente descrever o percurso histórico do fenômeno da variação da concordância verbal do século XIX até o século XX, bem como, testar a hipótese de que o fenômeno em estudo, por um lado, apresenta um sistema com concordância obrigatória com sujeito posposto no século XIX, por outro lado, um sistema com concordância variável com sujeito posposto no século XX, tanto no PB quanto no PE, embora nossa expectativa seja de que, em termos de freqüência, a variação se mostre mais evidente no PB. Gostaríamos de evidenciar ainda que a nossa análise se dará também no PE, a fim de tecer comparações a respeito da variação da concordância verbal com o PB, no intuito de caracterizar o fenômeno nos dois países de língua portuguesa. O quadro teórico da pesquisa se constituirá de um lado da Teoria da Variação e Mudança (cf. Weinreich, Labov e Herzog, 1968; Labov, 1972, 1994) e da Dialetologia Pluridimensional (cf. Radtke e Thun, 1996; Thun, 1998; Bellmann, 1999). Por outro 17 lado, nos apoiaremos nos pressupostos da Teoria Gerativa (cf. Chomsky, 1981, 1986) para darmos conta de alguns dos grupos de fatores lingüísticos a serem controlados no nosso estudo. Nosso trabalho está assim organizado. No primeiro capítulo, com base em trabalhos realizados sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE, circunscrevemos os limites do fenômeno em estudo, definindo os objetivos geral e específicos e as hipóteses gerais da nossa pesquisa. No segundo capítulo, discutimos os pressupostos teórico-metodológicos da Teoria da Variação e Mudança Lingüística (cf. Weinreich, Labov e Herzog, 1968; Labov, 1972, 1994) e da Dialetologia Pluridimensional (cf. Radtke e Thun, 1996; Thun, 1998; Bellmann, 1999), abordagem em que baseamos nosso trabalho. Definimos ainda neste capítulo, a amostra da pesquisa, o programa estatístico utilizado e a variável dependente do nosso estudo. Caracterizamos também as variáveis independentes e levantamos as hipóteses específicas para cada uma delas. Por fim, delineamos o perfil sócio-histórico das comunidades de fala a serem investigadas e indicamos os contextos de restrição do fenômeno em estudo. No terceiro capítulo, apresentamos e discutimos os resultados da análise sincrônica do PB e do PE. No quarto capítulo, retomamos as variáveis selecionadas nas amostras do PB e do PE, discutimos a correlação sintática entre os fenômenos da concordância verbal, da ordem e do preenchimento do sujeito, apresentamos e discutimos os resultados da análise diacrônica do PB e do PE e relacionamos os problemas para a mudança lingüística (Weinreich, Labov e Herzog, 1968) com o fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural. 18 Capítulo I – O FENÔMENO EM ESTUDO Neste capítulo, delimitamos o fenômeno em estudo, baseando-nos em trabalhos realizados sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE. Apontamos, ainda, o objetivo geral e os objetivos específicos da nossa pesquisa, bem como delineamos as hipóteses gerais a serem testadas em nosso trabalho. 1.1 Revisão Bibliográfica: alguns estudos sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural A concordância verbal de terceira pessoa do plural no português brasileiro vem sendo estudada, à luz da sociolingüística variacionista, desde a década de 70, com o trabalho precursor de Lemle e Naro (1977). No português europeu, estudos nos moldes labovianos já não são tão recorrentes como no Português do Brasil, embora alguns estudos sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural já apontem variação, no que se refere a esse fenômeno, desde a década de 501. Os estudos do português europeu na área de sintaxe desenvolvidos por europeus situam-se, basicamente, na linha da lingüística formal. Vamos apresentar, a seguir, resultados de alguns estudos que investigaram o fenômeno nas variedades brasileira e européia. 1.1.1 No Português do Brasil Como temos referência de vários trabalhos sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB, achamos melhor subdividi-los em análises que investigaram o português urbano e análises que investigaram o português não urbano. 1 Alguns estudos realizados por portugueses indicam a variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural como Mateus (1954), Cruz (1991) e Alves (1993 – realizado em 1965). Todos eles estão referidos em Naro e Scherre (2007). 19 1.1.1.1 Português urbano Em relação a trabalhos desenvolvidos com amostras do português urbano, apresentaremos resultados dos seguintes autores: Lemle e Naro (1977), Pontes (1986), Berlinck (1988), Scherre e Naro (1993), Scherre e Naro (1997), Scherre e Naro (1998), Monguilhott (2001), Scherre, Naro e Cardoso (2007)2 e Bortoni-Ricardo (2008). Lemle e Naro (1977) analisaram em sua pesquisa os fatores condicionadores do uso da regra variável da concordância verbal na fala de mobralenses do Rio de Janeiro, seguindo a metodologia laboviana. Segundo os autores, a alternância da regra da concordância por um mesmo informante, às vezes na mesma sentença e até com o mesmo verbo, permitiu-lhes tratar a concordância verbal como regra variável. O corpus do trabalho compreendeu sete entrevistas de uma hora de gravação com cada um dos 20 informantes. Foram extraídas todas as ocorrências de verbo com sujeito de terceira pessoa do plural. Os fatores controlados foram: variável estilística, variável morfológica, variável sintática e variável semântica. No que tange à variável estilística3, os autores evidenciam que os resultados encontrados não se mostraram consistentes. De acordo com Lemle e Naro, os mobralenses, no que tange à concordância verbal, não levam em conta o fator formalidade, “os informantes exibiram as mais diversas reações a situações sociais semelhantes” (LEMLE e NARO, 1977, p.47). No que se refere à variável morfológica, os resultados indicam que o uso da regra da concordância pelos informantes se relaciona diretamente com o grau de saliência fônica entre as formas singular e plural dos verbos. Os resultados obtidos, em termos de probabilidade4, foram os seguintes: para os pares menos salientes – come/comem (.06), fala/falam (.17), diz/dizem (.27); para os pares mais salientes – foi/foram (.69), é/são (.81). Para a variável sintática, a posição em que o sujeito está imediatamente antes do verbo favoreceu a concordância no verbo (.70 de peso relativo), opondo-se à posição em que o sujeito está posposto ao verbo, em que houve maior índice de desfavorecimento da concordância verbal (.22 de peso relativo). 2 Com relação a este estudo, embora o situemos nesta subseção que trata de variedades urbanas, a análise se dá em duas amostras de variedades urbanas e em uma de variedade não urbana. 3 A variável estilística controlada por Lemle e Naro (1977) consiste nos diferentes estilos de formalidade, prevendo a variação de locais, entrevistadores e atitudes. 4 Neste trabalho, usamos probabilidade e peso relativo com o mesmo sentido. Ambos referem-se aos resultados de uma análise multivariada. 20 Os resultados, referentes à variável semântica, apontam para altos índices de concordância verbal quando o sujeito é do tipo indeterminado (.61 de peso relativo) e para baixos índices quando o sujeito é do tipo determinado (.39 de peso relativo). Para os autores, o fato de o sujeito do tipo indeterminado apresentar como único traço relevante do sujeito a pluralidade parece natural ao favorecimento da regra de concordância, em oposição ao sujeito determinado, já que esse reúne outras características além do traço plural. Lemle e Naro estabelecem uma generalização a respeito das variáveis lingüísticas apresentadas: a realização da regra de concordância verbal depende do grau de impacto dos efeitos perceptuais com que ela se materializa. Para eles, são os fatores condicionadores que alicerçam a regra de concordância verbal. Pontes (1986) investiga, em seu trabalho, a relação entre posição do sujeito e concordância verbal. A autora discute o estatuto de sujeito do sintagma nominal (SN) posposto evidenciando que as duas características superficiais mais marcantes do sujeito em português são a posição (anteposta ao verbo) e a concordância estabelecida entre o SN e o verbo (V). No entanto, existem casos em que o sujeito não apresenta nenhuma dessas características, como em (1) em que o SN dente está posposto e não apresenta marcas de concordância. (1) A Sarinha tá nascendo dente (PONTES, op. cit., p.18) A concordância entre V e o suposto sujeito posposto, no exemplo em (1), de acordo com a autora, é proibida. Para ilustrar temos o exemplo extraído de Pontes (op. cit., p.18), em (2). (2) *A Sarinha tão nascendo dentes5 A autora conclui que esse SN posposto apresenta, então, características de objeto (posição V SN, [- concordância]). Entretanto, no que diz respeito à cliticização que todo objeto a princípio admite, esse SN é de natureza diferente, pois não permite assumir a forma de um pronome acusativo, assemelhando-se nesse caso a um sujeito. Assim sendo, 5 O asterisco no início da sentença indica agramaticalidade. 21 segundo Pontes, de acordo com o argumento da cliticização, embora questionável6, o SN posposto não pode ser objeto, como podemos observar em (3). (3) *A Sarinha nasceu-o Pontes ressalta, em seu livro, um teste realizado com alguns alunos da Faculdade de Letras da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), em 1984, para sondar conhecimentos e intuições desses estudantes, a respeito de sujeito e objeto. Os resultados do teste evidenciam que “os SNs pospostos não são considerados sujeitos por uma parcela significativa dos falantes; muitos falantes marcam como objeto os SNs pospostos, apesar de terem aprendido na escola o contrário; a concordância nos casos típicos não apresenta problemas para os alunos” [ou seja, nos casos em que o sujeito é aquele considerado prototípico: anteposto, com traços mais animados]. No entanto, nos casos em que o SN não é percebido como sujeito, a concordância passou a não ser marcada pelos estudantes. (PONTES, op. cit., p.144) Berlinck (1988), ao investigar os condicionamentos da ordem VS no PB, leva em consideração a concordância verbal subdividida em três categorias, a saber: presença de concordância, ausência de concordância e não se aplica (para casos de formas homófonas entre singular e plural e para formas inaudíveis). A autora investiga três corpora: dois diacrônicos, compostos por cartas de cunho pessoal (com 500 ocorrências cada um) dos séculos XVIII e XIX; e um sincrônico, composto por 20 falantes (com idade entre 20 e 30 anos, de ambos os sexos e com nível de escolaridade universitário, perfazendo um total de 1588 dados) do século XX, de 1987. Os resultados sincrônicos indicam a concordância verbal como estatisticamente relevante, o que não ocorre nas amostras diacrônicas. A ordem VS relaciona-se quase categoricamente com a não marcação da concordância verbal (94%, 0.93 de aplicação da regra7), em contraste com a marcação da concordância verbal (20%, 0.17 de aplicação da regra). De acordo com a autora, os resultados servem de “argumento favorável à tese do caráter ‘menos subjetivo’ do sujeito (ou SN) que ocorre em VSN, uma vez que a 6 Para Pontes (1986) o argumento da cliticização é questionável pois “o uso de clíticos é um processo altamente artificial para nós brasileiros, porque hoje está praticamente restrito à língua escrita. [...] Daí, seus resultados [resultados sobre análise dos clíticos], a meu ver, nem sempre serem muito confiáveis, no sentido de não refletirem a nossa competência da língua hoje, que usamos no dia-a-dia.” (p.27) 7 A aplicação da regra refere-se ao objeto que está em discussão, no caso do estudo de Berlinck, a ordem VS. No nosso estudo, refere-se ao uso da concordância verbal. 22 concordância verbal sempre foi considerada uma das propriedades formais definidoras da função-sujeito” (op. cit., p.98). Scherre e Naro (1993) apresentam resultados de um estudo da concordância verbo/sujeito numa amostra de 64 falantes cariocas, pertencentes ao Corpus Censo do Programa de Estudos sobre o Uso da Língua (PEUL). A variável presença versus ausência da marca formal de plural nos verbos foi observada em relação aos grupos de fatores: (1) paralelismo formal no nível clausal (marcas do sujeito) e (2) paralelismo formal no nível discursivo (marcas do verbo). Os resultados obtidos em relação ao grupo de fatores (1) apontam para o fato de que, quando o último elemento flexionável do sintagma nominal sujeito apresenta marca explícita de plural, independente de estar ou não inserido em um sintagma preposicional (ex.: os professores não perceberam isso), o verbo correspondente tende a exibir também marca explícita de plural (.61 e .56)8 e, quando o último elemento do sujeito, inserido ou não em um sintagma preposicional, apresenta um zero plural (ex.: tem umas pessoaØ que gostaØ de...), o verbo correspondente tende a exibir um zero plural (.24 e .17). Quando o último elemento do sujeito é um numeral, que não apresenta marca formal de plural depreensível, a concordância fica numa faixa intermediária, com .34 de peso relativo (ex.: os dois trabalham...). O sujeito com a última marca neutralizada (ex.: meus irmãos+são legal...) apresenta comportamento estatístico semelhante (.58) aos casos que apresentam a marca de plural explícita (.56 e .61). Em relação ao grupo de fatores (2), os autores verificam que o mesmo efeito detectado no nível clausal se refletiu no nível discursivo: marcas conduzem a marcas, e zeros conduzem a zeros, evidenciando a tendência de formas gramaticais particulares ocorrerem juntas. Os resultados relacionados ao grupo de fatores (2) mostram forte correlação entre o aparecimento de um verbo marcado e a presença de marcas explícitas no verbo subseqüente (.66). Scherre e Naro verificam ainda que o surgimento de um verbo não marcado provoca a ausência de marca na ocorrência verbal seguinte (.18). O fato de um dado verbo ocorrer isolado ou ser o primeiro de uma série não provocou aumento ou diminuição de marcas em relação à média global da concordância, com o peso relativo ficando entre os dois extremos (.48). 8 Os números referem-se aos pesos relativos da forma de plural explícita. 23 Em outro estudo, Scherre e Naro (1997) analisam a concordância verbo/sujeito, dentre outros fenômenos de concordância de número, focalizando as variáveis lingüísticas saliência fônica e posição do sujeito e também as sociais sexo, idade e escolaridade, em dados de fala do PEUL, com 4632 construções de concordância verbal. A amostra da pesquisa constituiu-se de 64 informantes, sendo 32 do sexo masculino e 32 do sexo feminino, subdivididos de acordo com os seguintes anos de escolarização: 1 a 4; 5 a 8 e 9 a 11 anos. Em relação ao grupo de fatores saliência fônica, os autores verificam que a oposição não-acentuada desfavorece a concordância, enquanto a oposição acentuada favorece a concordância independente dos anos de escolarização dos falantes. Entretanto, a diferença entre os anos de escolarização dos falantes é determinante na nitidez da escala da saliência na concordância verbal. Para o grupo de fatores posição, os resultados de Scherre e Naro apontam para o fato de que, quando o sujeito está em uma posição mais à esquerda e mais próximo do verbo, existe maior probabilidade de favorecimento da ocorrência da variante explícita, enquanto a posição à direita e o distanciamento em relação ao verbo a desfavorecem, independentemente do grau de escolaridade dos falantes. Dentre os grupos de fatores sociais analisados, os anos de escolarização, assim como o sexo, mostraram-se os mais relevantes. Os autores verificam que os falantes com mais anos de escolaridade e do sexo feminino apresentam maior tendência ao uso da variante explícita. Os resultados revelam as pressões que os falantes sofrem pelo fato de a variante zero ser estigmatizada pelos padrões sociais vigentes (cf. LABOV, 1975, 1981; CHAMBERS, J. K., 1995) e também que as mulheres estão mais expostas à correção gramatical, bem como são mais sensíveis às normas de prestígio. A variável faixa etária indicou que as pessoas mais pressionadas pela idade profissionalmente produtiva usam mais as formas prestigiadas. Scherre e Naro (1998), em seu estudo a respeito das restrições sintáticas e semânticas no controle da concordância verbal em português, analisam o efeito do traço humano no sujeito sobre a concordância no português falado (64 horas de fala de informantes cariocas, pertencentes ao corpus do PEUL) e a interação entre o traço de número e o traço humano no controle da concordância em dados do PB escrito na década de 90 e em dados de documentos do português do século XIII ao XVI. 24 Os autores constatam, através dos resultados estatísticos, que o traço humano exerce influência em dados da fala, em dados da escrita do PB moderno e em dados do português antigo. Em relação à língua falada, Scherre e Naro verificam que o verbo com sujeito [+humano] tende a uma maior concordância com seu sujeito (.53), diferentemente do verbo com sujeito [-humano] que apresenta menor probabilidade de concordância (.29). Monguilhott (2001) analisa a concordância verbal em uma amostra de língua falada pertencente ao Projeto Varsul (Variação Lingüística Urbana na Região Sul) composta de 24 florianopolitanos estratificados de acordo com idade, sexo e escolaridade. De um total de 1583 ocorrências, 1251 (79%) apresentaram marcas explícitas de concordância nos verbos e 332 (21%) apresentaram a variante zero de plural nos verbos. Os resultados do estudo apontaram os fatores lingüísticos: saliência fônica, posição do sujeito em relação ao verbo, paralelismo formal, traço humano no sujeito, tipo de verbo e tipo de sujeito, como mais relevantes em detrimento dos sociais, escolaridade e idade. O grupo de fatores saliência fônica mostrou-se o mais relevante no controle da variação na concordância verbal, confirmando a hipótese de que as formas mais salientes favorecem as marcas explícitas de plural nos verbos (os resultados referem-se às três categorias do nível 1, oposição não acentuada: 25%, .02 de peso relativo – p.r.; 80%, .46 de p.r. e 66%, .13 de p.r de aplicação da regra de concordância verbal), diferentemente das formas menos salientes (resultados referentes às três categorias do nível 2, oposição acentuada: 96%, .88 de p.r.; 83%, .65 de p.r. e 90%, .75 de p.r). A variável posição do sujeito em relação ao verbo foi a segunda a ser selecionada como mais significativa para o condicionamento da concordância verbal, confirmando a hipótese de que o sujeito posposto desfavorece a marcação da concordância, pois é encarado, muitas vezes, como objeto e não sujeito da sentença9. Os resultados apontam o sujeito anteposto ao verbo como favorecedor da concordância (84%, .78 de p.r., de aplicação da regra de concordância verbal), enquanto o sujeito posposto ao verbo como favorecedor da não concordância (52%, .17 de p.r., de aplicação da regra de concordância verbal). 9 Pontes (1986) ressalta que o SN posposto é encarado por uma parcela significativa de falantes do português como objeto pelas características que apresenta (posição VSN, - concordância). 25 O outro grupo a ser selecionado foi o paralelismo formal que confirmou a expectativa de que, por um lado, quando o último ou único elemento do SN apresentasse marca explícita de plural, o verbo também apresentaria tendência à pluralização, assim como a presença de plural também influenciaria na marcação do plural e de que, por outro lado, quando houvesse presença de zero no último elemento, haveria o desfavorecimento da forma de plural no verbo. Os resultados confirmaram o princípio do paralelismo de “formas gramaticais particulares ocorrerem juntas” (SCHERRE, 1998, p.42) (84%, .54 de p.r. de aplicação da regra de concordância verbal quando havia presença da forma de plural explícita no último elemento e 61%, .32 de p.r. quando havia presença da forma zero de plural no último elemento). Em seguida, o grupo de fatores traço humano no sujeito foi selecionado para o condicionamento da concordância verbal, confirmando a hipótese de que, quando o SN da sentença fosse [+humano], a probabilidade seria de marcação da concordância (85%, .55 p.r. de marcação da concordância) e quando o SN fosse [-humano] a tendência seria de não marcação da concordância no verbo (58%, .28 de p.r. de marcação da concordância). No que se refere ao grupo de fatores tipo de verbo, o quinto grupo a ser selecionado, atestou-se a inacusatividade como ambiente favorecedor da não-marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural na fala florianopolitana (78%, .63 p.r. de marcação da concordância para os verbos do tipo cópula, 82%, .49 de p.r., para os verbos transitivos, 82%, .46 de p.r. para os verbos intransitivos e 71%, .37 de p.r. para os inacusativos). O sexto grupo de fatores lingüísticos selecionado foi o tipo de sujeito. Foram controlados os seguintes tipos de SN: pleno simples, pleno nu, pleno composto, pronome pessoal, pronome indefinido, pronome demonstrativo, quantificador e SN+pronome relativo que. Alguns desses fatores foram amalgamados em função de seus índices de freqüência, bem como de seu comportamento uniforme quando da presença de outros fatores. Os resultados indicam que as categorias pronome pessoal + pronome demonstrativo (88%, .59 p.r. de aplicação da regra de concordância) e SN + pronome relativo (que) (83%, .47 de p.r de aplicação da regra) favorecem as marcas de concordância, enquanto as categorias SN pleno composto (40%, .18 de p.r. de aplicação da regra) e quantificador + pronome indefinido (60%, .22 de p.r. de aplicação da regra) desfavorecem tais marcas. 26 Em relação aos grupos de fatores sociais controlados no estudo de Monguilhott (2001), os resultados apontam que, para o fenômeno em estudo, se mostram menos decisivos que os fatores lingüísticos. A escolaridade, dentre os fatores sociais controlados, foi a variável que se mostrou mais relevante, confirmando a hipótese de que quanto maior o nível de escolaridade, maior a probabilidade de o falante utilizar a regra de concordância verbal (81%, .57 de p.r. de marcação da concordância para falantes com 11 anos de escolarização, 78%, .44 de p.r. de marcação da concordância para falantes com 4 anos de escolarização), já que a escola privilegia o uso dessa norma. O grupo de fatores idade, selecionado como último fator relevante neste estudo, apontou para uma tendência à marcação de concordância na fala dos mais velhos (52 a 76 anos) (81%, .55 de p.r de aplicação da regra de concordância) e dos mais jovens (15 a 24 anos) (81%, .52 de aplicação da regra) e para uma leve tendência à não-marcação na fala dos informantes de meia-idade (25 a 45 anos) (75%, .42 de p.r. de aplicação da regra). Os resultados indicam uma tendência questionável, já que o esperado, em função dos resultados de outros estudos que controlaram idade no fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural, era que os falantes mais jovens e mais velhos tendessem a não-marcação da concordância e os falantes de meia-idade tendessem ao uso das marcas de concordância. A investigação de Monguilhott (2001) confirma resultados de estudos anteriores (LEMLE e NARO, 1977; NARO, 1981; PONTES, 1986; LIRA, 1986; BERLINCK, 1988; SCHERRE e NARO, 1993; SCHERRE e NARO, 1997; SCHERRE e NARO, 1998) que haviam controlado os mesmos grupos de fatores, alguns tendo a concordância verbal como variável dependente, outros a tendo como variável independente. Scherre, Naro e Cardoso (2007) investigam o papel do tipo de verbo na concordância verbal de terceira pessoa no PB em três amostras distintas: (i) duas delas do Corpus Censo, uma com 64 falantes (dados coletados na década de 80), e outra com 16 falantes (recontactados na década de 90) e (ii) uma amostra de uma falante maranhense radicada em Brasília (dados de Cardoso, 2005). Os dados da primeira amostra totalizam 5000 ocorrências e foram distribuídos em três categorias: verbos nocionais, auxiliares em estruturas ativas e passivas e verbos de ligação. Levando em consideração outros grupos de fatores, como saliência fônica, traço humano do sujeito, posição e distância do sujeito em relação ao verbo e paralelismo discursivo e oracional, a análise do grupo tipo de verbo não se mostrou relevante. 27 A segunda amostra totalizou 1200 construções que foram categorizadas diferentemente dos dados da amostra anterior. Segundo os autores, foi levado em conta “além do aspecto semântico-lexical do verbo, a idéia de transitividade verbal como um fato dependente do contexto sintático, paralelamente à concepção de que os verbos apresentam uma transitividade preferencial” (op. cit., p.05). Essa análise também não revelou significância para o grupo de fatores tipo de verbo. Em relação à amostra da falante maranhense, os 464 dados coletados foram categorizados, de acordo com Cardoso (2005), em: transitivos, intransitivos nãoinacusativos, intransitivos inacusativos, auxiliares/inacusativos, ligação/inacusativos, existenciais/inacusativos e impessoais/inacusativos. A análise desta amostra também não se mostrou relevante estatisticamente, no entanto, em termos de freqüência observase a classe dos inacusativos desfavorecendo levemente a marcação da concordância (50%), em contraste com os transitivos (53%) e com os intransitivos (60%). Os autores fizeram ainda uma nova categorização com os dados dos 16 falantes do Corpus Censo seguindo a categorização de Cardoso (2005). Mesmo com a nova categorização, o grupo não foi selecionado como significativo, apresentando, em termos percentuais correspondência com os resultados da falante maranhense, ou seja, os inacusativos tendem levemente a não marcação da concordância (72%), comparativamente aos transitivos (84%) e aos intransitivos (76%). Por fim, Scherre, Naro e Cardoso, analisam os dados da amostra com os 16 falantes do Corpus Censo e da falante maranhense em termos de uma oposição binária, de um lado os inacusativos, existenciais/inacusativos e impessoais/inacusativos, de outro os demais verbos. Também não houve seleção do grupo de fatores, mas em termos de percentuais, percebe-se que o grupo dos inacusativos tendeu a não aplicação da regra de concordância com 63% em relação aos demais verbos, com 84% de aplicação. Diante dos resultados, os autores afirmam que “o efeito associado à categoria tipo de verbo é apenas aparente e que é, na realidade, o resultado da ação de outros fatores cuja presença se correlaciona aos fatores deste grupo” (p.17) [grifos dos autores]. Bortoni-Ricardo (2008) avalia, em seu estudo, reações subjetivas em relação à não marcação da concordância verbal em dois experimentos. O primeiro experimento 28 procurou identificar duas comunidades de fala10, de acordo com a definição de Labov (1966), em termos de suas reações ao traço em estudo. Já o segundo experimento avaliou as reações de universitários à concordância não-padrão em diversos ambientes morfossintáticos que provaram ser relevantes à aplicação da regra na pesquisa de Lemle e Naro (1977). No que se refere ao primeiro experimento, a autora, ao investigar se a concordância não-padrão era percebida da mesma forma por falantes de diferentes graus de escolaridade (universitários e alunos de supletivo de 1º. grau), constatou que os falantes que têm acesso a curso superior estigmatizam a concordância não-padrão, o que não acontece com os falantes que freqüentam curso supletivo, mesmo aqueles que residem em área urbana e têm curso primário. Bortoni-Ricardo evidencia que o fato de a não marcação da concordância verbal nas classes desfavorecidas ser maior do que nas classes escolarizadas corrobora a hipótese de Labov (1964, p.68) de que a “capacidade de perceber o significado social de diferenças dialetais precede a aquisição de estilos consistentes de prestígio” (BORTONI-RICARDO, 2008, p.370). Em relação ao segundo experimento, a autora, partindo do estudo de Lemle e Naro (1976), testou, em uma amostra de 360 alunos universitários, a hipótese de que as formas verbais em que mais ocorre a concordância não-padrão são as formas menos estigmatizadas. Os seus resultados indicaram que a estigmatização do traço ocorre mais evidentemente nos ambientes em que a não marcação é menos freqüente e confirmaram também a hipótese de Lemle e Naro de que a concordância verbal em português é menos provável precisamente onde sua ausência é minimamente saliente. 1.1.1.2 Português não urbano No que se refere a trabalhos desenvolvidos com amostras do português não urbano, destacaremos resultados das seguintes pesquisas: Rodrigues (1987), Silva (2003), Pereira (2004), Cardoso (2005) e Lucchesi (2006). 11 10 No capítulo II, seção 2.1.3, discutiremos mais detalhadamente o conceito de comunidade de fala. Caracterizamos como português não urbano as amostras das pesquisas com informantes que vivem em áreas periféricas como as favelas de São Paulo (RODRIGUES, 1987), áreas periféricas do Distrito Federal (CARDOSO, 2005), comunidades rurais da Bahia, de São Paulo e Minas Gerais (SILVA, 2003; PEREIRA, 2004). Inserimos o estudo de Lucchesi nesta seção, pois embora retrate amostras do português urbano (PEUL, NURC e VARSUL), também traz resultados de amostras do português não urbano (SILVA, 2003; VIEIRA, 1997 e NINA, 1980). 11 29 Rodrigues (1987) descreve a realização da regra de concordância verbal no português popular de São Paulo. Para a autora, fala popular é aquela usada pelo falante que “não adquire a variedade de língua que Labov rotula standard ou padrão consistente” (p.96). A amostra de sua pesquisa é composta por 40 informantes adultos, de ambos os sexos (16 homens e 24 mulheres), com baixo nível de escolaridade (escolaridade nula ou de 1ª. a 4ª. série do ensino fundamental), estratificados em três faixas etárias (20 a 35 anos, 36 a 50 anos, mais de 51 anos), procedentes da capital e do noroeste do Estado de São Paulo, do norte do Paraná, do norte de Minas Gerais, do sul da Bahia e da região nordeste do país (Pernambuco, Alagoas, Ceará e Paraíba), todos residentes das favelas dos jardins Carombé e Paulistano, na periferia paulistana. A autora analisou a concordância verbal de primeira e terceira pessoa do plural. Evidenciaremos os resultados referentes à terceira pessoa que apresentaram uma freqüência geral de não-marcação da concordância de 71% de um total de 1356 dados. No que tange aos fatores lingüísticos, a autora controlou a posição do sujeito em relação ao verbo, a saliência fônica e a classe morfológica do sujeito. Os resultados evidenciam que os três fatores lingüísticos considerados na análise se mostraram relevantes. Em relação ao grupo de fatores posição do sujeito, constatou-se que o sujeito posposto influenciou a não-concordância (97%12, .88), diferentemente do sujeito anteposto (76%, .31) e do sujeito distante do verbo (78%, .45). No grupo de fatores saliência fônica, atestou-se o que já era previsto em Naro (1981): formas mais salientes apresentam mais marcas de concordância padrão (ex. fez/fizeram 31% .20) do que formas menos salientes (ex.: fala/falam 94%, .93). No que se refere ao grupo de fatores classe morfológica do sujeito, os resultados indicam, por um lado, um menor uso da concordância padrão para o sujeito não-pronominal (82%, .67), seguido do sujeito explícito (72%, .45) e, por outro lado, o sujeito não explícito influenciando o uso de marcas de concordância (48%, .38). Rodrigues (1987) analisou, em seu trabalho, os grupos de fatores sociais: sexo, idade, escolaridade e procedência. Em relação à marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural, os grupos sexo e escolaridade foram considerados irrelevantes na análise. O grupo de fatores idade indicou que “formas lingüísticas aceitas como padrão tendem a ocorrer, predominantemente, entre falantes mais velhos” (p.219). Os 12 Vale ressaltar que as freqüências e os pesos relativos desse estudo referem-se à não-marcação da concordância verbal. 30 falantes mais jovens (20 a 35 anos) são os que menos utilizam marcas de concordância em sua fala (80%, .66), em contraste com os falantes da faixa etária intermediária (36 a 50 anos – 70%, .39) e com os falantes mais velhos (mais de 51 anos – 65%, .44). No que se refere à procedência, grupo de fatores mais significativo entre os sociais, a autora constatou que os falantes de São Paulo (capital) são os que mais preservam as marcas de concordância verbal (63%, .39), e os falantes do Norte de Minas Gerais e sul da Bahia são os que menos preservam as marcas em sua fala (75%, .71). Silva (2003) investiga a concordância verbal de terceira pessoa do plural em três comunidades rurais do estado da Bahia: Cinzento, Helvécia e Rio de Contas. Das 1706 ocorrências levantadas no corpus da pesquisa, 273 apresentaram marcas de concordância, 16% do total. Dentre as variáveis lingüísticas controladas, as seguintes foram selecionadas pelo programa Varbrul, por ordem de relevância: saliência fônica, indicação plural no SN sujeito, concordância nominal no sujeito, realização e posição do sujeito, tipos de verbo e caracterização semântica do sujeito. Já dentre as variáveis extralingüísticas selecionadas estão: faixa etária, comunidade e sexo. Em relação à saliência fônica, seus resultados comprovaram que as formas mais salientes são aquelas que mais favorecem a marcação da concordância verbal (CV) (31% de freqüência e .78 de peso relativo, contra 6% de freqüência e .27 de peso relativo para as marcas menos salientes). No que se refere à variável indicação plural no SN sujeito, foram controlados os fatores de indicação mórfica, quantificador e lexical13. Os resultados apontam para a indicação lexical como mais favorecedora da marcação da CV, com 80% de freqüência e .97 de peso relativo. Já a indicação mórfica apresentou 12% de freqüência e .47 de peso relativo e a indicação quantificador 17% de freqüência e .52 de peso relativo. A outra variável selecionada foi a concordância nominal no sujeito. Os resultados indicam que, quando havia concordância nominal, as chances de haver concordância verbal eram maiores (24% de freqüência e .74 de peso relativo) do que quando a concordância nominal não ocorria (9% de freqüência e .48 de peso relativo). A variável seguinte selecionada foi a realização e posição do sujeito. Os resultados para esta variável apontaram um favorecimento da concordância verbal para o sujeito não realizado (27% de freqüência e .61 de peso relativo), seguido do sujeito 13 Essa variável refere-se às estratégias de pluralização do sujeito: noção de plural indicada pelo morfema (indicação mórfica) “os minino tirô as calça”, noção de plural indicada pelo quantificador (quantificador) “muitos dele adoece” e noção de plural indicada pelo valor semântico do item lexical (lexical) “a nova geração tão animado”. Os exemplos foram extraídos do trabalho do autor. 31 posposto (11% de freqüência e .51 de peso relativo), do sujeito anteposto (14% de freqüência e .49 de peso relativo) e um desfavorecimento da concordância para o sujeito retomado por um relativo (9% de freqüência e .35 de peso relativo). Vale ressaltar que houve inversão em termos de freqüência e peso relativo para os fatores sujeito posposto e anteposto, embora em termos percentuais o sujeito posposto tenha desfavorecido a concordância em relação ao sujeito anteposto; em termos de peso relativo, houve uma inversão. O tipo de verbo apresentou os seguintes resultados: os verbos intransitivos foram os que mais preservaram as marcas de CV (16% de freqüência e .58 de peso relativo), seguido dos transitivos (15% de freqüência e .51 de peso relativo) e dos auxiliares (18% de freqüência e .47 de peso relativo). Os verbos ergativos foram os que menos preservaram as marcas de CV (8% de freqüência e .29 de peso relativo). Por fim, a última variável lingüística selecionada foi a caracterização semântica do sujeito que apontou para o SN-sujeito com traço [+humano] como favorecedor das marcas de CV (17% de freqüência e .52 de peso relativo), contrário ao SN-sujeito com traço [-humano] (10% de freqüência e .40 de peso relativo). Nos resultados de Silva (2003), no que se refere às variáveis extralingüísticas selecionadas, a faixa etária foi a mais significativa apontando um favorecimento nas marcas de CV para a faixa I (20 a 40 anos) com 22% de freqüência e .62 de peso relativo, seguido da faixa II (41 a 60 anos) com 14% de freqüência e .48 de peso relativo, por fim a faixa III (61 anos em diante) indicando desfavorecimento das marcas de CV com 10% de freqüência e .36 de peso relativo. A segunda variável extralingüística selecionada foi comunidade. Os resultados indicam que Rio de Contas é a localidade que mais preserva marcas de CV com 24% de freqüência e .67 de peso relativo, seguida de Helvécia com 16% de freqüência e .47 de peso relativo. Já Cinzento foi a comunidade que menos preservou marcas de CV com 13% de freqüência e .43 de peso relativo. O autor atribui os resultados à história de cada comunidade evidenciando que Rio de Contas apresenta maiores índices de marcação da CV em função das atividades turísticas existentes na localidade que tendem a influenciar a fala de seus habitantes. Por fim, a variável sexo foi selecionada e os resultados apontam uma tendência maior à marcação da CV para os homens (19% de freqüência e .56 de peso relativo) do que para as mulheres (13% de freqüência e .45 de peso relativo). Os resultados, de acordo com Silva, devem-se ao fato de, nas comunidades estudadas, a mulher apresentar 32 “comportamento conservador em função da história e do contexto social que o meio rural lhe proporciona” (SILVA, 2003, p.180). Pereira (2004), em seu estudo acerca da concordância verbal de 1ª. e 3ª. pessoa do plural no português popular falado por pessoas idosas na zona rural de São Paulo e Minas Gerais, encontra um índice de concordância verbal de terceira pessoa do plural de 24%. A amostra investigada pela autora faz parte do Corpus de língua falada do Projeto Filologia Bandeirante14. Em seu estudo, Pereira controla treze grupos de fatores para o condicionamento da concordância verbal de terceira pessoa, dos quais seis foram selecionados: saliência fônica, presença/ausência do sujeito pronominal, paralelismo discursivo, traço semântico do sujeito [+/- humano], paralelismo oracional e papel semântico do sujeito. Os resultados encontrados corresponderam às hipóteses da pesquisa com os seguintes fatores favorecedores da marcação da concordância nos verbos: formas verbais mais salientes, sujeito zero, verbo precedido de verbo com marca formal de plural, traço [+humano] no sujeito, presença de marca formal de plural no último elemento do SN sujeito e sujeito agente15. Cardoso (2005), ao analisar a fala de uma mulher de 40 anos com três anos de escolaridade, constatou a relevância dos fatores lingüísticos no controle da concordância verbal de 3ª e 1ª pessoa do plural: saliência fônica, traço semântico do sujeito, paralelismo oracional, paralelismo discursivo, adjacência entre núcleo e verbo e pessoa gramatical do sujeito. A autora coletou 656 dados de concordância verbal de 3ª. e 1ª. pessoa do plural, incluindo a gente. Na análise, os casos de a gente foram excluídos devido à categoricidade de concordância na 3ª pessoa do singular. Sendo assim, foram analisados 507 dados, sendo 264 (53%) com marcas de concordância verbal e 243 (47%) sem marcas de concordância verbal. Os resultados de Cardoso corroboraram resultados acerca do fenômeno em outros estudos, tendo os seguintes fatores condicionado a marcação da concordância verbal: formas verbais mais salientes, sujeito com traço mais humano, SN sujeito com marca formal de plural, sintagma verbal precedente com marca explícita de plural, SN imediatamente à esquerda do verbo e sujeito de 3ª pessoa do plural. 14 O projeto objetiva coletar dados de falantes de núcleos rurais dos estados de São Paulo, Minas Gerais, Goiás e Mato Grosso, localizados na rota dos bandeirantes. 15 Este último fator, conforme evidenciado pela autora, confirmou suas hipóteses em termos de percentuais, mas não em termos de probablilidade. 33 Lucchesi (2006), investigando a polarização sociolingüística do Brasil, evidencia resultados de estudos da variação da concordância verbal no PB em variedades cultas e semicultas (em amostras do PEUL, NURC16 e VARSUL) e em variedades populares. Sua análise acerca das normas cultas e semicultas indica que a variação na concordância verbal “tenha sido determinada, em suas origens, pela posição do sujeito relacionada à inacusatividade verbal; e essa variação pode ter sido intensificada por um eventual processo de enfraquecimento fonético da nasalidade do segmento final, na norma culta do PB” (op. cit., p.99). Em relação às variedades populares, Lucchesi menciona o estudo de Silva (2003), realizado em três comunidades rurais afro-brasileiras do Estado da Bahia, que indica a atuação da faixa etária no condicionamento da concordância verbal de terceira pessoa do plural. A freqüência e a probabilidade de marcação aumentam conforme a idade do falante diminui17, indicando, segundo o autor, “um processo de incremento da concordância verbal nas comunidades rurais afro-brasileiras” (p.104). Em outros dois estudos (VIEIRA, 1997; NINA, 1980) acerca da variedade popular, apresentados por Lucchesi, a relação entre concordância verbal e faixa etária é a mesma. Vieira (1997) investigou uma amostra de pescadores do norte do Rio de Janeiro e Nina (1980), pesquisou uma amostra de falantes analfabetos de dez municípios do interior do Pará. Para o autor, no processo de formação das variedades populares do PB houve erosão da morfologia flexional de pessoa e número do verbo que deve ter variado de acordo com cada situação sociolingüística. Ao longo do século XX, em função da crescente influência dos padrões lingüísticos urbanos, o uso dessa morfologia, conforme o autor, teria sido incrementado. Tal situação parece ser confirmada pelos resultados dos estudos acerca da concordância verbal. De um lado, em estudos de variedades populares, percebe-se o aumento no uso da concordância verbal na fala dos mais jovens; por outro lado, estudos de variedades urbanas cultas e semicultas indicam tendência de queda no nível de aplicação da regra para falantes mais jovens (cf. GRACIOSA, 1991) ou indicam variação estável (cf. SCHERRE e NARO, 1997). 16 Norma Lingüística Urbana Culta. Os resultados encontrados por Silva (2003) de acordo com a marcação da concordância verbal: faixa I (20 a 40 anos) – 22%, .62; faixa etária II (41 a 60 anos) – 14%, .48 e faixa etária III (61 anos em diante) – 10%, .36. 17 34 1.1.2 No Português Europeu No que se refere ao Português Europeu, salientaremos os seguintes estudos: Carrilho (2003), Varejão (2006) e Naro e Scherre (2007). Carrilho (2003) analisa, sob uma perspectiva formalista, a variação na concordância verbal de terceira pessoa em dados que fazem parte do CORDIAL-SIN18. Segundo a autora, a “discordância” verbal aparece em contextos em que o constituinte ocupa posição pós-verbal. Os dados analisados atestam que esta não marcação de concordância entre o verbo e um sujeito posposto ocorre apenas em construções com predicados verbais que não selecionam um argumento externo referencial, em casos de construções com verbos inacusativos e construções predicativas. Varejão (2006) investiga o fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural sob a ótica da Teoria da Variação Lingüística, embora enfatize que sua pesquisa “não se estabeleça sob sua orientação metodológica strictu senso” (p. 113). A amostra da sua pesquisa foi extraída da base de dados do CORDIAL-SIN. Dos 2520 dados coletados através da internet, 223 (9%) não apresentaram marcas de concordância. A autora controlou os seguintes grupos de fatores: saliência fônica, tipo de verbo, forma verbal, posição do sujeito, estrutura do SN sujeito e estatuto sintático do verbo que carrega as marcas de concordância. Embora Varejão não tenha feito uma análise quantitativa nos moldes labovianos, analisou a interferência dos fatores lingüísticos controlados. Sua análise revelou as formas verbais menos salientes e a posposição do sujeito como os mais significativos no desfavorecimento da marcação da concordância verbal no PE popular. Naro e Scherre (2007), ao investigarem as origens do PB, comprovam que há variação na concordância19 de número no português europeu atual e antigo. Embora a maioria dos portugueses, inclusive os profissionais da dialetologia, afirmem que o uso 18 O CORDIAL-SIN, Corpus Dialetal com Anotação Sintática, é um projeto do Centro de Lingüística da Universidade de Lisboa que apresenta excertos selecionados de 4500 horas de gravações de fala realizadas em 200 localidades de Portugal no âmbito dos atlas portugueses (ALEPG – Atlas Lingüístico e Etnográfico de Portugal e da Galiza, ALLP – Atlas Lingüístico do Litoral Português, ALEAç – Atlas Lingüístico e Etnográfico dos Açores e BA – Fronteira Dialetal do Barlavento Algarvio). Tais excertos estão disponíveis na internet na página www.clul.ul.pt. 19 Evidenciaremos os dados de concordância verbal de terceira pessoa do plural, nosso objeto de interesse, embora a análise dos autores contemple outros casos de concordância, como a nominal, por exemplo. 35 da regra de concordância é categórico, os autores, partindo de estudos do PE, garimpam exemplos da variação existente, como exemplificamos a seguir: (4) As querenguelas só presta para pescar Lanço das duas pedras que tá no meio do lanço ... corre todos os seus criados (versão do romance Adelina) (ALVES20, 1993, p.90, apud NARO e SCHERRE, 2007, p.55) (5) era duas, três sardinha É duas partes pru dono e uma pa cada um da gente (informante pescador, 69 anos) (NARO e SCHERRE, 2007, p. 56) (6) mas, minha senhora, pescadas e linguado nunca lá faltô a eles (informante mulher, 84 anos) (NARO e SCHERRE, 2007, p.56) Os exemplos em (4), (5) e (6) mostram a variação do PE no século XX, já os exemplos seguintes mostram que se encontra variação também em textos antigos. (7) mas dava lhe gram torva as portas çarradas (MIRA MATEUS, 1970, p.244, apud NARO e SCHERRE, 2007, p.58) (8) aqueles que, da gente d’Alexandria, reinou no Egipto (MIRA MATEUS, 1970, p.544, apud NARO e SCHERRE, 2007, p. 59) Os autores, em sua análise do PE antigo, verificam a influência do grupo de fatores saliência fônica para o condicionamento da variação da concordância verbal em oito textos portugueses medievais, num total de 235 dados de falta de concordância. A tabela a seguir evidencia os resultados encontrados pelos autores. 20 Segundo Naro e Scherre (op. cit.), os dados em (4) foram retirados da monografia de Joana Lopes Alves publicada primeiro em Lisboa em 1965, com dados não gravados. Os exemplos em (5) e (6) foram extraídos de gravações dos anos 80. 36 CATEGORIA N PESO RELATIVO - saliente + saliente 204 31 0,33 0,75 Tabela 1.1: Taxa de concordância verbo/sujeito em função da oposição singular/plural em oito textos portugueses medievais (NARO e SCHERRE, 2007, p.60) Naro e Scherre atestam, a partir dos resultados, que “os fatores que controlavam a variação no português medieval são os mesmos que controlam a variação no Brasil moderno de hoje” (2007, p.61). Os autores controlaram também em sua análise o grupo de fatores traço humano do sujeito. Os resultados estão na tabela abaixo. CATEGORIA N PESO RELATIVO humano não-humano 148 87 0,58 0,27 Tabela 1.2: Taxa de concordância verbo/sujeito em função do traço ‘humano’ do sujeito em oito textos portugueses medievais (NARO e SCHERRE, 2007, p.63) Pudemos verificar que os resultados dos textos medievais confirmam que os sujeitos com traço mais humano tendem à marcação da concordância, diferentemente dos sujeitos com traço menos humano. No que se refere à posição do sujeito em relação ao verbo, em uma análise de doze obras da dialetologia portuguesa européia, Naro e Scherre observaram que nove dos doze autores pesquisados apresentam exemplos de ausência de concordância verbal com sujeito à direita do verbo e também nove dos doze, com sujeito à esquerda do verbo. Observemos alguns exemplos, a seguir: (9) ... punhom-se pela cabeça, condo morria pessoas de família chigada... já bai os pães feitos tava lá já as criadas É os homes que puxim à carroça... ...corre todos os seus criados (NARO e SCHERRE, 2007, p. 96) (10) Foi os presos da cadeia 37 Que te nasça tantos bechochos... (...) D’pôs veiu o rei e a rainha (NARO e SCHERRE, 2007, p.97) (11) Duas canas dá oito mestras as borricêras que viero onte é que fez isto os nossos agasalhos é estes (NARO e SCHERRE, 2007, p.98) (12) O pai e a mãe nunca bai p’ró rio Carangueijos é do mar (NARO e SCHERRE, 2007, p.99) Os autores evidenciam que, além dos registros das ocorrências, a afirmação de uma das autoras portuguesas, de cuja obra foram retirados alguns dados, é bastante elucidativa: “Se o sujeito é plural e está depois do verbo, este fica freqüentemente no singular” e “mesmo quando o sujeito é plural e está antes do verbo, verifica-se, por vezes, o emprego deste no singular” [grifos dos autores] (CRUZ, 1991, p.159, apud NARO e SCHERRE, 2007, p.99). Desta forma, parece evidente a percepção de Cruz de que a posição do sujeito posposta ao verbo influencia mais “freqüentemente” na não marcação da concordância, enquanto a posição anteposta pode “por vezes” influenciar, assim como já é observado no PB (cf. NARO e SCHERRE, 1996; MONGUILHOTT, 2001). Em síntese, Naro e Scherre evidenciam que nem todas as variáveis independentes consideradas relevantes para o PB moderno foram testadas para os textos arcaicos do PE em função da quantidade de dados de que dispunham. No entanto, “o quadro diacrônico geral é a preservação do efeito hierárquico dos fatores condicionantes, acompanhado no Brasil de um aumento do nível da média global de uso da variante não explicitamente marcada no verbo, em contexto de sujeito plural” (NARO e SCHERRE, 2007, p.65). 