CEAP
CURSO DE DIREITO
Direito Previdenciário
Prof. UBIRATAN RODRIGUES DA SILVA
PLANO DE ENSINO: UNIDADE lll. DA LEGISLAÇÃO PREVIDENCIÁRIA
(PLANO DA AULA Nº 5)
OBJETOS: 1) A SEGURIDADE SOCIAL COMO DIREITO
HUMANO;
2) A RELAÇÃO JURÍDICA DA SEGURIDADE
SOCIAL.
OBJETIVOS: Analisar a natureza jurídica e as relações da
Seguridade Social com os outros Direitos, no
Brasil.
POSIÇÃO ENCICLOPÉDICA DO DIREITO DA
SEGURIDADE SOCIAL
 A taxionomia ou posição enciclopédica vai estudar
onde um ramo do Direito se enquadra dentro do próprio
Direito.
 Ulpiano já dividia o Direito em público e privado,
embora entendendo tal classificação como meramente
didática, pois o Direito enquanto ciência é o gênero,
tendo seus diversos ramos, que são considerados
espécies. Cada ramo do Direito mantém relações e
conexões com as demais espécies do gênero.
 No
século XIX, os juristas de tradição romanista
entendiam que o Direito Público era aquele que envolvia a
organização do Estado. Já o Direito Privado era o que
dizia respeito ao interesse dos particulares. Essa
orientação permanece nos dias atuais.
 A posição enciclopédica do Direito da Seguridade Social
situa-se no campo do Direito Público. Desde o Decreto-lei nº
72/66, o sistema é público, pois houve a unificação dos vários
institutos até então existentes no antigo INPS. Toda a base do
sistema tem sede na Constituição. Seus princípios (art. 194,
parágrafo único, incisos I a VII) e demais normas gerais que
dão suporte à matéria estão consagrados na Lei Maior, que
destinou o Capítulo II ("Da Seguridade Social"), dentro do
Título VIII ("Da Ordem Social"), para versar sobre o tema (Arts.
194 a 204). As leis ordinárias que completam o sistema têm
cunho nitidamente publicista, em face do sistema ser
administrado pelo Estado, por órgão do Poder Executivo
destinado a aplicar a matéria (Ministério da Previdência
Social). Apesar de existir a possibilidade de os segurados se
filiarem à previdência privada, todo o sistema é gerido e
administrado pelo Instituto Nacional da Seguridade Social
(INSS), órgão ligado ao Ministério da Previdência Social. As
contribuições para o sistema são impostas por lei, gerando
recursos para o pagamento dos benefícios e a prestação de
serviços, que são feitos pelo Estado.
 Embora existam normas coletivas ou regulamentos de
empresa
que
assegurem
complementações
de
aposentadoria (como as do Banco do Brasil, da Caixa
Econômica Federal, do Banco do Estado de São Paulo),
tais normas não podem servir para justificar a natureza
privada do Direito da Seguridade Social. Na verdade, são
preceitos subsidiários que estão no âmbito do Direito do
Trabalho.
 A Lei Complementar nº 109/01, que trata da Previdência
Privada Complementar, é exceção, pois tem por objetivo
complementar a aposentadoria deferida pelo INSS.
NATUREZA JURÍDICA DO DIREITO DA
SEGURIDADE SOCIAL
 A lei é que determina quais são os direitos e obrigações
atinentes à Seguridade Social.
 Estabelece
a Constituição que há competência
concorrente entre a União, os Estados-membros e o
Distrito Federal para legislar sobre "previdência social,
proteção e defesa da saúde" (Art. 24, XII). Os municípios
não estão incluídos nessa competência concorrente, nem
esses entes têm competência concorrente para legislar
sobre assistência social. No âmbito da competência
concorrente, a União estabelecerá normas gerais, que
suspendem a eficácia da lei estadual no que lhe for
contrário. Cabe, contudo, à União, privativamente, legislar
sobre seguridade social (art. 22, XXIII).
 Não é de se entender que a natureza da seguridade social
seja contratual e que decorreria do contrato de trabalho, mas
de lei, embora na vigência do contrato de trabalho é que ocorra
o
desconto
da
contribuição
previdenciária.
Outros
trabalhadores, todavia, não vinculados por contrato de
trabalho, também recolhem contribuições à Previdência Social,
como autônomos, sócios, diretores. Até mesmo a empresa tem
uma parcela calculada sobre os rendimentos da prestação de
serviços que é por ela recolhida diretamente, além do
desconto feito a empregados. O benefício, também, é
decorrente de lei.
 A natureza jurídica da Seguridade Social é publicista,
decorrente de lei (ex lege) e não da vontade das partes (ex
voluntates). A natureza jurídica da seguridade social
decorre da lei. Tem, portanto, cunho publicístico,
envolvendo o contribuinte, o beneficiário e o Estado, que
arrecada as contribuições, paga os benefícios e presta os
serviços, administrando o sistema.
 A relação jurídica é decorrente do exercício da atividade
laboral remunerada em relação aos segurados obrigatórios.
 Em relação ao segurado facultativo, há necessidade da
vontade do segurado de se filiar ao sistema, recolhendo a
contribuição.
 A Seguridade Social envolve um sistema de direito
social. É um direito fundamental da pessoa humana.
RELAÇÕES DO DIREITO DA SEGURIDADE
SOCIAL COM OS DEMAIS RAMOS DO DIREITO
1. DIREITO CONSTITUCIONAL → A Constituição de 1988 tratou do
Direito da Seguridade Social em todo um capítulo, denominado "Da
Seguridade Social", dentro do Título VIII ("Da Ordem Social"). Regula
a Seguridade Social nos Arts. 194 a 204. Existem, ainda, alguns
dispositivos esparsos no Art. 7º, que versa sobre direitos dos
trabalhadores urbanos e rurais, como: seguro-desemprego (inciso
II); 13º' salário com base na remuneração integral ou no valor da
aposentadoria (inciso VIII); salário-família (inciso XII); licença a
gestante, sem prejuízo do emprego e do salário, com duração de 120
dias (inciso XVIII); aposentadoria (inciso XXIV); assistência gratuita
aos filhos e dependentes desde o nascimento até cinco anos de
idade em creches e pré-escolas (inciso XXV); e seguro contra
acidentes do trabalho, a cargo do empregador (inciso XXVIII).
 Na verdade, da Constituição deveriam constar apenas princípios e
não matéria de lei ordinária, como ocorre na Lei Maior de 1988, entre
outras coisas; daí a necessidade de desconstitucionalização.
2. DIREITO DO TRABALHO → Alguns autores entendem que a
seguridade social, ou a previdência social, ainda faz parte do Direito
do Trabalho. Segundo esta corrente, o Direito do Trabalho poderia ser
assim dividido: Direito Individual do Trabalho, Direito Coletivo do
Trabalho, Direito Tutelar do Trabalho ou Direito Administrativo do
Trabalho, Direito Processual do Trabalho e Previdência Social.
 No entanto, com a Constituição de 1988, foi consagrado o Direito
da Seguridade Social como gênero que engloba a Previdência Social,
a Assistência Social e a Saúde. Assim, já está estabelecida a
autonomia do Direito da Seguridade Social.
 O Direito da Seguridade Social, entretanto, vai se abeberar em
vários conceitos oriundos do Direito do Trabalho, como o de
empregado (Art. 3º da CLT), empregador (Art. 2º da CLT),
remuneração (Art. 457 da CLT), salário (Art. 457 da CLT), salárioutilidade (art. 458 da CLT) etc. Também utiliza o Direito da Seguridade
Social conceitos advindos da legislação trabalhista esparsa, como de
empregado doméstico (Art. 1º da Lei nº 5.859), de trabalhador
temporário (Art. 16 do Decreto nº 73.841), etc.
3. DIREITO ADMINISTRATIVO → As determinações da seguridade
social são feitas por meio do Ministério da Previdência Social e da
legislação ordinária. O primeiro baixa normas administrativas.
Russomano (1979:55) já chegou a dizer que considera a relação
entre os dois ramos do Direito tão próxima que "o Direito da
Previdência Social nasceu do Direito Administrativo e caminha,
durante longos anos, ao lado do Direito do Trabalho".
 A normalização administrativa é feita por decreto editado pelo
presidente da República: o Decreto nº 3.048/99, que é o
Regulamento da Previdência Social. O Ministério da Previdência
Social expede uma série de portarias, ordens de serviço,
procurando esclarecer a lei e os decretos baixados sobre a
matéria.