1.1.3 Síntese Observamos, a partir dos trabalhos sobre o PB aqui arrolados, tanto no que se refere ao português urbano, quanto ao português popular, que em relação aos fatores internos as formas verbais mais salientes são as que apresentam mais marcas formais de 38 plural, a anteposição do sujeito favorece a marcação da concordância verbal, a indicação lexical favorece as marcas de concordância nos verbos, o sujeito indeterminado, pronominal, não explícito, zero, com traço de agentividade e mais humano favorece marcas de plural nos verbos. Com relação ao paralelismo, sintagmas nominais com marcas explícitas de plural favorecem marcas de plural nos verbos, assim como marcas de plural em verbos precedentes favorecem marcas de plural em verbos subseqüentes. No que tange ao tipo de verbo, observamos que este grupo de fatores não foi considerado estatisticamente significativo em alguns estudos que o controlaram (CARDOSO, 2005; SCHERRE, NARO e CARDOSO, 2007); no entanto, em termos de percentual, observou-se uma leve tendência ao desfavorecimento da marcação de plural para os inacusativos, em outros estudos (MONGUILHOTT, 2001; SILVA, 2003), a inacusatividade foi atestada como ambiente favorecedor da não-marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural. Já no que se refere aos fatores externos, os resultados apontam para diferentes caminhos quando se trata de PB urbano e PB não urbano, especificamente para o grupo de fatores faixa etária e sexo. Em relação à faixa etária, os resultados sobre o português popular de São Paulo indicam que os falantes mais velhos tendem ao uso das formas padrão. Os resultados sobre a fala urbana carioca, com dados do PEUL, evidenciam que as pessoas mais pressionadas pela idade profissionalmente produtiva usam mais marcas de concordância nos verbos. Os resultados sobre variedades cultas e semicultas, por um lado, com dados do PEUL, NURC e VARSUL, indicam que os mais velhos usam mais concordância do que os mais jovens, e sobre variedades populares da Bahia, Rio de Janeiro e Pará apontam para o fato de que os mais jovens usam mais concordância nos verbos. Em relação ao sexo, os estudos também apontam para duas direções: de um lado, na fala urbana, a mulher tende a marcar mais a concordância verbal (SCHERRE e NARO, 1997), por outro lado, na fala não urbana o homem é que apresenta essa tendência (SILVA, 2003). Quanto à escolarização, grupo de fatores controlado apenas nos trabalhos sobre o PB urbano aqui apresentados, os resultados evidenciam que os falantes mais escolarizados são os que tendem ao uso de marcas de concordância verbal. No que se refere às atitudes subjetivas sobre a não marcação da concordância verbal, grupo de fatores controlado em apenas um dos trabalhos aqui arrolados sobre o 39 PB urbano (BORTONI-RICARDO, 2008), os resultados indicam que os falantes com mais escolaridade estigmatizam a concordância verbal não padrão e as formas verbais com mais concordância não padrão são as que mais sofrem estigma por parte dos falantes. Os estudos que controlaram a concordância verbal de 3ª pessoa do plural e de 1ª pessoa do plural indicam que as formas de 3ª pessoa apresentam índices de não concordância mais evidentes do que as de 1ª pessoa21, o que, segundo os autores, parece indicar que a não marcação na 3ª pessoa tem menos estigma do que a não marcação na 1ª pessoa. No que tange às comunidades, parece haver relação entre a história de cada localidade e as variantes eleitas pelos seus falantes, o que indicaram os estudos de Rodrigues (1987) e de Silva (2003) sobre o PB popular. Os resultados dos estudos sobre o PE aqui apontados indicam que, assim como no PB, as formas verbais mais salientes são favorecedoras das marcas explícitas de plural nos verbos, a ordem VS, assim como sujeitos com traços menos humanos mostram-se contextos desfavorecedores da não marcação da concordância nos verbos. Em nossa pesquisa, vamos relacionar os resultados encontrados pelos estudos realizados com amostras do PB e do PE, a fim de constatar se no corpus do nosso trabalho, para ambas as variedades do português, encontramos os mesmos condicionadores da concordância verbal desses estudos. Desta forma, fica clara a delimitação do nosso objeto de estudo: a variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE atual e antigo. A seguir traçamos os objetivos, questões e hipóteses da pesquisa e, logo após, evidenciamos o aparato teórico-metodológico que fundamenta nossa tese. 21 No estudo de Rodrigues (1987), a não marcação da concordância verbal na 3ª pessoa do plural é de 71%, enquanto na 1ª pessoa é de 46%. Os resultados de Pereira (2004) apontam não marcação de 76% para a 3ª. pessoa do plural e de 67% para a 1ª pessoa do plural. 40 1.2 Objetivos, questões e hipóteses da pesquisa 1.2.1 Objetivos geral e específicos 1.2.1.1 Objetivo Geral Investigar e mapear o fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE em uma amostra sincrônica (século XXI), além de traçar o percurso diacrônico deste fenômeno (séculos XIX e XX). 1.2.1.2 Objetivos Específicos (i) Analisar grupos de fatores lingüísticos, geográficos e sociais que possam estar condicionando a variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE; (ii) Realizar um estudo comparativo para investigar o encaixamento lingüístico e social da concordância verbal de terceira pessoa do plural no português falado no Brasil e em Portugal; (iii) Verificar, a partir da investigação de dados sincrônicos, qual a relação entre as faixas etárias controladas e a variável diazonalidade no uso das variantes da concordância verbal de terceira pessoa do plural; (iv) Investigar nas amostras do PB e do PE, a partir da análise de dados diacrônicos, evidências de uma possível mudança nos diferentes percursos do tempo; (v) Observar a relação entre os problemas empíricos levantados por Weinreich, Labov e Herzog (1968) e o fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural. 1.2.2 Principais Questões (i) Que grupos de fatores lingüísticos e extralingüísticos condicionam a concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE? (ii) O encaixamento lingüístico e social da concordância verbal de terceira pessoa do plural se dá da mesma forma no PB e no PE? (iii) A marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural é distinta entre os falantes mais jovens e mais velhos da zona urbana e da zona não urbana do PB e do PE? 41 (iv) Se considerarmos os séculos XIX e XX, há distinção na marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE? (v) Como o fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural se relaciona aos problemas empíricos levantados por Weinreich, Labov e Herzog (1968)? 1.2.3 Hipóteses Gerais22 (i) A variação do fenômeno da concordância verbal é condicionada muito mais por grupos de fatores lingüísticos do que extralingüísticos, tanto no PB, quanto no PE (cf. MONGUILHOTT, 200123); (ii) Acreditamos que o PE se mostrará mais conservador na marcação da concordância verbal, apresentando freqüências maiores de marcas explícitas de plural nos verbos do que as freqüências que serão encontradas no PB (cf. NARO e SCHERRE, 2007); (iii) No que se refere ao recorte sincrônico do PB e do PE, nossa hipótese em relação às duas faixas etárias controladas, jovens e velhos, relaciona-se à diazonalidade. Esperamos que os jovens da zona não urbana preservem mais as marcas de concordância verbal do que os velhos desta mesma zona. Já no que se refere à zona urbana, acreditamos que os mais velhos preservem mais a concordância verbal (cf. LUCCHESI, 200624); (iv) No que tange ao recorte diacrônico, tanto do PB, quanto do PE, acreditamos que os resultados apresentarão aumento da variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural do século XIX para o século XX25. 22 As hipóteses específicas serão discutidas no capítulo II, seção 2.5, juntamente com o item que trata da caracterização e das hipóteses relativas a cada um dos grupos de fatores. Em relação aos problemas empíricos, também levantamos as hipóteses no capítulo II, seção 2.1.5. 23 Embora nossa hipótese seja tanto para o PB, quanto para o PE, os resultados de Monguilhott (2001) que correspondem à nossa hipótese referem-se somente ao PB, conforme salientamos na seção 1.1.1.1. 24 Lucchesi (2006) também trata de resultados somente do PB, cf. seção 1.1.1.2. 25 Levantamos essa hipótese correlacionando os resultados de estudos diacrônicos a respeito da ordem e do preenchimento do sujeito que serão discutidos no capítulo IV, seção 4.3. 42 Capítulo II – FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICO-METODOLÓGICA A abordagem teórico-metodológica deste estudo levará em conta os pressupostos da Teoria da Variação e Mudança Lingüística (cf. WEINREICH, LABOV e HERZOG, 1968; LABOV, 1972, 1994) e da Dialetologia Pluridimensional (cf. RADTKE e THUN, 1996; THUN, 1998; BELLMANN, 1999) que serão evidenciados neste capítulo. Ressaltamos, ainda, a amostra coletada e o programa utilizado para a análise estatística, delineamos o perfil sócio-histórico das comunidades de fala a serem investigadas neste trabalho, indicamos também a variável dependente do nosso estudo, apresentamos os contextos de restrição do fenômeno em estudo, e, por fim, caracterizamos e levantamos as hipóteses relativas às variáveis independentes. 2.1 Teoria da Variação e Mudança 2.1.1 Pressupostos Básicos A teoria da variação e mudança lingüística, proposta por William Labov (1966), consiste em um modelo teórico e metodológico que tem por objetivo analisar a língua como sistema heterogêneo. Língua, de acordo com Labov (2008 [1972], p.215), é “uma forma de comportamento social, [...] usada por seres humanos num contexto social, comunicando suas necessidades, idéias e emoções uns aos outros”. A teoria variacionista aborda a estrutura e evolução da linguagem num contexto social da comunidade de fala26, partindo do pressuposto de que a variação na fala de indivíduos pertencentes a uma mesma comunidade lingüística é sistematizada, i.e., toda variação é condicionada por fatores de ordem diversa, e a mudança lingüística resulta desta variação. É também chamada de sociolingüística quantitativa, pois utiliza-se de cálculos, como percentagens e probabilidades, de estruturas variáveis em dados coletados da fala. O modelo laboviano surgiu em meados da década de 60, momento em que despontava a teoria chomskiana27 e ainda vigoravam as idéias saussureanas28. Labov, 26 Na seção 2.1.3, discutiremos o conceito de comunidade de fala. Algumas idéias da Gramática Gerativa já estavam presentes na obra de Chomsky de 1955, Logical Structure of Linguistic Theory, mas o desenvolvimento destas idéias se deu em 1957, com Syntactic Structures. 28 As idéias de Saussure foram publicadas por dois de seus discípulos, Charles Bally e Albert Sechehaye com a colaboração de outro discípulo A. Riedlinger, em 1916, três anos depois de sua morte. Os alunos publicaram a obra “Cours de linguistique générale” a partir de anotações feitas durante o curso de Lingüística Geral oferecido pelo mestre na Universidade de Genebra. 27 43 naquele momento, apresenta críticas tanto ao modelo saussureano, quanto ao modelo chomskiano. Em relação a Saussure, Labov aponta o paradoxo saussureano como um dos pontos a serem rejeitados. O paradoxo está no fato de todos os falantes possuírem um conhecimento da langue (parte social da linguagem) e assim ser possível estudar o aspecto social da linguagem pela observação de um único indivíduo, no entanto, o estudo da parole (individual) só pode ser feito pela observação da linguagem em seu contexto social. Para Labov, a língua é heterogênea e a heterogeneidade é sistemática. Outro ponto a ser rejeitado pelo modelo laboviano é a questão da imanência defendida por Saussure. Segundo Saussure, os fatos lingüísticos são explicados através de outros fatos lingüísticos. Já para Labov, esses fatos são explicados também no campo extralingüístico em que se introduz o componente social. O modelo saussureano também defende que a fala só opera sobre um estado de língua, a sincronia – fato estático, e as mudanças que ocorrem entre os estados, diacronia – fato evolutivo, não têm nesses nenhum lugar, pois é a sincronia que constitui a realidade verdadeira e única. Para Labov, a variação e mudança no sistema devem ser investigadas a partir de fatos sincrônicos e diacrônicos. No que se refere aos preceitos teóricos de Chomsky, Labov rejeita o fato de, no modelo chomskiano, o objeto da lingüística ser uma comunidade de fala abstrata, homogênea, com falantes-ouvintes ideais. Para o modelo laboviano, a comunidade de fala é heterogênea, com falantes-ouvintes reais. Para a teoria chomskiana, os dados são as próprias intuições do lingüista e/ou dos falantes sobre a linguagem. São os lingüistas/falantes que fazem, a partir do “seu dialeto”, os julgamentos de gramaticalidade, de aceitabilidade e de relação semântica, o que implica muitos casos de julgamento duvidoso. Para Labov, os lingüistas não podem produzir teoria e dados ao mesmo tempo. A busca por julgamentos intuitivos homogêneos é falha; muitas vezes, a intuição é menos regular e mais difícil de interpretar do que a própria fala. De acordo com Labov, para lidar com a língua, é preciso olhar os dados de fala do dia-a-dia e relacioná-los às teorias gramaticais o mais criteriosamente possível, ajustando a teoria de modo que ela dê conta do objeto. Para Chomsky, a teoria não é determinada pelos dados; já para Labov, sim. Como uma metodologia científica, a teoria da variação e mudança pressupõe, portanto, um objeto e um método. Seu principal objeto é a língua, empregada em situações naturais e espontâneas do dia-a-dia por indivíduos pertencentes a uma 44 determinada comunidade. Algumas barreiras teóricas são apontadas para o estudo da linguagem do dia-a-dia; no entanto, todas elas superáveis, de acordo com Labov (1972). A agramaticalidade da fala é uma destas barreiras. Para Labov, o fato de existirem muitas sentenças mal formadas na fala é um mito sem base em fatos reais comprovado em vários estudos empíricos, em que aproximadamente setenta e cinco por cento dos enunciados são bem formados. Outra barreira apontada seria o fato de decidir o lugar da variação na estrutura lingüística, já que temos na língua formas alternativas de dizer a mesma coisa. De acordo com Labov, a existência de variação e estruturas heterogêneas na comunidade de fala é comprovada: a heterogeneidade não é apenas comum como é resultado natural de fatores lingüísticos básicos. Citando Weinreich, Labov e Herzog29, (1968, p.101), o autor afirma que “a ausência de alternância estilística e de sistemas comunicativos multiestratificados é que seria disfuncional” (LABOV, 2008 [1972], p. 238), já que a variação é inerente à comunidade de fala. Outro problema apontado para o estudo da linguagem do dia-a-dia são as dificuldades de audição e gravação da fala em situações naturais que, segundo Labov, é um problema resolvido com equipamentos de boa qualidade, o que a cada dia é mais fácil de se obter. Labov afirma, ainda, que não há necessidade de centenas de gravações para se fazer uma análise estatística, pois padrões básicos de estratificação social emergem de amostras de cerca de vinte e cinco informantes, sendo cinco por célula30. Por fim, a questão da raridade das formas sintáticas também é apontada como uma barreira teórica. Para o autor, há algumas estratégias para superar essa barreira, como o fato de o lingüista ser capaz de estabelecer uma conversação com um informante suscitando o uso natural de dada forma sem ele mesmo utilizá-la. Assim, poderá verificar se o falante tem tal forma incorporada em sua fala, se apresenta um uso regular ou não. Em relação ao método da sociolingüística variacionista, temos a questão da seleção dos informantes para compor as amostras para o estudo sociolingüístico. Os falantes são selecionados de acordo com suas características sociais e geográficas de modo que representem a sociedade na qual se inserem. O método consiste em verificar quais fatores sociais e lingüísticos condicionam a escolha de uma ou outra das formas alternantes da língua, as variantes, definidas por Labov (2008 [1972], p.313) como “a 29 30 Daqui por diante, ao nos referirmos aos autores, usaremos as iniciais dos seus sobrenomes WLH. Entende-se por célula a unidade de uma estratificação social. 45 opção de dizer ´a mesma coisa´ de várias maneiras diferentes, isto é, as variantes são idênticas em valor de verdade ou referencial, mas se opõem em sua significação social e/ou estilística”. Ao conjunto de variantes dá-se o nome de “variável lingüística”. De acordo com Oliveira (1987), não podemos restringir o contexto unicamente ao contexto estrutural, pois existe um outro tipo de seleção de formas que não ocorrem em termos estruturais. Segundo o autor, a literatura em lingüística antropológica aponta vários casos em que a seleção de formas acontece em termos da estrutura cultural da comunidade de fala. De fato, o contexto não-estrutural, em que se inserem fatores sociais, discursivos, pragmáticos etc., apresenta o mesmo efeito para certificar se estamos diante de variantes que o contexto estrutural apresentaria. Em relação ao valor de verdade, Oliveira busca subsídios na noção de sinonímia, já que, no caso das análises sociolingüísticas, a sinonímia é limitada ao valor de verdade. Para Labov (1978), duas sentenças que se referem ao mesmo estado de coisas têm o mesmo valor de verdade, ligando, desta forma, a noção de significado à de valor de verdade. Segundo Labov (2003 [1969]), um dos princípios fundamentais da investigação sociolingüística está no fato de não haver falantes com estilo único, já que todo falante mostra alguma variação em regras fonológicas e sintáticas de acordo com o contexto no qual ele fala. As mudanças estilísticas são determinadas, conforme Labov, (i) pelas interações do falante com os outros e relações de poder ou solidariedade entre o grupo; (ii) pelo contexto social – escola, trabalho, casa, vizinhança, igreja e ainda (iii) pelo tópico da fala. Os estudos variacionistas desenvolveram-se, em sua maioria, na área da fonologia, a começar pelos estudos pioneiros de Labov31. Essa preferência se desencadeou, de acordo com Bentivoglio (1987), primeiramente pela alta freqüência de 31 No primeiro estudo “The social motivation of a sound change” (1972 [1963], capítulo I), Labov investiga a variação dos ditongos [ay] e [aw] na Ilha de Martha’s Vineyard, Massachussets. O autor atesta, a partir da sua análise, que há uma tendência à centralização dos ditongos pelos nativos da ilha, contrária ao inglês padrão, condicionada pela resistência destes nativos que se identificam com a ilha aos veranistas que invadiam seu lugar para fazer turismo. Desta forma, Labov comprova que não é possível investigar um percurso de mudança lingüística separadamente da vida social da comunidade de fala, as pressões sociais agem sobre a linguagem. No segundo estudo “The social stratification of (r) in New York city department stores”(1972 [1966], capítulo II), Labov investiga a presença/ausência do [r] pós-vocálico na fala de nova iorquinos estratificados de acordo com classe social. Os dados foram coletados por Labov em três lojas de departamentos da cidade (Saks – classe média alta, Macy’s – classe média baixa e Klein – classe baixa). Os resultados apontam para o maior uso do [r] na Saks (62%) e na Macy’s (51%) e para o menor uso na Klein (21%). A análise do autor confirma a importância da estratificação social no condicionamento de usos lingüísticos, pois o novo padrão de prestígio de Nova Iorque é a presença do [r] e foi justamente nas lojas de classes sociais mais prestigiadas (Saks e Macy’s) que o segmento fônico apareceu com maior freqüência. 46 uso dos dados, necessária para a análise empírica, e também pelo campo da fonologia mostrar-se ideal para o estudo da variação, já que as variantes fonológicas apresentam significado social e estilístico32. 2.1.2 A variação na sintaxe Estendendo os estudos variacionistas para além do campo da fonologia, Weiner e Labov (1983 [1977]) realizam uma pesquisa quantitativa das construções ativas e passivas do inglês, testando fatores externos (estilo, sexo, classe, etnia, idade) e fatores internos (status informacional, paralelismo estrutural). Os autores, ao analisar seus resultados, verificam que a escolha de uma ou outra das formas alternantes é motivada sintaticamente, não sendo, portanto, socialmente determinada. Essas considerações sugerem uma reformulação de pressupostos em que a crença de que o estudo da variação pode detectar empiricamente a mudança, explicada em termos sociais, deixa de existir, passando-se a considerações de ordem interna relativas ao funcionamento da gramática. Partindo do estudo de Weiner e Labov, Lavandera (1978) levanta alguns argumentos favoráveis à inadequação de estender o estudo variacionista para além do nível fonológico. Primeiramente, ao salientar o fato de as construções sintáticas apresentarem cada uma, por definição, um significado, questionando, desta forma, o conceito de variantes sintáticas, a autora sugere o alargamento de mesmo significado para condição de “comparabilidade funcional”. Neste sentido, construções sintáticas cuja intenção comunicativa é a mesma, independentemente de possuírem mesmo significado, podem ser tratadas como variantes de uma mesma variável. Para Lavandera, outra opção seria restringir o estudo variacionista ao nível fonológico em que as variantes dizem de fato “a mesma coisa”. Labov (1978) discorda das propostas de Lavandera afirmando que unidades nãofonológicas não possuem cada uma um significado. Para isto, lança mão da noção de “estado de coisas” em que dois enunciados que se referem ao mesmo estado de coisas têm o mesmo significado referencial ou o mesmo valor de verdade. Lavandera coloca em foco também a noção de variável sociolingüística. Para a autora, estudos em que os fatores sociais e estilísticos não se mostram relevantes não 32 Para Labov (1972) o fato de as variantes apresentarem significado social e estilístico implica se dizer “a mesma coisa” de formas diferentes. Neste sentido, o autor evidencia que as variantes são idênticas em valor referencial ou valor de verdade, possuindo significação social e estilística oposta. 47 devem ser caracterizados como variação “sociolingüística”. Labov não distingue variável sociolingüística de variável lingüística e, contrário ao argumento de Lavandera, o autor deixa claro que, ao realizarmos estudos sociolingüísticos, não estamos somente preocupados em verificar a relevância dos fatores sociais, mas, antes disso, objetivamos obter um retrato da estrutura gramatical da língua, vista como um fenômeno social. Diante disto, acreditamos que, apesar de a extensão da teoria da variação lingüística a outros níveis além da fonologia gerar controvérsias, o caminho é possível de ser seguido. No caso da variável dependente deste estudo, a concordância verbal de terceira pessoa do plural, pudemos observar que se caracteriza como uma regra variável passível de um estudo variacionista, pois, como afirma Labov, vamos estar lidando com enunciados que se referem ao mesmo estado de coisas. Analisando os exemplos a seguir: (1) a. Chegaram as cartas b. Chegou as cartas (2) a. As cartas chegaram b. As cartas chegou percebemos que de fato as sentenças com ou sem marcação da concordância verbal apresentam a mesma intenção comunicativa, nos termos de Lavandera, e o mesmo valor de verdade, nos termos de Labov, podendo então ser consideradas variantes de uma mesma variável. 2.1.3 Comunidade de fala De acordo com a sociolingüística variacionista, os fenômenos variáveis devem ser observados em comunidades de fala. Labov (1972) afirma que a comunidade de fala não se define por nenhum acordo marcado quanto ao uso dos elementos da língua, mas, sobretudo, pela participação num conjunto de normas estabelecidas. Tais normas podem ser observadas em tipos claros de comportamento avaliativo e na uniformidade de padrões abstratos de variação, que são invariantes em relação a níveis particulares de uso. 48 Para o autor, comunidade de fala envolve um conjunto de indivíduos que avaliam a língua da mesma maneira, pensam a língua da mesma maneira, entrando em jogo, desta forma, os fatores sociais. Segundo Labov, não se trata de um grupo de falantes que utilizam as mesmas formas, mas de um grupo que segue as mesmas normas relativas ao uso da língua. Labov enfatiza então, para o conceito de comunidade de fala, a questão da avaliação no grupo, isto porque, para ele, a avaliação é mais homogênea do que os usos. Já Guy (2001), para chegar ao conceito de comunidade de fala, evidencia algumas questões. A primeira é o fato de que as diferenças entre falantes de uma língua devem ser extensivas, ou seja, devem atingir muitas áreas da gramática mental. Guy aponta também que os falantes compartilham características lingüísticas entre si que podemos reconhecer e que os distinguem de outros falantes que não compartilham tais características. O autor enfatiza, ainda, que essas diferenças existentes entre os falantes são sistemáticas e não aleatórias, correspondem à organização social e refletem subgrupos de falantes que usam as mesmas características e que estas diferenças não são limitadas a diferenças entre falantes, mas também acontecem dentro da fala de cada pessoa que vai variar o uso por vários motivos, sejam comunicativos ou sociais, questões que envolvam formalidade/informalidade, polidez/intimidade. Depois de apresentadas as questões, Guy (2000) define comunidade de fala como um grupo de falantes que apresentam: (i) características lingüísticas compartilhadas; isto é, palavras, sons ou construções gramaticais que são usados na comunidade, mas não o são fora dela; (ii) densidade de comunicação interna relativamente alta; isto é, as pessoas normalmente falam com mais freqüência com outras que estão dentro do grupo do que com aquelas que estão fora dele; (iii) normas compartilhadas; isto é, atitudes em comum sobre o uso da língua, normas em comum sobre a direção da variação estilística, avaliações sociais em comum sobre variáveis lingüísticas (p.18). Para a quantificação das diferenças e semelhanças lingüísticas em uma comunidade de fala, Guy sugere que podem ser medidas em termos de efeitos de contextos33. Segundo o autor, as comunidades diferentes apresentam diferenças nos efeitos contextuais representados pelos pesos relativos, o que implica diferenças gramaticais. Já os indivíduos que formam uma comunidade de fala, de acordo com Guy, 33 Efeitos de contextos seriam os efeitos exercidos por fatores lingüísticos condicionantes dos fenômenos variáveis. Guy (2001) cita como exemplo de efeito de contexto no português a influência do fator tipo de verbo na queda do /r/ final, fator este que faz parte do contexto morfológico ou lexical. 49 devem compartilhar os mesmos efeitos de contexto nos processos variáveis, entre os traços lingüísticos que definem a comunidade. As diferenças entre indivíduos dentro da mesma comunidade são de natureza não gramatical. Guy (2000) evidencia que as características definidoras da comunidade de fala estão imbricadas. Na verdade, os membros de uma comunidade compartilham traços lingüísticos em função da densidade da comunicação e das normas compartilhadas. Segundo o autor, pertencer a uma comunidade é em parte, acidental, determinado pelas circunstâncias de nascimento e residência, e pelo acesso comunicativo a outros. Mas é também parcialmente intencional, determinado pelas nossas atitudes social e lingüísticas, pelas nossas decisões sobre com quem queremos nos associar, e quem queremos emular. Adotar a gramática da comunidade é, em parte, um ato de identidade (2001, p.14). Desta forma, parece que Guy, diferentemente de Labov, atribui igual importância aos traços lingüísticos e às normas e atitudes compartilhadas pelos falantes, além de inserir a questão das redes sociais a que pertencem os falantes para a definição de comunidade de fala. Neste trabalho, é esta a concepção de comunidade de fala que adotamos. 2.1.4 Redes sociais Consideramos importante também a discussão que existe na literatura sociolingüística a respeito das redes sociais, aspecto a ser considerado neste trabalho e que, de certa forma, é levantado por Guy (2000, 2001), como vimos na sua definição de comunidade de fala. As redes sociais são definidas, de acordo com Milroy (2002), como a união de conexões contratadas entre os indivíduos. De acordo com a autora, a análise das redes examina as estruturas e as propriedades destas conexões, capturando a dinâmica dos comportamentos interacionais dos falantes. Esta análise, desenvolvida por antropólogos nas décadas de 60 e 70, passou a ser adotada pelos variacionistas a partir da década de 80, com o trabalho precursor de Milroy que revisou o conhecimento sociológico dos estudos de rede para aplicar em um estudo em Belfast (Irlanda), “para explicar o comportamento individual de vários grupos que não podem ser avaliados em termos das associações do grupo corporativo” (1980, p.135 apud CHAMBERS, 1995, p.67)3435. 34 “to explain individual behaviour of various kinds which cannot be accounted for in terms of corporate group membership”. 50 As redes sociais, segundo Milroy (2002), são criadas pelos indivíduos para suprir problemas da vida cotidiana, são comunidades pessoais constituídas por ligações interpessoais de diferentes tipos e intensidades, com estruturas e elos de conexões que podem variar. Chambers (1995) evidencia que a classe social foi a variável original a ser investigada na sociolingüística; no entanto, percebeu-se que, mesmo em grupos sociais relativamente homogêneos – vizinhança, igreja, instituições –, os indivíduos variam lingüisticamente. Diferentemente de outras categorias, como a classe social, as redes sociais não se constituem como uma categoria social fixa, situada no macro-nível, dado que as ligações dos indivíduos dentro e entre comunidades de fala podem mudar por diversas razões. “Estudos de rede”, como Guy (1988, p.54) aponta, “são microsociológicos em foco, enquanto estudos de classe são macroscópicos”36 (apud CHAMBERS, 1995, p.68). Chambers (1995) chama a atenção para o fato de que, por um lado, as redes sociais giram ao redor de uma série de valores locais que geram certa pressão social para que os indivíduos adotem os padrões valorizados por aquele grupo; por outro lado, as redes são, em algum grau, mais escolhidas do que impostas, já que o indivíduo se associa a tal e tal rede muitas vezes por escolha própria. Esse aspecto, segundo o autor, faz com que as ligações entre os membros das redes difiram das ligações em nível macro, as quais são amplamente determinadas pela família. Como Lippi-Green (1989, p.223 apud CHAMBERS, 1995, p.71) afirma, enquanto a idade e o gênero são indicadores das relações de grupo sobre as quais o indivíduo não tem escolha e dentro do qual o indivíduo deve atuar, os subsetores da rede representam um diferente aspecto do indivíduo como membro da comunidade: um agente livre.37 Para Chambers (1995), quando visamos a uma explicação das ligações de rede dos indivíduos, devemos olhar para suas associações diárias, investigando como muitas pessoas em certo grupo se conhecem e como elas fazem para se conhecer. O número de ligações entre os indivíduos em uma rede chama-se densidade (do inglês, density) e a capacidade das ligações entre os indivíduos constitui a plexidade (do inglês, plexity). 35 As traduções encontradas ao longo deste trabalho são de nossa responsabilidade. “Network studies are microsociological in focus, while class studies are macroscopic”. 37 “while age and gender are indicators of group alliance about which the individual has no choice, and within which he or she must function, the... network subsectors… represent a different aspect of the individual as a community member: that of a free agent”. 36 51 Quanto maior o número de pessoas que se conhecem umas às outras em uma determinada rede, maior sua densidade, o contrário configura uma rede frouxa ou de baixa densidade. As redes multiplexas são compostas por indivíduos que se relacionam entre si em diversas condições (podendo ser ao mesmo tempo parentes e vizinhos, ou ainda parceiros no trabalho e no lazer). Já a rede uniplexa é caracterizada por indivíduos que se relacionam de uma única maneira. Os estudos apontam que comunidades de alta densidade e multiplexas tendem a exibir forte resistência à influência de valores externos, em função dos fortes laços existentes entre os indivíduos e da identificação com os valores sociais da sua comunidade. Um outro termo importante que se vincula às redes sociais e será considerado em nosso trabalho é o localismo. Para Milroy (1980), localismo refere-se ao sentimento que o indivíduo tem de pertencer ao local em que mora, valorizando-o socialmente. Os indivíduos que se identificam com a comunidade da qual fazem parte tendem a reforçar os valores culturais e lingüísticos locais. Relacionado a esse conceito está o conceito de mobilidade. Indivíduos que apresentam alto grau de mobilidade, ou seja, de deslocamento do seu lugar de origem, da sua comunidade, tendem a adotar valores de um grupo externo de referência. Em relação à nossa amostra, esperamos que os informantes das comunidades não urbanas constituam redes mais densas e multiplexas, já que nessas comunidades os indivíduos se relacionam muito mais intensamente entre eles, são mais solidários entre si, enquanto que os informantes das comunidades urbanas constituam redes menos densas e uniplexas por terem menos contato entre si, apresentarem relações menos estreitas com os indivíduos que fazem parte da sua comunidade. Desta forma, esperamos que os informantes da zona não urbana tendam ao uso de variantes locais, no caso do nosso estudo, a não marcação da concordância verbal. Já os informantes da zona urbana, embora não exerçam interinfluências entre si por constituírem redes frouxas, usam padrões mais valorizados socialmente, no caso, a marcação da concordância verbal, em função de pertencerem à zona urbana. Acreditamos, também, que os informantes da nossa amostra que se identificarem com a sua localidade tenderão à valorização da cultura local, bem como dos usos lingüísticos locais, diferentemente dos indivíduos que não se identificarem com a localidade da qual fazem parte, que tenderão a adotar padrões lingüísticos externos. Esperamos ainda que os indivíduos que apresentarem pouca mobilidade tenderão ao uso 52 dos padrões valorizados localmente, diferentemente dos indivíduos que apresentarem alta mobilidade que tenderão a adotar padrões lingüísticos de grupos externos de referência. 2.1.5 Sobre mudança lingüística Através da sociolingüística quantitativa, podemos observar se existe certa estabilidade entre as variantes em concorrência, ou se há mudança em progresso, em que uma das variantes está ganhando a competição, e, neste caso, quais as tendências de uma possível mudança lingüística. Quando estamos diante de formas diferentes competindo por uma mesma função, é natural que essas formas se rejeitem mutuamente. Esta situação não parece nem econômica, nem funcional para a língua, pois não precisamos ter mais de uma forma, no mesmo contexto, dizendo a mesma coisa. Para Labov (2003 [1969]), em qualquer lugar a língua está em processo de mudança, já que há tendência para novas formas serem adotadas por um grupo social e gradualmente espalharem-se a outros grupos. O autor afirma que o valor atribuído à forma é derivado dos valores associados com o grupo que a introduziu. De acordo com WLH (1968), “nem toda variabilidade e heterogeneidade na estrutura lingüística implica mudança; mas toda mudança implica variabilidade e heterogeneidade”38, e são os fatores sociais, principalmente o fator idade, que nos permitem verificar os indícios de mudança em tempo aparente, assim como a investigação em períodos diferentes de tempo nos permite verificar os indícios de mudança em tempo real. Naro (1992), ao tratar de mudança lingüística em tempo aparente, ressalta alguns aspectos interessantes. Inicialmente, o autor evidencia a posição clássica (aceita desde gerativistas até sociolingüistas), que postula que o processo de aquisição da linguagem se encerra aproximadamente no início da puberdade e, a partir daí, a língua do indivíduo fica estável. Partindo dessa hipótese, Naro revela que o estado atual da língua de um falante adulto reflete o estado da língua adquirida quando tinha mais ou menos 15 anos. Desse modo, a fala de uma pessoa de 70 anos, pertencente a um corpus gravado em 1990, representaria o estado da língua adquirida em 1935. Estudos desse tipo, segundo o autor, revelam um padrão quase linear da mudança lingüística em progresso, com as pessoas mais velhas preferindo uma forma mais conservadora, os mais jovens a forma inovadora e os de meia-idade usando ambas 38 Tradução de Bagno (2006, p.126). 53 as formas, confirmando, assim, o postulado fundamental da hipótese clássica do relacionamento entre mudança e idade, em que “o processo da mudança se espelha na fala das sucessivas faixas etárias” (NARO, 1992, p.84). Naro aponta que, apesar de interessante, a hipótese clássica esconde algumas dificuldades: primeiro o fato de nem toda variação na fala representar mudança em progresso na língua e, também, o fato de a variação estável assim como a mudança em progresso poderem depender da faixa etária do falante. No caso de variação estável, segundo o autor, não costuma aparecer o padrão quase linear, mas um padrão curvilinear, com os jovens e os velhos apresentando comportamento semelhante em contraste com os de meia-idade. Desta forma, há evidências de que o falante muda sua língua no decorrer dos anos, diferentemente do que a hipótese clássica prevê: a existência da estabilidade na língua depois da puberdade. Em relação à questão: “qual a posição certa?”, Naro coloca que “a base empírica da hipótese clássica se encontra bastante enfraquecida atualmente” (1992, p.84). Revela, ainda, que os estudos devem contemplar as mudanças em tempo aparente relacionadas a mudanças em tempo real, pois “os dois padrões existem lado a lado” (1992, p.85). Os estudos em tempo real podem recorrer a estágios anteriores da língua ou ainda investigar amostras de fala da mesma comunidade (estudo do tipo “tendência”) ou do mesmo indivíduo em tempos diferentes (estudo do tipo “painel”). Paiva e Duarte (2003) evidenciam que o estudo da mudança em tempo real não está isento de problemas. Um deles refere-se ao fato de a amostra selecionada pelo pesquisador não ser representativa da comunidade de fala daquela época, já que se recorre a textos escritos, pois não se tem acesso a falantes de tais épocas. Apontam ainda que, muitas vezes, algumas formas são preservadas nos textos escritos, embora já não sejam mais usadas na fala. No que se refere ao presente estudo, recorreremos a estágios anteriores da língua a partir de uma amostra constituída de peças de teatro dos séculos XIX e XX, o que nos permitirá identificar o percurso da concordância verbal através desses séculos. Acreditamos que, no caso das peças de teatro, o problema apontado por Paiva e Duarte (2003) seja, talvez, amenizado, pois algumas peças do PB, por exemplo, não foram editadas e, por isso, não passaram por um processo criterioso de revisão e também pela característica deste gênero textual, que, embora escrito, pretende representar a fala de personagens, sendo, portanto, no que diz respeito aos diálogos, mais informal. 54 No que tange à investigação com dados atuais, como apresentamos no capítulo I, seção 1.2.3, nossas hipóteses em relação às duas faixas etárias a serem controladas, jovens e velhos, relaciona-se à diazonalidade. Esperamos que os jovens da zona não urbana preservem mais as marcas de CV do que os velhos desta mesma zona. Já no que se refere à zona urbana, acreditamos que os mais velhos preservem mais a CV. Em relação aos dados de outras épocas, acreditamos que encontraremos indícios de mudança do século XIX para o século XX nos casos de marcação da concordância com sujeito posposto ao verbo. Esperamos que, no século XIX, haja freqüência maior de concordância nestes casos, em função da maior recorrência de sujeito posposto naquele período, como atestam os dados de Berlinck (1988) e de Coelho (2006). À medida que a ordem anteposta vai se enrijecendo, o que acontece no século XX, o sujeito posposto passa a ser encarado pelos falantes como objeto (cf. PONTES, 1986), havendo assim menos marcação da concordância nos verbos. Esperamos que o padrão referente à variação e mudança com dados atuais e com dados de outras épocas seja encontrado tanto no PB quanto no PE, no entanto, com diferenças percentuais, com a variedade européia mostrando-se mais conservadora, tendendo ao uso percentualmente maior de marcas explícitas de concordância. Como Paiva e Duarte (2006, p.139) apontam “na proposta de WLH, a mudança é entendida como uma conseqüência inevitável da dinâmica interna das línguas naturais”. Dada a importância da investigação da mudança lingüística nos trabalhos variacionistas, pretendemos, nesta pesquisa, contemplar a discussão dos problemas de restrição, de transição, de encaixamento e de avaliação, levantados por WLH (1968). O problema da restrição busca, de acordo com os autores, “determinar o conjunto de mudanças possíveis e condições possíveis para a mudança”39. Para darmos conta deste problema, levantamos grupos de fatores lingüísticos e extralingüísticos que possam estar favorecendo ou restringindo a mudança na concordância verbal de terceira pessoa do plural. Já o problema de transição é definido pelos autores como a “trilha pela qual uma mudança lingüística está caminhando para se completar”40. No caso do nosso estudo, procuraremos definir o percurso das variantes da concordância verbal dentro da estrutura lingüística e dentro da sociedade. 39 40 Tradução de Bagno (op. cit., p.121) Tradução de Bagno (op. cit., p.90). 55 Dentro da estrutura lingüística, acreditamos que a queda da nasal fonêmica está levando à queda da nasal morfêmica, mudança por difusão lexical. Quanto ao percurso das variantes dentro da sociedade, procuraremos investigar tal percurso associado às diferentes faixas etárias dos informantes que fazem parte da amostra da pesquisa, às épocas distintas a serem controladas e às comunidades urbana e não urbana. Em relação ao problema de encaixamento, WLH (1968) levantam uma questão fundamental para a teoria da variação e mudança lingüística como as mudanças observadas estão encaixadas na matriz de concomitantes lingüísticos e extralingüísticos das formas em questão? (ou seja, que outras mudanças estão associadas a determinadas mudanças de um modo que não pode ser atribuído ao acaso?)41. Os autores evidenciam que as mudanças lingüísticas estão encaixadas no sistema lingüístico, portanto, não se dão de forma isolada; ao contrário, para serem compreendidas, há que se considerar sua inserção no sistema lingüístico que afetam. Assim sendo, procuraremos observar o encaixamento do fenômeno da concordância verbal, a ser investigado, e sua relação com outros fenômenos variáveis que vêm sendo apontados como interrelacionados no que se refere ao encaixamento do PB (cf. PAIVA e DUARTE, 2006). O que pretendemos discutir é se a não-marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural tem levado a um maior preenchimento do sujeito, ambos influenciados pela fixação da ordem SV. Por fim, no que se refere ao problema de avaliação, WLH (1968) apontam que “o nível de consciência social é uma propriedade importante da mudança lingüística que tem de ser determinada diretamente”42. Para abordar tal problema, elaboramos um teste de atitude/avaliação43 a respeito do fenômeno investigado para observarmos a significação social que a variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural tem na consciência dos falantes. A partir deste instrumento, pretendemos relacionar a avaliação subjetiva dos falantes com o processo de mudança do fenômeno em questão. Os problemas aqui levantados serão retomados e discutidos no capítulo IV, seção 4.3. 41 Tradução de Bagno (op. cit., p.36). Tradução de Bagno (op. cit., p.124). 43 O teste será descrito e analisado no capítulo IV, seção 4.4. 42 56 2.2 Dialetologia Pluridimensional 2.2.1 Os estudos no Brasil Os estudos dialetais no Brasil apresentam sua primeira manifestação, de acordo com Ferreira e Cardoso (1994), em 1826 com Visconde de Pedra Branca, que descreve a língua do Brasil ressaltando os empréstimos das línguas indígenas. A partir dessa data, as autoras consideram três fases na história dos estudos dialetais. A primeira fase inicia-se em 1826 e vai até 1920, data da publicação de “O dialeto caipira” de Amadeu Amaral. Essa primeira fase caracteriza-se pela produção de trabalhos voltados para o estudo do léxico no PB. Observa-se, a partir das publicações, que esta fase apresenta caráter lexicográfico (glossários e dicionários) com um primeiro estudo de natureza gramatical (“O idioma hodierno de Portugal comparado com o do Brasil” – 1879, de José Jorge Paranhos da Silva). O início da segunda fase dá-se com “O dialeto caipira” e apresenta predominância de trabalhos voltados para os estudos gramaticais, mesmo que ainda se produzam estudos lexicográficos. Embora se leve em conta o conhecimento empírico da realidade lingüística e não haja trabalho no campo sistemático, já se experimenta a observação direta à área a ser descrita e a preocupação com uma metodologia para o exame da realidade. Os destaques dessa fase são: “O dialeto caipira”, de Amadeu Amaral (1920), e “O linguajar carioca” de Antenor Nascentes (1922). A terceira fase caracteriza-se pela produção de trabalhos com base em corpus e é marcada pelo início das preocupações com o desenvolvimento e implementação dos estudos de geografia lingüística no Brasil. Manifesta-se também a intenção de elaborarse o Atlas lingüístico do Brasil que toma forma de lei em 20/03/1952. Ferreira e Cardoso (1994) evidenciam a importância, nessa fase, de quatro autores para o desenvolvimento da geografia lingüística no Brasil: Antenor Nascentes, Serafim da Silva Neto, Celso Cunha e Nelson Rossi. Até a terceira fase, a tradição nos estudos dialetais volta-se para a investigação da língua na perspectiva da variação relacionada à dimensão diatópica, restrita ao espaço geográfico, a chamada dialetologia monodimensional. A dialetologia monodimensional visa, então, ao estudo dos dialetos na dimensão horizontal apenas, ou seja, preocupa-se com a variação diatópica. Já a dialetologia pluridimensional, 57 perspectiva recente, alarga a análise para além da dimensão horizontal – eixo da arealidade44 – estendendo-se para a dimensão vertical – eixo da socialidade. 2.2.2 Os estudos em Portugal Em relação aos estudos da dialetologia portuguesa, há uma longa tradição na recolha de materiais para a constituição de atlas lingüísticos. Diferentemente do Brasil, Portugal já possui um atlas do continente português. Segundo Cintra (1995), José Leite de Vasconcelos é o fundador da dialetologia científica em Portugal. Em 1893, o autor apresentou pela primeira vez o seu Mapa Dialetológico do Continente Português, publicado em 1897, o qual já foi revisto e, posteriormente, foram apresentadas algumas tentativas de classificação dos dialetos portugueses continentais. Uma delas, feita em 1901, foi proposta também por Leite de Vasconcelos. Em 1929, o autor volta a publicar o Mapa Dialetológico com várias modificações, o que passa a ser considerado como uma nova proposta de classificação. Em 1942, Manuel de Paiva Boléo lança uma nova classificação baseada em inquéritos lingüísticos por correspondência. O mapa, elaborado com a colaboração de sua discípula, Maria Helena dos Santos Silva, foi publicado em 1959. Uma outra proposta de classificação dos dialetos portugueses aparece na Gramática de Pilar Vázquez Cuesta e Maria Albertina Mendes da Luz, publicada em 1961. Partindo das propostas de classificação dos autores citados, Cintra (1995) apresenta uma nova proposta em que considera, diferentemente dos autores, os dialetos galegos, os dialetos portugueses setentrionais e os dialetos portugueses centromeridionais. Outra recolha que envolve os estudos de dialetologia portuguesa, de acordo com Cintra (1995), deu-se para o Atlas Lingüístico da Península Ibérica. Os inquéritos em Portugal foram feitos em duas fases. A primeira entre os anos de 1932 a 1936 e a segunda entre 1947 e 1954. Nessas duas fases, foram coletados dados em 92 pontos do país. 44 O eixo da arealidade refere-se à área controlada, às dimensões diatópica e diazonal. 58 2.2.3 Pressupostos da Dialetologia Os estudos de dialetologia, como o próprio nome sugere, ocupam-se da investigação e da descrição dos dialetos. Não há, na literatura, um único conceito para o termo. Vejamos o sentido de dialeto de acordo com o ponto de vista de alguns autores. Para Coseriu (1982), o termo dialeto “designa uma língua menor incluída em uma língua maior, que é, justamente, uma língua histórica (um idioma)” (p.12). Dessa forma, o autor enfatiza a diferença entre língua e dialeto em termos de status histórico “dialeto sem deixar de ser intrinsecamente uma ´língua´, é considerado subordinado a outra ´língua´ de ordem superior” (p.11). Coseriu reconhece que as línguas históricas não estão sujeitas somente à variação dialetal (espacial/diatópica), mas também à variação sociocultural (diastrática) e à variação estilística (diafásica). No entanto, para o autor, cabe à dialetologia o estudo dos dialetos, já o estudo dos níveis diastráticos cabe à sociolingüística; e dos níveis diafásicos, à estilística. Para o autor, portanto, a dialetologia restringe-se ao estudo dos dialetos na dimensão espacial, diatópica. Ferreira e Cardoso (1994) definem língua como “um sistema de sinais acústicoorais, que funciona na intercomunicação de uma coletividade. É resultado de um processo histórico, evolutivo” (p.11). Para as autoras, a língua constitui-se como um sistema abstrato, pois, quando concretizada na fala, já aparece diversificada. Já o dialeto, conforme as autoras, define-se como “um subsistema inserido nesse sistema abstrato que é a própria língua” (p.12). Esse parece ser, na verdade, o conceito mais difundido na dialetologia, dialeto entendido como um subsistema dentro do sistema que é a língua. Chambers e Trudgill (1980) rejeitam a noção de dialeto como uma forma subpadrão, de baixo status, vista como uma forma rústica de língua, associada à classe trabalhadora ou a grupos de baixo prestígio; e ao contrário, adotam a noção de que todos os falantes são falantes de ao menos um dialeto – o inglês standard, por exemplo, é apenas um dos muitos dialetos como qualquer outra forma do inglês – e que não faz sentido supor que um dialeto seja lingüisticamente superior a outro (p.03)45. Os autores discutem o critério da mútua inteligibilidade para a distinção entre língua e dialeto. Segundo o critério, “a língua seria uma coleção de dialetos mutuamente 45 “[…] the notion that all speakers are speakers of at least one dialect – that standard English, for example, is just as much a dialect as any other form of English – and that it does not make any kind of sense to suppose that any one dialect is in any way linguistically superior to any other”. 59 inteligíveis” (op. cit., p.03) e caracteriza dialeto como subparte de uma língua. No entanto, conforme os autores, esta caracterização de ´língua´ e ´dialeto´ não dá conta de todos os exemplos. As línguas escandinavas, por exemplo, como o norueguês, o sueco e o dinamarquês, são consideradas línguas diferentes e são mutuamente inteligíveis. Por outro lado, o alemão é considerado apenas uma língua e, no entanto, algumas formas do alemão são ininteligíveis para os falantes. Os autores enfatizam que o critério da mútua inteligibilidade tem alguma relevância, mas não é totalmente eficaz na delimitação do que é ou não uma língua, já que existem razões políticas, geográficas, históricas, sociológicas e culturais, assim como razões lingüísticas, envolvidas nesta delimitação. Chambers e Trudgill afirmam que seria melhor substituir o termo ´língua´ por ´variedade´, termo que se aplica a qualquer tipo particular de língua. O termo variedade pode se referir a variedades fonética/fonologicamente diferentes de outras, que se chamariam ´acento´, ou a variedades gramaticalmente (e talvez lexicalmente), bem como fonologicamente diferentes de outras, que seria o ´dialeto´. Os autores evidenciam, ainda, que a língua pode ser vista como uma variedade autônoma com variedades dependentes, heterônomas. No entanto, esses papéis podem mudar, ou seja, variedades heterônomas podem tornar-se autônomas em função de desenvolvimento político, por exemplo, e ´novas línguas´ podem se desenvolver. Assim, os autores sinalizam para o fato de que a situação lingüística está imbricada a situações políticas, históricas e sociais; por isso, a definição de língua e dialeto não pode ser estanque; o que é uma língua hoje pode ter sido um dialeto, ou seja, uma variedade que por algum motivo (seja histórico, político ou social) adquiriu certo status e passou a ser língua oficial, situação que, possivelmente, pode mudar com o passar do tempo. Desta forma, acreditamos ser esse o conceito de dialeto que mais se adequa aos objetivos deste trabalho, dialeto entendido como variedade lingüística. Esse conceito de dialeto parece estar mais adequado à proposta que seguiremos neste trabalho, a da dialetologia pluridimensional, que, conforme apontada anteriormente, se ocupa tanto do estudo das variedades lingüísticas no eixo da arealidade, quanto no eixo da socialidade. Dessa forma, entendemos que os dialetos podem variar tanto em termos horizontais (no espaço geográfico), como em termos verticais (nos diversos estratos sociais). 60 De acordo com Bellmann (1999, p.20), o estudo bidimensional, nos eixos da arealidade e da socialidade, atinge bons resultados “desde que se efetue o levantamento dos dados com suficiente exatidão”. A mudança de perspectiva parece se dar, conforme Radtke e Thun (1996), a partir do momento em que se detecta certa crise na geolingüística46 românica contemporânea que vê diminuir o interesse pela disciplina e conseqüentemente diminuir a investigação a partir desse método. De acordo com os autores, a dialetologia e a geolingüística se distanciaram da realidade, pois não davam conta do mundo moderno das cidades, da mobilidade populacional, dos meios de comunicação, sendo superadas por ciências como sociolingüística, pragmática, psicolingüística, entre outras, tornandose disciplinas obsoletas. Desta forma, a dialetologia passa a transitar em novos caminhos, apoiando-se em novos parâmetros, métodos e meios técnicos, combinando, assim, o parâmetro diatópico, com os seguintes parâmetros: diastrático (referente aos diferentes estratos sociais, podendo ser nível socioeconômico, nível de escolaridade), diageracional (referente à idade), diassexual (referente ao sexo masculino e feminino), diafásico (referente aos diferentes estilos de fala), diarreferencial (referente à atitude do falante em relação à língua). No que tange à dimensão diatópica, costuma-se subdividi-la em topostática, que se refere ao controle dos falantes com pouca mobilidade, aqueles que nascem, vivem e trabalham no mesmo local, e em topodinâmica, controle de falantes com certo grau de mobilidade. Com essa mudança de perspectiva, os informantes selecionados também mudam seu perfil. Enquanto para a dialetologia monodimensional bastava um único representante de uma determinada localidade geralmente homem, mais velho, de nível sociocultural baixo, residente na zona rural, com pouca mobilidade espacial e com poucos contatos com pessoas de fora, características do que se considerava representante legítimo da localidade, portanto, falante do dialeto típico do lugar, principalmente no que diz respeito ao léxico e a marcas fonéticas, para a dialetologia pluridimensional, são exigidos informantes com diferentes perfis em cada um dos pontos47 selecionados; só assim as várias dimensões poderão ser controladas. 46 O termo geolingüística refere-se ao método utilizado na dialetologia, tanto monodimensional, quanto pluridimensional, que trata da variação lingüística no espaço. 47 Ponto significa localidade. 61 Como vimos, a perspectiva que será adotada em nosso trabalho, a da dialetologia pluridimensional, visa à investigação da variação da língua na dimensão geográfica e também na dimensão social. Acreditamos que essa nova perspectiva da dialetologia permite um trabalho associado à perspectiva da sociolingüística variacionista para a investigação da heterogeneidade lingüística, já que, como Thun (1998) evidencia, a dialetologia pluridimensional é formada pela superfície dialetológica horizontal (variação geográfica) e pelo eixo vertical da sociolingüística (variação social), analisando, então, os planos vertical e horizontal da linguagem e suas relações. 2.3 Axiomas metodológicos Embasados na Teoria da Variação e Mudança, os axiomas metodológicos apontados por Labov (1972) são seguidos neste trabalho. Neste momento, indicaremos alguns deles relacionando-os aos procedimentos metodológicos do nosso trabalho. Um destes axiomas é a alternância estilística. Segundo Labov, não existem falantes de estilo único; há alternância de variáveis de acordo com o contexto social e o tema. No nosso trabalho, fizemos um só tipo de coleta sincrônica, que foi a entrevista, e um só tipo de material diacrônico foi investigado, o texto teatral48. Assim sendo, podemos observar que houve variação em função do tema em que o assunto, tanto da entrevista, quanto do texto teatral, versou, e em relação ao contexto social, durante a entrevista permanecia o mesmo, já durante alguns textos teatrais houve variação, o que permitiu ao autor variar o estilo dos personagens. Outro axioma apontado por Labov é a atenção: os estilos podem ser dispostos ao longo de uma dimensão medida pelo grau de atenção dispensado à fala. O falante diminui o controle da atenção à medida que se envolve emocionalmente no discurso. No caso das nossas entrevistas, quando colocávamos em pauta assuntos em que o informante se envolvia emocionalmente, como em situações de risco ou de grande interesse pessoal, percebíamos menor monitoramento da sua fala. Já no caso dos textos teatrais, relacionamos o grau de atenção do autor com a edição das peças. Observamos que, quando a peça era editada, o grau de atenção era maior, já que havia uma revisão não só do autor, mas da editora. 48 O tipo de material coletado, tanto para a amostra sincrônica, quanto para a diacrônica, será detalhado na seção seguinte, 2.4. 62 O axioma seguinte trazido por Labov é o vernáculo, definido como o estilo em que a mínima atenção ao controle do discurso é dada. Sua observação, segundo o autor, nos proporciona os dados mais sistemáticos para a análise da estrutura lingüística. A partir das entrevistas, tínhamos em mente a coleta justamente do vernáculo; para tanto, elaboramos um questionário prévio com possíveis perguntas que poderiam ser inseridas durante a conversa com o informante para suscitar o maior envolvimento possível com os assuntos que surgiam, para que o vernáculo viesse à tona. Quanto aos textos teatrais, foram selecionados para a análise diacrônica em função do objetivo do autor se aproximar da fala do personagem, já que são textos elaborados com o fim de serem dramatizados. A formalidade é mais um dos axiomas apontados por Labov. Segundo ele, toda observação sistemática de um falante define um contexto formal em que há algum grau de atenção. Assim sendo, por mais que buscássemos o vernáculo dos falantes, no caso das entrevistas, temos consciência de que, em função de estarem sendo sistematicamente observados, havia algum grau de monitoramento à sua fala. No caso do texto teatral, também acreditamos que, em função de ser um texto escrito, embora elaborado para ser falado posteriormente, há algum grau de monitoramento. Por fim, Labov apresenta o axioma a respeito da qualidade dos dados. De acordo com o autor, a melhor forma de coleta de dados é a gravação de entrevistas individuais, principalmente, a partir de narrativas de experiências pessoais. Nossas coletas sincrônicas foram realizadas de acordo com este axioma, todas a partir de entrevistas individuais. No que se refere às coletas diacrônicas, como não se tem acesso à fala de tempos mais remotos, optamos por coletar dados de escrita de textos teatrais, por acreditarmos que os autores tentam retratar o mais fielmente possível o que entendem ser a fala característica do personagem e do tempo que estão retratando. 63 Mesmo na fala, sabemos que é uma recriação do real. Labov aponta um problema que é conhecido na literatura sociolingüística como “paradoxo do observador”: o objetivo da pesquisa lingüística na comunidade é verificar como as pessoas falam quando não estão sendo sistematicamente observadas; mas só podemos obter esses dados através da observação sistemática. O que o autor sugere em relação a este paradoxo é que busquemos mecanismos que desviem a atenção da fala, para que o vernáculo possa emergir, envolvendo o falante em tópicos que recriem emoções fortes vividas no passado, por exemplo. 2.4 A amostra utilizada e a análise quantitativa A amostra para esta pesquisa compreende dois corpora, um sincrônico de língua falada e outro diacrônico de língua escrita. Primeiramente, evidenciamos a amostra sincrônica e, em seguida, apresentamos a amostra diacrônica. O corpus de dados sincrônicos foi coletado em quatro localidades de Florianópolis (PB) e em quatro localidades de Lisboa (PE). As localidades de Florianópolis selecionadas para esse corpus foram: Ribeirão da Ilha e Costa da Lagoa, na zona não urbana, Ingleses e Centro, na zona urbana, e as localidades de Lisboa, Cascais e Sintra, na zona não urbana, Belém e Centro, na zona urbana. Para visualizar as localidades investigadas, observemos os Mapas 2.1 e 2.2, a seguir: 64 Mapa 2.1: Distribuição das localidades no PB49 Mapa 2.2: Distribuição das localidades no PE Para seleção das localidades, priorizou-se, principalmente, um dos aspectos levantados por Ferreira e Cardoso (1994): 49 Os mapas 2.1 e 2.2 foram adaptados do Google Earth (acesso em fevereiro de 2009). 65 o estabelecimento de uma rede a ser inquirida na qual se verifique a intensidade de pontos condizentes com a densidade demográfica da área, refletindo a eqüidistância entre eles, de modo a vir recobrir harmonicamente toda a região pretendida (p.26). Tal seleção levou em conta, ainda, a intenção de investigar comunidades urbanas e não urbanas. A seleção das localidades foi feita primeiramente em Florianópolis, com a orientação do Professor Doutor Felício Wessling Margotti, e a seleção feita em Lisboa, sob a orientação da Professora Doutora Ernestina Carrilho. A coleta em Florianópolis foi realizada durante o segundo semestre de 2006 e o primeiro semestre de 2007 e a coleta feita em Lisboa, durante estágio de doutorado no exterior no segundo semestre de 200750, deu-se de modo a constituir uma amostra o mais comparável possível àquela do PB que já havia sido selecionada anteriormente. Vale ressaltar que Lisboa é a capital de Portugal. Muito embora seja um país que não apresente tanta relevância política, econômica e social para a Europa, comparado a outros países como Inglaterra, França ou Alemanha, Portugal faz parte de um continente bastante importante em termos mundiais; ao contrário de Florianópolis, que apresenta muito pouca representatividade política, econômica e social em um país que se situa em um continente de países emergentes. Assim sendo, as características das localidades51, por mais que pretendêssemos aproximá-las, têm inegáveis distâncias, o que não invalida nossa investigação que levará em conta essas particularidades. Todas as entrevistas foram realizadas pela pesquisadora. Os assuntos levantados durante as entrevistas foram família, trabalho, lazer, estudo, redes sociais e situações de risco. As entrevistas foram gravadas em aparelho digital e armazenadas através do programa Audacity. Os dados foram coletados a partir de escutas realizadas com o auxílio do programa de áudio. Os informantes que constituem a amostra sincrônica desta pesquisa estão estratificados de acordo com idade e escolaridade. Para cada ponto selecionado temos quatro informantes, como veremos no quadro 2.1, a seguir: 50 O estágio de doutorado no exterior ocorreu no período de agosto de 2007 a janeiro de 2008, na Universidade de Lisboa, sob a orientação da Professora Doutora Ernestina Carrilho. O estágio foi realizado com bolsa Capes, processo 0773/07-7, por meio do Programa de Doutorado no País com Estágio no Exterior - PDEE. 51 A caracterização das localidades será feita posteriormente na subseção 2.5.2.2.1. 66 Quadro 2.1: Estratificação dos informantes Zona nãourbana / urbana Zona não urbana PB Ponto (localidade) Informante 1 Informante 2 Informante 3 Informante 4 Ribeirão da Ilha Zona não urbana PB Costa da Lagoa Zona urbana PB Ingleses Zona urbana PB Centro Zona não urbana PE Cascais Zona não urbana PE Sintra Zona urbana PE Belém Zona urbana PE Centro 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 15 a 36 anos – ensino fundamental 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 22 a 33 anos – ensino superior 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 48 a 74 anos – ensino fundamental 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior 45 a 76 anos – ensino superior Foram analisados todos os dados de construções que apresentavam variação na concordância verbal de terceira pessoa, extraídos de cada uma das trinta e duas entrevistas que apresentaram duração média de cinqüenta minutos. Para que pudéssemos verificar a influência dos fatores lingüísticos e sociais no fenômeno em estudo, os dados coletados foram codificados e analisados estatisticamente com o auxílio do programa Goldvarb (Robinson et al., 2001). Esse programa apresenta as mesmas características do programa Varbrul (Pintzuk, 1988), amplamente divulgado e utilizado em pesquisas sociolingüísticas. O Varbrul foi desenvolvido para ambiente DOS, enquanto o Goldvarb, inicialmente, para Macintosh (1999) e, posteriormente, construído para ambiente Windows. Esse pacote estatístico, de acordo com Scherre e Naro (1997, p.95), fornece [...] pesos relativos associados aos diversos fatores dos grupos de fatores ou variáveis independentes consideradas, bem como a seleção destes grupos em função de sua relevância estatística para a variação do fenômeno analisado. Os pesos relativos atribuídos indicam o efeito que cada um dos fatores tem sobre as variantes do fenômeno lingüístico analisado (a variável dependente) [....]. 67 O corpus de dados diacrônicos constitui-se de quatorze peças de teatro de autores catarinenses (PB), sendo cinco do século XIX e nove do século XX, e 14 peças de teatro de autores portugueses (PE), também cinco do século XIX e nove do século XX. Nosso corpus diacrônico inicia-se no século XIX, pois em SC a imprensa é introduzida pelo Brigadeiro Jerônimo Francisco Coelho com o Jornal “O Catharinense” em 28/7/1831. Embora em Portugal, tivéssemos peças teatrais de tempos anteriores, como nosso corpora pretendia ser comparativo, também coletamos peças a partir do século XIX. As peças da amostra do PB fazem parte de um projeto em curso coordenado pela Professora Doutora Izete Lehmkhul Coelho vinculado ao Projeto Varsul na Universidade Federal de Santa Catarina. Esse projeto visa à elaboração de um banco de dados para estudos diacrônicos e conta com a colaboração dos doutorandos Marco Antonio Martins e Isabel Monguilhott, assim como dos demais bolsistas de graduação, vinculados ao Projeto Varsul. Os textos foram selecionados a partir de pesquisas em acervos da Biblioteca Estadual de Santa Catarina, do Centro de Cultura Açoriana e da Academia Catarinense de Letras com a colaboração de pesquisadores da história do teatro em Santa Catarina, como a Professora Doutora Zilma Nunes, do Departamento de Língua e Literatura Vernáculas da Universidade Federal de Santa Catarina, a Professora Doutora Vera Collaço, do Departamento de Artes Cênicas da Universidade Estadual de Santa Catarina e o escritor e diretor de teatro do Grupo Teatral Armação Antonio Cunha. Já as peças portuguesas foram recolhidas durante meu estágio de doutorado no exterior a partir de pesquisas na Biblioteca Nacional de Lisboa, na Biblioteca da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa e, ainda, em livrarias e sebos52. Para a análise diacrônica, foram retirados todos os dados de variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural encontrados, tanto na fala dos personagens, quanto na fala do narrador. As peças elencadas a seguir ilustram, primeiramente, o corpus do PB e, em seguida, o corpus do PE. 52 Gostaria de agradecer ao meu colega de doutorado Marco Antonio Martins, que cedeu muitas das peças que já havia recolhido em Lisboa quando iniciei meu estágio e que me acompanhou na busca das outras peças para a constituição da minha amostra. 68 1 – Peças de teatro do século XIX (PB) Autor: Antero dos Reis Dutra (1829-1865) Título: BRINQUEDOS DE CUPIDO (Miscellanea) Data da 1ª. publicação: 1859 Autor: José Cândido Lacerda (1842-1900) Título: A CASA PARA ALUGAR Data da 1ª. publicação: 1867 Autor: Álvaro Augusto de Carvalho (1829-1865) Título: RAIMUNDO (drama em cinco atos – utilizamos o 1º. quadro do 2º. ato) – Série Memória Literária de SC Data da 1ª. publicação: 1868 Autor: Arthur Cavalcanti do Livramento (1872)53 Título: OS CIÚMES DO CAPITÃO Data da 1ª. publicação: 1880 Autor: Horácio Nunes (1855- 1919) Título da peça: O IDIOTA Data da 1ª. publicação: 1890 2 – Peças de teatro do Século XX (PB) Autor: Ildefonso Juvenal (1894-1965) Título da peça: WALTRUDES, O NAUTA VENEZIANO Data da 1ª. publicação: 1918 Autor: Clementino de Britto (1879-1953) Título da peça: JARDIM MARAVILHOSO Data da 1ª. publicação: 1920 53 Não conseguimos a data de morte do autor, nem as datas de nascimento e morte de João Antonio Vecchione. Os demais autores que apresentam apenas data de nascimento é porque ainda estão vivos. 69 Autor: Nicolau Nagib Nahas (1890-1934) Título da peça: ILHA DOS CASOS RAROS Data da 1ª. publicação: 1928 Autor: João Antonio Vecchione Título da peça: RECONCILIAÇÃO Data da 1ª. publicação: 1939 Autor: Ildefonso Juvenal (1894-1965) Título da peça: O COLAR DE PÉROLAS Data da 1ª. publicação: 1942 Autor: Ody Fraga (1927-1987) Título da peça: A MORTE DE DAMIÃO Data da 1ª. publicação: 1954 Autor: Ademir Rosa (1949-1997) Título da peça: A ESTÓRIA Data da 1ª. publicação: 1970 Autor: Mário Júlio Amorim (1939) Título da peça: O DIA DO JAVALI Data da 1ª. publicação: 1982 Autor: Augusto Miltom de Sousa (1944) Título da peça: STRADIVARIUS Data da 1ª. publicação: 1993 3 – Peças de teatro do século XIX (PE) Autor: Camilo Castelo Branco (1825-1890) Título: O ÚLTIMO ACTO Data da 1ª. publicação: 1859 70 Autor: Luís de Araújo (1833-1906) Título: J. R. Data da 1ª. publicação: 1865 Autor: Júlio César Machado (1835-1890) Título: PARA AS ELEIÇÕES Data da 1ª. publicação: 1868 Autor: Carlos de Moura Cabral (1852-1922) Título: PARIS EM LISBOA Data da 1ª. publicação: 1879 Autor: Gervásio Lobato (1850-1895) Título: O FESTIM DE BALTASAR Data da 1ª. publicação: 1894 4 – Peças de teatro do Século XX (PE) Autor: António Patrício (1978-1930) Título da peça: O FIM Data da 1ª. publicação: 1918 Autor: Raul Brandão (1876-1930) Título da peça: O DOIDO E A MORTE Data da 1ª. publicação: 1923 Autor: Vitoriano Braga (1978-1930) Título da peça: LUA-DE-MEL Data da 1ª. publicação: 1928 Autora: Alice Ogando (1900-1981) Título da peça: A PRIMA TANÇA Data da 1ª. publicação: 1934 71 Autor: Carlos Selvagem (1890-1973) Título da peça: BALADA DE OUTONO Data da 1ª. publicação: 1945 Autor: Romeu Correia (1917) Título da peça: CASACO DE FOGO Data da 1ª. publicação: 1953 Autor: Jaime Gralheiro (1930) Título da peça: O HOMEM DA BICICLETA Data da 1ª. publicação: 1977 Autor: Norberto Ávila (1936) Título da peça: D. JOÃO NO JARDIM DAS DELÍCIAS Data da 1ª. publicação: 1986 Autor: António Faria (1942) Título da peça: FUMOS DE GLÓRIA Data da 1ª. publicação: 1997 2.5 Perfil sócio-histórico de Florianópolis e de Lisboa De acordo com a perspectiva teórica adotada neste trabalho, a da Teoria da Variação e Mudança Lingüística e a da Dialetologia Pluridimensional, a língua reflete aspectos sócio-históricos da comunidade de fala. Desta forma, caracterizaremos sóciohistoricamente a cidade de Florianópolis e de Lisboa, a fim de auxiliar na compreensão do panorama lingüístico das comunidades de fala pesquisadas (PB e PE). 2.5.1 Florianópolis Neste momento, baseando-nos em fontes históricas, traçaremos o perfil da cidade de Florianópolis, antiga Nossa Senhora do Desterro, local em que se constituiu a amostra do PB. Evidenciaremos alguns fatos históricos, partindo dos primeiros habitantes, detendo-nos um pouco mais na colonização açoriana, chegando até os dias atuais. 72 Florianópolis é uma ilha situada na região sul do Brasil, capital do Estado de Santa Catarina (SC). Apresenta uma superfície de 431 km2, medindo 54 km de comprimento, 18 km de largura e uma orla de 172 km. Conforme pesquisas arqueológicas realizadas na Ilha de SC, o povoamento da região parece ter se iniciado em 3000 a.C. “por grupos humanos que eram ou se tornaram pescadores e coletores de moluscos, além de, secundariamente, praticarem a caça” (FUNDAÇÃO FRANKLIN CASCAES, 1995, p.11). Estas mesmas fontes indicam que a partir do ano 1000 d.C., “tais grupos foram substituídos por populações que conheciam a cerâmica e eram, possivelmente, praticantes de uma incipiente agricultura” (FUNDAÇÃO FRANKLIN CASCAES, 1995, p.11). Por volta de 1400, a ilha passa a ser ocupada por indígenas da nação Carijó, migrantes do Chaco paraguaio, da nação Tupi-Guarani, que, provavelmente, passaram por algum tempo convivendo com as populações que viviam no lugar anteriormente. No início do século XVI, os europeus chegam à ilha, habitada pelos Carijó desde o século XV, resistindo até o século XVII. Com a vinda dos europeus, os Carijó passaram a ser caçados, escravizados e exterminados pouco a pouco, como relata a história das nações indígenas por todo o país. Alguns morreram em decorrência do tráfico para as fazendas paulistas e nordestinas; outros, durante a sua catequização pela Companhia de Jesus, pelas doenças que os brancos traziam, como pneumonia, sarampo, varíola e gripe. Enfim, depois de 200 anos, o contato com o europeu dizimou uma população que era, em princípio, numerosa. A Ilha de SC recebia, desde os primeiros anos após a expedição de Cabral, navegantes dos mares do sul, mas o povoamento português efetivou-se no século XVII. Francisco Dias Velho, nobre de São Vicente54, por volta de 1675, funda Nossa Senhora do Desterro e “requer do governo da capitania paulista duas léguas em quadra na Ilha, justificando ter instalado uma igreja em devoção a Nossa Senhora do Desterro, benfeitorias e culturas na referida área” (FUNDAÇÃO FRANKLIN CASCAES, 1995, p. 18). Assim, inicia-se o povoado da ilha com 400 habitantes, entre familiares, agregados e escravos do fundador. Dias Velho, em 1687, aprisiona um navio corsário e envia os piratas para São Vicente com sua carga. A Fazenda Real se apodera da carga e liberta os prisioneiros que dois anos depois, voltam à ilha para se vingarem. Dias Velho é morto, sua família 54 A Vila de São Vicente foi o primeiro núcleo de povoação portuguesa estabelecido na costa brasileira, fundado no litoral de São Paulo em 1532 por Martim Afonso de Souza. 73 retorna a São Paulo, com exceção de um dos filhos que se instala em Laguna55, cidade do litoral sul de SC. Ficam, no vilarejo, pouquíssimos moradores, após a tragédia. Após 1700, chega à ilha o lisboeta Manoel Manso de Avelar com sua família. Considerado um ditador, Avelar torna-se líder da povoação e dedica-se ao contrabando com os navios estrangeiros que aqui aportavam, trocando produtos da terra por armas, pólvora e roupas. Durante seu mandato, o povoado não cresce; há um relato de 1719 afirmando que não havia no Desterro mais de 27 casas e 130 habitantes. Em 23/3/1726, o povoado do Desterro é elevado à categoria de Vila, desmembrando-se de Laguna. A partir desta data, a povoação passa a se desenvolver, impulsionada por projetos militares, pela colonização açoriana e pela pesca à baleia. A colonização açoriana inicia-se, de fato, em 06/01/1748, quando desembarcaram 461 pessoas, num total de 88 casais vindos do Arquipélago dos Açores56. De acordo com Furlan (1989, p.17), no período de 1748 a 1756, vieram para o litoral de SC 607157 açorianos que se somaram aos 4197 catarinenses, resultando um aumento demográfico de 144,6%. A colonização açoriana “visava” dois objetivos; o primeiro era resolver o problema de parte da população das ilhas, que formava uma verdadeira massa de miseráveis, desprovida de terras para o cultivo e sem emprego; o segundo era atender às necessidades políticas do Reino, de ocupação das terras do Sul do Brasil, disputadas com a Espanha (FUNDAÇÃO FRANKLIN CASCAES, p. 24). Neste período em que se inicia a colonização no litoral catarinense, os Açores passam por uma grave crise agrícola, com o esgotamento da fertilidade da terra; além disso, “houve várias catástrofes naturais: tempestades, secas, pragas, sismos, erupções vulcânicas” (FLORES, 2000, p.32); a emigração tornava-se, assim, a saída para muitos 55 De acordo com Farias (2000), Santo Antônio dos Anjos da Laguna, Nossa Senhora do Desterro e Nossa Senhora da Graça do Rio São Francisco foram as primeiras povoações do litoral catarinense fundadas por vicentistas e portugueses. 56 A origem do nome Açores, conforme Farias (1998), vem de uma espécie de águia conhecida por Açor encontrada pelos primeiros visitantes das ilhas. 57 Segundo Furlan (1989, p.177), os açorianos estabeleceram-se no litoral central de Santa Catarina (de Laguna ao Rio Camboriú), procedendo das ilhas de São Miguel (328), Terceira (912), Graciosa (772), São Jorge (2822), Pico (1776), Faial (1207) e da Madeira (579). Como podemos observar, as ilhas que tiveram maior participação na colonização foram: Terceira, Graciosa, São Jorge, Pico e Faial; são as ilhas que formam o conjunto central do arquipélago. A ilha de São Miguel teve pouca participação; juntamente com a ilha de Santa Maria, que não teve participação na colonização, forma o conjunto oriental do arquipélago. A parte ocidental do arquipélago constitui-se das ilhas de Flores e Corvo, que não tiveram participação alguma. A ilha da Madeira não faz parte do arquipélago e teve pouca participação também na colonização. 74 açorianos sem trabalho e sem sustento. No entanto, as dificuldades já começavam durante a viagem para o Brasil: Na promiscuidade dos alojamentos, as afecções cutâneas iam passando de uns para os outros. Surgia a parasitose. Surgiam as disenterias. E, com o correr dos dias, quando a viagem se adiantava, em meio do caminho, entre céu e mar, aparecia o pior: o mal de Loanda, que misteriosamente ia atingindo a fracos e fortes, homens e mulheres, poupando as crianças de peito, e que ia aos doentes alquebrando as forças, tirando-lhes a resistência física e moral. As pernas edemaciavam-se, a pele cobria-se de manchas que rebentavam em flictenas e ulceravam, o andar tornava-se trôpego e pesado, a língua grossa e saburrosa, não conhecia o paladar. Instalava-se a taquicardia, a dispnéia e uma fadiga sem fim prostrava mesmo os mais resistentes. Os dentes amoleciam nas gengivas edemaciadas e sangrentas. Era assim o mal de Loanda, o mesmo que dizimava os africanos nos navios negreiros. Era o escorbuto, a avitaminose, os resultados da falta de alimentos frescos, de frutas, de legumes, de vitamina C, que, então parecia paradoxal, desconcertante, pois ia fazendo vítimas mesmo entre aqueles que se julgavam capazes de resistir às peripécias da viagem (CABRAL, 1951, apud FLORES, 2000, p.50). Para cada casal, açoriano e madeirense, o governo português determinou que “fosse distribuído um lote de um quarto de légua (1650 metros) em quadro, duas vacas e uma égua, além de sementes e ferramentas” (FUNDAÇÃO FRANKLIN CASCAES, p. 24). As condições encontradas pelos açorianos tornaram sua adaptação lenta e difícil. O cultivo de trigo, cultura tradicional dos açorianos, não se adaptou ao clima da região. As vacas e éguas que haviam sido prometidas foram entregues a poucos. Os rapazes mais fortes eram chamados ao treinamento militar, embora o edital de inscrição para a imigração determinasse que seriam dispensados de tal tarefa. Desta forma, as terras foram sendo abandonadas e o trabalho agrícola substituído por ofícios urbanos diversos e pela pesca. Aqueles que ficavam na terra cultivavam mandioca, herança Carijó, desconhecida nos Açores, e o preparo da farinha passou a ser a principal fonte de renda. Nesse período, desenvolvem-se na ilha as armações de baleia, inserindo muitos açorianos na atividade pesqueira, e na construção naval, como ilustra o relato do viajante alemão Heinrich von Langsdorff, “o empreendimento da caça à baleia e produção de óleo é grande e oferecem trabalho e sustento a algumas centenas de almas [...]” (DE HARO, 1996, p. 178). Farias (1998) evidencia as várias contribuições trazidas pelos açorianos para o litoral catarinense. São eles que introduzem diversas espécies de uvas e iniciam a produção do vinho caseiro no século XVIII. Introduzem, ainda, o trigo, a cevada, embora não tenham se adaptado ao solo e ao clima da região, sendo substituídos pela 75 mandioca, planta da região, e pela cana-de-açúcar, trazida dos Açores. Introduzem também o cultivo de vagens, couves, figo, laranja. Produzem a partir de 1796 o café em SC, antes mesmo de sua introdução no sudeste. Como evidencia o relato de Adam von Krusenstern “no continente, bem como na ilha, o solo é notavelmente fértil. Excelentes café e açúcar são cultivados aqui” (DE HARO, 1986, p.140). Contribuindo decisivamente na formação da população da Ilha, os açorianos influenciaram a cultura local com a olaria cerâmica utilitária e decorativa, a produção artesanal (renda-de-bilro, crivo, produção em teares manuais, artesanato de palha e taquara, artesanato em conchas e moluscos), os jogos e brinquedos (peão, cinco marias, pandorga/pipa, peteca, taco, bolinha de vidro), as danças (ratoeira, pau-de-fita, arco-deflores, quadrilha), os folguedos (farra do boi, malhação de judas, boi-de-mamão, terno de reis, cantoria do Divino), a literatura (pão-por-Deus, pasquim), a religiosidade expressa nos nomes das localidades (Santo Antônio, Nossa Senhora da Conceição da Lagoa, Nossa Senhora da Lapa do Ribeirão, Cachoeira do Bom Jesus), as festividades religiosas (Festa do Divino Espírito Santo, Festa de Passos, Coberta d’alma), além das técnicas de produção (engenho de farinha, carro de boi, baleeira, construções de redes, espinhéis com anzóis de ferro, tarrafas, alambique de aguardente), da gastronomia (peixe, pirão, farofa), da mitologia (lobisomens e bruxas), da medicina popular (benzeduras e orações), da arquitetura (casas geminadas, sobrados), “havendo que se destacar ainda o linguajar local, caracterizado pelo ‘som cantado’ e pela alta velocidade de flexão vocal” (FUNDAÇÃO FRANKLIN CASCAES, p. 29). Como Farias (2000) evidencia, a Ilha de SC foi formada pelos valores trazidos pelos imigrantes açorianos somados aos valores vicentistas, que já haviam se fixado no litoral catarinense entre os séculos XVII e XVIII, bem como das culturas indígena, negra e de outras minorias. Em meados de 1894, Nossa Senhora do Desterro passa a se chamar Florianópolis em homenagem a Floriano Peixoto. Até hoje muitas pessoas que conhecem a história da cidade questionam tal homenagem feita pela Assembléia Legislativa no ano em que o coronel Antônio Moreira César, governador de SC, nomeado por Floriano, fuzila, sem qualquer julgamento, na Fortaleza da Ilha de Anhatomirim, 185 homens, alegando fazerem parte da Revolução Federalista. Chegando ao século XX, notam-se mudanças no panorama de Florianópolis: a iluminação a querosene ou a gás é substituída pela elétrica, os bondes puxados a burro começam a transitar pelas ruas, até serem substituídos por veículos motorizados, além 76 das redes de esgoto e dos novos veículos de comunicação. Há, como em todo o país, um processo de urbanização e a ampliação da expectativa de vida da população com a melhoria nas condições de higiene e saúde. Em 1926, inaugura-se a ponte Hercílio Luz que liga a ilha ao continente, fazendo desaparecer o tráfego de lanchas e balsas pelo canal. A cidade assume condição de pólo regional e reforça significativamente seu contato com o interior do estado. No fim da década de 50, início da de 60, há a implantação da UFSC, que passa a empregar muitos professores, atrai grande número de estudantes do interior e de outros estados. Há um grande deslocamento populacional facilitado pela abertura da BR10158. No início dos anos 70, instala-se a indústria turística, delineando novos ramos para a economia local e atraindo novos contingentes populacionais. A paisagem modifica-se com a destruição dos antigos casarios, a criação de modernos edifícios, a construção de duas novas pontes (Colombo Salles, Pedro Ivo Campos) e com o aterro da Baía Sul, que afasta a cidade do mar. No que se refere à colonização açoriana, o que se observa hoje é a preocupação em recuperar os valores da cultura trazida dos Açores, que, em função de alguns preconceitos, foi sendo esquecida. De acordo com Farias (2000), o contato dos descendentes ítalo-germânicos com a cultura açoriana gerou certos preconceitos, ainda hoje existentes na comunidade catarinense. Viam o homem do litoral como malandro e preguiçoso, pois os ítalogermânicos costumavam trabalhar durante todo o período diurno, já que vinham de centros urbanos acostumados aos horários comerciais-industriais, o que não era o caso dos luso-açorianos “que estavam na venda por volta de 4 e 5 horas da tarde tomando uns tragos e contando casos” (p.105). No entanto, esses homens eram pescadores e possuíam um ritmo de trabalho diferente, pois às 4 horas da manhã já estavam colocando o barco no mar e voltavam para casa por volta das 3 horas da tarde. Os horários em que eram vistos era no seu período de folga. Os descendentes ítalo-germânicos também viam os luso-açorianos como “um povo ignorante, atrasado, que não tem ambição, se conformando com o que tem, por isso é que é pobre” (FARIAS, 2000, p.106). De fato, os ítalo-germânicos vieram para SC em meados do século XIX59, período da Revolução Industrial, o que deve ter 58 Vale ressaltar que a população brasileira de modo geral sofre intenso êxodo rural ao longo do século XX, de 70% de população rural em 1940, passa a 44% em 1970, chegando a 20% em 1996. 59 De acordo com Margotti (2004), os alemães chegaram em SC a partir de 1829 e os italianos por volta de 1875. 77 influenciado a sua mentalidade capitalista, e também por terem sido trazidos pelas companhias de colonização que cobravam pelas terras e transportes, o que os obrigava a ter uma mentalidade acumulativa. Já os luso-açorianos não tinham essa mentalidade capitalista, pelo contrário, sua economia era de subsistência, trabalhavam o necessário para sobreviverem, sem ambicionar acumular riquezas. Esse contraste entre as culturas fez com que os descendentes ítalo-germânicos não permitissem, inclusive, casamento interétnico com os descendentes luso-açorianos “filho(a) meu (minha) não casa com brasileiro(a) (descendente de luso-açoriano) senão não entra mais na minha casa, não é mais meu(minha) filho(a) será deserdado(a)” (FARIAS, 2000, p.107). Os descendentes luso-açorianos passaram a sentir certa pressão em função dos valores culturais dessas sociedades tecnologicamente mais qualificadas e competitivas que passaram a mostrar “um outro universo de bens de consumo, técnicas de produção e visões de vida” (FARIAS, 2000, p.108), que os chamados “manezinhos, mocorongos, atrasados” (p.108) não conheciam. Para reverter essa sensação de desprestígio cultural que os descendentes dos luso-açorianos passaram a ter, procurando se desfazer de todos os traços caracterizadores dessa cultura, inclusive os lingüísticos, alguns movimentos importantes começaram a surgir. Em 1992, criou-se o Núcleo de Estudos Açorianos da UFSC, objetivando “devolver ao povo litorâneo o conhecimento de suas raízes históricas e culturais, despertando seu orgulho pelos valores culturais que praticava” (FARIAS, 2000, p. 108). Esse núcleo passou a oferecer cursos de cultura açoriana, além de divulgar atividades culturais regionais de origem açoriana na mídia. Construiu-se o monumento em homenagem à colonização açoriana em SC, criou-se também o troféu Açorianidade, a Semana da Cultura Açoriana, o Encontro sul-brasileiro de comunidades lusoaçorianas. A parceria com o Governo Regional dos Açores também contribuiu com a revitalização da cultura açoriana, viabilizando a ida de pessoas engajadas no projeto para os Açores a fim de realizarem cursos. Também não poderíamos deixar de lembrar que a mídia passou a destacar Florianópolis como uma das capitais com melhor qualidade de vida, assim como a ascensão do tenista Gustavo Kuerten, que sempre fez questão de enfatizar sua naturalidade e, juntamente com a criação do troféu “Manezinho da Ilha”, fez com que o ilhéu se sentisse de alguma forma prestigiado com o status de manezinho. 78 2.5.2 Lisboa Delinearemos, aqui, o perfil sócio-histórico de Lisboa, cidade em que se coletou o corpus do PE. A partir de “O Livro de Lisboa”, organizado por Moita (1994) com capítulos de vários autores, apontaremos alguns aspectos da história lisboeta, desde os primeiros indícios de povoamento, pontuando a evolução da cidade até os dias atuais. Lisboa é capital de Portugal e fica na margem norte do estuário do Tejo a 17 km do oceano Atlântico. Possui uma população de 550 mil pessoas, mas a Grande Lisboa, que engloba cidades vizinhas como Cascais e Sintra, possui quase 2 milhões de habitantes. A cidade, situada próxima a foz do Rio Tejo, passa a ser capital portuguesa a partir do século XIII, tendo sua posição privilegiada para a navegação contribuído para o fato. De acordo com Matos, há indícios de ocupações humanas no território de Lisboa em diferentes períodos: na época fenícia (século VIII-VII a.C.), na época púnica (século VI-III a.C.) e na época romana republicana (século III-I a.C.). Matos aponta que, a partir de escavações realizadas na cidade, se fazem algumas reflexões sobre aspectos urbanísticos da cidade romana. Segundo Gaspar, por exemplo, o urbanismo em Lisboa inicia-se justamente na época do domínio romano, sendo este povo responsável pela implantação de infra-estruturas na cidade, ao mesmo tempo em que valorizaram o potencial portuário e pescatório do local. Segundo Matos, é provável que no período da conquista romana, no século II, a população em Lisboa se restringisse ao povoado indígena do alto da colina e à zona ribeirinha onde havia uma população miscigenada de indígenas e de elementos mediterrânicos de várias origens. O autor salienta ainda que, mesmo sem poder precisar, parece que o número de habitantes era bastante elevado, já que foi reunido um grande número de lápides e sabese que apenas uma minoria privilegiada tinha acesso a tal luxo. A urbanidade trazida pelos romanos foi reforçada pelos muçulmanos (domínio que vai de 714 até o século XII) que, conforme Gaspar, havia se perdido na época anterior quando Lisboa esteve sob o domínio germânico. Os muçulmanos foram responsáveis pela criação de uma Lisboa fortificada. Nesse período, Lisboa era considerada uma cidade média em termos europeus, com um espaço interior à muralha de mais de 103 hectares. 79 Marques aponta que, no decorrer dos séculos XIV e XV, a população da cidade aumentou, passando de vinte mil nos finais do século duzentos, e mais do dobro no limiar do século de quinhentos. Nessa época, de acordo com o autor, as casas eram na sua maioria térreas, sobressaindo-se apenas em altura as numerosas torres de igrejas e palácios pela cidade. Já nos fins do século XV, o aumento da população faz com que as casas da cidade passem a elevar o número de andares. Nesse período, as casas exibiam espaços verdes, campos de pastagem, vinhas, olivais, além dos espaços de trabalho agrícola, o que, conforme Marques, “conferiam à Lisboa medieval, como a todas as cidades portuguesas, uma feição ainda marcadamente rural” (op. cit., p.91). O autor aponta ainda que o comércio, o artesanato e os serviços que caracterizavam a cidade, distinguindo-a das demais do país, casavam-se com a agricultura, a criação de gado e a pesca, sendo difícil dizer qual das atividades era predominante e responsável pelo sustento do maior número de pessoas. Embora se desenvolvessem tais atividades na cidade, em função de já ser considerada uma grande cidade, Lisboa também foi marcada nos séculos de 300 e 400, assim como outras cidades da mesma proporção, pela fome e pelas epidemias. Marques ressalta que Lisboa também era caracterizada pelo aspecto defensivo das cidades medievais. A cidade não se impunha pela monumentalidade das construções; na boa tradição portuguesa; segundo o autor, “os edifícios podiam ser ricos e decorados interiormente mas ostentavam pouca aparência no exterior” (op. cit., p.93). Os monumentos religiosos, como as igrejas e os conventos, de acordo com Marques, eram os mais importantes. Na verdade, havia poucos monumentos civis; os de maior destaque eram os palácios reais e senhoriais. No período filipino, entre 1580-1640, de acordo com Gaspar, Lisboa afirma sua vocação atlântica e, embora perdesse certo peso por deixar de ser sede da corte real, ganhou importância no contexto da Península Ibérica, beneficiando-se do trato das Américas e do Oriente. É no século XVI, como aponta Moita, que Lisboa descobre o caminho marítimo para a Índia, sendo colocada nas rotas do comércio mundial, tendo como conseqüência a transformação da cidade em diversos aspectos, embora já tivesse importância, em função de ser capital do país desde o século XIII. Em termos urbanísticos, a autora evidencia que, no século de 500, Lisboa recebe um legado medieval confortável, tanto no que se refere à área, definida pela muralha fernandina construída em finais do século XIV (1373-1375), e que lhe comparava em 80 extensão com outras cidades européias, quanto em relação a estruturas básicas que decorriam do fato de ser capital. Moita aponta ainda a importância do Tejo para a cidade que, neste período dos descobrimentos marítimos, era considerado mar. O Tejo era, conforme Moita, não só utilizado para viagens de trabalho e negócios dele partiram as embarcações de Vasco da Gama, Pedro Álvares Cabral e todas as outras rumo às descobertas, mas utilizado também como meio de transporte privilegiado, já que as vias terrestres eram insuficientes e de má qualidade. Lisboa recupera a corte em 1640, momento em que, segundo Gaspar, são construídos muitos palácios e conventos, perdidos, posteriormente, durante a Guerra dos 30 anos com a Espanha. De acordo com Pereira, na segunda metade do século XVII, a cidade não sofre grandes alterações, nem em termos do seu crescimento urbano, nem na sua imagem. O autor indica que, no cotidiano da cidade são comemoradas festas do calendário litúrgico acompanhadas de festejos populares, assim como jogos e touradas, o que dão sentido teatral ao seu espaço urbano, ao mesmo tempo que reforçam a ascensão da imagem da Corte como instância suprema de decisão e, doravante, símbolo exclusivo do poder de governar os homens, só disputado pelo poder da Igreja sobre as consciências (op. cit., p.349). No período entre 1706 e 1750, no reinado de D. João V, de acordo com Gaspar, Lisboa enriquece com o ouro do Brasil, passa por uma fase de monumentalidade e ostentação da nobreza e da igreja; no entanto, não se atualiza em termos de ciência, técnica e arte. É nesse período que se inicia na cidade a construção do Aqueduto das Águas Livres, obra muito importante para Lisboa, que permitiu, conforme Gaspar, melhorar as condições sanitárias e sociais da cidade em função do aumento significativo no abastecimento de água. Em 1/11/1755, ocorre um “terramoto” que destrói a cidade de Lisboa, que é reconstruída por Marquês de Pombal. De acordo com Gaspar, “acabaram por prevalecer as vantagens do sítio [lugar] original, optando-se por um novo desenho urbano e por inovações tecnológicas nas edificações, de molde a minimizar os impactos de futuros cataclismos” (op.cit, p.19). 