 O INSS é uma autarquia, regendo-se por regras de
Direito Administrativo. Pertence à Administração Pública
indireta.
 No âmbito dos recursos administrativos, a orientação administrativa é
de suma relevância, mormente pelos julgamentos feitos pelas Juntas de
Recursos da Previdência Social (JRPS) e, em segundo grau
administrativo, pelos Conselhos de Recursos da Previdência Social
(CRPS). Tais órgãos são colegiados, com representantes dos
empregados, dos empregadores e da Previdência Social, que irão julgar
no âmbito administrativo os direitos dos segurados. Assemelham-se aos
Conselhos de Contribuintes (CC), que julgam administrativamente os
recursos atinentes aos impostos e contribuições federais. Tanto a JRPS
quanto o CRPS têm papel relevante, que é o de uniformizar a
jurisprudência previdenciária no plano administrativo.
 O Art. 75 da Constituição de 1891 determinou que as aposentadorias
seriam dadas aos funcionários públicos que se invalidassem a serviço
da Nação. Assim, a aposentadoria surge no sistema público e depois
passa para os demais trabalhadores. Atualmente, a Lei nº 8.112/90 trata
não só de direitos dos funcionários públicos, mas também de benefícios,
inclusive aposentadorias, mostrando a íntima relação com a Previdência
Social.
A exigência da contribuição previdenciária também importa em ato
administrativo. O lineamento, que constitui o crédito da Seguridade
Social, é um ato administrativo plenamente vinculado, gerando inclusive
responsabilidade para o agente administrativo.
4. DIREITO CIVIL → A Seguridade Social nasce das regras do seguro
privado do Direito Civil. A Previdência Social foi a primeira a dar
tratamento à esposa ilegítima, à concubina, em razão da sua
dependência econômica com o segurado. Esse tratamento foi aceito
tanto pela doutrina como pela jurisprudência no Direito Civil, no qual a
Seguridade Social foi buscar o conceito para assegurar certos
benefícios à concubina.
 No caso de falecimento do segurado separado ou divorciado,
discute-se o direito à pensão por morte pela ex-cônjuge.
 O Direito da Seguridade Social também adota certos conceitos
atinentes ao direito de família, obrigações e sucessões, que são
pinçados do Direito Civil e trazidos para o seio da disciplina ora em
comentário.
 A relação com o Direito Civil se verifica, por exemplo, na
responsabilidade do empregador pela ocorrência de acidente do
trabalho.
 A relação com o Direito Civil também ocorre quanto à Previdência
Privada Complementar, pois é feito um contrato entre as partes, de
natureza civil, embora haja a interferência do Estado na relação para
regulá-la.
5. DIREITO COMERCIAL → Não há dúvida de que a empresa hoje é a
principal fonte de recursos da Seguridade Social. É dela que provém
a maior parte da arrecadação da Seguridade Social, detendo a maior
participação no custeio dos futuros benefícios previdenciários a
serem concedidos aos trabalhadores.
O conceito de empresário também é importante para a Seguridade
Social, pois ele é um dos segurados obrigatórios individuais do
sistema.
O Direito da Seguridade Social aplica os conceitos de recuperação
judicial e falência, principalmente quanto à habilitação do crédito
previdenciário. Por outro lado, a contabilidade da empresa servirá de
prova para a verificação do recolhimento das contribuições da
seguridade social.
6. DIREITO PENAL → A Constituição consagra o princípio de que não
haverá crime, nem pena, sem prévia cominação legal (Art. 5°, XXXIX). O
Código Penal dispõe quais são os crimes praticados contra a
Seguridade Social, como a sonegação do recolhimento das
contribuições da seguridade social (Art. 337-A), a apropriação indébita
previdenciária (Art. 168-A), a falsidade material e ideológica, etc.
7. DIREITO INTERNACIONAL → A relação do Direito da Seguridade
Social com o Direito Internacional Público é constatada por meio dos
tratados e convenções internacionais sobre a matéria.
 Há longo tempo, verificam-se tratados sobre tratamento recíproco
a respeito de reparação de acidentes do trabalho, como entre
Bélgica e Luxemburgo, em 1905; entre França e Inglaterra, em 1909;
entre Alemanha e Espanha, em 1913.