81 O terremoto, conforme França, destruiu 54 conventos, 35 paróquias, 33 palácios e 17 mil das 20 mil casas que havia, além de morrerem 5000 pessoas, dos 250 mil habitantes que se supõe residirem em Lisboa na época. O autor evidencia que Marquês de Pombal era secretário de Estado e tomou as rédeas da situação, com medidas enérgicas e que lhe confere até hoje grande popularidade na cidade, já que Dom Luís da Cunha passou a pasta do Reino logo após a catástrofe e nem tampouco visitou as ruínas da capital, apenas 20 anos depois quando se inaugurava uma estátua que lhe “celebrava a competência régia” (op. cit., p.363). Marques aponta que, das 21 igrejas contemporâneas dos séculos XIV e XV, só uma, a Sé, sobreviveu ao terremoto de maneira a ser imaginada como era no período medieval. As demais sofreram tantas modificações entre os séculos XVI e XVIII que hoje é difícil imaginar como eram nas suas origens. Segundo França, a cidade com Pombal abria-se para o futuro com novo desenho proposto. Em 1777, com a queda de Pombal e a morte do rei Dom José, as obras públicas foram paralisadas, assim como algumas obras privadas, mas, como indica o autor, a fidalguia perseguida até então é mais ou menos reabilitada por Dona Maria I. Nesse período, com a perda da corte passada ao Brasil, Lisboa entra numa fase de morosidade nos negócios. Conforme França, todas as obras ficam paradas, já que o dinheiro era pouco para pagar despesas da guerra e da ocupação. Em 1851, com o fim da guerra civil de 30 anos, o país, de acordo com Silva, passa por uma fase de desenvolvimento e civilização. Em Lisboa, em 1886, inaugura-se a Avenida da Liberdade e conclui-se a Avenida 24 de julho. Dois projetos, que, como aponta Silva, tinham algo em comum, afastavam fisicamente o rio da orla urbana. Começa-se, assim, a aproveitar as potencialidades das superfícies do interior. Silva evidencia que, se anuncia, deste modo, uma nova Lisboa, que rompe com a tradicional cidade ribeirinha, afastando o Tejo dos seus projetos de modernização e ainda ajudam-na “a sair do ciclo de pobreza em que viveu encerrada durante grande parte de oitocentos” (FERNANDES, op. cit., p.493). Nesse período são inaugurados o Caminho de Ferro de Cintura e o do Cais do Sodré a Cascais (1889), permitindo acesso mais rápido às zonas de veraneio, começa a substituição do gás pela eletricidade (1878) e, com a Companhia Carris de Ferro, instalam-se os carros elétricos (1876) e os elevadores mecânicos (1884). Por volta de 1900, como indica Silva, o príncipe Dom Afonso, irmão do rei, assustava os transeuntes ao volante de um dos primeiros automóveis que circulavam na 82 cidade. Há também, nesse período, de acordo com Fernandes, construções importantes da arquitetura do ferro que marcam Lisboa: os elevadores do Carmo (1902), da Alcântara (1906), os edifícios em andares (Alcântara, 24 de julho, 1904), as garagens (Rato, 1906), edifícios industriais (Fábrica Germânia, Almirante Reis, 1913), casas de espetáculos (Teatro Ginásio, 1923, Tivoli, 1924, Capitólio, 1925). Fernandes evidencia que, no início da década de 30, há um arranque na expansão da cidade, relacionado com a instauração do governo autoritário nacional em 1926, em que se assiste à construção de obras públicas como o Instituto Superior Técnico Nacional de Estatística (1927-35), a casa da Moeda do Arco Cego (1934-36) e o Pavilhão de Rádio em Sete Rios (1927-33). Entre 1935 e 1938, segundo Fernandes, há um Plano de Urbanização de Lisboa, realizado no Ministério de Duarte Pacheco com a colaboração de urbanistas franceses, em que se nota evidente modernização na cidade com a construção do aeroporto, da cidade universitária, dos parques de Monsanto e Eduardo VII. O autor indica que, entre 1948 e 1952, se implementa na cidade uma série de regras novas e modernizantes, dentre as quais se destacam: planejamento de sistemas de arruamentos hierarquizados (circulações separadas de pedestres e carros), novas formas de execução e gestão das edificações, bem como a diversificação controlada dos tipos de empreendimento, polifuncionalidade de novas áreas urbanizadas, combatendo assim a excessiva zonificação da cidade que desde a expansão dos finais de oitocentos se acentuava e articulação das novas áreas urbanizadas com as já existentes em continuidade no espaço urbano. Em termos de população, Fernandes aponta que, em 1930, se contavam 600.000 habitantes e, em 1940, 700.000. Um aumento considerável, já que em menos de um século, em 1864, se contavam 197 mil pessoas na cidade. Já em 1950 a população se aproxima de um milhão de habitantes. Depois da segunda guerra, Lisboa pára de crescer, conforme aponta Gaspar; há evidente declínio demográfico a partir dos anos 60 com visível expansão nos subúrbios. É nesse período que, conforme evidencia Custódio, a sociedade passa da era da metalúrgica do ferro e dos têxteis à era do consumo. A imagem de uma Lisboa manufactureira e industrial com as suas evidências arquitectónicas, fabris e técnicas, com os seus ruídos de trabalho, seus cheiros dos produtos recém-fabricados e as suas envolvências sociais de artesãos e operários, tal como era comum, nos finais do século XIX e ainda na metade do 83 século XX, esfumou-se do quotidiano do habitante da cidade nos últimos trinta anos [década de 60] (op. cit., p.435). É nesta época também que, segundo Custódio, a sociedade se esmera em resolver o problema da energia através das vantagens da eletricidade e, ao mesmo tempo, descobre o petróleo. Surgem novas condições sociais que promovem cada vez mais o bem-estar da população e o consumo, tanto de bens alimentares, como de equipamentos domésticos e do automóvel. O autor ressalta ainda que, em função do crescimento econômico, há também crescimento populacional principalmente de deserdados dos campos portugueses que buscam oportunidades de trabalho na cidade. No entanto, os baixos salários e os preços relativamente altos minavam os sonhos daqueles que iam em busca de condições melhores de vida. De acordo com Fernandes, o plano diretor de Lisboa, publicado em 1967, preocupava-se principalmente com a rede viária e com a previsão de vários túneis e viadutos, já que havia uma nova rede de comboios subterrâneos, desde 63, e o desenvolvimento da rede de “autocarros”. Observa-se, neste momento, o aumento cada vez maior dos fluxos pendulares de uma enorme população que mora na periferia e trabalha na cidade, contribuindo para a formação da Grande Lisboa, de Sintra a Setúbal ou de Vila Franca a Cascais. Gaspar salienta que, nos finais do século XX, se observa a beleza, grandiosidade e excelência funcional de Lisboa, embora ainda se perceba, em relação ao processo de urbanização, muita carência e erros cometidos. Para Fernandes, há, na atualidade, um tempo de recuperação da capitalidade perdida e uma tentativa de reorganização funcional, espacial e urbanístico-arquitetônica da cidade. O ano de 1974, marcado pelo “25 de abril”, data em que se derruba o regime político que vigorava em Portugal desde o golpe militar de 1926, de inspiração fascista, que manteve Salazar no poder de 1933 a 1968, sendo substituído por Marcello Caetano deposto então na data da revolução, faz com que surja uma nova ordem urbana que, segundo Fernandes, se mostrou tão inovadora, como passageira. Há nos anos 80, como indica o autor, reestabilização política e social na cidade e os problemas vêm à tona: - a necessidade urgente de reabilitar e repensar as funções de seus núcleos históricos centrais, 84 - o controlo da terciarização excessiva sofrida nos últimos anos nas áreas das avenidas, com reequilíbrio das áreas exclusivas de serviços e das áreas de lazer, equipamento e residência, - a reintegração das vastas áreas de habitação clandestina e degradada que envolvia Lisboa, intensamente agravada na última década, - o problema capital, que era o da gestão e desenvolvimento do seu território real, o qual ultrapassava largamente o dos limites administrativos, existentes criados há cem anos (op. cit., p.512). Percebem-se, a partir dos anos 90, como aponta Fernandes, ações efetivas na cidade, previstas há algum tempo, no sentido da recuperação do centro histórico, da criação de novas áreas de parque, do desenvolvimento da rede viária, complementadas por túneis, viadutos e parques de estacionamento e na faixa litoral a reconstrução da via marginal, duplicação e adaptação de transportes coletivos rápidos. Por fim, observamos na longa trajetória da história de Lisboa, por um lado, períodos áureos de muita riqueza e poder, períodos de crescimento econômico e social, e, por outro, períodos de estagnação e recuperação tanto do poder, quanto do crescimento. Hoje em dia, o que se observa é que, em termos europeus, embora Portugal esteja inserido na comunidade econômica européia, não faz parte do bloco dos países mais ricos, nem mais poderosos, mas, de maneira geral, há, na cidade de Lisboa, especificamente, boa qualidade de vida, já que a população conta com boa infraestrutura e acesso a bens e serviços que também são encontrados no restante da Europa. 2.6 A variável dependente e as variáveis independentes Estabelecemos como variável dependente em nosso estudo a marcação/não marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural. Buscando verificar os contextos favorecedores para cada uma das variantes, selecionamos os seguintes grupos de fatores lingüísticos e extralingüísticos ou variáveis independentes60. Os grupos de fatores lingüísticos: 1. Saliência Fônica 2. Paralelismo Formal 3. Tipo de Verbo 4. Posição do sujeito em relação ao verbo 5. Traço humano no sujeito 6. Tipo de sujeito 60 A análise dos grupos de fatores será feita somente com a amostra sincrônica. 85 Os grupos de fatores extralingüísticos: Sociais: 1. Sexo 2. Idade/escolaridade 3. Redes sociais Geográficos: 1. Diatopia 2. Diazonalidade Vamos agora delimitar os contextos de restrição da nossa amostra, em seguida caracterizamos e levantamos as hipóteses de cada um dos grupos de fatores a serem controlados em nossa análise61. 2.6.1 Contextos de Restrição Neste momento, evidenciaremos os dados que foram excluídos quando da delimitação do nosso objeto de pesquisa. a) Concordância semântica Os dados de SN coletivo de terceira pessoa do singular (ex.: a turma, o pessoal) que poderiam desencadear a chamada concordância semântica, em que há correlação do sentido de plural expresso pelo SN, fazendo com que o verbo fique no plural (ex.: O pessoal foram embora), não foram selecionados para esta pesquisa. Decidimos excluir estes dados por acreditarmos que a terceira pessoa do plural nestes casos seria a forma inovadora, em oposição ao objeto que estamos analisando, em que é a terceira pessoa do singular a forma inovadora. b) Construção verbo+SE+SN As construções verbo+SE+SN foram encontradas apenas na amostra do PE. As gramáticas (cf. CUNHA e CINTRA, 1991, p.150; BECHARA, 1999, p.435; MIRA MATEUS et al., 2003, p.531) consideram essas construções como passivas de -SE em que o argumento interno do verbo é considerado sujeito e, por isso, deverá apresentar relação de concordância com o verbo. 61 Vale ressaltar que a caracterização e as hipóteses dos grupos de fatores se referem ao PB e ao PE. 86 Nos dezesseis62 dados encontrados na amostra do PE, apenas três apresentaram marcas de concordância nos verbos, o que indica variação nesse tipo de construção. No entanto, resolvemos desconsiderar tais dados, primeiro por termos como objetivo, neste trabalho, constituir amostras comparáveis do PB e do PE e não termos dados dessa natureza na amostra do PB e também por sabermos que a regra estabelecida pelas gramáticas não reflete o que de fato ocorre na língua. Concordamos com os lingüistas que discutem tais construções (como BAGNO, 2000 e SCHERRE, 2005) defendendo que o sujeito a ser considerado é o SE e, por isso, o verbo deve ficar no singular. c) Sujeito nulo indeterminado Os casos com sujeito nulo indeterminado não foram considerados, pois todos os dados necessariamente apresentariam marca de plural, como no exemplo a seguir: (3) Ø Disseru que foi uma gripe (PBRCMVF04). 2.6.2 Os grupos de fatores lingüísticos 2.6.2.1 As hipóteses neogramática e difusionista Para os grupos de fatores saliência fônica e paralelismo formal, investimos nas hipóteses neogramática e difusionista. Apresentaremos, brevemente, as duas hipóteses e, em seguida, discutiremos se tais hipóteses podem dar conta desses grupos de fatores. A hipótese neogramática prevê que “as mudanças sonoras não têm exceções; são condicionadas apenas por fatores fonéticos; são foneticamente graduais e lexicalmente abruptas” [grifos nossos] (OLIVEIRA, 2003, p. 605). Os neogramáticos, desta forma, defendem que a mudança de som é sempre gradual, sempre regular, afetando todas as palavras ao mesmo tempo. A hipótese difusionista, ao contrário, prevê que as mudanças sonoras são foneticamente abruptas e lexicalmente graduais. Os difusionistas não aceitam a existência da mudança de som regular da forma como a hipótese neogramática defende; no entanto, de acordo com Oliveira (2003, p.606) 62 Os dados a que nos referimos serão apresentados na subseção 3.2.1.3 no Capítulo III, quando da discussão do grupo de fatores tipo de verbo. 87 o modelo da difusão lexical não descarta a regularidade; o que ele faz é permitir a existência de irregularidades. Além disso, o modelo difusionista não recusa a possibilidade de condicionamento fonético; o que ele faz é incorporar a possibilidade de mudanças sonoras que não sejam foneticamente condicionadas. Labov (1994)63 argumenta que há consideráveis evidências para a difusão lexical no processo de mudança, mas a perspectiva dos neogramáticos também tem força. Segundo o autor, algumas análises dão suporte à hipótese difusionista, assim como outras suportam à visão neogramática. Para Labov, ambas, a difusão lexical e a regularidade neogramática existem. No que se refere ao grupo de fatores saliência fônica, parece ser um caso de difusão lexical, já que esperamos que haja a queda da nasalidade nos contextos menos salientes e só depois os contextos mais salientes vão sendo atingidos, havendo, desta forma, uma mudança lexicalmente gradual, pois teremos apenas os itens menos salientes sendo atingidos ao mesmo tempo. Já em relação ao paralelismo formal, acreditamos que a hipótese neogramática se encaixe, pois parece haver um princípio mecânico agindo sobre esse grupo de fatores, levando, de um lado, à queda regular das marcas de plural em todos os verbos precedidos de elementos sem marcas de plural, e, de outro lado, à manutenção regular do plural nos verbos precedidos de elementos com marcas de plural. 2.6.2.1.1 Saliência fônica Este grupo de fatores foi estabelecido em função de dois critérios de acordo com Naro (1981): (1) presença ou ausência de acento na desinência e (2) quantidade de material fônico que diferencia a forma singular da forma plural. A partir do primeiro critério, estabeleceram-se dois níveis de saliência e em cada nível apresentavam-se três categorias, salientando a diferenciação do material fônico da relação singular/plural. • Nível 1: oposição não-acentuada: 1. não envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural (conhece/conhecem, consegue/conseguem, corre/correm, vive/vivem, sabe/sabem); (7) a. Eles não consegue alcançar nosso ritmo, né? (PBRIMJS13)64 63 Labov (1994) discute essas questões em The Regularity Controversy (Parte D). A codificação refere-se: à amostra do nosso corpus (PB – Português do Brasil, PE – Português Europeu), à localidade em que a entrevista foi realizada (no PB – RI: Ribeirão da Ilha, IN: Ingleses, CL: 64 88 b. Aí eles não conseguem ter um bom rendimento (PBRIMJS13) 2. envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural (ganha/ganham, era/eram, gosta/gostam); (8) a. Tenho três, quatro sobrinhos, anda todos eles também aí ao mar (PECAMVF03) b. Sim, andam aí uns brasileiros (PECAMVF03) 3. envolve acréscimo de segmentos na forma plural (diz/dizem, quer/querem); (9) a. Só que eles diz que eu tenho que trabalhá pra pagá (PBINMJF10) b. Ah, uns dizi que é porque ele foi demitido (PBINMJF10) • Nível 2: oposição acentuada: 1. envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural (tá/tão, vai/vão); (10) a. Os meus irmãos tá cada um do seu lado (PECAFJF11) b. Elas já tão o dia todo na escola (PECAFJF11) 2. envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural (bateu/bateram, viu/viram, incluindo o par foi/foram que perde a semivogal); (11) a. Conta coisas que pra ele foi um bocado traumáticas (PECAFJS15) b. As aulas práticas foram reduzidas (PECAFJS15) 3. envolve acréscimos de segmentos e mudanças diversas na forma plural: mudanças vocálicas na desinência, mudanças na raiz, e até mudanças completas (veio/vieram, é/são, disse/disseram). (12) a. Veio todos pra cá (PERCFJF12) b. Vieram muitos imigrantes de fora pra cá (PERCFJF12) Muitos estudos (cf. LEMLE e NARO, 1977; NARO, 1981; RODRIGUES, 1987; SCHERRE e NARO, 1997; MONGUILHOTT, 2001; PEREIRA, 2004; CARDOSO, 2005) já comprovaram a relevância deste grupo de fatores indicando que formas mais salientes tendem a ser mais marcadas do que as menos salientes, i.e., as oposições mais salientes, sendo mais perceptíveis, aumentam a probabilidade de ocorrência da variante explícita de plural. Partindo dos resultados desses estudos e da hipótese da difusão lexical, a expectativa para nossa amostra é de que as formas mais salientes também favoreçam a presença da marca de concordância na terceira pessoa do plural. Costa da Lagoa, RC: Região Central, no PE – SI: Sintra, BE: Belém, CA: Cascais, RC: Região Central), ao sexo do informante (F: feminino, M: masculino), à idade do informante (J – 15 a 36 anos, V – 45 a 76 anos), à escolaridade do informante (F: fundamental – de 1ª. a 9ª série, S: superior – do 12 ano ao superior concluído com mestrado) e ao número de identificação de cada informante na amostra. 89 2.6.2.1.2 Paralelismo Formal Controlaremos o paralelismo formal no nível clausal com o intuito de atestar se existe correlação entre o tipo de marca existente no sujeito e o tipo de marca existente no verbo, ou seja, se marcas explícitas de plural no sujeito levam à presença de marcas de plural no verbo e se o sujeito com marca zero de plural influencia a marca zero de plural no verbo. Subdividimos este grupo nos seguintes fatores: a. presença da forma de plural explícita no último (ou único) elemento (13) As mulheres não tinham direito a voto (PERCFVF04); b. presença da forma de plural zero no último elemento (14) Os homiØ ia assim tarrafeá (PBINFVF02); c. presença de numeral terminado em /s/ no último elemento (15) Os dois só estudu (PBINFVS06); d. presença de numeral não terminado em /s/ no último elemento (16) Na Costa aqui estudou parece uns cinco só na Lagoa (PBCLMVF03); e. sujeito nulo com sujeito anafórico com presença da forma de plural explícita no último (ou único) elemento (17) Todas as minhas amigas namoravam e Ø vinham às festas aqui (PBRIFVS05); f. sujeito nulo com sujeito anafórico com presença da forma de plural zero no último elemento (18) Os neto Ø dele chamava ele de tolo, Ø dizia: ah, o vô é tolo! (PBCLMVF03); g. sujeito nulo com sujeito anafórico com presença de numeral terminado em /s/ no último elemento (19) Tem dois ali que tão na biblioteca, Ø tão fazendo trabalho (PBRIMJF09); h. sujeito nulo com sujeito anafórico com presença de numeral não terminado em /s/ no último elemento65 A nossa hipótese contempla o princípio geral do paralelismo: marcas levam a marcas, zeros levam a zeros. Esperamos que, tanto no sujeito preenchido, quanto no sujeito nulo com sujeito anafórico, quando o último elemento do sujeito apresentar marca explícita de plural, o verbo correspondente tenderá a exibir a marca de plural, e se o último elemento do sujeito apresentar zero plural, o verbo correspondente tenderá também a exibir zero 65 Não foram encontrados dados na amostra para este fator. 90 plural (cf. SCHERRE e NARO, 1993; MONGUILHOTT, 2001; PEREIRA, 2004; CARDOSO, 2005). Em relação à presença de numeral, acreditamos que se o último elemento do sujeito, ou o sujeito anafórico, no caso de sujeito nulo, for um numeral terminado em /s/ haverá uma tendência maior para existir marca formal de plural no verbo, diferentemente dos numerais sem /s/, que deverão influenciar na não-marcação da concordância. Esperamos, ainda, confirmar a hipótese dos neogramáticos. 2.6.2.2 A hipótese da inacusatividade Para a discussão dos fatores internos: tipo de verbo, posição do sujeito em relação ao verbo, traço humano no sujeito e tipo de sujeito, nos apoiaremos no quadro da Teoria Gerativa, mais especificamente no Modelo de Princípios e Parâmetros (cf. CHOMSKY, 1981, 1986). Optamos por utilizar alguns dos pressupostos teóricos do modelo de Princípios e Parâmetros, em função de alguns dos resultados obtidos no nosso trabalho de 2001, discutidos na subseção 1.1.1.1 do capítulo I. A correlação entre tipo de verbo, posição do sujeito e traço humano no sujeito mostrou-se importante condicionadora da não-concordância verbal no PB, confirmada também por Carrilho (2003) no PE. Desta forma, decidimos continuar investindo nesta correlação; por isso, discutiremos alguns aspectos do Modelo de Princípios e Parâmetros, mais particularmente a questão da inacusatividade, que servirão de base para o levantamento de algumas hipóteses e, posteriormente, para a explicação dos resultados encontrados. A hipótese da inacusatividade foi formulada por Burzio (1986) que se utilizou das discussões de Perlmutter (1976), dentro de um modelo teórico conhecido como Gramática Relacional. Burzio (1986), analisando as estruturas intransitivas, constatou diferenças estruturais importantes entre elas, como o fato de nem todas apresentarem sujeito subjacente. O autor propôs que essas estruturas, a que denominou ergativas (doravante inacusativas), diferem das intransitivas em duas propriedades: (i) só exibem uma posição temática, a de objeto direto; 91 (ii) o objeto direto não recebe Caso do verbo inacusativo66. Segundo Burzio, as estruturas inacusativas são derivadas de uma Estrutura-D (estrutura profunda) que apresenta a posição de especificador vazia, devido a uma operação no nível lexical que suspende o papel temático do sujeito. Decorrente de não ter recebido Caso em sua posição de base, em Estrutura-D, o SN objeto se movimenta para a posição de sujeito na qual recebe nominativo: (20) Estrutura-S de verbos inacusativos: [IP SNi V [VP tv ti] ] (21) Estrutura-S de verbos intransitivos: [IP SNi V [VP ti tv] ] Burzio, ao analisar sentenças do inglês com sujeito pleonástico, e sentenças do italiano com sujeito posposto, propôs que em Estrutura-D tal estrutura apresenta um pronome expletivo na posição de sujeito, co-indexado ao SN pós-verbal para indicar a formação de uma CADEIA67 de Caso: (22) [SN pro expl]i [VP V SN i ] Segundo o autor, a estrutura acima apresenta apenas um SN argumento, tematicamente marcado pelo verbo; entretanto, esse SN não recebe Caso acusativo. Mas como pela Condição de Visibilidade todo SN com papel temático precisa receber Caso, então o autor propõe que ele deve estar recebendo nominativo e mostra a possibilidade de estar co-indexado com o expletivo na posição de sujeito. Isso quer dizer que o nominativo não é atribuído diretamente ao SN pós-verbal, mas transmitido a ele a partir da posição de sujeito via CADEIA. Segundo o que Burzio propõe, a atribuição de nominativo ao SN pós-verbal justifica-se pela manifestação dos traços de concordância verbal, já que o núcleo I é o responsável pela atribuição de Caso nominativo. 66 Como no exemplo: (a) Faltou um aluno. (b) *Faltou-o. Chomsky (1986) propõe o termo CADEIA (em caixa alta) para designar os pares expletivo-argumento, como no exemplo (c) proi chegaram [as cartas]i, e o termo cadeia (em letra minúscula) para designar as cadeias por movimento, como no exemplo (d) [As cartas]i chegaram ti. 67 92 Observemos as configurações (a), atribuída aos verbos inacusativos, e a configuração (b), atribuída aos intransitivos, em termos da Teoria X-Barra: a. VP | V’ / \ V SN b. VP / SN \ V’ | V Como podemos observar, as configurações (a) e (b) são distintas, pois os inacusativos selecionam um argumento interno, e os intransitivos selecionam um argumento externo. Outro aspecto que distingue esses verbos relaciona-se aos argumentos selecionados por eles aqueles selecionados pelos inacusativos podem apresentar traços mais ou menos humanos, enquanto os argumentos selecionados pelos verbos intransitivos apresentam necessariamente traços mais humanos. Para ilustrar esses casos, observemos abaixo as sentenças com o verbo inacusativo começar, apresentando em (23) sujeito com traço [+humano] e em (24) sujeito com traço [humano]. (23) As pessoas começaram a ir pra Lagoa (PBCLFVS07) (24) Aí começou os horário de cinco e meia (PBCLFVS07) Já com o verbo intransitivo isto não acontece. Em (25), por exemplo, temos o intransitivo pensar com sujeito [+humano] e em (26) ao derivarmos a sentença de (25) colocando sujeito com traço [-humano] acabamos por torná-la agramatical. (25) Acho que eles pensam muito (PESIFJF09) (26) *Acho que as canoas pensam muito Para evidenciarmos o fato de que os verbos inacusativos selecionam argumento interno e não externo, observaremos, em seguida, através de alguns exemplos, que, quando aparece um SN na posição de especificador de IP, nem sempre ele é argumento externo do verbo. No caso de verbos existenciais, por exemplo, o SN à sua esquerda é um objeto profundo que se moveu de sua posição de base para a posição de especificador de IP, como na sentença (28) derivada de (27) em que temos o SN trilhas ecológicas como argumento interno de existir. 93 (27) Existe trilhas ecológicas (PECAFJS15) (28) Trilhas ecológicas existe Agora, para contrastar também com os inacusativos, evidenciamos uma discussão trazida por Mioto et al. (1999) apresentando dados de verbos transitivos, pois estes necessariamente selecionam argumento externo. Observemos em (29): (29) a. Existe trilhas ecológicas (PECAFJS15) b. *Deseja trilhas ecológicas Enquanto desejar tem de ocorrer necessariamente com um argumento externo, caso contrário resulta em agramaticalidade, como em (29b), existir não admite que se postule um argumento externo antes dele, já que é incapaz de atribuir-lhe papel temático, como podemos observar em (30a): (30) a. *João existe trilhas ecológicas b. João deseja trilhas ecológicas Em (30a), o SN João não é licenciado na sentença, pois viola a cláusula (i) do Critério temático68. Como existir não seleciona João, também não lhe atribui papel temático. Já em (30b) o SN João recebe papel temático do verbo pelo qual é selecionado (desejar). Os aspectos da Teoria Gerativa aqui levantados evidenciam a correlação entre os grupos de fatores tipo de verbo, posição do sujeito e traço humano no sujeito. Percebemos que a inversão do sujeito é condicionada principalmente por contextos de inacusatividade, assim como a seleção de argumentos com traço [-humano] para figurarem como sujeitos na sentença dá-se também pelos inacusativos. Ciríaco e Cançado (2004) propõem uma classificação para os verbos inacusativos e intransitivos que acreditamos contribuir para a nossa análise. Utilizaremos a categorização dos verbos no nosso trabalho, levando em conta os seguintes critérios discutidos pelas autoras: rede temática, posposição do sujeito, 68 A cláusula (i) do Critério temático estabelece que todo argumento deve aparecer em uma cadeia que comporte um e apenas um papel temático. 94 indeterminação do sujeito e particípio absoluto. Levaremos em conta, ainda, para tal categorização, o critério do objeto cognato (cf. FIGUEIREDO SILVA, 1996; COELHO, 2000). Em relação à rede temática, as autoras propõem que os verbos inacusativos prototípicos apresentam a propriedade de afetado; já os intransitivos prototípicos apresentam a propriedade de desencadeador. Ciríaco e Cançado (2004), a partir de exemplos, mostram como investigar tal propriedade. Nos exemplos a seguir: (31) João correu ontem (32) João chegou de repente Observa-se, em (31), que João tem papel no desencadeamento do processo; já em (32), observa-se que João mudou de um estado para outro. As autoras sugerem que testes que provam agentividade não são aceitos pelos inacusativos, testes do tipo: o que X fez foi... As autoras apresentam os seguintes exemplos: (33) a. *O que a menina fez foi adoecer de dengue b. A menina adoeceu de dengue. Já com os verbos cujos argumentos são desencadeadores, de acordo com as autoras, os testes que provam agentividade são aceitos, como evidenciam os exemplos trazidos por elas: (34) a. O que João fez foi sair b. João saiu. Levamos em consideração ainda os testes sintáticos sugeridos pelas autoras: a posposição do sujeito, a indeterminação do sujeito e o particípio absoluto. Em relação à posição do sujeito, para Ciríaco e Cançado, a ordem VS é aceita mais naturalmente pelos inacusativos em comparação com os intransitivos, já que seu argumento é um objeto na origem, o que evidenciamos na discussão anterior. A partir dos exemplos das autoras, percebemos que, embora não possamos considerar a evidência da posposição isoladamente como único diagnóstico para a inacusatividade, 95 como as autoras alertam, os pares de exemplos apontam para uma aceitabilidade maior da inversão do sujeito para os inacusativos. Observemos os exemplos em (35), com os inacusativos, e os exemplos em (36), com os intransitivos: (35) a. Apareceu uma flor no meu jardim b. Caiu um menino ali na escada c. Morreu um velhinho na fila d. Nasceu um bebê lindo hoje na maternidade (36) a. ? Falou um menino logo ali b. ? Nadou um menino na piscina c. ? Andou uma criança por aqui d. ? Pulou um menino no meu colo No que se refere à indeterminação do sujeito, segundo as autoras, essa é uma propriedade restrita a verbos que possuem argumento externo. A partir dos exemplos das autoras (37) *Chegou-se muito ontem (38) Correu-se muito ontem na lagoa, podemos observar que o verbo chegar não admite indeterminação, pois é um verbo inacusativo, já o verbo correr admite, pois é intransitivo. No que tange ao particípio absoluto, de acordo com as autoras, considerado um diagnóstico mais preciso para a constatação da inacusatividade, observamos que os verbos inacusativos admitem particípio absoluto, ao passo que os intransitivos não o admitem. Constatamos a propriedade, nos exemplos trazidos pelas autoras: (39) Chegadas as cartas, pude descobrir a razão de tanta tristeza (40) *Corridos os atletas, a prova acabou. Por fim, temos a propriedade do objeto cognato discutida em Figueiredo Silva (1996) e Coelho (2000). Consideramos que os verbos intransitivos prototípicos admitem 96 uma espécie de objeto inerente, enquanto os verbos inacusativos prototípicos mostramse resistentes a tal construção, conforme os exemplos a seguir: (41) *João chegou uma chegada bonita (42) João correu a corrida de São Silvestre 2.6.2.2.1 Tipo de verbo Subdividimos os verbos em: inacusativo prototípico, inacusativo não prototípico, intransitivo prototípico, intransitivo não prototípico, transitivo e cópula. Consideramos, na nossa análise, verbos inacusativos prototípicos aqueles que apresentavam as seguintes propriedades: (+) posposição69, (-) desencadeador, (-) indeterminação, (+) particípio e (-) cognato. Já os intransitivos prototípicos foram considerados aqueles que apresentavam as propriedades: (-) posposição, (+) desencadeador, (+) indeterminação, (-) particípio e (+) cognato. Os inacusativos e intransitivos não-prototípicos foram definidos em função da não presença de alguma ou algumas propriedades dos verbos prototípicos. O verbo transitivo é aquele definido como verbo de mais de um argumento e o verbo cópula é aquele que seleciona uma SC, do Inglês small clause, pequena oração. O cópula é um verbo monoargumental inacusativo; no entanto, ao invés de selecionar um argumento interno, seleciona uma pequena oração; por isso, o categorizamos separadamente, pois acreditamos que tenha comportamento diferenciado no que se refere à concordância verbal. Os verbos estão subdivididos em: • Inacusativos prototípicos (43) Depois surgiu as carroças, os burros (PESIMJS13); • Inacusativos não-prototípicos (44) As pessoas não sai do Ribeirão todo dia pra vim no centro (PBRCMJS16); • Intransitivos prototípicos (45) Muitos escravos também trabalhavu nessa atividade (PBRIMJS13); 69 Embora a posição do sujeito em relação ao verbo seja um grupo de fatores a ser controlado no nosso trabalho, o que poderia enviesar a nossa análise, já que seu controle, desta forma, será reduplicado, inserimos a propriedade (+/-) posposição na caracterização dos inacusativos/intransitivos, pois do contrário teríamos apenas quatro propriedades distintivas o que inviabilizaria a proposta. 97 • Intransitivos não-prototípicos (46) Os primeiros europeus a vir pra cá foram os espanhóis que aportaram aqui (PBRIMJS13); • Transitivos (47) Os alunos dão importância também pra esse profissional (PBINFVS06); • Cópula (48) Como a maioria dos professores são catalães, é tudo em catalão, os textos é tudo em catalão (PERCFJS16). Nossa hipótese, para este grupo de fatores, relaciona-se às características dos diferentes tipos de verbos. Primeiramente, em relação aos verbos inacusativos, esperamos que, em função das suas propriedades: (-) desencadeador, (+) posposição, (-) indeterminação do sujeito, (+) particípio absoluto e (-) objeto cognato, tendam a apresentar menos marcas de concordância. Essas propriedades indicam que (i) os inacusativos não aceitam testes que provam agentividade, que é uma propriedade caracterizadora da marcação da concordância verbal; quanto mais agentivo, mais prototípico, mais concordância; (ii) aceitam mais naturalmente a ordem VS, que é condicionadora da não marcação da concordância verbal; (iii) não admitem indeterminação do sujeito, que é uma propriedade típica de verbos que selecionam argumento externo, que também é característica de marcação da concordância verbal; (iv) admitem particípio absoluto e (v) não possuem objeto cognato. No que se refere aos verbos intransitivos que possuem as propriedades contrárias às dos inacusativos, uma vez que selecionam apenas argumentos externos (e não internos), esperamos que tendam à marcação da concordância verbal. Os verbos transitivos, que se caracterizam por selecionarem também argumentos externos que figurem na posição típica de sujeito, devem se comportar como os intransitivos, apresentando maiores chances de marcas de concordância. Em relação aos verbos do tipo cópula, embora façam parte da categoria dos inacusativos, esperamos que tendam a exibir mais marcas de concordância do que os verbos inacusativos prototípicos e menos prototípicos, por selecionarem uma pequena oração (small clause). 98 2.6.2.2.2 Posição do sujeito em relação ao verbo O português é uma língua do tipo Sujeito-Verbo-Objeto que admite variação; por isso, o SN pode aparecer posposto ao verbo. Dessa forma, para esse grupo de fatores, consideramos a anteposição ou a posposição do sujeito: • SN V anteposição (49) Eles moru lá na cidade (PBRIMJF09) • V SN posposição (50) Mora três lá perto da minha casa (PBINFVF02) Baseando-nos em resultados de trabalhos empíricos, esperamos que haja enfraquecimento da concordância com o SN pós-verbal, como veremos a seguir. Lemle e Naro (1977) apontam que a probabilidade de concordância verbal com SNs pós-verbais é muito menor do que com SNs pré-verbais, independendo até mesmo do nível de escolaridade a que pertence o falante. Lira (1986) também comprova o alto índice de ausência de concordância com SNs pospostos em seus resultados: probabilidade de .62 de ausência de concordância para apenas .38 de presença. Rodrigues (1987), atestou, em seu estudo que o sujeito posposto influencia fortemente a não-concordância com 97% de freqüência e .88 de peso relativo, diferentemente do sujeito anteposto, com 76% de freqüência e .31 de peso relativo, assim também como o sujeito distante do verbo 78% de freqüência e .45 de peso relativo. Berlinck (1988) também apresenta resultados que apontam maior tendência aos SNs pospostos desencadearem menor concordância. Em seus resultados, 94% dos SNs pospostos apresentam ausência de concordância para apenas 20% de presença, um percentual bastante significativo. Vale lembrar que seus dados são de informantes de nível universitário. A autora diz que essa associação de SN posposto e ausência de concordância têm servido de argumento favorável à tese do caráter menos ‘subjetivo’ do sujeito. Pontes (1986) discute, em seu trabalho, o estatuto de sujeito do SN posposto evidenciando que este tipo de sujeito apresenta características de objeto70 (posição VSN, [- concordância]). 70 Como evidenciamos no capítulo I, subseção 1.1.1.1, o SN posposto, conforme Pontes (1986), mesmo apresentando características de objeto não admite cliticização como em: (1) A Sarinha tá nascendo dente; (2) *A Sarinha nasceu-o. 99 A autora ressalta, a partir de um teste feito com alguns estudantes da Faculdade de Letras da UFMG, que o SN posposto é encarado, muitas vezes, como objeto por uma parcela significativa de falantes que, por conseqüência, apresentam dificuldade na marcação da concordância com esses tipos de SNs. Scherre e Naro (1997) apresentam resultados que apontam para o fato de que, quando o sujeito está em uma posição mais à esquerda e mais próximo do verbo, existe maior probabilidade de favorecimento da ocorrência da variante explícita, enquanto a posição à direita e o distanciamento em relação ao verbo a desfavorecem, independentemente do grau de escolaridade dos falantes. Monguilhott (2001) evidencia em seus resultados o sujeito anteposto ao verbo como favorecedor da concordância com 84% de freqüência e .78 de peso relativo, enquanto o sujeito posposto ao verbo como favorecedor da não concordância com 52% de freqüência e .17 de peso relativo. Coelho e Monguilhott (2007) atestam, em seu trabalho, que a ordem VS condiciona a não marcação da concordância nos verbos, corroborando a tese do caráter não subjetivo do argumento que se posiciona à direita do verbo. Coelho, Monguilhott e Martins (2008) apresentam resultados de amostras diacrônicas em que há marcação de 100% nos casos de verbos com sujeito invertido no século XIX. Já no século XX, a freqüência de marcação é de 85%. Os autores evidenciam que os resultados refletem a relação que há entre marcação da CV e ordem SV; como a ordem SV está cada vez mais enrijecida no PB, há menos marcação da CV com sujeito invertido no PB atual. Partindo destas evidências, acreditamos que o SN, quando posposto ao verbo, apresentará forte tendência à variante zero de plural nos verbos. 2.6.2.2.3 Traço humano no sujeito Controlaremos, neste grupo de fatores, os traços do SN do tipo [+/-humano]: • SN [+humano] (51) Eles não trabalham com isso (PBRCMJS16); • SN [-humano] (52) Ainda existe terras mais pequenininhas aqui dentro do Conselho (PESIFJF09). 100 Em relação a esse grupo de fatores, esperamos que, quando o traço do sujeito for [+humano], a probabilidade de marcas de concordância no verbo seja maior, já que ele se caracterizará mais prototipicamente como sujeito, diferentemente do SN com traço [humano], que tenderá a desencadear menos marcas de concordância no verbo em função de, numa escala de “sujeitividade”, apresentar-se menos “sujeito”. 2.6.2.2.4 Tipo de sujeito Controlamos as seguintes formas de representação do SN-sujeito: • SN pleno simples (53) As pessoas trabalham só pelo dinheiro (PERCFVF04); • SN pleno nu (54) Não eram colunas assim como tá hoje (PBINFVS06); • SN pleno composto (55) Comia o pai e a mãe na mesa, os filho no chão (PBCLMVF03); • Pronome pessoal (56) Elas fazem uns doces muito bons (PERCFVS08); • Pronome indefinido (57) Trabaia uns na pesca (PBCLMVF03); • Quantificador (58) Moru todos lá (PBRCMJF12); • SN + pronome relativo (que) (59) Tem várias etnias que contribuíram pra formação dessa nossa ilha (PBRIMJS13); • Sujeito nulo (60) Todas as minhas amigas namoravam e Ø vinham às festas aqui (PBRIFVS05). Para o grupo de fatores tipo de sujeito, nossa hipótese baseia-se numa possível relação existente entre esse e o grupo de fatores posição do SN sujeito em relação ao verbo. De acordo com Zilles (2000), quando o SN é do tipo pleno (simples, nu e composto) ou pronome indefinido, existe forte tendência a aparecer à direita do verbo, por isso esperamos que nesses casos a probabilidade de não-marcação da concordância 101 seja mais acentuada. Além do estudo de Zilles (2000), outros estudos a respeito da variável posição do sujeito em relação ao verbo também indicam que a posposição do sujeito é um dos fatores determinantes para a não-aplicação da regra de concordância nos verbos. Já o SN do tipo pronome pessoal dificilmente ocorre à direita (cf. ZILLES, 2000), assim como o SN + pronome relativo (que), ocupando, então, uma posição privilegiada para a marcação de plural nos verbos. Em relação ao sujeito nulo, esperamos grande marcação de concordância, pois a desinência verbal torna-se mais necessária para identificar o sujeito quando este não está preenchido. 2.6.3 Os grupos de fatores extralingüísticos Como evidenciamos na apresentação da fundamentação teórico-metodológica da Teoria da Variação e Mudança e da Dialetologia Pluridimensional, o componente social e geográfico da concepção que norteia nossa pesquisa é fundamental. Como bem salienta Borges Neto Sem a perspectiva do social, sem a consideração do não-estrutural, a sociolingüística deixa de ser uma teoria e passa a ser uma metodologia de análise de dados lingüísticos que só se distingue de outras metodologias pela atenção que presta às variações inter e intra-individuais e pelo uso de instrumental estatístico. [grifos do autor] (2004, p.210-211) Assim sendo, gostaríamos de evidenciar a importância dos grupos de fatores extralingüísticos a serem controlados nos dados sincrônicos que serão apresentados a seguir. 102 2.6.3.1 Os grupos de fatores sociais 2.6.3.1.1 Sexo Embora não tenhamos levado em conta este grupo de fatores na composição da nossa amostra, pois o número de células ficaria maior do que o desejado e também por não ter sido significativo em nosso estudo anterior (MONGUILHOTT, 2001), a coleta se deu aleatoriamente com ambos os sexos. Desta forma, este grupo de fatores foi controlado de forma não sistemática. Esperamos encontrar, nos resultados, marcação da CV maior por parte das mulheres, por elas se mostrarem mais receptivas à atuação normatizadora da escola, como apontam Oliveira e Silva e Scherre (1996) para o PB, tendendo ao uso das formas mais prestigiadas. 2.6.3.1.2 Idade/escolaridade71 Em relação a este grupo de fatores, controlaremos as seguintes faixas etárias e níveis de escolaridade: • 04 falantes com idade entre 15 e 36 anos com ensino fundamental (da 4ª. série completa a 9ª. série completa) – jovem/ensino fundamental; • 04 falantes com idade entre 22 e 33 anos com ensino superior concluído72 – jovem/ensino superior; • 04 falantes com idade entre 48 e 74 anos com ensino fundamental (de 1ª. a 4ª. série incompleta a 7ª. série completa) – velho/ensino fundamental; • 04 falantes com idade entre 45 e 76 anos com ensino superior concluído73 – velho/ensino superior. Nossas hipóteses em relação às duas faixas etárias controladas, jovens e velhos, relacionam-se à diazonalidade. Acreditamos que os jovens da zona não urbana preservem mais as marcas de CV do que os velhos desta mesma zona. Já no que se refere à zona urbana, acreditamos que os mais velhos preservem mais a CV. 71 Os grupos de fatores idade e escolaridade foram controlados conjuntamente. Apenas uma informante do PE não havia concluído o curso superior, faltava um ano para a conclusão. 73 Os informantes do PB de 45 a 76 anos apresentam ensino superior concluído, no entanto, dos quatro informantes do PE apenas um apresenta o ensino superior concluído, os demais têm até o 12º ano. Como tivemos dificuldade em encontrar pessoas desta faixa etária com ensino superior concluído, resolvemos considerar o ensino médio destes informantes, já que contrastam com os informantes com ensino fundamental, o que era nosso objetivo. Em anexo, encontra-se o quadro 2.2 com o perfil de cada informante separadamente. 72 103 Nossa expectativa, em relação à zona não urbana, baseia-se em Baxter (1995) e Lucchesi (2006). Baxter, citando o trabalho de Bortoni (1985), aponta que, em dialetos rurais, os jovens usam mais marcas de plural do que os falantes mais velhos (op. cit., p.85). Lucchesi salienta tal relação (cf. apontado no capítulo I, seção 1.1.1.2), baseandose nos resultados de Nina (1980), Vieira (1997) e Silva (2003). O autor aponta que a marcação da CV aumenta conforme a idade do falante diminui. Em relação à zona urbana, baseamo-nos também em Lucchesi (2006), que evidencia, a partir do trabalho de Graciosa (1991), que há queda na marcação da CV na fala dos mais jovens. No que se refere à escolaridade, esperamos que, quanto maior o nível de escolaridade, maior seja a probabilidade de o falante utilizar marcas mais formais, no caso do nosso estudo a marcação da concordância verbal, pois a escola é um dos ambientes que privilegia a norma lingüística utilizada na escrita e, de acordo com estudos variacionistas envolvendo a variável anos de escolarização, existe correlação entre formas lingüísticas consideradas padrão (ensinadas na escola e reforçadas em outros ambientes - como TV, jornais) e maior escolaridade. 2.6.3.1.3 Redes sociais Algumas pesquisas incluindo grupos de fatores que vão além dos aspectos do macro-nível (idade, sexo, escolaridade e profissão) têm apresentado resultados interessantes. Um desses grupos de fatores visa ao controle das redes sociais com o intuito de reconhecer as características mais específicas dos indivíduos e da comunidade, através de questões etnográficas e de práticas sócio-econômico-culturais. As redes sociais são definidas por Milroy (2003) como os relacionamentos criados pelas pessoas para suprir as dificuldades da vida cotidiana. Tais redes podem variar de um indivíduo para outro e ser constituídas por ligações de diferentes tipos e intensidades. Chambers (1995) indica que os elementos que enriquecem as redes são basicamente os mesmos em todo o lugar, sejam eles, o grau de parentesco, a ocupação (ambiente de trabalho) e a amizade. Milroy (2003) distingue, ainda, redes de primeira e de segunda ordem. Constituem as redes de primeira ordem a família e os amigos; e as de segunda são compostas por pessoas com as quais o indivíduo passa boa parte do tempo, no entanto, não confia a elas segredos ou conselhos. Ainda de acordo com Milroy (2003), estudos feitos por Labov (1963) e Cheshire (1982) mostraram que 104 quanto mais integrado o sujeito está a uma rede, mais freqüentemente tende a usar variantes locais/regionais. Buscamos, no nosso trabalho, analisar a rede social dos informantes com o intuito de compreender o fenômeno de variação da concordância verbal de terceira pessoa do plural por permitir investigar as diferentes práticas sociais de que nossos informantes fazem parte. Inicialmente analisamos as redes em termos da densidade e da plexidade das relações entre os informantes. Em seguida, analisamos em termos do localismo e da mobilidade dos informantes. Para definirmos a densidade, a plexidade, o localismo e a mobilidade dos informantes, coletamos informações durante as entrevistas (algumas das questões que surgiram ao logo das entrevistas estão no quadro 2.3, em anexo) e fizemos também questionamentos que fazem parte das suas fichas sociais74. Em relação à densidade e à plexidade, temos como hipótese que os informantes da zona não urbana fazem parte de redes sociais mais densas e multiplexas, o que possibilita o uso de padrões valorizados localmente, menos formais, no caso do nosso estudo, a não marcação da concordância verbal, diferentemente dos informantes que fazem parte da zona urbana que tendem a apresentar redes menos densas e uniplexas, por isso, tendem ao uso de padrões mais valorizados socialmente, no caso, a marcação da concordância verbal. No que se refere ao localismo e à mobilidade, acreditamos que os indivíduos que se identifiquem com a sua localidade apresentem tendência à valorização da cultura local, bem como dos usos lingüísticos locais, diferentemente dos indivíduos que não se identifiquem com a localidade da qual fazem parte, que tenderão a adotar padrões lingüísticos externos. Quanto à mobilidade, esperamos que os indivíduos que apresentem alta mobilidade adotem padrões lingüísticos mais valorizados socialmente para que possam ser aceitos nas diversas instâncias que percorrem, diferentemente daqueles indivíduos que apresentarem pouca mobilidade, que deverão tender ao uso dos padrões valorizados localmente. Para que pudéssemos categorizar os dados para submetê-los às rodadas estatísticas, definimos dois subfatores para as redes sociais: o localismo e a mobilidade. Em relação ao localismo, qualificamos se os indivíduos que fazem parte da amostra eram bem integrados ao bairro em que moravam (se participavam das atividades do bairro, se gostavam de morar no bairro), mais ou menos integrados (se participavam das 74 Os termos densidade, plexidade, localismo e mobilidade foram discutidos no capítulo II, seção 2.1. 105 atividades do bairro, mas gostariam de residir em outro bairro, ou se gostavam de residir no bairro, mas não participavam das atividades que o bairro oferecia), e se pouco integrados (não gostavam de morar no bairro, nem participavam de atividades no bairro). No que se refere à mobilidade, controlamos também três fatores, se o indivíduo tinha pouca mobilidade (se trabalhava ou estudava no bairro, se fazia compras no bairro), se tinha média mobilidade (se trabalhava ou estudava no bairro, mas fazia compras fora do bairro) ou se tinha muita mobilidade (trabalhava ou estudava fora do bairro). 2.6.3.2 Os grupos de fatores geográficos75: 2.6.3.2.1 Diatopia76 No PB: A cidade de Florianópolis possui muitos bairros, sendo que a maioria se localiza na ilha, além de outros na parte continental. Em nosso estudo, optamos por selecionar os quatro pontos a serem investigados na ilha, localizados em áreas distintas, por julgarmos representativos da comunidade de fala florianopolitana77. Vamos agora apontar algumas características de cada uma das localidades a serem estudadas: a.1) Costa da Lagoa (localidade não urbana)78 Origem do nome: a denominação resulta da topografia da localidade – é uma costa do lado interno de uma lagoa. Idade do ponto: a freguesia foi fundada em 20/6/1750. População: 9.849 habitantes79. 75 Os grupos de fatores extralingüísticos, geográficos e sociais, serão discutidos a partir dos pressupostos da Teoria da Variação e Mudança e da Dialetologia Pluridimensional. 76 A caracterização da cidade de Florianópolis e da cidade de Lisboa será feita posteriormente na seção 2.6. 77 Para definirmos Florianópolis como uma comunidade de fala, assim como Lisboa, levamos em conta os critérios apontados por Guy (2000, 2001), discutidos no capítulo 2. 78 Algumas das informações foram retiradas do site http://floripa.geoguia.com.br, consultado em 23/11/2006. Outras informações foram retiradas do site http://pt.wikipedia.org, consultado em 03/11/2008 e outras ainda das entrevistas realizadas com os informantes para a coleta dos dados da pesquisa, bem como das impressões da pesquisadora ao longo de sua vivência nas localidades durante o trabalho de campo. 79 A densidade demográfica refere-se à Freguesia da Lagoa da Conceição, da qual a localidade da Costa da Lagoa faz parte. A localidade investigada possui uma população muito pequena, mas não obtivemos o dado preciso. 106 Perfil sócio-econômico: a localidade caracteriza-se por apresentar uma população extremamente integrada entre si. Ao longo de toda a extensão do bairro, todos se conhecem e sabem a casa em que os vizinhos moram e quais as atividades que realizam. As famílias ainda dividem o terreno como é costume em zonas menos urbanas, já que os filhos casam e continuam morando no terreno dos pais. Muitos casam com moradores do bairro, o que facilita ainda mais a integração. Os moradores participam das atividades do bairro, como discussões realizadas no conselho comunitário e festas promovidas na localidade. O bairro possui uma pré-escola municipal. A maioria dos moradores freqüenta escolas de ensino fundamental na Lagoa da Conceição, que fica a meia hora de barco e, quando vão para o ensino médio, muito optam por escolas no centro da cidade. O bairro recebe visitantes no verão, que costumam freqüentar os restaurantes e fazer passeios de barco. Alguns moradores ainda vivem da produção agrícola e pesqueira. Muitos têm barco e vivem da atividade de transportar passageiros, já que as pessoas que visitam a localidade, assim como os moradores, precisam do transporte lacústre, a não ser aqueles que se arriscam a chegar à localidade através de trilhas, o que é uma minoria. Alguns moradores são donos de restaurantes ou trabalham como empregados nesses restaurantes. Esses restaurantes apresentam intenso movimento durante o verão, mas no resto do ano o movimento diminui. Muitos moradores precisam se deslocar para outros bairros para trabalhar. Não há na localidade hotéis, pousadas, nem comércio. Poucos moradores alugam suas casas para veranistas, e, ainda assim, quando possuem alguma referência, pois eles deixam claro que não têm intenção alguma de mudar as características do bairro, seja em função do turismo ou por outro motivo qualquer. Eles valorizam muito a tranqüilidade que possuem sem qualquer indício de violência no lugar e parecem todos muito satisfeitos com a vida extremamente pacata que levam. Acesso à localidade: somente a pé, por trilhas, ou, de barco, pela lagoa. a.2) Ribeirão da Ilha (localidade não urbana) Origem do nome: pequeno rio que nasce no Morro da Cabeça do Macaco, na localidade. Idade do ponto: originou-se a partir de um decreto de 11/8/1809. População: 20.392 habitantes. Perfil sócio-econômico: desenvolve-se na localidade cultivo de ostras e mexilhões, tendo inclusive uma cooperativa – cooperilha. A produção é vendida para os restaurantes da localidade e para fora do estado também. Há muitos pescadores no local, 107 assim como pessoas que vivem da lida com o gado. O cultivo dos moluscos trouxe visibilidade recente à localidade, que se destaca pelos vários restaurantes freqüentados durante todo o ano por turistas e moradores da cidade. A localidade é uma praia; no entanto, por se situar dentro da baía, não apresenta apelo turístico, já que não possui nenhuma extensão de areia e o mar não parece muito convidativo para o banho. O bairro possui uma associação de moradores bastante atuante, que promove atividades e festas para os moradores, além de reivindicar melhorias para o bairro. O carnaval é uma festa marcante na localidade, assim como a festa do Divino Espírito Santo. Os moradores freqüentam a igreja do bairro e costumam participar dos festejos promovidos pela diocese. A localidade possui uma escola de ensino fundamental e médio; no entanto, muitos moradores optam por estudar no centro da cidade. A vida na localidade ainda é pacata, sem muita violência, com pouco comércio e, por isso, também com poucas possibilidades de emprego e renda para os moradores, que, na sua maioria, se deslocam para outras localidades para trabalhar. Acesso à localidade: embora seja uma reivindicação antiga da população, a estrada que dá acesso à localidade ainda é de paralelepípedos com alguns trechos de estrada de chão. Recentemente, a prefeitura inaugurou uma estrada paralela asfaltada que facilitou o acesso ao bairro. a.3) Ingleses (localidade urbana) Origem do nome: existem duas hipóteses. A primeira, de um naufrágio de uma embarcação inglesa na localidade. A segunda, mais remota, de que o primeiro ocupante da localidade teria sido um cidadão inglês. Idade do ponto: originou-se a partir de um decreto de 11/8/1831. População: 16.514 habitantes. Perfil sócio-econômico: a localidade já foi centro de pesca, hoje vive principalmente do comércio e do turismo. O bairro apresenta crescente desenvolvimento demográfico em função, principalmente, do turismo, que inicialmente era feito de forma “amadora” com aluguel de casas dos próprios moradores para veranistas na temporada de dezembro a março. No entanto, a localidade virou ponto de referência na década de 80 para argentinos e gaúchos que passaram a vir todos os anos para aproveitar os meses de verão em uma das praias mais bonitas da ilha. Hoje em dia, muitos moradores se mantêm do turismo com comércio de todo tipo, trabalhando em hotéis, lojas, bares, restaurantes e supermercados que, embora tenham um fluxo mais intenso no verão, 108 apresentam movimento durante o ano todo. Existem escolas municipais e estaduais no bairro que a cada ano apresentam mais e mais problemas para dar conta do contingente de pessoas que passam a residir no bairro. Existem bolsões de pobreza instalados na localidade, principalmente, de pessoas que vêm do interior do estado em busca de oportunidades. O crescimento, tanto populacional, como econômico da localidade, como em qualquer lugar, trouxe, por um lado, benefícios para os moradores – como acesso a vários serviços, tornando-os independentes do centro da cidade, por exemplo, por outro lado, trouxe violência para o bairro. Em função da alta densidade demográfica e da alta arrecadação que há na localidade com a atividade comercial, há, inclusive, um movimento de emancipação do bairro. Acesso à localidade: o acesso é bastante fácil com pistas duplicadas pela SC 401. a.4) Região Central de Florianópolis (localidade urbana) Origem do nome: Florianópolis recebe o nome em homenagem a Floriano Peixoto, o segundo presidente do Brasil (1891-1894) no período da República Velha. Idade do ponto: entre 1651 e 1662, iniciou-se a fundação da cidade. Em 23/3/1726, é elevada à categoria de vila. População: 228.869 habitantes Perfil sócio-econômico: definimos como região central, neste estudo, as proximidades da Universidade Federal de Santa Catarina. A atividade comercial na região é bastante intensa com shoppings, restaurantes e comércio de modo geral. Há muitas escolas públicas e particulares, além de duas universidades públicas: a federal (referida anteriormente) e a estadual. Muitos moradores do bairro não precisam se deslocar para trabalhar. Acesso à localidade: o acesso dos bairros localizados na ilha se dá pelas Avenidas Mauro Ramos, Beiramar e pela recente via expressa sul. Pelos bairros do continente o acesso é pela ponte Colombo Salles. No PE: a cidade de Lisboa revela-se bastante urbana em função, principalmente, de ser capital de um país europeu. Assim sendo, optamos por estender nossa coleta para a Grande Lisboa para que conseguíssemos selecionar informantes que apresentassem perfis não urbanos, o que seria difícil se nossas entrevistas ficassem circunscritas à região metropolitana da cidade. Apontamos, a seguir, algumas características de cada uma das localidades a serem investigadas: 109 b.1) Cascais80 (localidade não urbana) Origem do nome: vem do fato de ser uma região pesqueira, sendo comum em toda a orla amontoados de cascas de mexilhão, chamados cascais. Idade do ponto: sua fundação deu-se em 1364. População: 33.000 habitantes81. Perfil sócio-econômico: a localidade é caracterizada por ser um balneário de verão há mais de um século. Existem, ao longo de toda a orla, condomínios fechados, que servem de casas de veraneio dos ricos lisboetas, desde o século XIX. Para os nativos e moradores da região, a pesca ainda se constitui como atividade importante. Embora o município acredite que tenha incentivado a atividade na região com a criação de um novo cais e com a Doca Pesca, os pescadores têm reclamado muito, pois só podem vender o pescado para a prefeitura, ao preço estipulado, não tendo mais liberdade para o comércio do seu pescado. Aqueles que não vivem da pesca vivem das atividades ligadas ao turismo, como restaurantes, hotéis e comércio de modo geral. Há muitas pessoas que moram em Cascais, mas que trabalham em Lisboa e outras que fazem o caminho inverso, moram em Lisboa e trabalham em Cascais. Há escolas na região e serviços de modo geral, o que faz a comunidade ser bastante independente de Lisboa. Acesso à localidade: existem boas estradas de acesso, mas o uso de trem é bastante freqüente. Há saída de Lisboa a cada meia hora, mesmo tempo que leva até a localidade. b.2) Sintra (localidade não urbana) Origem do nome: partiu de um templo erguido aproximadamente 308 anos antes de Cristo, por gregos, galo-celtas e túrdulos, dedicado à lua. Os celtas chamavam lua de “cynthia” e, quando os árabes dominaram a região, passaram a denominar o local de “Chintra” ou “Zintira”. Idade do ponto: passou a fazer parte definitivamente do país após a reconquista de D. Afonso Henriques em 1154. População: 25.000 habitantes. 80 Algumas das informações foram retiradas do Guia visual Publifolha Portugal – Madeira e Açores, 5.ed., São Paulo: Divisão de Publicações do Grupo Folha, 2007. Outras informações foram retiradas do site http://pt.wikipedia.org, consultado em 03/11/2008 e outras ainda das entrevistas realizadas com os informantes para a coleta dos dados da pesquisa, bem como das impressões da pesquisadora ao longo de sua vivência nas localidades durante o trabalho de campo. 81 A vila de Cascais possui 33.000 habitantes, já o concelho, que abarca várias freguesias, possui cerca de 185.000 habitantes. 110 Perfil sócio-econômico: a localidade é considerada refúgio para os moradores da região central de Lisboa, principalmente, no verão, já que possui bosques, fontes de água fresca, bem como um micro-clima que faz com que não haja calor intenso no lugar. Sintra recebe turistas durante todo o ano por ser um lugar muito agradável e apresentar construções famosas no país, como o Palácio Nacional de Sintra, o Palácio da Pena, o Castelo dos Mouros, a Quinta da Regaleira, além de alguns museus como o Museu do Brinquedo e o Museu de Arte Moderna. Sintra possui bons restaurantes e hotéis. Embora o fluxo de turistas seja grande durante todo o ano, a vida da população residente na localidade é bastante calma. Ainda há quem viva da lida com o gado e com a agricultura nas regiões mais rurais da localidade, mas a maioria das pessoas vive do comércio da região, como lojas de produtos de artesanato, restaurantes, lanchonetes, hotéis e atendendo nos museus e palácios. Há escolas e médicos na localidade, mas a população reivindica um hospital, além de outros serviços básicos que são oferecidos na casa do cidadão, que não existem na região, e, portanto, precisa deslocar-se para Lisboa quando precisam destes serviços. Acesso à localidade: existem boas estradas de acesso, mas é muito comum o uso de trem que sai de Lisboa a cada meia hora, mesmo tempo que leva até a localidade. b.3) Belém (localidade urbana) Origem do nome: na verdade, a localidade chama-se Santa Maria de Belém, e parece ter sido assim nomeada em função da devoção do Rei Dom Manoel à Nossa Senhora de Belém. Idade do ponto: a fundação da localidade deu-se em 1833. População: 9.752 habitantes. Perfil sócio-econômico: a localidade situa-se próxima à foz do Tejo, que era de onde partiam as caravelas para as viagens dos descobrimentos. Com Dom Manoel I no poder em 1495, Belém ganha monumentos que são símbolos da localidade: o Mosteiro dos Jerônimos e a Torre de Belém. A localidade passou por um período de industrialização (entre 1819 e 1821) com unidades fabris movidas a vapor; no entanto, com o passar do tempo, as fábricas, como as de curtumes, de cordoaria, de garrafas de vidro preto, de conservas e a Gás Belém, foram fechando e Belém passou de densamente industrializado a zona de lazer e cultura. A localidade recebe muitos turistas o ano todo para visitar as construções famosas como as já citadas Torre de Belém e Mosteiro dos Jerônimos, assim como vários museus que existem na região (como o Museu de Arte 111 Popular, o Museu da Marinha, o Museu Nacional de Arqueologia e o Museu Nacional dos Coches), bem como outras construções (como o planetário Calouste Gulbenkian), jardins (como o Jardim Agrícola Tropical e o Jardim Botânico da Ajuda), monumentos (como o Padrão dos Descobrimentos), centros culturais (como o Centro Cultural de Belém) e ainda a famosa Casa dos Pastéis de Belém. A população vive basicamente do comércio que há na região; além das construções já citadas, há restaurantes e casas de artesanato, além de escolas e bancos. O bairro tem sido cada vez mais valorizado e, por isso, as casas têm ficado cada vez mais caras, o que tem obrigado muitas pessoas nativas da localidade a irem procurar casas em locais mais afastados. Acesso à localidade: existem boas estradas de acesso, mas, diferentemente da maioria dos bairros de Lisboa, não há acesso de metrô para a localidade, apenas ônibus ou elétrico fazem o trajeto. b.4) Região Central de Lisboa (localidade urbana) Origem do nome: o nome Lisboa parece ter se originado de uma expressão na língua fenícia – Alis-Ubbo – que significava enseada amena. Idade do ponto: a fundação da cidade deu-se por Dom Afonso Henriques em 1179 e passou a ser capital de Portugal em 1256. População: 550.000 habitantes82 Perfil sócio-econômico: delimitamos, como região central para o nosso estudo, a zona comercial da cidade entre a praça Marquês de Pombal, a praça Saldanha e a Universidade de Lisboa. Há muitos centros comerciais na região, bancos, escolas, hotéis, restaurantes e serviços de modo geral. O movimento é intenso durante todo o ano. Acesso à localidade: o acesso à região central tem se tornado um problema cada vez maior para os lisboetas que transitam de carro, pois há muitos carros na cidade e poucos lugares para estacionar. É comum o uso de metrô e ônibus por boa parte da população, já que esses meios de transporte possuem boa estrutura. A nossa expectativa em relação às localidades a serem investigadas é de que suas características, em termos da idade do ponto, da densidade demográfica, bem como das características sociais, históricas e econômicas, interfiram nas escolhas lingüísticas 82 A densidade demográfica refere-se à cidade de Lisboa, considerando-se todos os seus bairros. Para a área circunscrita, região central, não obtivemos o dado preciso da densidade demográfica. 112 dos falantes nativos. Pretendemos mapear o fenômeno da concordância verbal em cada um dos pontos selecionados para verificarmos a atuação deste fator. 2.6.3.2.2 Diazonalidade Em cada um dos quatro pontos de coleta de dados no PB e no PE, foram realizadas duas entrevistas na zona urbana e duas na zona não urbana. Decidimos investigar, além da dimensão diatópica, também a dimensão diazonal por acreditarmos que esse fator poderia apontar evidências interessantes na variação da concordância verbal. Embora para algumas pessoas classificar bairros de Florianópolis como não urbanos pareça um equívoco, e um equívoco ainda maior classificar bairros de Lisboa como não urbanos, haja vista a alta mobilidade da população e a atividade agropecuária não se mostrar tão significativa, características comumente atribuídas a comunidades menos urbanas, caracterizamos as localidades não urbanas como aquelas que, comparativamente às consideradas urbanas, apresentam menor mobilidade, vivendo a população mais isolada e menos sujeita à influência externa e, por isso, consideradas mais conservadoras. No entanto, como os padrões da zona urbana apresentam mais prestígio social, por serem considerados mais avançados, modernos e desenvolvidos, esperamos que os informantes das localidades classificadas como urbanas apresentem maior probabilidade de uso da concordância verbal, variante mais prestigiada, enquanto os informantes das localidades classificadas como não urbanas, apresentem menor probabilidade de uso de marcas de concordância verbal. Fazemos menção aqui também para justificar a caracterização urbano/não urbano ao contínuo de urbanização traçado por Bortoni (2004). Segundo a autora, “em um dos pólos do contínuo, estão as variedades rurais usadas pelas comunidades geograficamente mais isoladas. No pólo oposto, estão as variedades urbanas que receberam a maior influência dos processos de padronização da língua [...]” (op. cit., p.52). Como em nossa amostra não temos comunidades totalmente isoladas, preferimos denominar, ao invés de comunidades rurais, comunidades não urbanas, as quais acreditamos estarem, no contínuo sugerido por Bortoni, em contraste com as comunidades rurais, mais próximas das comunidades urbanas. 113 2.7 Síntese Neste capítulo evidenciamos os pressupostos da Teoria da Variação e Mudança Lingüística e da Dialetologia Pluridimensional, abordagem teórico-metodológica do nosso estudo. Evidenciamos, também, os corpora que serão analisados, o programa estatístico que será utilizado, delimitamos a variável dependente da nossa pesquisa e, ainda, caracterizamos e levantamos as hipóteses relativas aos grupos de fatores. Em seguida, traçamos o perfil sócio-histórico das comunidades de fala a serem investigadas nesta tese e, por fim, indicamos os contextos de restrição do fenômeno em estudo. A seguir, analisamos e discutimos os resultados da nossa análise sincrônica do PB e do PE. 114 Capítulo III – ANÁLISE E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Neste capítulo, evidenciamos os resultados obtidos na análise dos dados sincrônicos do PB e do PE. Inicialmente, salientamos os grupos de fatores selecionados pelo Programa Goldvarb (2001) para os resultados do PB e apresentamos aqueles que não foram selecionados pelo pacote estatístico. Os grupos de fatores que foram selecionados pelo Goldvarb mostraram-se relevantes quando da verificação dos condicionamentos a que a concordância verbal de terceira pessoa do plural está submetida. Apresentamos também a análise e discussão dos resultados referentes às variáveis lingüísticas, sociais e geográficas do PB levando em conta a caracterização feita e as hipóteses levantadas para as variáveis no capítulo II. Em seguida, ressaltamos os resultados obtidos na análise dos dados sincrônicos do PE evidenciando os grupos de fatores selecionados pelo Programa Goldvarb (2001) e também apresentando aqueles que não foram selecionados. Assim como na análise do PB, levamos em conta a caracterização das variáveis lingüísticas, sociais e geográficas, feita no capítulo II, bem como as hipóteses delineadas para cada uma delas neste mesmo capítulo. Apresentamos, ainda, a análise e a discussão dos resultados para cada grupo de fatores considerado na análise do PE. 3.1 Análise e discussão dos resultados sincrônicos do PB Conforme salientado na seção 2.4 do Capítulo II, foram analisados todos os dados de construções que apresentavam variação na concordância verbal de terceira pessoa, extraídos de cada uma das dezesseis entrevistas que constituem nossa amostra do PB. A partir dessa amostra, obtivemos um total de 794 dados de variação na concordância verbal (CV), com 640 dados apresentando marcas de plural nos verbos, correspondendo a 80,6% da amostra, e 154 dados, 19,4% do total, com marcas zero de plural nos verbos, como mostra o gráfico 3.1, a seguir. 115 Concordância 80,6% Não concordância 19,4% Gráfico 3.1: Distribuição geral dos dados do PB Em relação ao mapeamento da variação na concordância encontrada em cada uma das localidades do PB investigadas, podemos observar o mapa 3.1 a seguir que traz os resultados da freqüência de uso da CV na fala de cada informante que faz parte da amostra investigada. Mapa 3.1: Distribuição da marcação da concordância verbal no PB83 83 Os mapas 3.1 e 3.2 foram adaptados do Google Earth (acesso em fevereiro de 2009). 116 3.1.1 Variáveis lingüísticas Dentre as variáveis lingüísticas controladas, as seguintes foram selecionadas de acordo com a ordem de relevância estabelecida pelo Programa Goldvarb (2001)84: saliência fônica, paralelismo formal, posição do sujeito em relação ao verbo e traço humano no sujeito. As variáveis tipo de verbo e tipo de sujeito não foram selecionadas85. Vamos agora aos resultados e à discussão das variáveis lingüísticas. 3.1.1.1 Saliência Fônica O grupo de fatores saliência fônica foi o que se mostrou mais relevante na análise probabilística realizada, sendo o primeiro a ser selecionado pelo Programa Goldvarb. Nossos resultados vêm corroborar os resultados de outros estudos que haviam controlado esse grupo de fatores no PB (LEMLE e NARO, 1977; RODRIGUES, 1987; SCHERRE e NARO, 1997; MONGUILHOTT, 2001; SILVA, 2003; PEREIRA, 2004; CARDOSO, 2005) com a oposição acentuada favorecendo a presença de marcas explícitas de plural nos verbos, contrário à oposição não-acentuada, com maiores probabilidades de marcas zero de concordância, como podemos observar na tabela 3.1 a seguir. 84 Considerando todas as variáveis controladas, o Programa Goldvarb (2001) estabeleceu a seguinte ordem de relevância: saliência fônica, paralelismo formal, posição do sujeito em relação ao verbo, idade/escolaridade, traço humano do sujeito e diatopia. A variável social idade/escolaridade e a variável geográfica diatopia que foram selecionadas serão discutidas posteriormente. 85 Fizemos rodadas separadas com informantes da zona não urbana e informantes da zona urbana para confirmar os resultados que discutimos ao longo desta seção que consideraram todos os informantes do PB. Na rodada só com informantes da zona não urbana, o Programa Goldvarb (2001) selecionou os seguintes grupos de fatores, por ordem de relevância: saliência fônica, posição do sujeito em relação ao verbo, idade/escolaridade, traço humano no sujeito, tipo de sujeito e diatopia. Já na rodada com informantes da zona urbana, os seguintes grupos de fatores foram selecionados, por ordem de relevância: saliência fônica, posição do sujeito em relação ao verbo, idade/escolaridade, diatopia, traço humano no sujeito e paralelismo formal. 117 Nível 1: Oposição não-acentuada a. não envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural c. envolve acréscimo de segmentos na forma plural Nível 2: Oposição acentuada a. envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural c. envolve acréscimos de segmentos e mudanças diversas na forma plural Total Apl/Total86 19/89 % 21% PR87 .04 274/324 84% .50 48/51 94% .74 Apl/Total 73/87 % 83% PR .48 64/68 94% .74 162/175 92% .69 640/794 80% Tabela 3.1: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável saliência fônica Verificamos, a partir dos resultados apontados na tabela 3.1, que os fatores pertencentes ao nível 1, oposição não-acentuada apresentaram uma escala hierárquica crescente de acordo com o aumento do grau de saliência perceptível. Na categoria a temos 21% de marcação da CV e .04 de peso relativo, na categoria b 84% e .50 e na c 94% e .74 de peso relativo. No nível 2, a hierarquia não obedeceu a mesma ordem do nível 1, tendo uma pequena alteração entre as categorias b e c. A categoria a apresentou 83% de marcação da CV e .48 de peso relativo, a categoria b 94% e .74 e a c 92% de marcação e .69 de peso relativo. É inegável que o nível 2, nos resultados gerais, apresenta maior probabilidade de aplicação da regra de concordância verbal em relação ao nível 1, como a tabela 3.2 a seguir confirma, feita a partir de uma rodada em que os fatores do nível 1 estão amalgamados, assim como os fatores do nível 2. 86 A aplicação da regra refere-se às marcas explícitas de concordância no verbo, pois estas marcas sobressaíram-se em relação às marcas zero. Dos 794 dados coletados do PB, 640 apresentaram marcas explícitas de concordância. Os 640 dados com concordância correspondem a 80,6% do total, como evidenciamos no gráfico 3.1; no entanto, em todas as tabelas aparece 80% de aplicação da CV no total dos dados, pois foi esse o percentual fornecido pelo Programa Goldvarb que parece não aplicar a regra de arredondamento decimal. 87 PR significa peso relativo. 118 Saliência Fônica Nível 1: Oposição não-acentuada Nível 2: Oposição acentuada Total Apl/Total 341/464 299/330 % 73% 90% 640/794 80% PR .35 .70 Tabela 3.2: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 No entanto, valem algumas observações. A categoria c do nível 1 apresentou freqüência e peso relativo maior do que as categorias a e c do nível 2, ficando idêntica à categoria b do nível 2, o que parece indicar que as formas encontradas naquele nível sejam mais perceptíveis do que Naro (1981) estabelece. Aplicamos inclusive um pequeno teste de avaliação entre 13 colegas do curso de pós-graduação em Lingüística da Universidade Federal de Santa Catarina, em anexo (quadro 3.1), durante a disciplina de Sociolingüística (2008/2), com o objetivo de avaliarmos o nível de saliência entre pares do nível 1c e do nível 2a. De acordo com o teste, dos cinco pares de frases avaliados, pertencentes ao nível 1c e 2a, 63% dos colegas julgaram mais salientes as frases do nível 1c e 32% julgaram como mais salientes as frases do nível 2a. Embora seja um teste feito com poucas pessoas, com poucos pares de frases também, talvez aponte para um questionamento da escala da saliência utilizada que possivelmente possa variar de acordo com a comunidade de fala investigada. Outro resultado que gostaríamos de salientar é a inversão ocorrida entre a categoria b e a categoria c do nível 2, apontada anteriormente. Estudos realizados com falantes da zona rural, Rodrigues (1987) e Pereira (2004), apresentam resultados que evidenciam que a categoria c do nível 2 considerada com pares como é/são mostram menos concordância do que categorias anteriores, assim como ocorreu com nossos resultados, mesmo que em proporção menor, no caso do nosso estudo. Podemos observar esses resultados na tabela 3.3 a seguir. 119 Saliência Fônica Nossos resultados Rodrigues88 (1987) A/T=% PR Pereira (2004) Cardoso (2005) A/T=% A/T=% A/T=% PR PR PR Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a 19/89=21% 274/324=84% 49/51=94% 73/87=83% .04 .50 .74 .48 637/679=94% 70/86=81% 91/182=50% 107/254=42% .93 .77 .35 .34 32/290=11% 2/15=13% 14/43=33% 58/116=50% .24 .30 .79 .89 5/32=15% 63/193=32% 15/39=38% 37/51=72% Nível 2b 64/68=94% .74 22/72=31% .26 18/35=51% .87 14/22=63% .77 Nível 2c 162/175=92% .69 31/83=37% .20 1/21=5% .16 130/170=76%.83 .08 .22 .23 .76 TOTAL 640/794=80% 958/1356=71% 125/520=24% 264/507= 52% Tabela 3.3: Resultados de diferentes estudos sobre a CV de terceira pessoa do plural no PB em comparação com nossos resultados do PB, segundo a variável saliência fônica Nossos resultados referentes à zona não urbana, como mostra o gráfico 3.289, a seguir, evidenciam que a inversão que há entre o nível 2b e 2c é justamente na zona não urbana (91% e 89%), já que na zona urbana o nível 2 apresenta o mesmo percentual de marcação da CV nos níveis b e c (97%). Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c Saliência Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.2: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade Voltando à tabela 3.3, podemos observar, ainda, que os resultados de Cardoso (2005) mostram uma inversão em termos percentuais, também no nível 2, mas entre as categorias b e c. O que queremos evidenciar com estes resultados é que nem sempre a 88 Rodrigues (1987) e Pereira (2004) categorizaram seus dados seguindo uma escala de saliência um pouco diferente da sugerida por Naro (1981) e seguida pelos outros estudos citados nesta tabela. O primeiro nível de saliência refere-se a pares como come/comem, fala/falam, o segundo aos pares faz/fazem, o terceiro a dá/dão, o quarto a falou/falaram, o quinto a veio/vieram, fez/fizeram e o último a é/são. Vale ressaltar ainda que, no estudo de Rodrigues (1987) as freqüências e probabilidades referem-se a não-aplicação da regra de concordância verbal, diferentemente de todos os outros estudos considerados na tabela. 89 Os gráficos de 3.2 a 3.18 e 3.20 a 3.34 que constam desse capítulo apresentam tabelas correspondentes em anexo, para que se possam observar a aplicação/total dos dados a que se referem suas freqüências. 120 escala hierárquica pretendida e alcançada por Naro (1981) ocorre em todas as amostras de fala. Fizemos também um cruzamento entre a variável saliência fônica e a escolaridade, para verificarmos se havia influência dos anos de escolarização dos falantes na nitidez da escala da saliência, como comprovado em Scherre e Naro (1997). 100% Percentual 80% 60% 40% 20% 0% Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c Saliência Ensino fundamental Ensino superior Gráfico 3.3: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade De fato, o gráfico 3.3 comprova que a escala da saliência é mais nítida nos dados dos falantes com menos anos de escolarização, no caso do nosso estudo, informantes com ensino fundamental. Esses resultados corroboram os resultados de Scherre e Naro (1997), que controlaram falantes com escolaridade correspondente a 1 a 4 anos, 5 a 8 anos e 9 a 11 anos, evidenciando que para os falantes de 1 a 4 anos a escala é mais nítida, assim como no estudo de Naro (1981), que apresenta uma escala bastante nítida para falantes analfabetos. Observamos a tabela 3.4 a seguir, que expõe os resultados do nosso estudo em comparação aos dos autores. 121 Saliência Fônica Nossos resultados Nossos resultados Resultados de Scherre e Naro (1997) 1-4 anos de escolaridade 58/192=30% 393/725=54% Resultados de Scherre e Naro (1997) 9-11 anos de escolaridade 67/129=52% 300/389=77% Resultados de Naro (1981) Nível 1a Nível 1b Ensino Fundamental 1/43=2% 101/142=71% Ensino Superior 18/46=39% 173/182=95% Nível 1c 20/23=87% 28/28=100% 64/110=58% 55/67=82% 99/273=36% Nível 2a 29/37=76% 45/50=90% 161/227=71% 188/201=94% 604/927=65% Nível 2b 23/27=85% 41/41=100% 63/81=78% 41/47=87% 266/365=73% Nível 2c 70/75=93% 92/100=92% 386/452=85% 235/260=90% 1160/1450=80% TOTAL 243/347=70% 397/447=89% 1125/1787=63% 886/1093=81% 3002/6310=48% Analfabetos 110/755=15% 763/2540=30% Tabela 3.4: Comparação entre os resultados deste estudo com dados do PB, os de Scherre e Naro (1997) e Naro (1981), para a freqüência de CV no cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade Nossos resultados para a variável saliência fônica parecem confirmar a hipótese difusionista, discutida na subseção 2.6.2.1 do capítulo II, já que houve uma queda mais acentuada nos contextos menos salientes e só depois os contextos mais salientes foram sendo atingidos, o que parece indicar uma mudança lexicalmente gradual, em que os itens menos salientes (nível 1) vão sendo atingidos primeiro, seguidos dos itens mais salientes (nível 2). 3.1.1.2 Paralelismo Formal O paralelismo formal, no nível clausal, mostrou-se bastante significativo na análise do Programa Goldvarb, sendo o segundo grupo selecionado. Os resultados confirmam parcialmente nossas hipóteses. Como podemos observar na tabela 3.5, a marcação da concordância foi maior para os fatores presença da forma de plural explícita no último elemento (86% de freqüência e .60 de peso relativo) e sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita (87% de freqüência e .66 de peso relativo). Tais resultados confirmam resultados de outros estudos com diferentes amostras do PB (SCHERRE e NARO, 1993; MONGUILHOTT, 2001; SILVA, 2003; PEREIRA, 2004; CARDOSO, 2005). 122 Paralelismo Formal Presença da forma de plural explícita no último elemento Presença de numeral no último elemento Presença da forma zero de plural no último elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita Sujeito nulo com anafórico com presença de numeral terminado em /s/ no último elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de zero plural Total Apl/Total 418/483 % 86% PR .60 20/33 52/100 60% 52% .13 .10 128/148 87% .66 4/5 80% .58 17/25 68% .29 640/794 80% Tabela 3.5: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável paralelismo formal Nossas expectativas também se confirmaram em relação aos fatores presença da forma zero de plural no último elemento e sujeito nulo com anafórico com presença da forma de zero plural, já que ambos os fatores tenderam à menor marcação da CV, com resultados de 52% de freqüência e .10 de peso relativo e 68% de freqüência e .29 de peso relativo, respectivamente. Quanto aos fatores presença de numeral terminado em /s/ e não terminado em /s/ no último elemento, os resultados foram amalgamados em função de seus índices de freqüência, bem como de seu comportamento, mostrarem-se uniformes quando da presença de outros fatores90. Para esse grupo de fatores, nossas expectativas não se confirmaram, pois esperávamos maior marcação da CV. Nossos resultados apontam para uma marcação próxima da marcação do fator presença da forma zero de plural no último elemento, com 60% de freqüência e .13 de peso relativo. Já em relação ao sujeito nulo com anafórico com presença de numeral terminado em /s/ no último elemento, nossa hipótese se confirmou, já que os resultados apontam esse fator como favorecedor da marcação da CV com 80% de freqüência e .58 de peso relativo. Para o fator sujeito nulo com presença de numeral não terminado em /s/, não obtivemos dados. Embora os resultados em relação ao fator presença de numeral no último elemento não tenham confirmado nossa hipótese, os resultados gerais obtidos para esta amostra do PB vêm confirmar o princípio do paralelismo de “formas gramaticais 90 Na rodada sem amálgama dos fatores, obtivemos os seguintes resultados: presença de numeral terminado em /s/ no último elemento – 18/28 = 64% e .14 de peso relativo; presença de numeral não terminado em /s/ no último elemento – 2/5 = 40% e .06 de peso relativo. 123 particulares ocorrerem juntas” (SCHERRE, 1998, p.42). Acreditamos que esta repetição apresenta caráter mecânico; como Scherre (op. cit., p.49) aponta, diversos estudos variacionistas que controlaram o paralelismo (WEINER e LABOV, 1981; BRAGA, 1986; SCHIFFRIN, 1981; TANNEN, 1998) “concluíram que pode haver a repetição meramente mecânica”. Os resultados gerais confirmam a hipótese neogramática, discutida na subseção 2.5.1.1 do capítulo II, que prevê um princípio mecânico agindo sobre esse grupo de fatores fazendo com que a queda nas marcas de plural nos elementos anteriores influencie na queda da marcação de plural nos verbos. Observa-se queda regular das marcas de plural em todos os verbos que vêm precedidos de um zero fonético anterior, e, ao contrário, manutenção regular do plural para os verbos que vêm precedidos de marcas de plural. No gráfico 3.4, a seguir, observam-se os resultados percentuais do cruzamento entre o grupo de fatores paralelismo formal e diazonalidade. Os resultados apontam para menor freqüência de CV em todos os fatores analisados na zona não urbana. 100% Percentual 90% 80% 70% 60% 50% 40% Presença da Presença de Presença da Sujeito nulo Sujeito nulo Sujeito nulo forma de numeral no forma zero de com anafórico com anafórico com anafórico plural explícita último plural no com presença com presença com presença no último elemento último da forma de de numeral da forma de elemento elemento plural explícita terminado em zero plural /s/ no último elemento Paralelismo Formal Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.4: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade 3.1.1.3 Posição do sujeito em relação ao verbo A posição do sujeito em relação ao verbo foi o terceiro grupo de fatores selecionado pelo Goldvarb. Podemos observar, através da tabela 3.6, que a probabilidade de aplicação da regra de concordância foi maior quando o sujeito estava anteposto ao verbo, com 84% de freqüência e .57 de peso relativo, distanciando-se significativamente da posposição do sujeito, com 34% de freqüência e .08 de peso 124 relativo, confirmando, dessa forma, nossa hipótese e corroborando resultados de alguns estudos do PB (LEMLE e NARO, 1977; PONTES, 1986; RODRIGUES, 1987; BERLINCK, 1988; SCHERRE e NARO, 1997; MONGUILHOTT, 2001; SILVA, 2003; CARDOSO, 2005). Posição SN anteposto SN posposto Total Apl/Total 464/546 23/67 487/61391 % 84% 34% 79% PR .57 .08 Tabela 3.6: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável posição do sujeito em relação ao verbo Nossos resultados indicam, conforme apontam alguns estudos, que o sujeito quando posposto ao verbo passa a ser encarado como objeto pelo falante que não aplica a regra de concordância, já que não o considera sujeito da sentença. Para confirmar os resultados apontados em Lemle e Naro (1977) e Scherre e Naro (1997) de que a não marcação da concordância verbal com sujeito posposto independe da escolaridade dos informantes, fizemos um cruzamento entre as variáveis posição e escolaridade e podemos observar os resultados percentuais no gráfico 3.5, a seguir. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Ensino fundamental Ensino superior Escolaridade SN anteposto SN posposto Gráfico 3.5: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e idade/escolaridade Nossos resultados indicam que a freqüência de marcação da CV cai consideravelmente quando o sujeito está posposto ao verbo, independentemente da escolaridade do informante. Para os informantes com ensino fundamental, temos um percentual de 50% de queda e para os informantes com ensino superior um percentual 91 Vale observar que, para esse grupo de fatores, temos um total de 613 dados, pois os dados de sujeito nulo não puderam ser considerados. 125 de 47% de queda da marcação da concordância com sujeito posposto em relação ao sujeito anteposto. Na relação entre posição do sujeito e diazonalidade, observamos, no gráfico 3.6, que na zona não urbana a freqüência de não CV é maior tanto para o fator SN anteposto, quanto para o fator SN posposto; no entanto, se verificarmos a diferença nas taxas de freqüência, notamos que para o fator SN posposto essa diferença é mais acentuada, 8% menos CV na zona não urbana, enquanto no fator SN anteposto a diferença é menor, 5% menos CV na zona não urbana. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Zona não-urbana Zona urbana Diazonalidade SN anteposto SN posposto Gráfico 3.6: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade 3.1.1.4 Traço humano no sujeito O grupo de fatores traço humano no sujeito foi selecionado como estatisticamente relevante em quinto lugar. Confirmando nossa hipótese e também resultados de pesquisas com amostras do PB (SCHERRE e NARO, 1998; MONGUILHOTT, 2001; SILVA, 2003; PEREIRA, 2004; CARDOSO, 2005), quando a sentença possuía um SN [+humano] a probabilidade à concordância verbal foi maior (83% de freqüência e .56 de peso relativo) do que em sentenças com SNs [-humanos] (55% de freqüência e .12 de peso relativo), como mostram os resultados na tabela 3.7. Traço humano no sujeito SN [+humano] SN [-humano] Total Apl/Total 588/701 52/93 640/794 % 83% 55% 80% PR .56 .12 Tabela 3.7: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável traço humano no sujeito 126 Para verificarmos a correlação entre o grupo de fatores traço humano no sujeito e posição do sujeito em relação ao verbo, grupo de fatores discutido anteriormente, observemos os resultados no gráfico 3.7. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% SN anteposto SN posposto Posição do sujeito em relação ao verbo SN [+humano] SN [-humano] Gráfico 3.7: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e posição do sujeito em relação ao verbo Podemos verificar que, de um lado, o SN posposto [- humano] é o ambiente que se mostra menos favorecedor de marcas de CV, com 29% de freqüência, de outro lado, o SN anteposto [+ humano] é o ambiente em que temos a maior freqüência de CV com 87% de marcação. No gráfico 3.8, a seguir, verificamos que a freqüência de CV para o fator SN [humano] apresenta queda considerável na fala dos informantes da zona não-urbana comparando-se à fala dos informantes da zona urbana (74% para a zona urbana e 44% para a zona não urbana), diferentemente do fator SN [+ humano] em que a queda é bem menor (86% para a zona urbana e 82% para a zona não urbana). Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Zona não-urbana Zona urbana Diazonalidade SN [+humano] SN [-humano] Gráfico 3.8: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade 127 3.1.1.5 Tipo de verbo Esse grupo de fatores não foi selecionado como estatisticamente relevante, nas rodadas gerais. No entanto, como acreditávamos que poderia haver sobreposição entre os grupos de fatores posição do sujeito em relação ao verbo, traço humano no sujeito e tipo de verbo, dada a relação existente entre eles, fizemos uma rodada sem esses outros grupos de fatores. Nessa rodada, o tipo de verbo foi selecionado em quinto lugar92 e é a partir desses resultados que apresentaremos os resultados gerais para este grupo de fatores. Na tabela 3.8, a seguir, podemos observar os resultados para o tipo de verbo. Confirmando nossas expectativas, o verbo inacusativo foi o ambiente que se mostrou menos favorecedor da marcação da concordância verbal, com 73% e 77% de freqüência e .30 e .27 de peso relativo, considerando-se os inacusativos não-prototípicos e prototípicos, diferentemente dos demais tipos de verbos que se mostraram favorecedores da marcação da CV. Nossos resultados confirmam resultados de outros estudos do PB que controlaram o grupo de fatores tipo de verbo levando em consideração os inacusativos (MONGUILHOTT, 2001; SILVA, 2003; CARDOSO, 2005; SCHERRE, NARO e CARDOSO, 2007). Embora em algumas pesquisas o grupo de fatores não seja considerado estatisticamente relevante, os percentuais sempre apontam para certa tendência à não marcação da concordância nos inacusativos. Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Apl/Total 303/363 70/85 17/21 80/96 21/27 149/202 % 83% 82% 80% 83% 77% 73% Total 640/794 80% PR .62 .58 .74 .38 .27 .30 Tabela 3.8: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável tipo de verbo Nos gráficos a seguir, evidenciamos a forte relação que há entre os verbos inacusativos, a posposição do sujeito e o traço [- humano] do sujeito. No gráfico 3.9, a seguir, nota-se que todos os verbos com sujeito posposto apresentam freqüências muito 92 Os outros grupos de fatores selecionados nesta rodada, de acordo com a ordem de relevância estabelecida pelo Programa Goldvarb (2001): saliência fônica, paralelismo formal, idade/escolaridade, diatopia, tipo de verbo e tipo de sujeito. 128 menores comparadas às freqüências de sujeito anteposto, indicando o desfavorecimento da marcação da CV. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo nãoprototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo nãoprototípico Tipo de verbo SN anteposto SN posposto Gráfico 3.9: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo No gráfico 3.10, os resultados revelam também que é no verbo inacusativo nãoprototípico com sujeito com traço [- humano] que se encontra a menor freqüência de concordância verbal. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo nãoprototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo nãoprototípico Tipo de verbo SN [+ humano] SN [- humano] Gráfico 3.10: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito Comparando-se os resultados do cruzamento entre o grupo de fatores tipo de verbo e diazonalidade, observamos que há menor freqüência de uso da CV para o tipo de verbo inacusativo não-prototípico na zona não urbana. 129 Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo nãoprototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo nãoprototípico Tipo de verbo Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.11: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade 3.1.1.6 Tipo de sujeito Embora o grupo de fatores tipo de sujeito não tenha sido selecionado como estatisticamente relevante, vale salientar os resultados em termos percentuais. Em nossa análise, confirmando nossas expectativas, o sujeito pronome pessoal teve o maior percentual de marcação da CV, 89%, seguido pelo sujeito nulo, 84%. O sujeito pronome indefinido amalgamado ao quantificador também teve freqüência de marcação da CV alta com 82%, o que não esperávamos, em função da nossa hipótese de que ocorreriam mais à direita do verbo desfavorecendo as marcas de CV. Os fatores foram amalgamados em função dos resultados (83% de CV para os indefinidos e 80% para o quantificador). O SN + pronome relativo (que) apresentou percentual um pouco menor (75%) de concordância, mas ainda assim alto, o que confirmou nossa expectativa. Os sujeitos pleno simples, pleno nu e pleno composto foram os que menos preservaram as marcas de CV, com 72%, 61% e 44% de marcação, respectivamente, confirmando nossas expectativas para estes fatores. Podemos observar estes resultados na tabela 3.9, a seguir. Tipo de sujeito Sujeito pronome pessoal Sujeito nulo Sujeito pronome indefinido + quantificador SN + pronome relativo (que) Sujeito pleno simples Sujeito pleno nu SN pleno composto Apl/Total 224/251 151/179 28/34 % 89% 84% 82% 67/89 158/219 8/13 4/9 75% 72% 61% 44% Total 640/794 80% Tabela 3.9: Freqüência de CV no PB, segundo a variável tipo de sujeito 130 Mesmo que os resultados não tenham confirmado totalmente nossas expectativas em termos da marcação da CV, podemos observar, no gráfico 3.12, abaixo, que os resultados confirmam nossas hipóteses, baseadas em Zilles (2000), no que se refere aos percentuais de posposição relacionados aos tipos de sujeito da nossa amostra. Os sujeitos pronome indefinido + quantificador, plenos (simples, composto e nu) são os que apresentam os maiores percentuais de posposição do sujeito com 17%, 20%, 44% e 61%, respectivamente. Já os sujeitos pronome pessoal e SN + pronome relativo (que) são os que apresentam menores freqüências de posposição com 0% e 3%, respectivamente. 61% Tipo de sujeito Sujeito pleno nu SN pleno composto 44% Sujeito pleno simples 20% 17% Sujeito pronome indefinido + quantificador SN + pronome relativo (que) Sujeito pronome pessoal 3% 0% Percentual Gráfico 3.12: Freqüência de posposição do sujeito no PB, segundo a variável tipo de sujeito Observando o gráfico 3.13, a seguir, no qual se expõem os resultados para o cruzamento entre o tipo de sujeito e a diazonalidade, percebemos que a CV é maior na zona não urbana nos fatores pronome pessoal e pleno nu, contrariamente aos demais fatores em que a CV é maior na zona urbana. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Sujeito pronome pessoal Sujeito nulo Sujeito SN + pronome Sujeito pleno pronome relativo (que) simples indefinido + quantificador Sujeito pleno nu SN pleno composto Tipo de sujeito Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.13: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade 131 3.1.2 Variáveis sociais Dentre as variáveis sociais controladas, sexo, idade/escolaridade e redes sociais (mobilidade e localismo), somente a variável idade/escolaridade foi selecionada como estatisticamente relevante pelo Programa Goldvarb (2001). A variável foi selecionada em quarto lugar. Vamos agora aos resultados e à discussão das variáveis sociais. 3.1.2.1 Idade/escolaridade Os resultados mostram que, tanto no nível superior, quanto no nível fundamental, os mais jovens tendem a preservar as marcas de CV (89% de freqüência e .74 de peso relativo para os jovens com ensino superior, 72% de freqüência e .32 de peso relativo para os jovens com fundamental) do que os mais velhos (88% de freqüência e .52 de peso relativo para os velhos com ensino superior, 67% de freqüência e .28 de peso relativo para os velhos com fundamental), como podemos verificar na tabela 3.10, a seguir. Idade/escolaridade Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Apl/Total 225/252 172/195 115/158 128/189 % 89% 88% 72% 67% Total 640/794 80% PR .74 .52 .32 .28 Tabela 3.10: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável idade/escolaridade Os resultados apontam, ainda, que os informantes mais escolarizados, independentemente da idade, preservam as marcas de concordância verbal, correspondendo, desta forma, aos resultados de outros estudos que controlaram a escolaridade em amostras do PB (SCHERRE e NARO, 1997; MONGUILHOTT, 2001). O cruzamento entre os grupos de fatores idade/escolaridade e diazonalidade indica que os jovens com ensino fundamental preservam mais a CV do que os velhos com ensino fundamental, tanto na zona urbana, quanto na zona não urbana. Observamos 132 freqüência de 79% de marcas para os jovens da zona urbana, contra 75% para os mais velhos, e 65% de marcas para os jovens da zona não urbana, contra 59% para os mais velhos. Já no ensino superior, os mais jovens preservam mais a CV na zona urbana, 97% de marcação da CV, contra 89% para os mais velhos da zona urbana, e na zona não urbana há pequena inversão com 87% de CV para os mais velhos e 86% para os mais jovens. O gráfico 3.14 evidencia os resultados: 100% Percentual 80% 60% 40% 20% 0% Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Idade / Escolaridade Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.14: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade No que se refere à idade relacionada à zona não urbana, observamos que nossos resultados indicam tendências que outros estudos com amostras do PB não urbano já apontaram, embora em nenhum deles a idade tenha sido controlada em correlação à escolaridade. De um lado, os jovens menos escolarizados usam mais marcas de concordância verbal, como os resultados do estudo de Silva (2003) com amostras de comunidades rurais do interior da Bahia, também atestaram. Por outro lado, os velhos menos escolarizados usam mais marcas de concordância nos verbos, como a investigação de Rodrigues (1987), com a fala de moradores de favelas de São Paulo, apontou. 3.1.2.2 Sexo Como evidenciamos anteriormente, o grupo de fatores sexo não foi selecionado pelo Programa Goldvarb; por isso, apontaremos os resultados apenas em termos percentuais. Podemos observar nos resultados da tabela 3.11, a seguir, que as nossas expectativas se confirmaram, já que as mulheres preservaram mais as marcas de CV (85%) do que os homens (72%), o que parece estar indicando que as mulheres estão mais atentas às regras estabelecidas, sejam elas sociais ou lingüísticas. 133 De acordo com Vazzata-Dias (2000, p.214), isto se deve, entre outras coisas, “ao maior formalismo associado aos papéis femininos, por exemplo, a sua responsabilidade na educação dos filhos”. Sexo Masculino Feminino Total Apl/Total 237/325 403/469 640/794 % 72% 85% 80% Tabela 3.11: Freqüência de CV no PB, segundo a variável sexo Nossos resultados confirmam resultados de outras pesquisas com amostras do PB que indicam as mulheres como favorecedoras da manutenção de marcas da concordância nos verbos (SCHERRE e NARO, 1997; MONGUILHOTT, 2001). Os resultados do gráfico 3.15, a seguir, apontam que as mulheres e os homens da zona urbana apresentam a mesma freqüência de uso da CV; no entanto, na zona não urbana, observamos que as mulheres tendem a usar mais marcas de CV do que os homens. Diferentemente dos nossos resultados, Silva (2003), ao investigar comunidades rurais do interior da Bahia, verificou uma tendência à marcação da concordância verbal na fala dos homens. 