 Após a Segunda Guerra Mundial, cresceu o número de tratados
sobre Seguridade Social prevendo reciprocidade entre as prestações
de seguro social.
 Em decorrência da criação da Comunidade Econômica Européia,
foi criado o Código Europeu de Seguridade Social, que foi
complementado pela Convenção Européia de Seguridade Social, de
1972.
 O Brasil mantém diversos tratados de direitos recíprocos quanto à
previdência social, como com Portugal, no qual se assegura a
contagem do tempo de serviço em ambos os países (Decreto nº
67,695, de 3-12-1970). Foi feito novo acordo de Seguridade Social
entre Brasil e Portugal em 7-5-91, tendo sido aprovado pelo
Congresso em 23-12-92, sendo que o Decreto nº 1.457, de 17-4-95,
promulgou o referido acordo.
 A Declaração Universal dos Direitos do Homem, de 1948,
prevê no Art. 22 que "todo homem, como membro da
sociedade, tem direito à segurança social...". Dispõe o Art.
85 que "todo homem tem direito a um padrão de vida capaz
de assegurar a si e a sua família saúde e bem-estar,
inclusive alimentação, vestuário, habitação, cuidados
médicos e os serviços sociais indispensáveis, o direito à
seguridade no caso de desemprego, doença, invalidez,
viuvez, velhice ou outros casos de perda dos meios de
subsistência em circunstâncias fora de seu controle.
 A relação do Direito da Seguridade Social com o Direito
Internacional Privado ocorre quanto aos conflitos de leis
no espaço. Seria o caso de um trabalhador ser
contratado na Espanha e vir a trabalhar no Brasil. Aqui,
sofre acidente do trabalho. Qual é a lei aplicável para a
reparação do infortúnio, a brasileira, a espanhola ou
outra qualquer?
8. DIREITO TRIBUTÁRIO → Essa relação torna-se mais evidenciada no
tocante ao custeio do sistema da seguridade social. Começa com o
problema da natureza jurídica da contribuição à seguridade social, se
é ou não tributo. Também podemos verificar tal relação quando vamos
analisar a questão do lançamento previdenciário, que vai buscar
normas subsidiárias no Art. 142 do Código Tributário Nacional (CTN)
para a constituição do crédito previdenciário. Do mesmo modo, os
Arts. 45 e 46 da Lei nº 8.212, que tratam de decadência e prescrição do
crédito previdenciário, repetem os Arts. 173 e 174 do CTN sobre os
mesmos institutos quanto ao credito tributário. Em períodos
anteriores, o prazo de decadência era regulado pelo Art. 173 do CTN.
Os Arts. 45 e 46 da Lei nº 8.212 modificaram apenas os prazos de
prescrição e decadência, que passaram a ser de 10 anos para cada
um.
 Podemos aplicar outros conceitos oriundos do Direito Tributário,
como o de fato gerador (Art. 114 do CTN), obrigação (Art. 113 do
CTN), sujeito ativo (Art. 119 do CTN), sujeito passivo (Art. 121 do
CTN), incidência, base de cálculo, contribuintes etc.
9. DIREITO FINANCEIRO → Há também relação da matéria em exame
com o Direito Financeiro, principalmente quanto à fixação da receita
que irá para os cofres da Previdência Social.
O § 2º do Art. 195 do Estatuto Supremo deixa claro que "a proposta de
orçamento da seguridade social será elaborada de forma integrada
pelos órgãos responsáveis pela Saúde, Previdência e Assistência
Social, tendo em vista as metas e prioridades estabelecidas na Lei de
Diretrizes Orçamentárias, assegurada a cada área a gestão de seus
recursos". O inciso III, do § 5º, do Art. 165, da Lei Magna dispõe que a
lei orçamentária anual compreenderá "o orçamento da seguridade
social, abrangendo todas as entidades e órgãos a ela vinculados, da
administração direta ou indireta, bem como os fundos e as fundações
instituídos e mantidos pelo Poder Público".
É vedada a utilização dos recursos provenientes das contribuições
sociais dos empregadores e dos trabalhadores para a realização de
despesas distintas do pagamento de benefícios do regime geral de
previdência social (Art. 167, XI, da Constituição).
DICA DE ESTUDOS
MARTINS, Pinto Sérgio. Direito da Seguridade Social. São Paulo: Atlas, 2007,
p. 26-38.
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