100% Percentual 90% 80% 70% 60% 50% 40% Masculino Feminino Sexo Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.15: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade 3.1.2.3 Redes Sociais Analisamos inicialmente as redes em termos da densidade e da plexidade. Nestes termos, não há como quantificá-las; por isso, apresentamos os resultados em termos qualitativos. Em seguida, apresentamos os resultados referentes ao localismo e à mobilidade. 134 Para a análise da densidade e da plexidade, levamos em conta as relações entre os informantes caracterizadas como de primeiro, segundo e terceiro graus, baseadas no quadro a seguir, retirado de Batistti et al. (2007, p.19): Quadro 3.2: Critérios para estabelecer os graus de relação em rede 1. Primeiro Grau ___________ 1A Marido/mulher 1B Pais/filhos 1C Colegas de trabalho com interação 2. Segundo Grau ----------------2A Tios/sobrinhos/primos/cunhados 2B Amigos íntimos 2C Vizinho íntimo 2D Colega de associação com interação 3. Terceiro Grau ......................... 3A Amigo não-íntimo 3B Vizinho não íntimo 3C Colega de trabalho sem interação93 3D Colega de associação sem interação Podemos observar, através das figuras a seguir, que as redes das comunidades do Ribeirão da Ilha e da Costa da Lagoa, consideradas no nosso trabalho como comunidades não urbanas apresentam as redes mais densas (2 ligações de primeiro grau, 6 ligações de segundo grau e 5 de terceiro grau), sendo três delas multiplexas. Nas comunidades consideradas urbanas, Ingleses e Região Central temos relações pouco densas entre os informantes e todas uniplexas (1 ligação de primeiro grau e 3 de terceiro). 93 Aqui inserimos outras duas categorias que apareceram nas relações entre os informantes da nossa amostra: professor/aluno na mesma escola, funcionário/aluno na mesma escola. 135 Figura 3.1: Redes sociais no Ribeirão da Ilha Figura 3.3: Redes sociais na região central de Florianópolis Figura 3.2: Redes sociais na Costa da Lagoa Figura 3.4: Redes sociais nos Ingleses O que esta análise revela é que os informantes das comunidades não-urbanas constituem redes mais densas, ao contrário dos informantes das comunidades urbanas, que constituem redes menos densas. Confirmamos nossas expectativas, já que os informantes da zona não urbana fazem parte de redes mais densas e multiplexas; por isso, tendem ao uso de variantes locais, no caso do nosso estudo, a não marcação da CV. Já os informantes da zona urbana tendem a apresentar redes menos densas e uniplexas e, por isso, não exercem interinfluências entre si, mas usam padrões mais valorizados socialmente, no caso, a marcação da CV, em função de pertencerem à zona urbana. Esses resultados são confirmados pelo grupo de fatores diazonalidade (v. tabela 3.16). Como temos poucos informantes em cada uma das comunidades estudadas, acreditamos que os resultados quantitativos a respeito do localismo e da mobilidade possam nos indicar uma relação mais consistente entre redes sociais e variação na concordância verbal. Primeiramente, observemos os resultados a respeito do localismo. Os informantes que se mostraram bem integrados ao bairro em que residem são aqueles que marcam menos a CV (78%), já os informantes que se mostraram mais ou menos integrados ao bairro em que residem marcam um pouco mais a CV (85%), como 136 evidenciam os resultados da tabela 3.12, a seguir. Não houve informante que tenha sido definido como pouco integrado ao bairro em que reside. Redes sociais (localismo) Mais ou menos integrado Bem integrado Total Apl/Total 230/269 410/525 640/794 % 85% 78% 80% Tabela 3.12: Freqüência de CV no PB, segundo a variável redes sociais (localismo) Agora observemos os resultados em relação à mobilidade. Os informantes que apresentaram média mobilidade foram os que mostraram o maior percentual de marcação da CV (90%); em seguida os informantes que apresentaram pouca mobilidade foram os que mais preservaram a CV (80%); e, por último, os que apresentaram muita mobilidade (70%), como podemos observar nos resultados da tabela 3.13, a seguir. Redes sociais (mobilidade) Pouca mobilidade Média mobilidade Muita mobilidade Total Apl/Total 444/555 127/141 69/98 640/794 % 80% 90% 70% 80% Tabela 3.13: Freqüência de CV no PB, segundo a variável redes sociais (mobilidade) Nossa expectativa em relação ao grupo de fatores localismo era a de que os informantes que se identificassem com a sua localidade apresentassem tendência à valorização da cultura local, bem como dos usos lingüísticos locais, diferentemente dos indivíduos que não se identificassem com a localidade da qual fazem parte que tenderiam a adotar padrões lingüísticos externos. Para verificar tais expectativas, fizemos um cruzamento entre esse grupo de fatores e a diazonalidade. Os resultados mostram que o comportamento dos informantes considerados bem integrados à comunidade não urbana e urbana é o mesmo (78% de marcação da CV), como podemos verificar no gráfico 3.16, a seguir. 137 100% Percentual 90% 80% 70% 60% 50% 40% Mais ou menos integrado Bem integrado Redes Sociais (localismo) Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.16: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade Em relação ao grupo de fatores mobilidade, esperávamos que os indivíduos que apresentassem pouca mobilidade tendessem ao uso dos padrões valorizados localmente, diferentemente dos indivíduos que apresentassem alta mobilidade que tenderiam a adotar padrões lingüísticos de grupos externos de referência. Diante disto, cruzamos a mobilidade com a diazonalidade e percebemos, a partir dos resultados do gráfico 3.17 a seguir, que nossas expectativas também parecem não se confirmar totalmente, pois, por um lado, os informantes com pouca mobilidade apresentam o mesmo comportamento na zona não urbana, e, na zona urbana, por outro lado, os informantes com muita mobilidade, pertencentes à zona urbana tendem à marcação da CV, o que seria esperado. No entanto, aqueles pertencentes à zona não urbana, conforme nossas expectativas, deveriam tender ao uso de padrões lingüísticos de referência, no caso, esperávamos freqüência maior de marcação da CV. Percentual 100% 90% 80% 70% 60% 50% 40% Pouca mobilidade Média mobilidade Muita mobilidade Redes Sociais (Mobilidade) Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.17: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (mobilidade) e diazonalidade A seguir, podemos observar os resultados com relação ao comportamento dos informantes individualmente. Primeiramente, na tabela 3.14, verificamos os resultados para os indivíduos e a questão do localismo. Os quatro primeiros informantes (01, 05, 138 09 e 13) fazem parte da localidade do Ribeirão da Ilha, zona não-urbana. Os dois categorizados como bem integrados (05 e 13) são de escolaridade superior, o que justifica o alto índice de marcação da CV. Os quatro informantes seguintes (03, 07, 11 e 15) são da localidade da Costa da Lagoa, zona não urbana. Todos eles categorizados como bem integrados à comunidade, foram os que tenderam, comparativamente às outras comunidades, a menor marcação da CV. Os quatro próximos informantes (04, 08, 12 e 16) fazem parte da Região Central de Florianópolis, zona urbana. Apenas um foi categorizado como bem integrado à comunidade; no entanto, todos eles apresentaram alto índice de marcação da CV independentemente até mesmo do nível de escolaridade, como o caso dos informantes 04 e 12, ambos do nível fundamental. Os quatro últimos informantes (02, 06, 10 e 14) fazem parte da comunidade dos Ingleses, zona urbana, dois deles categorizados como mais ou menos integrados à comunidade e os outros dois como bem integrados. Percebemos que aqueles mais ou menos integrados usaram, comparativamente aos considerados bem integrados, mais a CV, o que não era esperado, o que talvez se justifique em função das características dessa comunidade. Embora pertença à zona urbana, apresenta características de comunidade não urbana, conforme discussão feita no capítulo II. Indivíduo PBRIMVF01 PBRIFVS05 PBRIMJF09 PBRIMJS13 PBCLMVF03 PBCLFVS07 PBCLMJF11 PBCLFJS15 PBRCMVF04 PBRCMVS08 PBRCMJF12 PBRCMJS16 PBINFVF02 PBINFVS06 PBINMJF10 PBINFJS14 Total Mais ou menos integrado 16/22 73% 18/25 45/49 92% 76/92 32/60 45/54 28/46 74/83 83% 53% 83% 61% 89% 28/29 97% 28/49 54/63 57% 86% 410/525 78% 72% 52/58 90% 54/65 38/39 83% 97% 15/22 37/38 230/269 Bem integrado 68% 97% 86% Tabela 3.14: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (localismo) 139 Na tabela 3.15, verificamos os resultados para a relação entre o indivíduo e a mobilidade. Na comunidade do Ribeirão da Ilha, apenas um dos informantes (05) apresenta média mobilidade, os demais (01, 09 e 13) apresentam pouca mobilidade. De fato, o informante que apresenta mais mobilidade é aquele que também apresenta maior tendência à marcação da CV, o que era esperado, já que a comunidade faz parte da zona não urbana. Os quatro informantes seguintes (03, 07, 11 e 15) fazem parte da comunidade da Costa da Lagoa. Observamos que apenas um deles apresenta alta mobilidade e mesmo assim tende à não marcação da CV. Na verdade, esse informante durante boa parte da vida trabalhou nos arredores da comunidade como pescador, mas foi categorizado como tendo alta mobilidade porque hoje em dia trabalha no centro da cidade na COMCAP (Companhia de Melhoramento da Capital), órgão da prefeitura de Florianópolis. Tal fato talvez justifique a escolha lingüística do informante que é um morador bastante conhecido no bairro. Os demais informantes confirmam nossa expectativa; apresentam pouca mobilidade e menos tendência à marcação da CV. Os informantes 04, 08, 12 e 16, que fazem parte da Região Central, apresentam, com exceção do informante 08, pouca mobilidade, o que justifica o alto índice de marcação da CV, já que fazem parte da zona urbana que apresenta padrões lingüísticos mais prestigiados como padrão. Por fim, temos os informantes da comunidade dos Ingleses. Os informantes 02 e 10 apresentam pouca mobilidade e menor tendência à marcação da CV, o que não seria esperado em função de a comunidade fazer parte da zona urbana. No entanto, como referimos anteriormente essa comunidade, embora urbana, ainda apresenta vestígios de uma comunidade não-urbana, o que já foi há bem pouco tempo. Levando em conta tais características da comunidade, talvez justifique o fato de os informantes 06 e 14 apresentarem, respectivamente média e muita mobilidade, maior tendência à marcação da CV, já que buscam padrões externos prestigiados como referência. 140 Indivíduo PBRIMVF01 PBRIFVS05 PBRIMJF09 PBRIMJS13 PBCLMVF03 PBCLFVS07 PBCLMJF11 PBCLFJS15 PBRCMVF04 PBRCMVS08 PBRCMJF12 PBRCMJS16 PBINFVF02 PBINFVS06 PBINMJF10 PBINFJS14 Total Pouca mobilidade 16/22 73% Média mobilidade 45/49 18/25 76/92 72% 83% 45/54 28/46 74/83 52/58 83% 61% 89% 90% 54/65 38/39 28/49 15/22 444/555 Muita mobilidade 92% 28/29 97% 54/63 86% 32/60 53% 37/38 69/98 97% 70% 83% 97% 57% 68% 80% 127/141 90% Tabela 3.15: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (mobilidade) 3.1.3 Variáveis geográficas Nesta pesquisa, consideramos as variáveis geográficas diatopia e diazonalidade. Nas rodadas estatísticas realizadas com o auxílio do Programa Goldvarb, a diatopia foi a sexta variável selecionada. Vamos agora aos resultados e à discussão das variáveis geográficas. 3.1.3.1 Diatopia A diatopia foi o sexto e último grupo de fatores selecionado pelo Programa Goldvarb. O que podemos observar nos resultados da tabela 3.16, abaixo, é que a região central foi a que mais preservou as marcas de CV com 90% de freqüência e .83 de peso relativo. Em seguida, temos o Ribeirão da Ilha, com 82% de freqüência e .48 de peso relativo; logo após, temos os Ingleses com 77% de freqüência e .33 de peso relativo. Por fim, temos a Costa da Lagoa com 73% de freqüência de marcação da CV e .32 de peso relativo. 141 Diatopia Ribeirão da Ilha Costa da Lagoa Ingleses Região Central Apl/Total 155/188 179/243 134/172 172/191 % 82% 73% 77% 90% Total 640/794 80% PR .48 .32 .33 .83 Tabela 3.16: Freqüência e probabilidade de CV no PB, segundo a variável diatopia O que esperávamos para este grupo de fatores era que as localidades que fazem parte da zona urbana, Região Central e Ingleses, preservassem mais a CV. No caso da Região Central foi o que aconteceu, mas não nos Ingleses. O que parece explicar os resultados é que, embora o bairro dos Ingleses tenha se urbanizado nos últimos tempos com o crescente comércio em função do turismo, os nativos continuam convivendo muito mais entre eles, preservando, desta forma, as marcas menos urbanas. Em relação ao Ribeirão da Ilha e à Costa da Lagoa, nossas expectativas se confirmaram, já que os bairros considerados não urbanos, em função do distanciamento com a região central da cidade, preservaram menos as marcas de CV do que a Região Central. Considerando os dois bairros, os resultados confirmam o que de fato também era esperado. Embora sempre que vá se falar de interior da Ilha de Santa Catarina, em bairro típico da cidade, em “falar manezinho”, se faça referência primeiramente ao Ribeirão da Ilha, a Costa da Lagoa é caracterizadamente mais rural do que o Ribeirão, em função principalmente do seu isolamento, só se chega lá de barco, as pessoas todas se conhecem, o que já não ocorre no Ribeirão que tem estradas e muitas pessoas de fora o ano inteiro circulando, em função principalmente da maricultura. 3.1.3.2 Diazonalidade Como evidenciamos anteriormente, a diazonalidade não foi selecionada pelo programa estatístico; portanto, a tabela 3.17, a seguir apresenta os resultados apenas em termos de percentuais. Diazonalidade Zona urbana Zona não urbana Total Apl/Total 306/363 334/431 640/794 % 84% 77% 80% Tabela 3.17: Freqüência de CV no PB, segundo a variável diazonalidade 142 Embora não tenha sido selecionado, o grupo de fatores diazonalidade confirmou nossas expectativas, já que os informantes da zona urbana usam mais marcas de CV (84%) do que os informantes da zona não urbana (77%), como indicam os resultados na tabela acima. 3.2 Análise e discussão dos resultados sincrônicos do PE Como havíamos salientado na seção 2.4 do Capítulo II, analisamos todos os dados de construções com variação na concordância verbal de terceira pessoa, extraídos de cada uma das dezesseis entrevistas que fazem parte da nossa amostra do PE, perfazendo um total de 807 dados. Do total de dados obtidos, 742 apresentaram marcas de concordância nos verbos, correspondendo a 91,95% da amostra, e 65 dados, 8,05% do total, apresentaram a variante zero de plural nos verbos, como mostra o gráfico 3.18 a seguir. Concordância 91,95% Não concordância 8,05% Gráfico 3.18: Distribuição geral dos dados do PE A seguir, apresentamos o mapeamento da variação na concordância encontrada em cada uma das localidades do PE investigadas. O mapa 3.2 retrata as freqüências de uso da CV na fala de cada informante que faz parte da nossa amostra. 143 Mapa 3.2: Distribuição da marcação da concordância verbal no PE 3.2.1 Variáveis lingüísticas Consideramos as seguintes variáveis lingüísticas na nossa análise: saliência fônica, paralelismo formal, posição do sujeito em relação ao verbo, traço humano no sujeito, tipo de verbo e tipo de sujeito. Dentre estas variáveis, o Programa Goldvarb (2001) selecionou, por ordem de relevância: traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo e tipo de verbo94. As variáveis saliência fônica, paralelismo formal e tipo de sujeito não foram selecionadas95. 94 Considerando todas as variáveis controladas, o Programa Goldvarb (2001) selecionou ainda, em último lugar em ordem de relevância, a variável social idade/escolaridade que será discutida posteriormente. 95 Assim como para a amostra do PB, também fizemos rodadas separadas com informantes da zona urbana e informantes da zona não-urbana da nossa amostra do PE, com o objetivo de confirmar os resultados que consideraram todos os informantes, que serão discutidos nesta seção. Na rodada só com informantes da zona não-urbana, o Programa Goldvarb (2001) selecionou os seguintes grupos de fatores, por ordem de relevância: posição do sujeito em relação ao verbo, traço humano no sujeito e redes sociais (mobilidade). Na rodada com informantes da zona urbana, os seguintes grupos de fatores foram selecionados, por ordem de relevância: traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo e idade/escolaridade. 144 Vamos agora aos resultados e à discussão das variáveis lingüísticas. 3.2.1.1 Traço humano no sujeito O grupo de fatores traço humano no sujeito foi selecionado como estatisticamente relevante em primeiro lugar. Confirmando nossa hipótese, quando a sentença possuía um SN [+humano], a probabilidade à concordância verbal foi maior (96% de freqüência e .61 de peso relativo) do que em sentenças com SNs [-humanos] (71% de freqüência e .11 de peso relativo), como mostram os resultados na tabela 3.18. Apl/Total96 632/653 110/154 742/807 Traço humano no sujeito SN [+humano] SN [-humano] Total % 96% 71% 91% PR .61 .11 Tabela 3.18: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável traço humano no sujeito Nossos resultados confirmam os resultados encontrados em Naro e Scherre (2007) para textos escritos do PE antigo com o traço [+ humano] do sujeito condicionando a marcação da concordância verbal. Podemos observar, nos resultados do gráfico 3.19 a seguir, que, no cruzamento entre traço humano e diazonalidade, o ambiente mais favorecedor da CV é o traço [+ humano] na zona urbana e o menos favorecedor é o traço [- humano] na zona não urbana. 100% Percentual 90% 80% 70% 60% 50% 40% SN [+humano] SN [-humano] Traço humano no sujeito Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.19: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade 96 Assim como salientamos para os resultados do PB, consideramos em todas as tabelas o percentual fornecido pelo Programa Goldvarb que parece não aplicar a regra de arredondamento decimal. 145 3.2.1.2 Posição do sujeito em relação ao verbo A posição do sujeito em relação ao verbo foi o segundo grupo de fatores selecionado pelo Goldvarb. Podemos observar, através dos resultados apresentados na tabela 3.19, que a probabilidade de aplicação da regra de concordância foi maior quando o sujeito estava anteposto ao verbo, com 92% de freqüência e .56 de peso relativo, distanciando-se significativamente da posposição do sujeito, com 59% de freqüência e .18 de peso relativo, confirmando, desta forma, nossa hipótese. Posição SN anteposto SN posposto Total Apl/Total 354/381 43/72 397/453 % 92% 59% 87% PR .56 .18 Tabela 3.19: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável posição do sujeito em relação ao verbo Nossos resultados indicam, como já evidenciado na análise do PB, que o sujeito quando posposto ao verbo passa a ser encarado como objeto pelo falante que não aplica a regra de concordância, já que não o considera sujeito da sentença. Assim como fizemos na análise do PB, para confirmar os resultados apontados em Lemle e Naro (1977) e Scherre e Naro (1997) de que a não marcação da concordância verbal com sujeito posposto independe da escolaridade dos informantes, fizemos um cruzamento entre as variáveis posição e escolaridade, como podemos observar no gráfico 3.20, a seguir. 100% Percentual 90% 80% 70% 60% 50% 40% Ensino fundamental Ensino superior Escolaridade SN anteposto SN posposto Gráfico 3.20: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis escolaridade e posição do sujeito em relação ao verbo Os resultados observados no gráfico 3.20, revelam que a marcação da concordância nos verbos é menor com SN posposto, tanto para os informantes com ensino fundamental, quanto para os informantes com ensino superior. Para os 146 informantes com ensino fundamental a queda da marcação do SN anteposto para o SN posposto é mais sensível, de 91% para 51%, já para os informantes com ensino superior a queda é menor, de 95% para 69%. Vale ressaltar, ainda, o que Carrilho (2003) atesta para o PE no que se refere à relação entre concordância verbal e posição do sujeito, evidenciado no capítulo I, subseção 1.1.2. De acordo com a autora, a não-concordância verbal no PE aparece em contextos em que o constituinte ocupa posição pós-verbal. Nossos resultados confirmam também os resultados da pesquisa de Varejão (2006) com amostras de fala do PE e da pesquisa de Naro e Scherre (2007) com amostras de escrita do PE. Observamos os resultados no gráfico 3.21, a seguir, para o cruzamento entre posição do sujeito e diazonalidade que, em relação ao SN anteposto, não há muita diferença entre zona urbana e zona não urbana, uma diferença de 2% de menos marca de CV na zona não urbana. No entanto, no que se refere ao SN posposto, a diferença é muito mais acentuada: 32% a menos de marcação da CV para a zona não-urbana em relação à zona urbana. 100% Percentual 90% 80% 70% 60% 50% 40% SN anteposto SN posposto Posição do sujeito em relação ao verbo Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.21: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade 3.2.1.3 Tipo de verbo O grupo de fatores tipo de verbo foi o terceiro a ser selecionado como estatisticamente relevante pelo Programa Goldvarb97. 97 Na rodada em que consideramos a construção verbo+se+ SN, o grupo de fatores tipo de verbo foi o primeiro a ser selecionado pelo Programa Goldvarb, que selecionou a posição do sujeito em segundo lugar, o traço humano em terceiro e a idade/escolaridade em quarto. No entanto, como queríamos uma amostra comparável a do PB e como não tínhamos dados dessa natureza nessa outra amostra, conforme salientamos no capítulo II, resolvemos não considerar tais dados; por isso, evidenciamos apenas os resultados nesta nota: verbo transitivo 319/325=98%, .76 p.r.; verbo intransitivo prototípico 57/58=98%, .77 p.r.; verbo intransitivo não-prototípico 12/13=92%, .41 p.r.; verbo inacusativo prototípico 41/45=91%, .37 p.r.; verbo inacusativo não-prototípico 154/167=92%, .41 p.r.; verbo cópula 147 Na tabela 3.20, a seguir, podemos observar os resultados para o tipo de verbo. O verbo cópula foi o ambiente que se mostrou menos favorecedor da marcação da concordância verbal, com 79% de freqüência e .28 de peso relativo. Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico98 Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Apl/Total 319/325 57/58 12/13 41/45 154/167 159/199 % 98% 98% 92% 91% 92% 79% Total 742/807 91% PR .60 .63 .20 .54 .41 .28 Tabela 3.20: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável tipo de verbo Nos gráficos a seguir, apresentamos o resultado do cruzamento entre a variável tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo, e tipo de verbo e traço humano no sujeito, evidenciando a relação existente entre os verbos inacusativos, a posposição do sujeito e o traço [- humano] do sujeito. Os resultados no gráfico 3.22, a seguir, evidenciam que os verbos que apresentam a possibilidade de sujeito posposto, como os inacusativos e o cópula, têm freqüências menores, indicando o desfavorecimento da marcação da CV. 159/199=79%, .19 p.r.; construção verbo+se+SN 3/16=18%, .01 p.r.. Os dados de construção verbo +se+SN encontrados na amostra foram os seguintes: (1) fazia-se tipo umas marchas (PERCFVF04); (2) à véspera de Natal fazem-se as filhoses (PERCFVF04), (3) faz-se os bolos de natal (PERCFVS08), (4) fazse os doces (PERCFVS08), (5) mas no São João, no Santo António, fazem-se (PERCFVS08), (6) fazemse (PERCFVS08), (7) ouve-se os passarinhos (PERCFJF12), (8) reúne-se comerciantes (PESIMVF01), (9) coze-se as batatas (PEBEMVF02), (10) coze-se as couves (PEBEMVF02), (11) à noite, come-se mais umas porcarias, umas rabanadas (PEBEMVF02), (12) come-se azeitonas (PEBEMVF02), (13) no verão é melhor, apanha-se os polvos (PECAMVF03), (14) junta-se outras pessoas (PECAMVF03), (15) não sei se no Brasil diz-se asneiras (PECAFVS07), (16) elas não quero sacrificar, pois de manhã sei como é, pois custa-se a levantar (PECAFJF11). Vale ressaltar que dos 16 dados encontrados, 14 são de informantes mais velhos, o que parece indicar que essa construção também já não é freqüente na fala dos mais jovens. 98 Vale ressaltar que os resultados dos intransitivos não-prototípicos apresentaram alta freqüência de não concordância com resultados bastante semelhantes aos dos inacusativos não-prototípicos e aos dos inacusativos prototípicos, no entanto, se comparados aos intransitivos prototípicos e aos transitivos a freqüência da marcação desses verbos é baixa. 148 Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo nãoprototípico Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Tipo de verbo SN anteposto SN posposto Gráfico 3.22: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo Nos resultados do gráfico 3.23, podemos observar que os verbos inacusativos e o cópula com sujeito com traço [- humano] são os que apresentam as menores freqüências de concordância verbal. Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo nãoprototípico Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Tipo de verbo SN [+ humano] SN [- humano] Gráfico 3.23: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito Observando os resultados do gráfico 3.24, percebemos que o cruzamento entre o tipo de verbo e a diazonalidade indica diminuição da marcação da CV na zona não urbana com mais acento para os verbos inacusativos. 149 Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo nãoprototípico Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Tipo de verbo Zona urbana Zona não-urbana Gráfico 3.24: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade 3.2.1.4 Saliência Fônica O grupo de fatores saliência fônica não foi selecionado pelo Programa Goldvarb; por isso, apresentamos apenas os resultados percentuais. Nossos resultados vão de encontro tanto com as nossas expectativas, quanto com os resultados de outros estudos que haviam controlado este grupo de fatores no PE (VAREJÃO, 2006; NARO e SCHERRE, 2007), com a oposição não-acentuada favorecendo mais a presença de marcas explícitas de plural nos verbos (93% de freqüência) do que a oposição acentuada (90% de freqüência), como podemos observar os resultados na tabela 3.21, a seguir com os fatores do nível 1 e do nível 2 amalgamados99. Saliência Fônica Nível 1: Oposição não-acentuada Nível 2: Oposição acentuada Total Apl/Total 365/392 377/415 % 93% 90% 742/807 91% Tabela 3.21: Freqüência de CV no PE, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 Agora observemos a tabela 3.22, que traz os resultados com as três categorias do nível 1 separadamente, assim como as três categorias do nível 2. 99 Acreditamos que nossos resultados talvez indiquem que a escala da saliência fônica no PE tenha suas particularidades e seja diferente da escala do PB em função da pronúncia distinta nessas duas variedades do português ou em função das diferenças relacionadas ao valor social das estruturas sintáticas com cópula nas duas variedades. Neste trabalho, não faremos uma análise considerando a pronúncia, mas traremos algumas reflexões sobre a sintaxe dessas construções no capítulo IV, a partir de uma nova rodada estatística dos dados do PE. 150 Nível 1: Oposição não-acentuada a. não envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural c. envolve acréscimo de segmentos na forma plural Nível 2: Oposição acentuada a. envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural c. envolve acréscimos de segmentos e mudanças diversas na forma plural Total Apl/Total 62/66 % 93% 232/251 92% 74/75 Apl/Total 73/79 94% % 92% 154/159 96% 150/177 84% 742/807 91% Tabela 3.22: Freqüência de CV no PE, segundo a variável saliência fônica Como podemos verificar, os fatores pertencentes ao nível 1, oposição nãoacentuada, apresentaram resultados percentuais bastante próximos. Na categoria a, temos 93% de marcação da CV; na categoria b, 92%; e na c, 94%. No nível 2, a categoria a apresentou 92% de marcação da CV; a categoria b, 96% e a c apresentou o menor percentual de marcação da CV entre todas as categorias, inclusive se comparada às categorias do nível 1, com 84% de freqüência. Acreditamos que a diminuição da marcação da CV na categoria c do nível 2 se deva ao considerável número de verbos cópula (é/são) que apresentaram, conforme discussão anterior, no item 3.2.1.3, desfavorecimento da marcação da concordância nestes verbos. Como pudemos constatar através dos resultados da tabela 3.22, houve inversão entre a categoria b e a categoria c do nível 2, apontada anteriormente. No entanto, diferentemente dos resultados do PB, observamos que essa inversão ocorre na zona urbana, como podemos observar nos resultados do gráfico 3.25, a seguir. Na zona não urbana, as freqüências são menores em todos os fatores, menos no nível 2c, que são os pares mais salientes. O que parece ocorrer no PE é que esses pares, embora salientes, não parecem apresentar estigma social. 151 100% Percentual 90% 80% 70% 60% Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c Saliência Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.25: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade A seguir, apresentamos os resultados do cruzamento entre a variável saliência fônica e a escolaridade, para verificarmos se há influência dos anos de escolarização dos falantes na nitidez da escala da saliência, como comprovado em Scherre e Naro (1997). Percentual 100% 80% 60% 40% 20% 0% Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c Saliência Ensino fundamental Ensino superior Gráfico 3.26: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade O que os resultados do gráfico 3.26 parece evidenciar é que, para essa amostra do PE, a escala da saliência não se mostrou significativa, nem para os falantes com nível fundamental, nem para os falantes com nível superior. 3.2.1.5 Paralelismo Formal O paralelismo formal, no nível clausal, não foi selecionado como significativo na análise do Programa Goldvarb; por isso, salientaremos os resultados em termos percentuais. Os resultados atestaram nossas hipóteses. Como podemos observar na tabela 3.23, a marcação da concordância foi maior para o fator sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita, apresentando 97% de freqüência. O fator presença 152 da forma de plural explícita no último elemento apresentou 87% de marcação da CV e o fator que apresentou a menor freqüência de CV foi presença da forma zero de plural no último elemento com 80% de freqüência, como previam nossas expectativas. Paralelismo Formal Presença da forma de plural explícita no último elemento Presença da forma zero de plural no último elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita Total Apl/Total 398/454 % 87% 4/5 80% 340/348 97% 742/807 91% Tabela 3.23: Freqüência de CV no PE, segundo a variável paralelismo formal Vale ressaltar que não foram encontrados dados na amostra do PE para os fatores: presença de numeral terminado em /s/ no último elemento, presença de numeral não terminado em /s/ no último elemento, sujeito nulo com sujeito anafórico com presença da forma de plural zero no último elemento, sujeito nulo com sujeito anafórico com presença de numeral terminado em /s/ no último elemento e sujeito nulo com sujeito anafórico com presença de numeral não terminado em /s/ no último elemento. Desta forma, estes fatores não puderam ser considerados na análise. Nos resultados do gráfico 3.27, a seguir, observamos que a zona não urbana apresenta freqüências menores de marcação da CV para as três categorias consideradas para o grupo paralelismo formal. Percentual 100% 90% 80% 70% 60% Presença da forma de plural explícita no último elemento Presença da forma zero de plural Sujeito nulo com anafórico com no último elemento presença da forma de plural explícita Paralelismo formal Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.27: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade 153 3.2.1.6 Tipo de sujeito Embora o grupo de fatores tipo de sujeito não tenha sido selecionado como estatisticamente relevante, vale salientar os resultados em termos percentuais. Em nossa análise, confirmando nossas expectativas, o sujeito pronome pessoal teve o maior percentual de marcação da CV, 98%, seguido pelo sujeito nulo, 97% e pelo sujeito pronome indefinido amalgamado ao quantificador, 93%, o que não esperávamos, em função da nossa hipótese de que ocorreriam mais à direita do verbo desfavorecendo as marcas de CV. Os fatores foram amalgamados em função dos resultados (93% de CV para os indefinidos e também para o quantificador). O SN + pronome relativo (que) apresentou um percentual um pouco menor (90%) de concordância, mas ainda assim alto, o que confirmou nossa hipótese. Os sujeitos pleno simples, pleno nu e pleno composto foram os que menos preservaram as marcas de CV, com 84%, 60% e 40% de marcação, respectivamente, confirmando nossas expectativas para estes fatores. Podemos observar estes resultados na tabela 3.24, a seguir. Tipo de sujeito Sujeito pronome pessoal Sujeito nulo Sujeito pronome indefinido + quantificador SN + pronome relativo (que) Sujeito pleno simples Sujeito pleno nu SN pleno composto Apl/Total 89/90 341/350 29/31 % 98% 97% 93% 77/85 196/231 6/10 4/10 90% 84% 60% 40% Total 742/807 91% Tabela 3.24: Freqüência de CV no PE, segundo a variável tipo de sujeito Embora os resultados não tenham confirmado nossas expectativas na totalidade em termos da marcação da CV, podemos observar no gráfico 3.28, que os resultados confirmam nossas hipóteses, baseadas em Zilles (2000), no que se refere aos percentuais de posposição relacionados aos tipos de sujeito da nossa amostra. Os sujeitos pleno nu, pleno composto, pronome indefinido + quantificador e pleno simples apresentaram os seguintes percentuais de posposição do sujeito com 70%, 40%, 41% e 20%, respectivamente. Já os sujeitos pronome pessoal e SN + pronome relativo (que) não apresentaram dados de posposição. É interessante notar que, embora o sujeito pronome 154 indefinido + quantificador tenha apresentado 41% de posposição do sujeito, também tenha apresentado alto índice de marcação da concordância, 93%. 70% Tipo de sujeito Sujeito pleno nu 40% SN pleno composto 20% Sujeito pleno simples 41% Sujeito pronome indefinido + quantificador SN + pronome relativo (que) 0% Sujeito pronome pessoal 0% Percentual Gráfico 3.28: Freqüência de posposição do sujeito no PE, segundo a variável tipo de sujeito Verificamos que há uma diferença maior na freqüência de marcação da CV entre a zona urbana e a zona não urbana no sujeito pleno nu. 100% Percentual 80% 60% 40% 20% 0% Sujeito pronome pessoal Sujeito nulo Sujeito SN + pronome Sujeito pleno pronome relativo (que) simples indefinido + quantificador Sujeito pleno nu SN pleno composto Tipo de sujeito Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.29: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade 3.2.2 Variáveis sociais Dentre as variáveis sociais controladas, sexo, idade/escolaridade e redes sociais (mobilidade e localismo), somente a variável idade/escolaridade foi selecionada como estatisticamente relevante pelo Programa Goldvarb. A variável foi selecionada em quarto lugar. Vamos agora aos resultados e à discussão das variáveis sociais. 155 3.2.2.1 Idade/escolaridade Como evidenciamos anteriormente, este foi o único grupo de fatores sociais selecionado como estatisticamente relevante. Os resultados mostram que, no ensino superior, os mais jovens preservam mais a CV (94% de freqüência e .61 de peso relativo) do que os mais velhos (92% de freqüência e .59 de peso relativo). Já no ensino fundamental, os informantes mais velhos preservam mais as marcas de CV (90% de freqüência e .49 de peso relativo) do que os mais jovens (89% de freqüência e .30 de peso relativo), como podemos observar na tabela 3.25, a seguir. Idade/escolaridade Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Apl/Total 204/216 158/170 171/191 209/230 % 94% 92% 89% 90% Total 742/807 91% P.R. .61 .59 .30 .49 Tabela 3.25: Freqüência e probabilidade de CV no PE, segundo a variável idade/escolaridade Podemos observar, no gráfico 3.30, a seguir, o cruzamento entre idade/escolaridade e diazonalidade. Os informantes com nível superior da zona não urbana, tanto os mais jovens, quanto os mais velhos, tendem a menor uso de marcação da CV em comparação aos informantes da zona urbana. Já os informantes com nível fundamental da zona não urbana têm comportamento diferente. Os informantes mais velhos apresentaram maior freqüência da marcação da CV em contraste aos informantes da zona urbana, e os informantes mais jovens tenderam a menor uso da CV em comparação aos informantes da zona urbana. Percentual 100% 95% 90% 85% 80% Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Idade / Escolaridade Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.30: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade 156 3.2.2.2 Sexo Como apontamos anteriormente, o grupo de fatores sexo não foi selecionado pelo Programa Goldvarb; por isso, apresentaremos os resultados apenas em termos percentuais. Podemos observar, nos resultados na tabela 3.26, a seguir, que as nossas expectativas se confirmaram, já que as mulheres preservaram mais as marcas de CV (92%) do que os homens (90%), o que parece estar indicando que as mulheres estão mais atentas às regras estabelecidas, sejam elas sociais ou lingüísticas. Sexo Masculino Feminino Total Apl/Total 252/279 490/528 742/807 % 90% 92% 91% Tabela 3.26: Freqüência de CV no PE, segundo a variável sexo No gráfico 3.31, percebemos nos resultados que, de acordo com o cruzamento entre sexo e diazonalidade, os homens da zona não urbana usam mais CV do que na zona urbana, diferentemente das mulheres. Percentual 100% 95% 90% 85% 80% Masculino Feminino Sexo Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.31: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade 3.2.2.3 Redes Sociais Inicialmente, apresentamos os resultados qualitativos para este grupo de fatores referentes à análise da densidade e da plexidade. Logo após, apresentamos os resultados quantitativos referentes ao localismo e à mobilidade. 157 Conforme já apontado, utilizamos os critérios adotados em Battisti (2000) para evidenciar os graus de relação das redes existentes entre os informantes da nossa amostra100. Através das figuras a seguir, podemos observar que as comunidades de Sintra e Cascais, comunidades não urbanas, apresentam, em comparação com Belém e Região Central, as redes mais densas (1 ligação de segundo grau, 3 ligações de terceiro grau). Já nas comunidades consideradas urbanas, temos relações menos densas entre os informantes, em Belém temos 3 ligações de terceiro grau e na Região Central não há relação nenhuma entre os informantes. Vale ressaltar que todas as relações existentes entre os informantes da amostra são uniplexas. Figura 3.5: Redes sociais em Sintra Figura 3.6: Redes sociais em Cascais Figura 3.7: Redes sociais na região central de Lisboa Figura 3.8: Redes sociais em Belém A partir desta análise, observamos que, de maneira geral, há poucas relações entre os informantes da nossa amostra, mas, ainda assim, os informantes das comunidades não urbanas constituem redes mais densas comparando-se aos informantes das comunidades urbanas, o que confirma nossas expectativas. De um lado, temos os informantes de comunidades não urbanas fazendo parte de redes mais densas e assim tendendo ao uso de variantes locais, no caso, a não marcação da CV; e, de outro lado, os informantes da zona urbana tendendo a apresentar redes menos densas favorecendo o 100 As redes são classificadas em primeiro, segundo e terceiro graus, conforme o quadro 3.2 utilizado na subseção 3.1.2.3. 158 uso de padrões mais valorizados socialmente, no caso, a marcação da CV, em função de pertencerem à zona urbana. Assim como na análise do PB, temos poucos informantes em cada uma das comunidades estudadas, e, por isso, investimos nos resultados quantitativos a respeito do localismo e da mobilidade, os quais podem nos indicar uma relação mais consistente entre redes sociais e variação na concordância verbal. Primeiramente, observemos os resultados a respeito do localismo. Os informantes que se mostraram mais bem integrados ao bairro em que residem são aqueles que marcam mais a CV (92%), já os informantes que se mostraram mais ou menos integrados ao bairro em que residem marcam um pouco menos a CV (91%), e aqueles que se mostraram pouco integrados são os que menos marcam a CV (88%), como evidencia a tabela 3.27, a seguir. Redes sociais (localismo) Bem integrado Mais ou menos integrado Pouco integrado Total Apl/Total 263/285 456/496 23/26 742/807 % 92% 91% 88% 91% Tabela 3.27: Freqüência de CV no PE, segundo a variável redes sociais (localismo) Agora, observemos os resultados a respeito da mobilidade. Os informantes que apresentaram muita mobilidade foram os que mostraram o maior percentual de marcação da CV (94%), em relação aos informantes com média mobilidade (92% de freqüência) e aos informantes que apresentaram pouca mobilidade (90% de freqüência), como apontam os resultados da tabela 3.28, a seguir. Redes sociais (mobilidade) Pouca mobilidade Média mobilidade Muita mobilidade Total Apl/Total 301/334 290/314 151/159 742/807 % 90% 92% 94% 91% Tabela 3.28: Freqüência de CV no PE, segundo a variável redes sociais (mobilidade) No que se refere ao grupo de fatores localismo, esperávamos que os informantes categorizados como bem integrados à sua localidade apresentassem tendência à valorização da cultura local, bem como dos usos lingüísticos locais, diferentemente dos indivíduos categorizados como pouco integrados que, não se identificando com a 159 localidade da qual fazem parte, tenderiam a adotar padrões lingüísticos externos. Para verificar essa hipótese, fizemos um cruzamento entre localismo e diazonalidade. De acordo com os resultados, no gráfico 3.32, abaixo, nossa expectativa parece se confirmar, já que o comportamento dos informantes considerados bem integrados à comunidade não urbana é de menos marcação da CV (91% de freqüência) e na comunidade urbana é de mais marcação da CV (98% de freqüência), assim como na categoria mais ou menos integrado, em que na zona não urbana temos menos marcação da CV (90%) do que na zona urbana (93%). Em relação à categoria pouco integrado, não houve informante na zona não urbana assim classificado; temos os resultados apenas da zona urbana com o menor índice de marcação da CV, em comparação com as outras categorias (88%). Percentual 100% 95% 90% 85% 80% Bem integrado Mais ou menos integrado Pouco integrado Redes Sociais (Localismo) Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.32: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade Para o grupo de fatores mobilidade, nossa expectativa era a de que os indivíduos que apresentassem pouca mobilidade tendessem ao uso dos padrões valorizados localmente. Já os indivíduos que apresentassem alta mobilidade tenderiam a adotar padrões lingüísticos de grupos externos de referência. Assim sendo, cruzamos mobilidade com diazonalidade, como podemos observar nos resultados do gráfico 3.33, a seguir. 160 Percentual 100% 95% 90% 85% 80% Pouca mobilidade Média mobilidade Muita mobilidade Redes Sociais (Mobilidade) Zona não-urbana Zona urbana Gráfico 3.33: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (mobilidade) e diazonalidade Os resultados parecem evidenciar a confirmação das nossas expectativas com os informantes com pouca mobilidade da zona não urbana apresentando menos freqüência de CV (90%), comparando-se aos informantes da zona urbana (92%), e com os informantes com média mobilidade da zona não urbana também tendendo a uma menor marcação da CV (92%) do que aqueles pertencentes à zona urbana (93%). Em relação à categoria muita mobilidade, não tivemos informantes na zona não urbana assim classificados. Os informantes da zona urbana que pertencem a essa categoria apresentaram freqüência alta de marcação da CV (95%), o que, de certa forma, também confirma nossas expectativas. Verificamos, a partir da tabela 3.29, a seguir, os resultados para a relação entre o comportamento individual dos informantes no que diz respeito ao localismo. Os quatro primeiros informantes (01, 05, 09 e 13) pertencem à localidade de Sintra, que faz parte da zona não-urbana. Os informantes 01, 05 e 09 foram categorizados como mais ou menos integrados à comunidade e o informante 13 foi classificado como bem integrado. Os resultados parecem ir ao encontro das nossas expectativas, já que esses informantes, comparativamente aos informantes das comunidades urbanas, tenderam a um menor uso da marcação da CV. Nossa hipótese era a de que sendo mais ou menos integrados ou bem integrados tenderiam a valorizar os traços locais de uma comunidade não urbana, que seriam as marcas menos prestigiadas socialmente. Os próximos quatro informantes (03, 07, 11 e 15) fazem parte da localidade de Cascais, zona não-urbana. Os informantes 03, 11 e 15 foram categorizados como bem 161 integrados e o informante 07 como mais ou menos integrado à comunidade. Os resultados mostram que são os informantes que menos preservam as marcas de CV na nossa amostra do PE, o que confirma nossas expectativas, já que sendo mais ou menos ou bem integrados a uma comunidade não urbana tendem a adotar e valorizar os padrões da comunidade que seriam menos prestigiados socialmente, comparando aos padrões de comunidades urbanas. Os quatro informantes seguintes (04, 08, 12 e 16) fazem parte da Região Central de Lisboa, zona urbana. Apenas um foi categorizado como bem integrado (16), os demais como mais ou menos integrados à comunidade. Percebemos que todos eles apresentaram alto índice de marcação da CV, independentemente até mesmo do nível de escolaridade, como o caso dos informantes 04 e 12, ambos do nível fundamental, o que também confirma nossas expectativas, já que fazem parte de uma comunidade urbana e, sendo mais ou menos e bem integrados a ela, tendem a valorizar os padrões da comunidade que são os mais prestigiados socialmente. Os quatro últimos informantes (02, 06, 10 e 14) fazem parte da comunidade de Belém, zona urbana, um deles categorizado como pouco integrado à comunidade (10), os demais como mais ou menos integrados à comunidade. Percebemos que o informante categorizado como pouco integrado, como esperávamos, apresentou menor freqüência de marcação da CV, comparativamente aos considerados mais ou menos integrados, com exceção do informante 02, que, embora seja mais integrado que o informante 10 e tenha a mesma escolaridade que ele, tem uma profissão menos valorizada socialmente, já que é o sapateiro do bairro, o que talvez justifique tal freqüência de uso da CV. 162 Indivíduo Pouco integrado PESIMVF01 PESIMVS05 PESIFJF09 PESIMJS13 PECAMVF03 PECAFVS07 PECAFJF11 PECAFJS15 PERCFVF04 PERCFVS08 PERCFJF12 PERCFJS16 PEBEMVF02 41/47 55/59 33/35 49/53 PEBEFVS06 PEBEMJF10 PEBEFJS14 Total Mais ou menos integrado 44/50 88% 38/41 92% 45/48 93% 23/26 23/26 Bem integrado 37/41 61/64 90% 95% 54/64 49/53 84% 92% 62/63 98% 87% 93% 94% 92% 49/57 46/47 85% 97% 56/59 456/496 94% 92% 88% 88% 263/285 92% Tabela 3.29: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (localismo) Na tabela 3.30, evidenciamos os resultados do cruzamento entre indivíduo e mobilidade. Dos quatro primeiros informantes da comunidade de Sintra, dois (01 e 09) apresentam pouca mobilidade e dois (05 e 13), média mobilidade. Parece que não há evidência da mobilidade com a marcação da CV, já que a distribuição é bastante desigual, enquanto o informante 01, que apresenta pouca mobilidade, confirma nossas expectativas por apresentar baixo índice de CV, o informante 09, que também apresenta pouca mobilidade, tem a maior freqüência da marcação, comparativamente aos outros informantes da comunidade tendo nível de escolaridade fundamental. Os próximos quatro informantes (03, 07, 11 e 15) fazem parte da comunidade de Cascais. Apenas um deles apresenta média mobilidade (15); os demais apresentam pouca mobilidade. Os resultados parecem confirmar nossas expectativas, já que temos três informantes com pouca mobilidade e temos a comunidade que apresenta menor tendência à marcação da CV. De acordo com a nossa hipótese, quanto menor a mobilidade do informante, mais tendência terá de adotar os padrões da comunidade. Os quatro informantes seguintes (04, 08, 12 e 16) fazem parte da Região Central. Um deles (08) apresenta pouca mobilidade; dois deles (04 e 16), média mobilidade, e o outro (12), muita mobilidade. Os informantes da Região Central foram os que apresentaram o mais alto índice de marcação da CV nessa amostra, o que talvez não se 163 explique em função da mobilidade, já que todos eles, independentemente da categoria em que foram classificados, tenderam a preservar as marcas de CV. Os quatro últimos informantes fazem parte da comunidade de Belém. O informante 10 apresenta pouca mobilidade; o informante 02, média mobilidade; e os informantes 06 e 14, muita mobilidade. O que pudemos verificar é que os informantes que apresentam muita mobilidade são os que mais preservam as marcas de CV. Na verdade, o que esperávamos era que os informantes com pouca mobilidade também preservassem as marcas de CV, já que Belém é uma comunidade urbana e tende a valorizar traços lingüísticos formais como de prestígio. Indivíduo PESIMVF01 PESIMVS05 PESIFJF09 PESIMJS13 PECAMVF03 PECAFVS07 PECAFJF11 PECAFJS15 PERCFVF04 PERCFVS08 PERCFJF12 PERCFJS16 PEBEMVF02 Pouca mobilidade 44/50 88% 45/48 93% 61/64 41/47 54/64 95% 87% 84% 33/35 Média mobilidade 38/41 92% 37/41 90% 49/53 55/59 92% 93% 94% 62/63 49/57 23/26 301/334 49/53 92% 46/47 97% 56/59 151/159 94% 95% 98% 85% PEBEFVS06 PEBEMJF10 PEBEFJS14 Total Muita mobilidade 88% 90% 290/314 92% Tabela 3.30: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis indivíduo e redes sociais (mobilidade) 3.2.3 Variáveis geográficas Nesta pesquisa, consideramos as variáveis geográficas diatopia e diazonalidade. Nas rodadas estatísticas realizadas com o auxílio do Programa Goldvarb, nenhuma das duas foi selecionada. Vamos agora aos resultados e à discussão da variáveis diatopia e diazonalidade. 164 3.2.3.1 Diatopia A diatopia não foi selecionada como estatisticamente relevante pelo Programa Goldvarb. O que podemos observar nos resultados da tabela 3.31, abaixo, é que a região central foi a que mais preservou as marcas de CV com 94% de freqüência. Em seguida, temos Belém com 92% de freqüência de marcação da CV, Sintra com 91% de freqüência e, por último, temos Cascais com 89% de freqüência de marcação da concordância nos verbos. Diatopia Sintra Cascais Belém Região Central Apl/Total 164/180 205/228 174/189 199/210 % 91% 89% 92% 94% Total 742/807 91% Tabela 3.31: Freqüência de CV no PE, segundo a variável diatopia O que esperávamos para este grupo de fatores era que as localidades que fazem parte da zona urbana, Região Central e Belém, preservassem mais a CV. Nossa análise confirmou tais expectativas. A Região Central foi a que mais preservou a marcação da concordância nos verbos, o que mostra que ela é de fato mais urbanizada do que Belém, que, embora sendo urbana também, apresenta características um pouco distintas, como o fato de não ter acesso à localidade através de metrô, por exemplo. Belém é um dos centros turísticos mais importantes de Lisboa, o que faz com que tenha grande circulação de turistas, mas que, com o passar do tempo, perdeu muita população e comércio em detrimento das atividades turísticas. Em função da valorização do local, a população teve que ir morar em bairros vizinhos, pois as casas ficaram muito caras e o comércio do bairro teve que ir se adaptando aos novos tempos; o comércio em geral com lojas de móveis, roupas, sapataria, etc. deu lugar a lojinhas de artesanato e souveniers, restaurantes e bancos para servir ao turista. Em relação aos pontos não urbanos, Sintra e Cascais, os resultados também parecem evidenciar as peculiaridades de cada localidade. Sintra, embora seja uma vila rural, pacata, que vive basicamente do turismo, mas que ainda apresenta atividade agrícola, distingue-se de Cascais, que é uma vila basicamente pesqueira. 165 3.2.3.2 Diazonalidade Como evidenciamos anteriormente, a diazonalidade não foi selecionada pelo programa estatístico; portanto, a tabela 3.32, a seguir, apresenta os resultados apenas em termos de percentuais. Diazonalidade Zona urbana Zona não urbana Total Apl/Total 373/399 369/408 742/807 % 93% 90% 91% Tabela 3.32: Freqüência de CV no PE, segundo a variável diazonalidade Embora não tenha sido selecionado, o grupo de fatores diazonalidade foi ao encontro das nossas expectativas, já que os informantes da zona urbana usaram mais marcas de CV (93%) do que os informantes da zona não urbana (90%), como indica a tabela acima. 3.3 Síntese Evidenciamos, neste capítulo, a análise e discussão dos resultados referentes à amostra sincrônica do PB e do PE. Primeiramente, diante dos resultados da amostra do PB apresentados, constatamos que os ambientes lingüísticos favorecedores da marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural são os contextos em que há presença de acento na desinência, os ambientes em que o sujeito preenchido ou nulo apresenta antecedente com marca de plural, os contextos em que o verbo apresenta sujeito antecedente, em que apresenta sujeito com traço [+ humano], em que apresenta sujeito do tipo pronome pessoal e nos contextos em que os verbos são transitivos e intransitivos. Em relação aos resultados dos grupos de fatores extralingüísticos, aqui apresentados, verificamos que as características sociais e geográficas que favorecem a marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural, na amostra do PB, desta pesquisa, são: jovens com ensino superior, do sexo feminino, pertencentes a redes sociais mais ou menos integradas e com média mobilidade, moradores/nativos da Região Central, pertencentes à zona urbana. No que tange aos resultados do PE aqui apresentados, referentes às variáveis lingüísticas, identificamos como contextos lingüísticos favorecedores da marcação da 166 concordância verbal de terceira pessoa do plural verbos com sujeito com traço [+ humano], verbos com sujeito antecedente, verbos do tipo transitivo e intransitivo prototípico, os contextos em que há ausência de acento na desinência, verbos com sujeito nulo cujo antecedente apresenta marca de plural e verbos com sujeito do tipo pronome pessoal. No que se refere aos resultados dos grupos de fatores extralingüísticos, geográficos e sociais, aqui apresentados, constatamos que, na nossa amostra do PE, os informantes com as seguintes características mostraram maior favorecimento da marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural: jovens com ensino superior, do sexo feminino, pertencentes a redes sociais bem integradas e com muita mobilidade, moradores/nativos da Região Central, pertencentes à zona urbana. A seguir, apresentamos uma retomada das variáveis selecionadas nas amostras do PB e do PE, e resultados de uma nova rodada estatística dos dados do PE (rodada 2), discutimos alguns aspectos da sintaxe do português, analisamos e discutimos os resultados da nossa amostra diacrônica e relacionamos os problemas para a mudança lingüística (WLH, 1968) ao fenômeno da concordância verbal. 167 Capítulo IV – SOBRE CONDICIONAMENTOS SINCRÔNICOS E DIACRÔNICOS: ALGUMAS REFLEXÕES Neste capítulo, retomamos as variáveis selecionadas nas amostras do PB e do PE, analisadas no capítulo III, trazendo novas reflexões e questionamentos. Evidenciamos também a correlação entre os fenômenos de variação da concordância verbal, da ordem do sujeito e do preenchimento do sujeito na língua portuguesa, correlação que vem sendo atestada em alguns estudos. Traçamos, ainda, o percurso diacrônico do fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE (séculos XIX e XX). Por fim, discutimos os problemas empíricos para a mudança lingüística (WLH, 1968) relacionados ao objeto de estudo do nosso trabalho. 4.1 Retomada das variáveis selecionadas no PB e no PE Como apresentamos no capítulo III, os resultados gerais mostram um percentual de variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural distinto nas duas variedades do português analisadas no nosso trabalho. O PE mostrou-se mais conservador, como já esperávamos, com uma marcação de 91,95% de concordância nos verbos (dos 807 dados, 742 apresentaram marcas de plural). Os dados do PB também mostraram uma alta freqüência de marcação da concordância 80,6% (dos 794 dados, 640 apresentaram marcas de concordância), no entanto, comparativamente aos resultados do PE, a freqüência é mais baixa. Em relação à seleção das variáveis para as duas amostras analisadas, também observamos diferenças. Enquanto no PE temos os grupos de fatores condicionadores traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo e tipo de verbo como os mais relevantes; no PB, temos como condicionadores mais relevantes os grupos de fatores saliência fônica e paralelismo formal. Para a amostra do PB, tivemos dois grupos de fatores selecionados como relevantes (posição do sujeito em relação ao verbo e traço humano no sujeito), coincidentes com os grupos selecionados para a amostra do PE, com diferença na ordem de seleção. Dos grupos de fatores sociais controlados na nossa pesquisa, houve coincidência nos resultados para as duas amostras, tanto do grupo de fatores selecionado, quanto da ordem de seleção. O único grupo de fatores selecionado para as amostras do PB e do PE foi idade/escolaridade. Quanto aos grupos de fatores 168 geográficos, somente no PB um dos dois grupos controlados foi selecionado como estatisticamente relevante: a diatopia. A partir desses resultados gerais, observamos que duas das hipóteses delineadas neste trabalho, apresentadas na subseção 1.2.2, capítulo I, se confirmam. São elas: (i) A variação do fenômeno da concordância verbal é condicionada muito mais por grupos de fatores lingüísticos do que extralingüísticos, tanto no PB, quanto no PE (cf. MONGUILHOTT, 2001); (ii) Acreditamos que o PE se mostrará mais conservador na marcação da concordância verbal, apresentando freqüências maiores de marcas explícitas de plural nos verbos do que as freqüências que serão encontradas no PB (cf. NARO e SCHERRE, 2007). A seguir, retomamos as variáveis selecionadas nas amostras do PB e do PE, a fim de estabelecer comparações entre as duas variedades do português e, no fim da seção, levantamos algumas considerações e novas hipóteses. 4.1.1 Saliência Fônica O grupo de fatores saliência fônica foi selecionado como o mais relevante estatisticamente para a amostra do PB. Já para a amostra do PE, como indicamos anteriormente, a saliência fônica não foi selecionada como estatisticamente relevante101. Os resultados do PB indicaram que as formas mais salientes preservam mais as marcas de plural nos verbos, diferentemente das formas menos salientes, que favorecem uma queda maior das marcas de concordância nos verbos, confirmando nossas expectativas. Contrários às nossas hipóteses, os resultados do PE indicaram as formas mais salientes como desfavorecedoras da marcação de plural nos verbos e as formas menos salientes como favorecedoras da marcação, como apontam os resultados da tabela a seguir. Saliência Fônica Nível 1: Oposição não-acentuada Nível 2: Oposição acentuada Total PB Apl/Total = % 341/464 = 73% 299/330 = 90% PE Apl/Total = % 365/392 = 93% 377/415 = 90% 640/794 = 80% 742/807 = 91% Tabela 4.1: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 101 Para os grupos de fatores saliência fônica, paralelismo formal e diatopia, iremos ressaltar os resultados em termos percentuais, pois, para a amostra do PE, não temos, até neste momento, pesos relativos para comparar aos resultados do PB. 169 A distinção entre os resultados das duas amostras parece se explicar pelo fato de, no PE, os pares é/são, que são os mais salientes e estão no nível 2, oposição acentuada, não apresentarem o mesmo comportamento observado no PB. Para os falantes do PE, a não marcação da concordância nesses verbos não parece ter o estigma que há para outros casos de não concordância; por isso, o fato de ser recorrente na fala dos portugueses, inclusive dos mais escolarizados. Os estudiosos portugueses, que muitas vezes não admitem a variação na concordância verbal em outros contextos, chamam a atenção para a ausência de concordância nesses casos. A seguir, apresentamos alguns exemplos retirados da nossa amostra do PE em que os pares é/são não apresentam marcas explícitas de plural. (1) Como a maioria dos professores são catalães, é tudo em catalão, os textos é tudo em catalão (PERCFJS16) (2) Tenho família no Brasil também, tenho primos que tão lá....e, portanto, uma vez, veio cá um primo e eu fiquei assim quando fomos levá-lo ao aeroporto e ele vira-se pra mim e diz: vamos ali comprar balas? balas pra mim era pra pistolas, balas, balas é rebuçados pra vocês, né? é pra comer, pra que que o miúdo quer balas, queria matar quem? (PECAFVS07) (3) Os sonhos é assim umas bolinhas, ótimo, de massa que aquilo depois é frito e depois passa-se no açúcar e canela e as filhoses é assim compridas (PECAFJF11) Observamos que os dados em variação de concordância com verbos copulativos apresentam certas particularidades sintáticas que os distinguem dos demais. Na maioria dos casos, como nos exemplos de (1), (2) e (3), os sintagmas nominais: os textos, as balas, os sonhos e as filhoses, em geral, marcados com traço [- humano], parecem estar em uma posição de tópico102. É como se tivéssemos um pronome nulo neutro (como um isso) na posição do sujeito, como ilustram os dados reanalisados abaixo: (1’) Como a maioria dos professores são catalães, é tudo em catalão, os textos (isso tudo) é em catalão. 102 Consultamos uma lingüista portuguesa, Profa. Dra. da Universidade Nova de Lisboa, Maria Lobo, a respeito da sua intuição quanto a essas construções sem marcação na concordância com verbos copulativos. No exemplo (1), para a lingüista, temos a concordância do ser com o sujeito tudo e os textos funciona como tópico, construção, segundo ela, freqüente na fala, inclusive, de pessoas escolarizadas. Quanto ao exemplo (2), de acordo com Maria Lobo, balas também seria tópico e o sujeito da frase seria um pro neutro isso. Em relação ao exemplo (3), a lingüista afirma que, na primeira coordenada, os sonhos também é considerado tópico, já na segunda coordenada, é mais difícil, segundo ela, fazer essa análise em função da concordância no predicativo compridas. 170 (2’) Tenho família no Brasil também, tenho primos que tão lá....e, portanto, uma vez, veio cá um primo e eu fiquei assim quando fomos levá-lo ao aeroporto e ele vira-se pra mim e diz: vamos ali comprar balas? balas pra mim era pra pistolas, balas, balas (isso) é rebuçados pra vocês, né? (isso) é pra comer, pra que que o miúdo quer balas, queria matar quem? (3’) Os sonhos (isso) é assim umas bolinhas, ótimo, de massa que aquilo depois é frito e depois passa-se no açúcar e canela e as filhoses (isso) é assim compridas. Como não levamos em conta, na nossa análise, a distinção entre tópico e sujeito, o que pretendemos investigar futuramente, resolvemos fazer um refinamento da análise com mais uma rodada (doravante rodada 2) desconsiderando o verbo cópula, para que pudéssemos observar o comportamento do grupo de fatores saliência fônica e também o do grupo tipo de verbo, que será analisado posteriormente, sem a interferência desses contextos específicos. Na amostra do PB, também encontramos uma construção com verbo copulativo sem marcação de concordância, em que o sujeito parece estar na posição de tópico, como o exemplo (4) a seguir, falado por um informante mais velho, em que há, inclusive, uma pausa entre o sujeito e o verbo, o que contribui para confirmar a hipótese de o SN ser tópico. (4) Eu sou católico, não vou deixar a minha pelas outra, não vou dizer que as outra Ø é ruim, minha família é tudo espírita, a mulher não é e a irmã não é, as outra são da espírita (PBRIMVF01) (4’) Eu sou católico, não vou deixar a minha pelas outra, não vou dizer que as outra, (isso) é ruim, minha família é tudo espírita, a mulher não é e a irmã não é, as outra são da espírita. Vale lembrar que a freqüência de uso dessas construções com SN [- humano] sem marcação de concordância é bem mais recorrente no PE do que no PB103 A seguir, apresentamos exemplos em que o sujeito parece estar topicalizado também, mas os verbos exibem marcas de plural, o que evidencia variação nesses casos, tanto para o PE (exemplos 5 e 6), quanto para o PB (exemplos 7 e 8). 103 No PE, temos 16 (dezesseis) dados com construções com verbos copulativos correspondentes aos pares é/são com SN [- humano] sem concordância verbal, enquanto no PB, temos 05 (cinco) dados. Também encontramos construções com verbos copulativos correspondentes aos pares era/eram com SN [- humano] sem marcação da concordância, no PE temos 05 (cinco) dados e no PB 04 (quatro). 171 (5) As viagens são caríssimas104 (PERCFJS16) (6) As médias de cá são de zero a vinte (PERCFJS16) (7) As coisas, elas são tão misturadas (PBRIMJS13) (8) Estudos de gênero são estudos de sexualidade (PBRCMJS16) O fato de encontrarmos variação na concordância com construções com verbos copulativos com tópico na amostra do PB, à semelhança da amostra do PE, no entanto, com apenas um dado de fala de um informante mais velho sem marcação da concordância, parece trazer evidência de que aquelas construções sem marcação de concordância podem ser resquícios de uma gramática do PE. No que se refere ao grupo de fatores saliência fônica, na rodada em que excluímos os verbos copulativos (rodada 2), a variável passou a ser selecionada como estatisticamente relevante em terceiro lugar105. Na tabela 4.2, a seguir, podemos observar que, na rodada em que não consideramos os verbos copulativos, a escala da saliência encontrada continua não correspondendo aos resultados de Naro (1981) e de Scherre e Naro (1997), assim como na rodada em que consideramos os verbos copulativos (rodada 1). No entanto, considerando apenas o nível 2, a escala nos dados do PE obedece a um aumento crescente da concordância à medida que os itens ficam mais salientes, o que não ocorreu na rodada 1. Comparando os resultados do PE aos nossos resultados da amostra do PB, observamos que, no nível 1, há uma diferença mais acentuada entre os resultados, em relação ao nível 2, em que a hierarquia ficou bastante parecida, principalmente, no que se refere aos pesos relativos. 104 De acordo com a lingüista portuguesa Maria Lobo, nessas construções com predicativo plural, há estigma se não há concordância verbal. 105 Na rodada 2, sem os verbos copulativos, os seguintes grupos de fatores foram selecionados pelo Goldvarb, obedecendo a respectiva ordem de relevância: posição do sujeito em relação ao verbo, diazonalidade, saliência fônica e traço humano no sujeito. 172 Nível 1: Oposição não-acentuada a. não envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural c. envolve acréscimo de segmentos na forma plural Nível 2: Oposição acentuada a. envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural c. envolve acréscimos de segmentos e mudanças diversas na forma plural Total PB Apl/Total=% 19/89 = 21% PR .04 PE Apl/Total=% 61/65=93% PR .41 274/324=84% .50 210/219=95% .48 48/51=94% .74 71/75=94% .12 Apl/Total=% 73/87=83% PR .48 Apl/Total=% 48/51=94% PR .22 64/68=94% .74 143/146=97% .79 162/175=92% .69 50/51=98% .75 640/794=80% 583/607=96% Tabela 4.2: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável saliência fônica na rodada sem verbos copulativos para a amostra do PE Já na tabela 4.3, a seguir, podemos observar que, na rodada 2, os resultados passam a corresponder aos resultados do PB com a oposição não-acentuada apresentando freqüência de uso da concordância verbal menor do que a apresentada na oposição acentuada, diferentemente do que os resultados da rodada 1 indicaram, conforme apresentado na tabela 4.1 em que a oposição não-acentuada favorecia a marcação da concordância verbal. Saliência Fônica Nível 1: Oposição não-acentuada Nível 2: Oposição acentuada Total PB Apl/Total = % 341/464 = 73% 299/330 = 90% PE Apl/Total = % 342/359 = 95% 241/248 = 97% 640/794 = 80% 583/607 = 96% Tabela 4.3: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável saliência fônica com amálgama dos fatores do nível 1 e nível 2 na rodada sem verbos copulativos para a amostra do PE É possível, portanto, que as construções com verbos copulativos, como as apresentada em (1’), (2’) e (3’), com sujeito topicalizado, que pode ser retomado por um pronome nulo neutro (isso), sejam estruturas sintáticas diferentes no PE e que na análise anterior (rodada 1) tenham contribuído para um enviesamento dos resultados. 173 4.1.2 Paralelismo formal O paralelismo formal, no nível clausal, foi o segundo grupo de fatores selecionado na amostra do PB. Já para o PE esse grupo de fatores não foi selecionado, em nenhuma de nossas rodadas (rodada 1 e rodada 2). Na amostra do PE, não foram encontrados dados para todos os fatores controlados, assim vamos comparar os resultados para os fatores que apresentaram dados nas duas variedades. Os resultados, tanto para o PB, quanto para o PE, mostram que, quando há presença da forma de plural explícita no último elemento, com sujeito preenchido ou nulo, há maior marcação de plural nos verbos, diferentemente de quando há presença da forma zero de plural no último elemento, como mostram os resultados da tabela a seguir. Paralelismo Formal Presença da forma de plural explícita no último elemento Presença de numeral no último elemento Presença da forma zero de plural no último elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita Sujeito nulo com anafórico com presença de numeral terminado em /s/ no último elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de zero plural Total PB Apl/Total = % 418/483 = 86% PE Apl/Total = % 398/454 = 87% 20/33 = 60% 52/100 = 52% _____ 4/5 = 80% 128/148 = 87% 340/348 = 97% 4/5 = 80% _____ 17/25 = 68% _____ 640/794 = 80% 742/807 = 91% Tabela 4.4: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável paralelismo formal Os resultados indicam que há diferenças nas duas amostras em termos percentuais. Embora a hierarquia entre os fatores permaneça a mesma, há uma diferença maior no PB para os fatores presença da forma zero de plural no último elemento e presença da forma de plural explícita no último elemento (com sujeito preenchido e nulo). No PB, a diferença é de 86% e 87% para 52%; e no PE, de 87% e 97% para 80%. O que parece explicar é o fato de não haver praticamente variação na concordância nominal no PE, não existindo, assim, chances de uma menor marcação da concordância nos verbos com presença da forma zero de plural no último elemento. 174 Outra diferença, em termos percentuais, observada é o fato de no PE o sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita apresentar índice de marcação bem maior (97%) do que o índice apresentado no PB (87%), em comparação com o fator presença da forma de plural explícita no último elemento com sujeito preenchido (87% no PE, 86% no PB). Aqui parece que o que está influenciando a marcação é o sujeito nulo que apresenta comportamento diferente nas duas variedades do português. Enquanto o PE apresenta maiores índices de sujeito nulo, o PB prefere os sujeitos preenchidos (cf. DUARTE 1995, 1997, 2004). 4.1.3 Posição do sujeito em relação ao verbo Para o PB, a posição do sujeito em relação ao verbo foi o terceiro grupo de fatores selecionado e, para o PE, o segundo na rodada 1 e na rodada 2 foi o primeiro a ser selecionado106. Embora a ordem de seleção desta variável tenha sido diferente para as duas amostras analisadas, podemos observar que, a freqüência e a probabilidade de marcação da concordância apresentaram a mesma hierarquia com o sujeito anteposto preservando as marcas de plural nos verbos, ao contrário do sujeito posposto, como os resultados da tabela a seguir evidenciam. Posição do sujeito SN anteposto SN posposto Total PB Apl/Total = % PR 464/546 = 84% .57 23/67 = 34% .08 487/613107 = 79% PE Apl/Total = % PR 354/381 = 92% .56 43/72 = 59% .18 397/453 = 87% Tabela 4.5: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável posição do sujeito em relação ao verbo 4.1.4 Traço humano no sujeito O grupo de fatores traço humano no sujeito foi selecionado como estatisticamente relevante em primeiro e quarto lugar na amostra do PE (rodadas 1 e 2108) e em quinto lugar na amostra do PB. Nas duas amostras, a hierarquia, tanto em termos percentuais, quanto em termos de probabilidade, foi a mesma, com o SN com 106 Na rodada 2, os resultados mantêm a mesma curva dos resultados da rodada 1, com o SN [+ anteposto] preservando as marcas de concordância verbal. 107 Vale observar que para esse grupo de fatores, temos um total diferente de dados, pois os dados de sujeito nulo não puderam ser considerados. 108 Na rodada 2, os resultados mantêm a mesma curva dos resultados da rodada 1, com o SN [+ humano] preservando as marcas de concordância verbal. 175 traço [+ humano] tendendo a preservar as marcas de plural nos verbos, diferentemente do SN com traço [- humano], como podemos observar nos resultados da tabela a seguir. Traço humano no sujeito SN [+humano] SN [-humano] Total PB Apl/Total = % PR 588/701 = 83% .56 52/93 = 55% .12 640/794 = 80% PE Apl/Total = % PR 632/653 = 96% .61 110/154 = 71% .11 742/807 = 91% Tabela 4.6: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável traço humano no sujeito 4.1.5 Tipo de verbo O grupo de fatores tipo de verbo foi o terceiro a ser selecionado na amostra do PE (rodada 1) e na amostra do PB não foi selecionado nas rodadas gerais, apenas nas rodadas em que excluímos os grupos de fatores posição do sujeito em relação ao verbo e traço humano no sujeito, quando foi selecionado em quinto lugar. O mesmo aconteceu com a amostra do PE na rodada 2, quando o tipo de verbo foi selecionado em segundo lugar quando excluímos os grupos posição do sujeito em relação ao verbo e traço humano no sujeito109. Para os resultados do PE, o verbo cópula foi o que se mostrou o menos favorecedor da marcação de plural nos verbos, seguido dos inacusativos prototípicos. Já para os resultados do PB, foi o verbo inacusativo o que se mostrou menos favorecedor da marcação da concordância verbal, tanto os inacusativos não-prototípicos, quanto os prototípicos. Podemos observar os resultados na tabela a seguir. 109 Nessas rodadas, em que excluímos os verbos copulativos e os grupos de fatores posição do sujeito em relação ao verbo e traço humano no sujeito, os seguintes grupos de fatores são selecionados pelo Goldvarb, obedecendo a respectiva ordem de relevância: paralelismo formal, tipo de verbo, diazonalidade e saliência fônica. 176 Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico PB Apl/Total = % 303/363 = 83% .62 70/85 = 82% .58 17/21 = 80% .74 80/96 = 83% .38 21/27 = 77% .27 149/202 = 73% .30 PE Apl/Total = % 319/325 = 98% .60 57/58 = 98% .63 12/13 = 92% .20 159/199 = 79% .28 41/45 = 91% .54 154/167 = 92% .41 Total 640/794 = 80% 742/807 = 91% Tabela 4.7: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável tipo de verbo Na tabela a seguir, podemos observar os resultados para o grupo tipo de verbo na rodada 2. Verificamos, através dos resultados, que sem os verbos copulativos e com os verbos inacusativos prototípicos e não-prototípicos amalgamados e com verbos intransitivos prototípicos e não prototípicos também amalgamados, os resultados da amostra do PB e do PE se assemelham. Temos, de um lado, os verbos transitivos (e intransitivos) como favorecedores da marcação da concordância verbal e, de outro lado, os verbos inacusativos como ambientes menos favorecedores dessa marcação. Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo Verbo inacusativo Total PB Apl/Total = % 302/362 = 83% .61 87/106 = 82% .61 170/229 = 74% .27 559/697=80% PE Apl/Total = % 319/324 = 98% .63 69/71 = 97% .50 195/212 = 91% .30 583/607=96% Tabela 4.8: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável tipo de verbo na rodada sem verbos copulativos para ambas as amostras Pudemos observar, através dos resultados dos grupos de fatores posição do sujeito em relação ao verbo, traço humano no sujeito e tipo de verbo, semelhanças existentes entre as duas variedades do português aqui investigadas. A seguir, trazemos alguns exemplos da nossa amostra, com sujeito [- humano] posposto a verbos inacusativos, ambientes que, de fato, se mostram desfavorecedores da não concordância, tanto no PB, quanto no PE. (9) Sempre existe aquelas conversas, né? (PBRIMJS13) (10) Então às vezes aqui acontece alguns casos (PBRIMJS13) 177 (11) Aí começou os horário de cinco e meia (PBCLFVS07) (12) Já existe trilhas ecológicas (PECAFJS15) (13) Depois surgiu as carroças, os burros (PESIMJS13) (14) Dia dois, eu acho, já começa as aulas (PECAFJF11) Podemos observar nos exemplos de (9) a (14) que há verbos menos salientes sem concordância como existe, acontece e começa e há verbos mais salientes sem concordância como começou e surgiu. Diante desses dados, resolvemos fazer um cruzamento entre as variáveis saliência fônica e posição do sujeito em relação ao verbo, para que pudéssemos verificar a força dessas variáveis. Nível 1: Oposição nãoacentuada a. não envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural c. envolve acréscimo de segmentos na forma plural Nível 2: Oposição acentuada a. envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural c. envolve acréscimos de segmentos e mudanças diversas na forma plural Total PB SN anteposto 11/20=55% PB SN posposto 1/9=11% PE SN anteposto 34/35=97% PE SN posposto 2/5=40% 201/221=91% 7/30=23% 108/114=95% 12/24=50% 37/39=95% _____ 33/36=92% _____ Apl/Total=% Apl/Total=% Apl/Total=% Apl/Total=% 60/68=88% 0/5=0% 33/35=94% 1/5=20% 41/43=95% 5/6=83% 64/66=97% 16/19=84% 114/120=95% 10/17=59% 82/95=86% 12/19=63% 464/546=85% 23/67=34% 354/381=93% 43/72=60% Tabela 4.9: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e saliência fônica com verbos copulativos110 Os resultados da tabela 4.9 evidenciam que tanto a variável saliência fônica, quanto a variável posição do sujeito em relação ao verbo se mostram relevantes no condicionamento da concordância verbal. Observamos que, por um lado, em todas as 110 Fizemos o cruzamento entre as variáveis excluindo os verbos copulativos; como os resultados se mostraram bastante semelhantes, apresentamos a tabela apenas em anexo (tabela 4.9’). 178 categorias com sujeitos pospostos há menos marcação da concordância, comparadas às categorias com sujeitos antepostos. Por outro lado, a concordância vai diminuindo à medida que a saliência vai aumentando; a diferença, em termos percentuais, nos itens menos salientes, nível 1, categorias (a) e (b), fica entre 44% e 68% para o PB e 57% e 45% para o PE. Já a diferença para os itens mais salientes, nível 2, categorias (e) e (f) fica entre 12% e 36% para o PB e 13% e 23% para o PE. Não há dúvidas de que há variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural quando o sujeito, argumento interno de um verbo inacusativo, marcado com traço [- humano], estiver posposto. Essa variação encontra-se nas duas variedades do português (PB e PE). 4.1.6 Idade/escolaridade O grupo de fatores idade/escolaridade foi o quarto a ser selecionado, tanto na amostra do PB, quanto na do PE. Os resultados mostram caminhos diferentes para as duas amostras. No PB, tanto no nível superior, quanto no nível fundamental, os mais jovens tendem a preservar mais as marcas de CV do que os mais velhos. Já no PE, no ensino superior, os mais jovens preservam mais a CV do que os mais velhos, mas no ensino fundamental os informantes mais velhos preservam mais as marcas de CV do que os mais jovens. Idade/escolaridade Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Total PB Apl/Total = % 225/252 = 89% 172/195 = 88% 115/158 = 72% 128/189 = 67% PR .74 .52 .32 .28 PE Apl/Total = % 204/216 = 94% 158/170 = 92% 171/191 = 89% 209/230 = 90% 640/794 = 80% PR .61 .59 .30 .49 742/807 = 91% Tabela 4.10: Freqüência e probabilidade de CV no PB e no PE, segundo a variável idade/escolaridade Fizemos um cruzamento entre os grupos de fatores idade/escolaridade e diazonalidade, a fim de verificar se a hipótese (iii) seria confirmada: (iii) No que se refere ao recorte sincrônico do PB e do PE, nossa hipótese em relação às duas faixas etárias controladas, jovens e velhos, relaciona-se à diazonalidade. Esperamos que os jovens da zona não urbana preservem mais as marcas de concordância verbal do que os velhos desta mesma zona. Já no que se refere à zona 179 urbana, acreditamos que os mais velhos preservem mais a concordância verbal (cf. LUCCHESI, 2006). No PB, os resultados confirmam a hipótese apenas com os falantes da zona não urbana com escolaridade fundamental, em que os jovens preservam mais a concordância (65%) do que os mais velhos (59%). Já no PE, a hipótese é confirmada apenas com os falantes da zona não urbana com escolaridade superior, em que os jovens também preservam mais a concordância (91%) do que os mais velhos (90%). Idade/escolaridade Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Total PB Zona não urbana 150/175 86% 90/103 87% 46/71 65% 48/82 59% 334/431 77% PB Zona urbana 75/77 97% 82/92 89% 69/87 79% 80/107 75% 306/363 84% PE Zona não urbana 86/94 91% 79/88 90% 99/112 88% 105/114 92% 369/408 90% PE Zona urbana 118/122 97% 79/82 96% 72/79 91% 104/116 90% 373/399 93% Tabela 4.11: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade 4.1.7 Diatopia A análise estatística selecionou a diatopia como o sexto e último grupo de fatores relevante para o PB; já para o PE, o grupo de fatores não foi selecionado. Como evidenciamos ao longo deste trabalho, buscamos, na seleção das localidades do PB e do PE, constituir amostras o mais comparáveis possível. Desta forma, temos para as duas variedades do português duas localidades da zona urbana, Região Central e Ingleses para o PB e Região Central e Belém para o PE, e duas localidades da zona não urbana, Ribeirão da Ilha e Costa da Lagoa para o PB e Sintra e Cascais para o PE. Na tabela a seguir, podemos observar os resultados para as duas amostras. Diatopia Ribeirão da Ilha Costa da Lagoa Ingleses Região Central Total Apl/Total 155/188 82% 179/243 73% 134/172 77% 172/191 90% 640/794 80% Diatopia Sintra Cascais Belém Região Central Total Apl/Total 164/180 91% 205/228 89% 174/189 92% 199/210 94% 742/807 91% Tabela 4.12: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo a variável diatopia 180 Verificamos que, tanto para o PB, quanto para o PE, a Região Central apresenta o maior percentual de marcação da concordância nos verbos, 90% e 94%, respectivamente. Em relação à outra localidade da zona urbana, para o PE os resultados mostram que temos a segunda maior freqüência de uso da concordância (Belém com 92% de freqüência); já para o PB, tal localidade teve a terceira maior freqüência (Ingleses com 77% de freqüência). No que se refere às localidades da zona não urbana, no PE temos as menores freqüências de uso, 91% para Sintra e 89% para Cascais. Já para o PB temos a segunda maior freqüência de uso para uma das localidades, Ribeirão da Ilha com 82%, e a menor freqüência de uso para a localidade da Costa da Lagoa, 73%. Embora o grupo de fatores diatopia não tenha sido selecionado para a amostra do PE, os resultados confirmaram nossas expectativas, já que as localidades da zona urbana preservaram mais as marcas de concordância verbal em relação às localidades da zona não urbana. Por outro lado, para a amostra do PB, mesmo a diatopia tendo sido selecionada, os resultados confirmaram parcialmente nossas expectativas, já que uma das localidades da zona urbana, Ingleses, apresentou freqüência de uso menor do que uma das localidades da zona não urbana, Ribeirão da Ilha. O que parece justificar os resultados para o PB são as características da localidade Ingleses, que foi considerada zona urbana em função da alta densidade demográfica e do intenso comércio e turismo na região; no entanto, a população nativa de modo geral, ainda, caracteriza-se como a de tempos atrás em que a comunidade se mostrava bastante isolada e com costumes menos urbanos. 4.1.8 Algumas considerações Como vimos ao longo desta seção, os resultados sincrônicos da nossa pesquisa apontam semelhanças e diferenças entre as duas variedades do português que fazem parte da nossa amostra: PB e PE. Em termos de semelhanças, observamos que, tanto na amostra do PB, quanto na amostra do PE, temos determinados contextos desfavorecendo a concordância verbal, sujeitos com traço [- humano] pospostos a verbos inacusativos. No que se refere às diferenças, temos o fato de o PE apresentar, em termos percentuais, maior tendência ao uso da concordância verbal, ao contrário do PB, que apresenta maior variação no fenômeno em estudo. Tais resultados parecem indicar que 181 o processo de variação a caminho de uma possível mudança na concordância verbal está mais avançado no PB, já que há um número maior de contextos atingidos pela variação nessa variedade do português. Observamos, também, que a seleção dos condicionadores da marcação da concordância é distinta para o PB e o PE. Enquanto o PE apresenta como condicionadores mais relevantes as variáveis sintáticas traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo, tipo de verbo, o PB apresenta a variável morfofonológica saliência fônica como o condicionador mais importante. Vale ressaltar que a variável saliência fônica também se mostra relevante no condicionamento da variação no PE quando excluímos os dados de verbos copulativos, momento em que o tipo de verbo passa a não mais ser selecionado. Esses resultados nos fazem pensar se o início da variação na concordância verbal no português se dá pela fonologia ou pela sintaxe da língua. De acordo com Naro (1981), retomado em Naro e Scherre (2007), o início do fenômeno da concordância deu-se no nível fonológico. Os resultados dos autores comprovam que, tanto no PB, quanto no PE, houve desnasalização em toda a escala da saliência fônica proposta em Naro (1981), que se inicia no plano fonético-fonológico e se expande para o plano morfossintático. Já para Lucchesi (2006), como evidenciamos no capítulo I, a variação na concordância verbal parece ter “sido determinada, em suas origens, pela posição do sujeito relacionada à inacusatividade verbal; e essa variação pode ter sido intensificada por um eventual processo de enfraquecimento fonético da nasalidade do segmento final, na norma culta do PB” (op. cit., p.99). Nossos resultados em termos da seleção das variáveis no condicionamento da concordância associados às freqüências de uso nas duas variedades, de um lado, considerando apenas a rodada 1, nos fazem acreditar que os contextos sintáticos são os primeiros a serem atingidos no processo de variação e mudança desse fenômeno, para que, depois, os contextos morfofonológicos passem a ser atingidos, confirmando a hipótese de Lucchesi. Por outro lado, considerando a rodada 2, em que em termos de seleção de contextos sintáticos, não temos mais a posição relacionada à inacusatividade verbal condicionando a variação da concordância no PE, e temos a saliência exercendo papel importante no condicionamento dessa variação, parece que nossa análise confirma a hipótese de Naro (1981) também. 182 Considerando então as rodadas 1 e 2, o que se mostra é uma confluência das duas hipóteses, pois parece haver, nas duas variedades do português, enfraquecimento fonético da nasalidade e enrijecimento de uma construção VSN que não discrimina a não marcação da concordância verbal, por ser considerada uma construção VO associada à inacusatividade verbal. 4.2 Análise diacrônica do PB e do PE Evidenciaremos aqui a análise diacrônica do PB e do PE a partir da nossa amostra, definida no capítulo II, com o intuito de observar o que está acontecendo com a sintaxe do PB e do PE ao longo dos séculos111. Nossa amostra diacrônica, conforme apontamos na seção 2.4, constitui-se de 14 peças de teatro de autores catarinenses, para o PB, e 14 peças de autores portugueses, para o PE. Dessas 14 peças de cada variedade do português, 5 foram escritas no século XIX e 9 no século XX. Em relação aos resultados gerais, temos, para o PB no século XIX, um total de 197 dados de variação na concordância verbal, dos quais apenas 02 não apresentam marcas de concordância. No século XX, temos um total de 352 dados, dos quais 12 sem marcas de plural nos verbos. Podemos observar o total de dados levantados em cada peça analisada e os dados sem marcas de concordância nos verbos encontrados no quadro a seguir. 111 Vale ressaltar que não iremos controlar grupos de fatores condicionadores na nossa análise diacrônica, em função do pequeno número de dados encontrado. Acreditamos que, se a nossa amostra fosse constituída de outros gêneros textuais, talvez tivéssemos mais dados. Esperamos investir na ampliação da amostra em investigações futuras. 183 Quadro 4.1: Dados diacrônicos do PB Ano Século XIX 1859 1867 1868 1880 1890 TOTAL Século XX 1918 1920 1928 1939 1942 1954 1970 1982 1993 TOTAL TOTAL Peça / Autor Dados totais Dados sem CV Brinquedos de Cupido Antero dos Reis Dutra (1829-1865) A Casa para Alugar José Cândido Lacerda Coutinho (1842-1900) Raimundo (2o Ato / 1o Quadro) Álvaro Augusto de Carvalho (18291865) Os Ciúmes do Capitão Arthur Cavalcanti do Livramento (1872) O Idiota Horácio Nunes (1855-1919) 05 peças 44 dados - 25 dados - 70 dados 02 dados 23 dados - 35 dados - 197 dados 02 dados 35 dados 02 dados 23 dados - 32 dados 03 dados 29 dados - 40 dados - 27 dados - 52 dados 02 dados 48 dados 01 dados 66 dados 04 dados 352 dados 590 dados 12 dados 14 dados Waltrudes, o nauta veneziano Ildefonso Juvenal (1894-1965) Jardim Maravilhoso Clementino de Britto (1879-1953) Ilha dos Casos Raros Nicolau Nagib Nahas (1890-1934) Reconciliação João Antonio Vecchione ??? O Colar de Pérolas Ildefonso Juvenal (1894-1965) A Morte de Damião Ody Fraga (1927-1987) A Estória Ademir Rosa (1949-1997) O Dia do Javali Mário Júlio Amorim (1939) Stradivarius Augusto Miltom de Sousa (1944) 09 peças 14 peças No que se refere ao PE, temos, para o século XIX, 209 dados com 100% de marcação de plural nos verbos. No século XX, temos 371 dados, dos quais 03 184 apresentam marcas zero de plural nos verbos. No quadro abaixo, observamos o total de dados levantados nas peças que fazem parte da amostra do PE, assim como os dados sem marcas de concordância verbal. Quadro 4.2: Dados diacrônicos do PE Ano Século XIX 1859 1865 1868 1879 1894 TOTAL Século XX 1918 1923 1928 1934 1945 1953 1977 1986 1997 Peça / Autor Dados totais Dados sem CV O Último Acto Camilo Castelo Branco (Lisboa, 1825-1890) J.R. Luís de Araújo (Portalegre,1833-1906) Para as Eleições Júlio César Machado (Lisboa, 1835-1890) Paris em Lisboa Carlos de Moura Cabral (Lisboa, 1852-1922) O festim de Baltasar Gervásio Lobato (Lisboa, 1850-1895) 05 peças 34 dados - 66 dados - 23 dados - 31 dados - 55 dados - 209 dados - 57 dados 01 dado 24 dados - 26 dados - 25 dados - 40 dados - 50 dados - 58 dados 02 dados 46 dados - 45 dados - O Fim Antônio Patrício (Lisboa, 1978-1930) O Doido e a Morte Raul Brandão (Foz de Douro, 1867-1930) Lua-de-mel Vitoriano Braga (Lisboa, 1888-1940) A Prima Tança Alice Ogando (Lisboa, 1900-1981) Balada de outuno Carlos Selvagem (Lisboa, 1890-1973) Casaco de Fogo Romeu Correia (Almada ,1917) O homem da bicicleta Jaime Gralheiro (S. Pedro do Sul, 1930) D. João no jardim das delícias Norberto Ávila (Angra do Heroísmo - Açores, 1936) Fumos de glória António Faria (Amarante, 1942) 185 TOTAL TOTAL 09 peças 14 peças 371 dados 580 dados 03 dados 03 dados A seguir, iremos analisar os dados diacrônicos que não apresentaram marcas de concordância nos verbos. Primeiramente, pretendemos verificar se a hipótese levantada em 1.2.3 se confirma: (v) No que tange ao recorte diacrônico, tanto do PB, quanto do PE, acreditamos que os resultados apresentarão aumento da variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural do século XIX para o século XX. Em seguida, pretendemos verificar, de um lado, se há, no século XIX, indícios de um sistema com concordância obrigatória com sujeito posposto, já que, conforme aponta Coelho (2008), temos mais possibilidade de posposição nesse período, tanto para o PB, quanto para o PE, o que, de certa forma, facilitaria o reconhecimento do sujeito invertido como sujeito da sentença pelos falantes favorecendo, assim, a marcação da concordância verbal. Por outro lado, vamos observar se há, no século XX, um sistema com concordância variável com sujeito posposto no PB, pois, com o passar dos séculos, a ordem sujeito-verbo foi ficando cada vez mais enrijecida e os indivíduos passaram a “confundir” o sujeito posposto com o objeto da sentença. No PE, acreditamos que o sistema do século XIX continue atuando. No século XIX, para a amostra do PB, temos dois dados sem concordância: (18) João André: Eu te conheço; ficarias vermelho. Olha Raimundo, nós marinheiros, nós que nos criamos sobre o convés, não devemos abaixar a cabeça diante dessa súcia de biltres que não nos valem, nem no corpo, nem n’alma: não nos misturemos, Raimundo; sejamos, sempre, francos marujos, e bons camaradas. E com um milhão de diabos, quando alguém se engrilar mostra-se-lhe os dez mandamentos. (Peça: Raimundo, 1868, p.40) (19) D. Manoel: É o que acontece sempre que se vive em contato imediato com o povo; toma-se amizades...relações, e esquece a gente o que deve ao seu nome (Peça: Raimundo, 1868, p.58) 186 Os dados acima indicam que, no PB, encontramos casos de falta de concordância nos verbos no século XIX, diferentemente do PE, que não apresentou qualquer caso de ausência de concordância. Observamos, tanto no exemplo (18), quanto no (19), que são casos de verbos inacusativos com sujeito posposto com traço [humano], ambiente que também se mostrou desfavorecedor da concordância na nossa análise sincrônica. Ainda com relação à amostra do PB, temos 13 dados sem concordância no século XX: (20) Paulo: Emquanto o homem possue dinheiro è considerado na Sociedade. Mil aduladores o cerca (Peça: Waltrudes, o nauta veneziano, 1918, p.62). (21) Walfrides: Elle è pobre, mas existe tantos pobres que julgam-se felizes no mundo (Peça: Waltrudes, o nauta veneziano, 1918, p.67). (22) Policia: São tanta as arruaça, os otomóve véve sempre a corrê que inté parece um raio. Estes chofre precisa mêmo dum acorretivo (Peça: Ilha dos Casos Raros, 1928, p.40). (23) Mulher: É, os primeiros pingos de chuva começa a cair. Preciso ir. (Peça: A Estória, 1970, p.10). (24) Mulher: Minha religião e educação não permite. (Peça: A Estória, 1970, p.21) (25) Homem: Você sabe, é cada vez mais acidentes, mais crimes, guerras... (Peça: O Dia do Javali, II ato, 1982, p.42) (26) Curió: Mas tinha que acontecer estas coisas comigo hoje. (Peça: Stradivarius, 1993, p.08) (27) Moambeiro: Eles pensam que é assim. Sai por aí atropelando a mãe dos outros e não dão a mínima satisfação. (Peça: Stradivarius, 1993, p.15). 187 (28) Curió: E se o meu nome e a minha cara aparece no jornal, eles logo pensam que eu tenho grana (Peça: Stradivarius, 1993, p.24). (29) Uma voz: Nisso aparece a cara do repórter e da fotógrafa na boca do senário. Peça: Stradivarius, 1993, p.30) Observamos, na nossa amostra do século XX, do PB que nos dados em (21), (25), (26) e (29), temos casos de falta de concordância nos verbos com sujeito posposto. Assim como no século XIX, todos os verbos de sujeito posposto são inacusativos com sujeitos [- humanos]. Os dados em (23), (27) e (28) também apresentam ausência de concordância em ambiente inacusativo, no entanto, com sujeito anteposto ou nulo. Em (20) e (24), não temos casos de verbos inacusativos; o que observamos é que, assim como alguns dos outros dados de verbos inacusativos (como em (21), (23), (26), (27), (28) e (29)), são verbos que apresentam pouca saliência fônica, o que talvez também favoreça a falta de concordância na escrita. O dado em (22) apresenta uma fala visivelmente estigmatizada. Embora saibamos que os dados possam ser propositais, inserimos na nossa amostra justamente para comprovar que os autores das peças de teatro têm consciência de que retratam determinadas falas e que esses textos retratam hipóteses de falantes da língua quanto ao uso variável da concordância verbal. Como evidenciamos anteriormente, no que se refere à amostra do PE, no século XIX, temos 100% de concordância nos verbos. Já no século XX, temos 03 dados sem marcas de concordância: (30) A Rainha – Duque! Amanhã na recepção, não quero cruzes / Cruzes, grã-cruzes, sempre cruzes... Não, não... Faz-me lembrar enterros, muitas luzes... (Peça: O Fim, 1918, p.29) (31) Mulher – Mas com este tempo aquilo não é um caminho! É um lodaçal. Já lá ficou afogago, na lama, um homem e um burro. (Peça: O homem da bicicleta, 1978, p.08) (32) Camponês – Ai, então vocemecê quer saber p’ra que serve a Junta e o Grêmio? (Peça: O homem da bicicleta, 1978, p.24) 188 Assim como esperávamos, temos ausência de concordância com sujeito posposto no século XX. Dos três dados sem marcação de concordância no PE, dois deles (31) e (32) apresentam ausência de concordância com sujeito invertido; apenas no dado (30), o sujeito está anteposto ao verbo. Vale lembrar que, no entanto, Cruzes, grãcruzes, sempre cruzes.... é um sintagma [- humano], está deslocado, numa posição possivelmente de tópico, com a possibilidade de um sujeito neutro nulo, do tipo isso, como nos dados de fala. (30’) A Rainha – Duque! Amanhã na recepção, não quero cruzes / Cruzes, grãcruzes, sempre cruzes... Não, não... (isso) Faz-me lembrar enterros, muitas luzes... Nossa análise da amostra diacrônica indica que o PE se mostra mais conservador com relação ao fenômeno da concordância verbal, já que apresentou menos dados com ausência de concordância, assim como a análise dos dados sincrônicos também havia indicado. Verificamos, ainda, que a nossa hipótese de que, no século XIX, temos indícios de um sistema com concordância obrigatória com sujeito posposto se confirma, pois temos apenas dois casos de falta de concordância com sujeito posposto no PB e nenhum caso no PE; já no século XX, temos quatro casos de ausência de marcas de concordância com sujeito posposto no PB e dois casos no PE112. Nossos resultados confirmam, ainda, os resultados de estudos diacrônicos a respeito da ordem (cf. BERLINCK, 1988; COELHO, 2006). 4.3 Problemas empíricos para a mudança lingüística Discutiremos aqui os problemas de restrição, de transição, de encaixamento, de avaliação e de implementação, levantados por WLH (1968), como havíamos apontado no capítulo II, seção 2.1.5, momento em que apresentamos os problemas relacionandoos ao fenômeno da concordância verbal. Quanto ao problema da restrição, que busca, segundo WLH (1968), “determinar o conjunto de mudanças possíveis e condições possíveis para a mudança”113, 112 Quanto aos dados de sujeito posposto com marcação da concordância verbal, nossos dados estão assim distribuídos: século XIX – PE: 27 dados, PB: 19 dados; século XX – PE: 24 dados, PB: 39 dados. 113 Tradução de Bagno (2006, p.121) 189 controlamos alguns grupos de fatores lingüísticos e extralingüísticos para verificar quais deles poderiam estar favorecendo ou restringindo a mudança na concordância verbal de terceira pessoa do plural em dados de fala do PB e do PE. Como discutimos anteriormente, na seção 4.1, os grupos de fatores que favorecem ou restringem a variação da concordância verbal e que, por isso, podem estar condicionando a mudança com relação a este fenômeno são diferentes para as duas variedades do português aqui investigadas. Verificamos, através da análise dos dados coletados, que os grupos de fatores lingüísticos, para as duas variedades, favorecem a variação da concordância verbal com maior relevância do que os grupos de fatores extralingüísticos. Para a amostra do PB, os grupos saliência fônica e paralelismo formal se mostraram os mais importantes no condicionamento do fenômeno, seguidos dos grupos posição do sujeito em relação ao verbo, idade/escolaridade, traço humano no sujeito e diatopia, enquanto, para a amostra do PE, foram os grupos traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo e tipo de verbo os mais relevantes, seguidos do grupo idade/escolaridade. Já na rodada 2, um grupo apenas que havia sido selecionado na rodada 1 continuou sendo o mais relevante para o condicionamento da variação no PE, a posição do sujeito em relação ao verbo, seguido dos grupos diazonalidade, saliência fônica e traço humano no sujeito. Para a amostra do PB, de um lado, temos como contextos favorecedores da marcação da concordância nos verbos os contextos verbais mais salientes, aqueles que apresentavam um nome com marca de plural antecedendo um verbo com sujeito preenchido ou nulo, os contextos com sujeito anteposto ao verbo e com traço [+humano] usados por falantes mais jovens com nível de escolaridade superior residentes na região central de Florianópolis. Por outro lado, os contextos que favorecem a não marcação da concordância foram os contextos verbais menos salientes, contextos com presença da forma zero de plural no último elemento que antecede um verbo, contextos com sujeito posposto e com traço [-humano] usados por falantes mais velhos com escolaridade correspondente ao ensino fundamental residentes na localidade da Costa da Lagoa. Para a amostra do PE, na rodada 1, os contextos que se mostraram favorecedores do uso das marcas de plural nos verbos foram os de sujeito anteposto ao verbo e com traço [+ humano], sujeitos de verbos transitivos e de verbos intransitivos prototípicos usados por falantes mais jovens com escolaridade correspondente ao nível superior. Na 190 rodada 2, temos como contextos favorecedores os de sujeito anteposto ao verbo com traço [+ humano], os contextos verbais mais salientes usados por informantes da região urbana de Lisboa. Já como contextos que se mostraram favorecedores da não marcação da concordância verbal, na rodada 1, temos os contextos com sujeito posposto ao verbo e com traço [- humano], sujeitos de verbo do tipo cópula usados por jovens do ensino fundamental. Na rodada 2, temos os contextos com sujeito posposto ao verbo e com traço [- humano], contextos verbais menos salientes usados por informantes da região não urbana de Lisboa. Considerando as duas variedades aqui investigadas, observamos, de um lado, que os contextos que podem estar restringindo uma possível mudança, favorecendo o uso das marcas de plural nos verbos, seriam os sujeitos antepostos com traço [+ humano], os contextos verbais mais salientes, marcas presentes na fala de jovens com escolaridade superior. De outro lado, observamos os contextos de sujeitos pospostos com traços [- humanos] e os contextos verbais menos salientes como favorecedores de uma possível mudança no caminho da não marcação da concordância verbal. Para abordar o problema da transição, definido por WLH (1968) como a “trilha pela qual uma mudança lingüística está caminhando para se completar”114, investigamos o percurso das variantes da concordância verbal dentro da estrutura lingüística e dentro da estrutura social. Como enfatizamos no capítulo II, seção 2.1.5, dentro da estrutura lingüística, acreditamos que a queda da nasal fonêmica está levando à queda da nasal morfêmica, mudança por difusão lexical. Os dados de Battisti (2000) comprovam a hipótese. A autora, em seu estudo com dados do sul do Brasil, apresenta como resultados da redução da nasal para o grupo de fatores classe de palavra: para os verbos . 48 de peso relativo (41% de redução), para os nomes .61 de peso relativo (59% de redução) e para os nomes em –gem .78 de peso relativo (69% de redução). Para a autora, uma possível explicação para os resultados encontrados parece ter relação com a função que possui a sílaba em que se encontra o ditongo. Nos verbos, corresponde a sufixos flexionais de modo, tempo, número e pessoa, importantes para o estabelecimento de relações de concordância e, por conseqüência, para a compreensão dos enunciados. Já a sílaba final dos nomes não porta essa carga, o que talvez contribua para que a redução ocorra, uma vez que distinções de sentido não se perderiam nesse contexto (Battisti, 2000, p.268). 114 Tradução de Bagno (op. cit., p.90). 191 Quanto aos “possíveis caminhos na sociedade pelos quais a mudança na concordância verbal está caminhando para se completar”, os resultados das amostras investigadas apontam percursos um pouco diferentes. Para o PB, em relação às faixas etárias, temos os falantes mais velhos e menos escolarizados como os que menos preservam as marcas de plural nos verbos (33% de não concordância). No que se refere às épocas distintas controladas temos uma mudança no caminho da não concordância com o passar do tempo com 1% de não concordância para os dados do século XIX (2/197)115 e 3,4% de não concordância para os dados do século XX (12/352). Embora com um corpus distinto, temos ainda mais dados de não concordância para a amostra do século XXI 19,4% (154/794). Para os resultados em relação às amostras urbana e não urbana, temos a zona não urbana no caminho da não marcação da concordância (23%, contra 16% de não marcação na zona urbana). Já para a amostra do PE, temos os falantes mais jovens com menos escolaridade no caminho da não marcação da concordância nos verbos (11% de não marcação), em comparação com os demais falantes da amostra, o que se distingue dos resultados do PB. Para os resultados quanto ao caminho percorrido pela sociedade em direção à mudança na concordância, relacionados às épocas distintas a serem controladas e às comunidades urbana e não urbana, os resultados para o PE coincidem com os resultados para o PB, com diferenças nas freqüências de uso. Com relação às épocas controladas temos também um aumento com o passar dos séculos, com 0% de não marcação da concordância no século XIX (0/209), para quase 1% de não marcação (3/371) e 8,05% para o século XXI (65/807). Por fim, no que se refere às zonas urbana e não urbana, temos freqüência menor de marcação da concordância verbal na zona não urbana (10%), em comparação com a zona urbana (7%). No que se refere ao problema do encaixamento, WLH (1968) afirmam que as mudanças lingüísticas não se dão de forma isolada, mas estão encaixadas no sistema lingüístico a que pertencem. Vamos evidenciar a seguir a correlação entre o fenômeno da concordância verbal, o preenchimento do sujeito e a ordem do sujeito. Fenômenos que, segundo Galves (1983), iniciaram uma mudança no caminho do preenchimento do sujeito, do enrijecimento da ordem SV e do enfraquecimento das marcas de concordância em um mesmo momento, na segunda metade do século XIX. 115 Os números referem-se aos dados de aplicação da não marcação da concordância verbal/total de dados analisados. 192 Apresentaremos, inicialmente, os resultados de alguns estudos que analisam a ordem e o preenchimento do sujeito para suscitar reflexões a respeito de uma possível mudança sintática no fenômeno de variação da concordância verbal. Berlinck (1989), analisando um corpus do século XVIII, XIX e XX, mostra que a freqüência de VS diminui à medida que o tempo avança. No século XVIII (1750), a autora encontra uma freqüência de 42% de VS; no século XIX (1850), a freqüência cai para 31%; e no século XX (1987), cai ainda mais para 21%, indicando um “progressivo ´enrijecimento´ da ordem em SNV” (op.cit., p.97). Como condicionador da ordem, a concordância verbal só aparece no século XX; para as amostras do século XVIII e XIX, não é selecionada como relevante. Segundo a autora, a seleção da concordância verbal no século XX se justifica em função do vínculo que há entre ela e a natureza do verbo predicador, que se mostrou o condicionador mais determinante para essa amostra. Em Coelho et al. (2006), os autores evidenciam os trabalhos a respeito da variável ordem do sujeito (SV/VS) de Coelho (2000), em que foram analisadas 2033 construções declarativas monoargumentais retiradas do Banco Varsul, das quais 642 apresentaram a ordem VS (32%), e de Costa (2003), em que foram considerados dados de fala e escrita de crianças e adolescentes num total de 542 dados com 24 de sujeito posposto, menos de 5% dos casos. Os resultados a respeito da ordem do sujeito, segundo os autores, correlacionados ao tipo de verbo, apontam para um enrijecimento de SV nas construções intransitivas e para variação nas construções inacusativas. Coelho e Monguilhott (2007) investigam a correlação entre ordem do sujeito e concordância verbal em uma amostra de 16 falantes de Florianópolis. As autoras analisam um total de 616 sentenças das quais 548 (89%) são ocorrências de SV e 68 de VS (11%). Das 68 ocorrências de VS, 45 (66%) não apresentam marcação de concordância nos verbos. Os resultados apontam, de um lado, que a ordem prototípica do PB é SVO e, por outro lado, é na ordem VS que encontramos o maior índice de não concordância, corroborando a tese do caráter não subjetivo do argumento que se posiciona à direita do verbo (cf. PONTES, 1986). Em Coelho, Monguilhott e Martins (2008), os autores ressaltam que estudos diacrônicos como os de Berlinck (1989, 1995) e Coelho (2006) mostram que, nos séculos XVIII e XIX, o português apresenta freqüências de VSO em todos os tipos de 193 construções verbais e com todos os tipos de SNs, diferentemente do que acontece no século XX. Coelho, Monguilhott e Martins evidenciam o estudo diacrônico de Coelho (2007) a respeito da variação da ordem SV/VS em 1466 construções declarativas com sujeito preenchido, extraídas de seis peças de teatro de autores catarinenses dos séculos XIX e XX. Os resultados de Coelho apontam uma queda de VS do século XIX para o século XX (de 15% para 8%) e apontam ainda que há um caso de mudança em tempo real com uma ordem variável em diferentes contextos sintáticos (construções transitivas, intransitivas e inacusativas) no século XIX e com uma ordem SV basicamente categórica com construções transitivas e intransitivas no século XX, com a inacusatividade constituindo-se como requisito fundamental de ocorrência da variação nesse século. Os autores verificam, ainda, a correlação entre concordância verbal de terceira pessoa do plural e ordem do sujeito na mesma amostra de Coelho (2007). Com um total de 165 dados de concordância verbal com sujeito preenchido, apenas 7 dados não apresentaram marca de concordância. Os resultados indicam que a marcação da concordância está atrelada à ordem SV e a não marcação à ordem VS inacusativa, no PB atual. No século XIX, a marcação é categórica com sujeito invertido e, no século XX, a percentagem desce para 85%. Os estudos indicam que há uma queda tanto da ordem SV, quanto da marcação da concordância verbal do século XIX para o século XX no português de Santa Catarina, sugerindo a correlação entre os fenômenos da ordem do sujeito e da marcação da concordância verbal. Galves (1993), a partir de resultados de estudos de Tarallo, evidencia o percurso do preenchimento do sujeito no PB mostrando a tendência a um maior preenchimento ao longo do tempo (de 23,3% em 1725 a 79,4% em 1981), mudança que se inicia na segunda metade do século XIX. A autora mostra, a partir dos resultados de Berlinck (1989) e de Duarte (1991) sobre a posição do sujeito, que é também na segunda metade do século XIX que se inicia a mudança no caminho da fixação da ordem SVO. Galves ressalta, a partir dos estudos de Nunes (1990, 1991), que a diminuição da freqüência da concordância verbal em estruturas com “se” é também uma mudança ocorrida no século XIX. 194 Para a autora, o enfraquecimento da concordância está relacionado às outras características da mudança observadas: aumento do preenchimento do sujeito e fixação da ordem SV. Duarte (1995) indica, em seus resultados, o alto índice de preenchimento do sujeito no PB. Analisando o uso do sujeito pronominal em uma amostra de 13 informantes, obteve um total de 1424 dados, dos quais 415 (29%) eram de sujeito nulo e 1009 (71%) com sujeito pronominal pleno. Dos grupos de fatores condicionadores da ocorrência de sujeito nulo, a pessoa do discurso foi a variável que se mostrou mais relevante, com a terceira pessoa do plural apresentando os índices mais altos de sujeitos nulos. Duarte (2004) evidencia a correlação entre os três fenômenos: preenchimento do sujeito, ordem e concordância verbal no PB. A autora aponta que os sujeitos preenchidos são preferência no PB. Para a autora, a mudança de língua de sujeito nulo para língua de sujeito preenchido no PB se deu pelas mudanças no quadro pronominal e pela redução do paradigma flexional. O quadro flexional empobrecido passa a impedir que os sujeitos nulos sejam licenciados, já que a desinência verbal tem como função identificar um sujeito nulo. Até aqui trouxemos resultados de estudos que apontam a correlação entre os fenômenos sintáticos da concordância verbal, da ordem e do preenchimento do sujeito no PB. E o que acontece com a outra variedade do português que faz parte da amostra da nossa pesquisa? Lucchesi (2007) ressalta que uma das diferenças existentes entre PE e PB responsáveis pela hipótese de haver duas gramáticas distintas na língua portuguesa é o preenchimento do sujeito, que aparece com uma freqüência de uso muito maior no PB em relação ao PE. O que teria desencadeado o processo seria a mudança no paradigma pronominal no PB com a substituição dos pronomes tu e nós por você e a gente, respectivamente116. O autor evidencia que “como a propriedade do sujeito nulo estaria relacionada a uma morfologia rica do verbo em relação às categorias de pessoa e número (cf. Chomsky 1981, 1986)” (LUCCHESI, 2007, p.53), seria natural o enfraquecimento da propriedade do sujeito nulo. Lucchesi ressalta, ainda, que o enfraquecimento da flexão 116 Vale ressaltar que, quando o vocês entra na língua portuguesa (e desbanca o vós) faz com que o verbo de terceira pessoa do plural seja conjugado da mesma forma que se conjuga eles (vocês foram/eles foram), provocando uma homonímia de formas e, naturalmente, um aumento do sujeito preenchido. 195 verbal também foi desencadeador da perda da inversão VS no PB, como Galves (1993) salienta. Os resultados da nossa pesquisa parecem apontar a correlação sintática evidenciada nos estudos apresentados aqui. Essa correlação parece indicar direções diferentes para as duas variedades do português investigadas, PB e PE. Enquanto no PB a não marcação da concordância verbal (com freqüência de uso de 80,6%, contra 91,95% no PE) parece estar levando a um maior preenchimento do sujeito (com freqüência de uso de 77%, contra 56% no PE), ambos os fenômenos influenciados pela fixação da ordem SV (com freqüência de uso de 89%, contra 84% no PE), no PE, por haver menor redução do paradigma flexional, o sujeito nulo continua sendo licenciado e a ordem posposta parece apresentar mais contextos de variação do que no PB117. Uma mudança encadeada à outra mudança. Parece que uma mudança no paradigma pronominal do português com a substituição de tu por você e de nós por a gente passou a não mais ter uma marcação obrigatória da concordância verbal. Com um paradigma flexional com formas iguais para várias pessoas, o PB passa a não ter mais o sujeito nulo licenciado, passando de uma língua de sujeito nulo a uma língua de sujeito preenchido. Essa mudança vai encadear a mudança na ordem do sujeito; com a posição do sujeito cada vez mais preenchida, vamos tendo um enrijecimento da ordem SV, já que a posição prototípica do sujeito é à esquerda do verbo, ficando a ordem VS condicionada a contextos de inacusatividade. Já no PE, o sujeito nulo continua sendo licenciado, pois não há a mesma redução no paradigma pronominal e, conseqüentemente, no paradigma flexional. Quanto ao problema da avaliação, segundo WLH (1968), temos que observar o nível de consciência social dos falantes em relação a um determinado fenômeno lingüístico. Para que pudéssemos observar a significação social que a variação na concordância verbal de terceira pessoa do plural teria na consciência dos falantes, 117 Coelho, em trabalho apresentado no XV Congresso Internacional da Associação de Lingüística e Filologia da América Latina, em agosto de 2008, verifica que no século XIX, o PB e o PE admitiam a ordem VS em diferentes contextos sintáticos (estruturas transitivas, intransitivas e inacusativas) e com sujeitos tanto pronominais, quanto com SNs plenos. No final do século XX, o PE continua admitindo VS em diferentes contextos sintáticos e com sujeitos pronominais e SNs plenos, diferentemente do PB que passa a apresentar contextos mais restritos de VS (preferencialmente em construções inacusativas) e somente com SNs plenos. 196 aplicamos um teste de atitude/avaliação a respeito do fenômeno investigado. Observemos o instrumento aplicado no quadro 4.3, a seguir. Quadro 4.3: Teste de atitude sobre a concordância verbal Dados do informante Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino Idade: Escolaridade: Naturalidade: Profissão: Leia os dados de fala abaixo e avalie cada uma das frases seguindo os critérios de (1) a (4), a seguir: (1) a frase é boa (2) a frase é muito boa (3) a frase é ruim (4) a frase é muito ruim 1.( ) Já não existe muitos moradores aqui 2.( ) Era mais de cem pombos nessa escola 3.( ) É assim que começa a aparecer os problemas 4.( ) Veio pessoas doentes e idosas de Portugal para cá 5.( ) Então às vezes aqui acontece alguns casos 6.( ) Foi os meus primos, meus tios e minhas tias comemorar o meu aniversário 7.( ) Aparece, de vez em quando, os malinhas aí 8.( ) Falta algumas coisas ainda em Lisboa 9.( ) Trabalhava muitos escravos também nessa atividade 10.( ) Eu fui assistir um carnaval lá em Torres onde tava muitos brasileiros 11.( ) Ainda nem era conhecido, os pastéis 12.( ) Dia dois, eu acho, já começa as aulas 13.( ) Ia pra lá todos os turistas 14.( ) Todas as pessoas que vem aqui agora diz que melhorou em tudo, a comida, o ambiente... 15.( ) Os textos na faculdade de medicina de Barcelona é tudo em catalão 16.( ) Os amigos que a gente tinha na escola é os que a gente ainda tem hoje 17.( ) As pessoas que vai prali agora, só reclamam 18.( ) Trabalha uns na pesca 19.( ) Já lá vai, sei lá, oito anos talvez, sete, oito anos 20.( ) Mora três lá perto da minha casa 21.( ) Os meus irmãos tá cada um do seu lado 22.( ) Depois surgiu as carroças, os burros 23.( ) Comia o pai e a mãe na mesa, os filhos no chão 24.( ) Aqui da Costa estudou parece uns cinco só na Lagoa 25.( ) Geralmente é uma, duas barcas que vai agora no inverno 26.( ) As pessoas não sai do Ribeirão todo dia pra vir ao centro 27.( ) Eles pergunta se ela é portuguesa As sentenças avaliadas foram adaptadas a partir de sentenças retiradas da amostra sincrônica da pesquisa. O instrumento foi aplicado a 24 alunos do nono ano do 197 ensino fundamental de uma escola da rede pública de ensino de Florianópolis, com idade entre 13 e 16 anos, 19 alunos da terceira fase do curso superior de Engenharia de Produção da Universidade Federal de Santa Catarina, com idade entre 18 e 28 anos, e com 5 alunos da primeira fase do curso superior em Letras da mesma universidade, com idade entre 18 e 19 anos. Selecionamos trinta sentenças com verbos de diferentes tipos (transitivos, intransitivos, inacusativos e cópula) sem marcas de concordância, com sujeito anteposto e posposto ao verbo e com sujeito com traço + e – humano. O tipo de sujeito também não foi controlado, já que, na nossa análise da amostra sincrônica, não se mostra uma variável determinante no condicionamento da variação da concordância verbal de terceira pessoa do plural. Os resultados parecem confirmar a relevância das variáveis controladas no condicionamento da concordância verbal de terceira pessoa do plural, verificadas na amostra sincrônica desta pesquisa, como podemos observar através da tabela 4.13, a seguir. Sentenças avaliadas Ensino Fundamental Critério Ensino Superior Freqüência Critério Freqüência (1) 42% (3) 54% (3) 38% (3) 71% (1) (3) (3) (3) 29% 42% 46% (3) (3) (1) 75% 50% 42% (3) 33% (3) 54% (1) (3) 92% 42% (1) (3) 42% 63% (1) 46% (3) 54% (3) 42% (3) 50% (2) (3) (3) 29% 46% (3) (3) 58% 58% 118 Sentenças com verbos inacusativos com sujeito posposto com traço [– humano] (3) É assim que começa a aparecer os problemas (5) Então às vezes aqui acontece alguns casos (8) Falta algumas coisas ainda em Lisboa (12) Dia dois, eu acho, já começa as aulas (19) Já lá vai, sei lá, oito anos talvez, sete, oito anos (22) Depois surgiu as carroças, os burros Sentenças com verbos inacusativos, com sujeito posposto, com traço [+ humano] (1) Já não existe muitos moradores aqui (4) Veio pessoas doentes e idosas de Portugal para cá (6) Foi os meus primos, meus tios e minhas tias comemorar o meu aniversário (7) Aparece, de vez em quando, os malinhas aí (13) Ia pra lá todos os turistas (20) Mora três lá perto da minha casa 118 O critério que consta da tabela é aquele que foi a opção escolhida pela maioria dos informantes. A freqüência refere-se aos informantes que avaliaram a sentença a partir de tal critério. 198 Sentença com verbo inacusativo, com sujeito anteposto, com traço [– humano] (25) Geralmente é uma, duas barcas que vai agora no inverno Sentenças com verbos inacusativos, com sujeito anteposto, com traço [+ humano] (17) As pessoas que vai prali agora, só reclamam (26) As pessoas não sai do Ribeirão todo dia pra vir ao centro Sentenças com verbos cópula, com sujeito posposto, com traço [– humano] (2) Era mais de cem pombos nessa escola (11) Ainda nem era conhecido, os pastéis Sentença com verbo cópula, com sujeito posposto, com traço [+ humano] (10) Eu fui assistir um carnaval lá em Torres onde tava muitos brasileiros Sentença com verbo cópula, com sujeito anteposto, com traço [– humano] (15) Os textos na faculdade de medicina de Barcelona é tudo em catalão Sentenças com verbos cópula, com sujeito anteposto, com traço [+ humano] (16) Os amigos que a gente tinha na escola é os que a gente ainda tem hoje (21) Os meus irmãos tá cada um do seu lado Sentenças com verbos intransitivos, com sujeito posposto, com traço [+ humano] (9) Trabalhava muitos escravos também nessa atividade (18) Trabalha uns na pesca (23) Comia o pai e a mãe na mesa, os filhos no chão (24) Aqui da Costa estudou parece uns cinco só na Lagoa Sentenças com verbos transitivo, com sujeito anteposto, com traço [+ humano] (14) Todas as pessoas que vem aqui agora diz que melhorou em tudo, a comida, o ambiente... (27) Eles pergunta se ela é portuguesa (3) 38% (3) 67% (3) 42% (4) 83% (3) 38% (4) 67% (3) (4) 66% 38% (3) (4) 50% 54% (1) 33% (4) 54% (3) 42% (4) 54% (1) 33% (3) 38% (4) 58% (3) 54% (3) 50% (3) 63% (4) (2) 42% 33% (3) (4) 54% 46% (3) 42% (3) 58% (2) 42% (4) 50% (4) 54% (4) 71% Tabela 4.13: Resultados do teste de atitude sobre a concordância verbal Os resultados parecem evidenciar que, nas sentenças com verbos inacusativos, que são a maioria, já que esses verbos se mostraram fortes condicionadores da não marcação da concordância verbal na amostra da pesquisa, o papel do sujeito selecionado pelo verbo se mostrou bastante importante. Pudemos observar que as sentenças (17) e (26) com verbos inacusativos com sujeito anteposto, com traço [+humano] foram as únicas, dentre as sentenças com inacusativos, avaliadas com o critério (4) pelos informantes de nível superior, sentenças consideradas muito ruins, portanto. Vale 199 observar que as freqüências relativas ao número de informantes que optou por tal critério são bastante altas, 83% e 67%, respectivamente. Para as sentenças com verbos copulativos, parece que a posição do sujeito e o traço humano no sujeito não se mostraram determinantes no condicionamento da marcação da concordância verbal. Observamos que tanto as sentenças com sujeito posposto com traço [- humano] (2) e (11) quanto as sentenças com sujeito anteposto com traço [+ humano] (16) e (21) foram avaliadas em algum momento com o critério (4) pelos informantes, que a consideraram, portanto, muito ruins. Os resultados relativos aos verbos intransitivos e aos verbos transitivos parecem confirmar os resultados da amostra investigada nessa pesquisa. Das quatro sentenças com verbos intransitivos que fazem parte do instrumento de avaliação, duas, (18) e (23), foram classificadas como muito ruins pela maioria dos informantes e as duas sentenças com verbos transitivos que fazem parte do instrumento de avaliação, (14) e (27), também foram classificadas como muito ruins pela maioria dos informantes. Em relação ao controle da escolaridade no instrumento de avaliação, percebemos que, das 27 sentenças avaliadas, 13 delas (1, 2, 4, 5, 7, 9, 11, 12, 20, 22, 24, 25 e 27) tiveram a mesma avaliação para os informantes com o nível fundamental e com o nível superior, já que o mesmo critério de avaliação obteve o maior percentual de escolha para ambos os níveis de escolaridade, embora com diferenças percentuais. No que se refere às outras 14 sentenças, 5 delas (15, 17, 18, 21 e 26) tiveram diferença na freqüência de opção dos critérios selecionados; no entanto, os informantes avaliaram as sentenças como ruins ou muito ruins, o que consideramos uma diferença não muito relevante. As outras 9 sentenças (3, 6, 8, 10, 13, 14, 16, 19 e 23) é que diferiram: enquanto os informantes de um nível de escolaridade classificaram as sentenças ou como boas ou muito boas, os informantes do outro nível de escolaridade classificaram as sentenças ou como ruins ou muito ruins. Podemos observar que, com exceção da sentença (19), os informantes do nível superior se mostraram mais conservadores na classificação das sentenças, em comparação com os informantes do nível fundamental, no sentido de classificarem as sentenças ou como ruins ou como muito ruins, o que confirma nossos resultados estatísticos, já que esses informantes estão há mais tempo em contato com a norma padrão da língua e tendem a estigmatizar formas que fogem do padrão, como é o caso da não marcação da concordância nos verbos. 200 Nossos resultados confirmam os resultados de Bortoni-Ricardo (2008). Conforme salientamos no capítulo I, seção 1.1.1.1, a autora ao aplicar um instrumento de avaliação sobre a concordância verbal em universitários e alunos que freqüentavam curso supletivo, verificou que os universitários estigmatizam a concordância verbal nãopadrão, ao contrário dos alunos que freqüentam curso supletivo, ou seja, falantes com menos escolaridade. Acreditamos que este instrumento, embora com algumas limitações, tanto em termos de indivíduos selecionados, quanto em termos do número e tipo de sentenças, nos deu algumas pistas no caminho da mudança em relação ao fenômeno aqui investigado, confirmando as tendências observadas tanto na amostra sincrônica, quanto na amostra diacrônica. 4.4 Síntese Iniciamos este capítulo com a retomada dos grupos de fatores selecionados para as amostras do PB e do PE que haviam sido discutidos no capítulo anterior. Apresentamos novamente os resultados a fim de comparar as duas amostras investigadas e apresentamos, também, o refinamento desta análise com resultados de uma nova rodada para o PE. Em seguida, analisamos nossa amostra diacrônica evidenciando o percurso da concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE nos séculos XIX e XX. Logo após, discutimos a respeito de uma possível correlação no português entre os fenômenos de variação da concordância verbal, da ordem do sujeito e do preenchimento do sujeito. Por fim, levantamos os problemas empíricos para a mudança lingüística (WLH, 1968) em relação ao objeto de estudo do nosso trabalho. Seguem as considerações finais do nosso trabalho. 201 CONSIDERAÇÕES FINAIS Buscamos, nesta tese, investigar e mapear o fenômeno da concordância verbal de terceira pessoa do plural no PB e no PE em uma amostra sincrônica (século XXI), além de traçar o percurso diacrônico deste fenômeno (séculos XIX e XX). Os resultados gerais confirmam uma de nossas hipóteses com o PE mostrando-se mais conservador na marcação da concordância verbal, tanto na amostra sincrônica, quanto na diacrônica, apresentando freqüências maiores de marcas explícitas de plural nos verbos do que as freqüências encontradas no PB. No que se refere à amostra sincrônica, os resultados da análise estatística do PB e do PE confirmam outra de nossas hipóteses indicando que a variação do fenômeno da concordância verbal é condicionada muito mais por grupos de fatores lingüísticos do que extralingüísticos. Para a amostra do PB, os seguintes contextos lingüísticos foram selecionados como estatisticamente relevantes no condicionamento da marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural: aqueles em que há presença de acento na desinência, os ambientes em que o sujeito preenchido ou nulo apresenta antecedente com marca de plural, os contextos em que o verbo apresenta sujeito anteposto, em que apresenta sujeito com traço [+ humano] e nos contextos em que os verbos são intransitivos nãoprototípicos. Por outro lado, temos os seguintes ambientes como desfavorecedores da concordância verbal de terceira pessoa do plural: os contextos em que há ausência de acento na desinência, os ambientes em que há presença da forma zero de plural no último elemento que antecede o verbo, em que o sujeito está posposto ao verbo, em que apresenta sujeito com traço [- humano], e nos contextos em que os verbos são, preferencialmente, inacusativos. Em relação aos contextos extralingüísticos, temos os jovens com ensino superior, moradores/nativos da Região Central como favorecedores da marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural e os velhos com ensino fundamental, moradores/nativos da Costa da Lagoa como desfavorecedores da marcação da concordância. No que tange à amostra sincrônica do PE, nossa análise estatística selecionou os seguintes contextos lingüísticos como condicionadores da marcação da concordância 202 verbal de terceira pessoa do plural: verbos com sujeito com traço [+ humano], verbos com sujeito antecedente e verbos do tipo transitivo e intransitivo prototípico. Como ambientes desfavorecedores da marcação da concordância verbal de terceira pessoa do plural, identificamos os sujeitos com traço [- humano], pospostos a verbos copulativos. Já em relação aos contextos extralingüísticos, a análise estatística apontou os informantes jovens com ensino superior como favorecedores da marcação da concordância verbal e os jovens com ensino fundamental como desfavorecedores. Diante dos resultados, observamos diferenças e semelhanças em relação à análise das amostras sincrônicas do PB e do PE. Primeiramente, em relação às variáveis lingüísticas selecionadas, constatamos que no PB a saliência fônica e o paralelismo formal foram as variáveis mais relevantes no condicionamento da concordância verbal, variáveis que não foram selecionadas para a amostra do PE (na rodada 1). Por outro lado, as variáveis traço humano no sujeito, posição do sujeito em relação ao verbo e tipo de verbo foram selecionadas para ambas as amostras, com o sujeito com traço [- humano] e posposto ao verbo como desfavorecedor da marcação da concordância nos verbos tanto para o PB, quanto para o PE. Em relação à variável tipo de verbo, observamos algumas particularidades. No PE, os verbos copulativos mostraram-se ambientes desfavorecedores da marcação da concordância verbal, e no PB os verbos inacusativos é que apresentaram tal comportamento. No entanto, ao fazermos uma análise mais refinada dos dados do PE com verbos copulativos, verificamos que algumas construções sintáticas do PE são bastante particulares, diferindo das do PB, como se tivéssemos aí sujeitos deslocados, em uma posição de tópico, por exemplo, distinção que não foi considerada na nossa análise. Quando fizemos rodadas excluindo o fator cópula para a variável tipo de verbo, a seleção dos grupos de fatores ficou bastante diferente, tendo, inclusive, a saliência fônica selecionada como estatisticamente relevante no condicionamento da concordância, o que nos faz pensar que, talvez, existam particularidades nas construções com esses verbos do PE que não foram levadas em conta, e que pretendemos investigar futuramente. Constatamos ainda, através da análise sincrônica, que a nossa hipótese que relacionava as duas faixas etárias controladas com a diazonalidade, em que esperávamos que os jovens da zona não urbana preservassem mais as marcas de concordância verbal 203 do que os velhos desta mesma zona e os mais velhos da zona urbana preservassem mais a concordância verbal se confirmou parcialmente. Para a amostra do PB, verificamos que os falantes mais jovens da zona não urbana com escolaridade fundamental preservam mais a concordância do que os mais velhos e, para a amostra do PE, os falantes mais jovens da zona não urbana com escolaridade superior preservam mais a concordância do que os mais velhos. No que se refere à amostra diacrônica, embora tenhamos encontrado poucos dados de não concordância no corpus de peças de teatro selecionado para as amostras do PB e do PE, verificamos um aumento da variação na concordância verbal no século XX em relação ao século XIX, para ambas as amostras, confirmando, desta forma, outra hipótese do nosso trabalho. Os resultados da análise diacrônica indicaram que, no século XIX, temos indícios de um sistema com concordância obrigatória com sujeito posposto, já que, conforme aponta Coelho (2008), temos mais possibilidade de posposição nesse período, tanto para o PB, quanto para o PE, o que, de certa forma, facilitaria o reconhecimento do sujeito invertido como sujeito da sentença pelos falantes, favorecendo, assim, a marcação da concordância verbal. Já no século XX, os resultados parecem apontar para um sistema com concordância variável com sujeito posposto, principalmente no PB, pois com o passar dos séculos a ordem sujeito-verbo foi ficando cada vez mais enrijecida e os indivíduos passaram a “confundir” o sujeito posposto com o objeto da sentença. No PE, acreditamos que o sistema do século XIX continue atuando. Partindo da abordagem teórico-metodológica da Teoria da Variação e Mudança Lingüística e da Dialetologia Pluridimensional, acreditamos ter contribuído com essa pesquisa para a descrição do português falado e escrito no Brasil e em Portugal, à medida que confirmamos resultados de estudos sobre a concordância verbal de terceira pessoa do plural com outras amostras da língua portuguesa. 204 BIBLIOGRAFIA ALTENHOFEN, Cléo Vilson. Áreas lingüísticas do português falado no Sul do Brasil: um balanço das fotografias lingüísticas do ALERS. In: VANDRESEN, Paulino. Variação e mudança no português falado da região Sul. 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Tu/o(a) senhor(a) gosta(s) do bairro em que mora(s)? Por quê? É um bom lugar para se criar os filhos? 2. Tu/o(a) senhor(a) trocaria(s) este bairro por outro? Qual? Por quê? 3. Em que cidade tu/o(a) senhor(a) gostaria(s) de morar? Por quê? 4. A) (se morador de área rural) O que tu/o(a) senhor(a) acha(s) das pessoas que moram no centro/cidade? Tu/o(a) senhor(a) gostaria(s) de morar no centro? 5. B) (se morador da área central) O que tu/o(a) senhor(a) acha(s) das pessoas que moram nas localidades do interior da Ilha, como Ribeirão da Ilha ou Costa da Lagoa? Tu/o(a) senhor(a) moraria(s) num desses lugares? 6. O que tu/o(a) senhor(a) costuma(s) fazer no final de semana? 7. Eu queria que tu/o(a) senhor(a) contasse sobre encontros de família. Costumam se encontrar freqüentemente? Conte como são alguns desses encontros. 8. Teus/seus amigos moram aqui perto? 9. Há algum clube, centro comunitário, igreja ou parque aqui no bairro? Tu/o(a) senhor(a) costuma(s) ir a esse local? 10. Tu/o(a) senhor(a) te/se reúne(s) com as pessoas aqui do bairro? 11. Existe algum tipo de festa típica que vocês façam aqui no bairro? Tu/o(a) senhor(a) freqüenta(s) alguma? 12. Na tua/sua opinião, o que é “ser mané”? (para PB) 13. Tu/o(a) senhor(a) acha(s) que o “mané” fala diferente das pessoas de outras cidades ou de outros estados? (para PB) 14. Tu/o(a) senhor(a) conhece(s) x, y ou z (informantes que já haviam sido ou viriam a ser entrevistados naquela localidade)? 218 Quadro 3.1: Avaliação da saliência fônica Dados do informante Sexo: ( ) Masculino ( ) Feminino Idade: Escolaridade: Profissão: Naturalidade: Leia os dados de fala abaixo e assinale (um em cada par) aquele em que para você a falta de concordância verbal é mais perceptível, mais marcada, mais saliente: (1) ( ( (2) ( ( ) Só que eles diz que eu tenho que trabalhá pra pagá (PB) ) Os meus irmãos tá cada um do seu lado (PE) ) Vai entrando outras pessoas, vai modificando os costumes (PB) ) Essa é a proposta que eles faiz pra gente, né? (PB) (3) ( ( ) Já lá vai, sei lá, oito anos talvez, sete, oito anos (PE) ) Entram, não diz boa tarde (PE) (4) ( ( ) Todas as pessoas que vem aqui agora diz que melhorou em tudo, a comida, o ambiente... (PE) ) Será o bacalhau, será caras de bacalhau que eu gosto mais (PE) (5) ( ( ) Acho que tá a falir muitas empresas (PE) ) Acho bem, acho ótimo haver muita coisa, muitas coisas dessas porque faz falta (PE) 219 Saliência/ diazonalidade Zona não urbana Zona urbana TOTAL Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c 9/55=16% 139/163=85% 29/30=97% 46/59=78% 32/35=91% 79/89=89% 10/34=29% 135/161=84% 19/21=90% 27/28=96% 32/33=97% 83/86=97% 19/89=21% 274/324=85% 48/51=94% 73/87=84% 64/69=94% 162/175=93% Tabela 3.33: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade Sal iência/ Escolaridad e119 Ensino fundamental Ensino superior TOTAL Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c 1/43=2% 101/142=71% 20/23=87% 29/37=76% 23/27=85% 70/75=93% 18/46=39% 173/182=95% 28/28=100% 45/50=90% 41/41=100% 92/100=92% 19/89=21% 274/324=85% 48/51=94% 73/87=84% 64/68=94% 162/175=93% Tabela 3.34: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade Paralelismo Formal Zona não urbana Zona urbana Total Presença da forma de plural explícita no último elemento Presença de numeral no último elemento 224/264 = 85% 194/219 = 89% 418/483 = 87% 9/15 = 60% 11/18 = 61% 20/33 = 61% Presença da forma zero de plural no último elemento 28/60 = 47% 24/40 = 60% 52/100 = 52% Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de plural explícita Sujeito nulo com anafórico com presença de numeral terminado em /s/ no último elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da forma de zero plural Total 57/67 = 85% 72/81 = 89% 129/148 = 87% 2/3 = 67% 2/2 = 100% 4/5 = 80% 14/22 = 64% 3/3 = 100% 17/25 = 68% 334/431 = 77% 306/363 = 84% 640/794 = 81% Tabela 3.35: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade 119 Os fatores jovem/ensino fundamental e velho/ensino fundamental foram amalgamados, assim como os fatores jovem/ensino superior e velho/ensino superior, já que nosso objetivo é verificar o condicionamento da escolaridade especificamente. 220 Idade/escolaridade Ensino fundamental Ensino superior Total SN anteposto 158/213 74% 306/333 92% 464/546 85% SN posposto 8/34 24% 15/33 45% 23/67 34% Tabela 3.36: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e idade/escolaridade Diazonalidade Zona não urbana Zona urbana Total SN anteposto 249/300 83% 215/246 87% 464/546 85% SN posposto 12/39 31% 11/28 39% 23/67 34% Tabela 3.37: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade Posição do sujeito em relação ao verbo SN anteposto SN posposto Total SN [+humano] SN [-humano] 420/482 15/39 435/521 44/64 8/28 52/92 87% 38% 83% 69% 29% 57% Tabela 3.38: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e posição do sujeito em relação ao verbo Diazonalidade Zona não urbana Zona urbana Total SN [+humano] 310/376 82% 278/325 86% 588/701 84% SN [-humano] 24/55 44% 28/38 74% 52/93 56% Tabela 3.39: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Total SN anteposto 230/271 85% 47/55 85% 11/15 73% 59/66 89% 16/18 89% 101/121 83% 464/546 85% SN posposto 0/0 0% 120 1/6 17% 0/0 0% 10/19 53% 2/5 40% 10/37 27% 23/67 34% Tabela 3.40: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo 120 Os dados de intransitivos com posposição: Trabalha na educação infantil, as duas (PBINFVS06), Trabalha, né? minhas prima (PBINMJF10), Trabaia uns na pesca (PBCLMVF03), Comia o pai e a mãe na mesa, os filho no chão, (PBCLMVF03), [E*E estudaram?] Estudaru, os dois (PBCLFVS07), Na Costa aqui estudou parece uns cinco só na Lagoa (PBCLMVF03). 221 Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Total SN [+ humano] 299/356 84% 69/83 83% 17/21 81% 57/63 90% 15/19 79% 131/159 82% 588/701 84% SN [- humano] 4/7121 57% 122 1/2 50% 0/0 0% 23/33 70% 6/8 75% 18/43 42% 52/93 56% Tabela 3.41: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo cópula Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Total Zona não urbana 164/199 82% 36/45 80% 9/9 100% 44/54 81% 12/17 71% 69/107 64% 334/431 77% Zona urbana 139/164 85% 34/40 85% 8/12 67% 36/42 86% 9/10 90% 80/95 84% 306/363 84% Tabela 3.42: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade Tipo de sujeito Sujeito pronome pessoal SN + pronome relativo (que) Sujeito pronome indefinido + quantificador Sujeito pleno simples SN pleno composto Sujeito pleno nu Apl/Total 1/251 3/87 6/34 % 0% 3% 17% 45/219 4/9 8/13 20% 44% 61% Total 67/613 10% Tabela 3.43: Freqüência de posposição do sujeito no PB, segundo a variável tipo de sujeito 121 Os dados de transitivos com SN [- humano]: O governo do estado e outros governos que possam então conseguir colocar em prática esse projeto (PBRIMJS13), Tem várias etnias que contribuíram pra formação dessa nossa ilha (PBRIMJS13), A gente sabe que o turismo, esses grandes empreendimentos que têm aqui nos Ingleses favorece pra uma qualidade de vida melhor (PBINFVS06), Escolas particulares que já atendi ensino básico (PBINFVS06), Alguns (bois) invade assim (PBCLMJF11), As universidades federais deveriam fazer um vestibular (PBRCMVS08), As teorias de Wygotsky e Wallon vão me por mais em contato (PBRCMJS16). 122 Os dados de intransitivos com SN [-humano] são, ambos, casos de metonímia: Tem quarenta e seis barquinho que trabalha lá no verão (PBCLMJF11), Os estudos culturais não trabalham com essa produção (PBRCMJS16). 222 Tipo de sujeito Sujeito pronome pessoal Sujeito nulo Sujeito pronome indefinido + quantificador SN + pronome relativo (que) Sujeito pleno simples Sujeito pleno nu SN pleno composto Total Zona não urbana 120/131 92% 73/92 79% 14/19 74% Zona urbana 104/120 87% 78/87 90% 14/15 93% 37/51 83/125 5/6 2/7 73% 66% 83% 29% 30/38 75/94 3/7 2/2 334/431 77% 306/363 79% 80% 43% 100% 84% Tabela 3.44: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade Idade/escolaridade Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Total Zona não urbana 150/175 86% 90/103 87% 46/71 65% 48/82 59% 334/431 77% Zona urbana 75/77 97% 82/92 89% 69/87 79% 80/107 75% 306/363 84% Tabela 3.45: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade Sexo Masculino Feminino Total Zona não urbana 170/245 69% 164/186 88% 334/431 77% Zona urbana 67/80 84% 239/283 84% 306/363 84% Tabela 3.46: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade Redes sociais (localismo) Mais ou menos integrado Bem integrado Total Zona não urbana 34/47 72% 300/384 78% 334/431 77% Zona urbana 196/222 88% 110/141 78% 306/363 84% Tabela 3.47: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade Redes sociais (mobilidade) Pouca mobilidade Média mobilidade Muita mobilidade Total Zona não urbana 257/322 80% 45/49 92% 32/60 53% 334/431 77% Zona urbana 187/233 80% 82/92 89% 37/38 97% 306/363 84% Tabela 3.48: Freqüência de CV no PB, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade 223 Traço humano no sujeito SN [+humano] SN [-humano] Total Zona não urbana Zona urbana 311/325 96% 321/328 98% 58/83 70% 52/71 73% 369/408 90% 373/399 93% Tabela 3.49: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis traço humano no sujeito e diazonalidade Idade/escolaridade Ensino fundamental Ensino superior Total SN anteposto 178/196 91% 176/185 95% 354/381 93% SN posposto 19/37 51% 24/35 69% 43/72 60% Tabela 3.50: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis escolaridade e posição do sujeito em relação ao verbo Posição do sujeito em relação ao verbo SN anteposto SN posposto Total Zona não urbana 181/196 14/33 195/229 Zona urbana 92% 173/185 42% 29/39 85% 202/224 94% 74% 90% Tabela 3.51: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e diazonalidade Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Total SN anteposto 136/142 96% 27/28 96% 3/4 75% 23/23 100% 73/73 100% 92/111 83% 354/381 93% SN posposto 0/0 0% 2/2123 100% 0/0 0% 7/11 64% 18/30 60% 16/29 55% 43/72 60% Tabela 3.52: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e posição do sujeito em relação ao verbo 123 Os dados de intransitivo prototípico com posposição encontrados: (1) estudam todos aqui (PESIMVS05), (2) estudaram esses meus irmãos todos (PECAFJF11). 224 Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Total SN [+ humano] 300/303 99% 56/57 98% 12/13 92% 37/37 100% 130/136 96% 97/107 91% 632/653 97% SN [- humano] 19/22 86% 124 1/1 100% 0/0 0% 4/8 50% 24/31 77% 62/92 67% 110/154 71% Tabela 3.53: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e traço humano no sujeito Tipo de verbo Verbo transitivo Verbo intransitivo prototípico Verbo intransitivo não-prototípico Verbo inacusativo prototípico Verbo inacusativo não-prototípico Verbo cópula Total Zona urbana 153/155 99% 26/26 100% 2/3 67% 27/28 96% 91/94 97% 74/93 80% 373/399 93% Zona não urbana 166/170 98% 31/32 97% 10/10 100% 14/17 82% 63/73 86% 85/106 80% 369/408 90% Tabela 3.54: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de verbo e diazonalidade Saliência/ diazonalidade Zona não urbana Zona urbana TOTAL Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c 32/36=89% 117/128=91% 31/35=89% 38/43=88% 74/78=95% 77/88=88% 30/30=100% 115/123=93% 40/40=100% 35/36=97% 80/81=99% 73/89=82% 62/66=94% 232/251=92% 71/75=95% 73/79=92% 154/159=97% 150/177=85% Tabela 3.55: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e diazonalidade Saliência/ escolaridade Ensino fundamental Ensino superior TOTAL Nível 1a Nível 1b Nível 1c Nível 2a Nível 2b Nível 2c 28/30=93% 131/144=91% 38/41=93% 42/47=89% 74/74=100% 67/85=79% 34/36=94% 101/107=94% 33/34=97% 31/32=97% 80/85=94% 83/92=90% 62/66=94% 232/251=92% 71/75=95% 73/79=92% 154/159=97% 150/177=85% Tabela 3.56: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis saliência fônica e escolaridade 124 O dado de intransitivo prototípico com SN [- humano]: (1) onde as gôndolas andam (PERCFVF04). 225 Paralelismo Formal Zona não urbana Zona urbana Presença da forma de plural explícita no 197/230 86% 201/224 90% último elemento Presença da forma zero de plural no último 3/4 75% 1/1 100% elemento Sujeito nulo com anafórico com presença da 169/174 97% 171/174 98% forma de plural explícita Total 369/408 90% 373/399 93% Tabela 3.57: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis paralelismo formal e diazonalidade Tipo de sujeito Sujeito pleno nu SN pleno composto Sujeito pronome indefinido + quantificador Sujeito pleno simples Sujeito pronome pessoal SN + pronome relativo (que) Apl/Total 7/10 4/10 13/31 % 70% 40% 41% 48/230 0/90 0/82 20% 0% 0% Total 72/453 15% Tabela 3.58: Freqüência de posposição do sujeito no PE, segundo a variável tipo de sujeito Tipo de sujeito Sujeito pronome pessoal Sujeito nulo Sujeito pronome indefinido + quantificador SN + pronome relativo (que) Sujeito pleno simples Sujeito pleno nu SN pleno composto Total Zona não urbana 45/45 100% 170/175 97% 16/16 100% Zona urbana 44/45 98% 171/175 98% 13/15 87% 45/50 89/111 2/6 2/5 90% 80% 33% 40% 32/35 107/120 4/4 2/5 91% 89% 100% 40% 369/408 90% 373/399 93% Tabela 3.59: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis tipo de sujeito e diazonalidade Idade/escolaridade Jovem/ensino superior Velho/ensino superior Jovem/ensino fundamental Velho/ensino fundamental Total Zona não urbana 86/94 91% 79/88 90% 99/112 88% 105/114 92% 369/408 90% Zona urbana 118/122 97% 79/82 96% 72/79 91% 104/116 90% 373/399 93% Tabela 3.60: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis idade/escolaridade e diazonalidade 226 Sexo Masculino Feminino Total Zona não urbana 180/196 92% 189/212 89% 369/408 90% Zona urbana 72/83 87% 301/316 95% 373/399 93% Tabela 3.61: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis sexo e diazonalidade Redes sociais (localismo) Bem integrado Mais ou menos integrado Pouco integrado Total Zona não urbana 201/222 91% 168/186 90% ____________ 369/408 90% Zona urbana 62/63 98% 288/310 93% 23/26 88% 373/399 93% Tabela 3.62: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (localismo) e diazonalidade Redes sociais (mobilidade) Pouca mobilidade Média mobilidade Muita mobilidade Total Zona não urbana 245/273 90% 124/135 92% _____________ 369/408 90% Zona urbana 56/61 92% 166/179 93% 151/159 95% 373/399 93% Tabela 3.63: Freqüência de CV no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis redes sociais (mobilidade) e diazonalidade 227 Nível 1: Oposição não-acentuada a. não envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve mudança na qualidade da vogal na forma plural c. envolve acréscimo de segmentos na forma plural Nível 2: Oposição acentuada a. envolve apenas mudança na qualidade da vogal na forma plural b. envolve acréscimo de segmentos sem mudanças vocálicas na forma plural c. envolve acréscimos de segmentos e mudanças diversas na forma plural Total PB SN anteposto 11/20=55% PB SN posposto 1/8=12% PE SN anteposto 33/34=97% PE SN posposto 2/5=40% 193/211=91% 5/22=23% 98/100=98% 8/15=53% 37/39=95% _____ 33/36=92% _____ Apl/Total=% Apl/Total=% Apl/Total=% Apl/Total=% 54/60=90% 0/4=0% 21/22=95% 0/2=0% 36/38=95% 4/5=80% 58/58=100% 13/16=81% 74/77=96% 3/9=33% 19/19=100% 4/5=80% 405/480=84% 13/48=27% 262/269=97% 27/43=63% Tabela 4.9’: Freqüência de CV no PB e no PE, segundo o cruzamento entre as variáveis posição do sujeito em relação ao verbo e saliência fônica sem verbos copulativos 228