MARINHA DO B RASIL ESCOLA DE GUERRA NAVAL OPERAÇÕES PSICOLÓGICAS – A VITÓRIA DA INTELIGÊNCIA SOBRE A FORÇA C iro De Oliveira Ba rb osa Capitão-d e-C orveta 20 03 SUMÁRIO SUMÁRIO ............................................................. 2 INTRODUÇÃO .................................................... 3 DESENVOLVIMENTO ..................................... 5 CONCEITOS............................................................. 5 OPERAÇÕES PSICOLÓGICAS- PSYOPS ..................................... 5 ANTECEDENTES HISTÓRICOS.............................. 6 PERCEBENDO A IMPORTÂNCIA DAS OPERAÇÕES PSICOLÓGICAS ................................ 11 CONCLUSÃO....................................................... 18 BIBLIOGRAFIA.................................................. 20 ANEXO A.............................................................. 21 ANEXO B .............................................................. 24 INTRODUÇÃO “ O i mp or t a n t e é e nf r aq u e ce r o u d es t ru i r a v o nt ad e d e l ut a r d o i ni m i g o, le v a r t e rr o r às s u as ho st e s” . Me s t r e S un Tz u As operações de guerra tem mostrado um aspecto que sempre ocorreu no desenrolar desses embates, porém, não muito explorado: o aspecto psicológico, ou seja, a mudança do comportamento, causado pelo termo “guerra”, influenciando as estruturas política, social, econômica e militar dos atores envolvidos. Esse aspecto psicológico visa basicamente: a manutenção do elevado moral da população e o desequilíbrio emocional do inimigo. Esse conjunto nos dá o enfoque psicológico da guerra, e, para materializá-lo são empregadas as Operações Psicológicas (PSYOPS)1. Nesse contexto, a persuasão torna-se um elemento chave das PSYOPS, uma vez que permite explorar o descrédito, a covardia e o desequilíbrio espiritual; ou seja, implica no enfraquecimento ou anulação da vontade de combater e de vencer do inimigo. 1 Operações Psicológicas (OP) - propósito: controlar o gerenciamento e o uso da informação com o intui- to de se obter vantagem militar, atingindo a mente ou vontade do oponente demovendo-o do desejo de lutar. Da mesma forma, a aplicação do conceito de persuasão no campo interno de um país, pode contribuir para elevar o moral dos combatentes e das populações, fazendo-os compreender a importância da causa em questão e a necessidade de se lutar, minimizando, inclusive, a possibilidade de sucesso das ações inimigas .(2) O presente trabalho analisa, de forma sucinta, a contribuição do emprego das Operações Psicológicas (PSYOPS) para a rápida vitória da Coalizão na última guerra do Iraque, enfocando, prioritariamente, a atuação das agências americanas, apesar da participação secundária de outros atores ( países) nessa área. DE SENVOLVIME NTO CONCEITOS OPERAÇÕES PSICOLÓGICAS- PSYOPS A abrangência das PSYOPS é ampla alcançando as infra-estruturas física, militar, econômica, política e social. Será objeto deste ensaio somente o campo militar. Nessa ótica, as ações das OP, assim como a “Gestão da Percepção” subdividem-se nos seguintes níveis de atuação: estratégico, operacional e tático. Dentro do nível estratégico podemos apontar as operações voltadas contra a vontade nacional, já as ações classificadas como operacionais ou táticas, são as direcionadas contra os comandantes adversários e as suas tropas. Atualmente, vivemos uma época de abertura do mundo sem precedentes tornando mais complexa a nossa compreensão dessa realidade, gerando expectativas e uma demanda por informações em tempo real levando a mídia a veicular matérias sensacionalistas e com hiper-realismo. Falamos acima sobre realidade, mas o que é a realidade? A definiremos para o escopo deste assunto, como um fenômeno da percepção humana, dessa forma, não seremos o que somos, seremos tudo aquilo que os outros perceberem ou forem levados a crer que sejamos. “Estamos assim, vivendo tempos não mais da notícia como informação, e sim da notícia como espetáculo. E notícia como espetáculo não é re- gida pelas regras da informação, mas sim pelas regras da dramaturgia” (Arthur da Távola). Na ótica do macro-setor de comunicação, os principais atores envolvidos são os grandes conglomerados da mídia e o Estado. Os “alvos” são os clientes desses atores, que se encontram ávidos por informações, principalmente, as que atendam aos quesitos: quem, quando, onde e como. Assim, o volume dessas informações que chega até o leitor / telespectador / ouvinte é tão grande, que quase não se torna possível perceber as enormes variações sobre os mesmos fatos, ocasionando, que qualquer engano simplesmente não mereça retratação. Outro fato de interesse, é que nenhuma campanha veiculada pelos meios de comunicação prospera, sem antes haver uma predisposição latente do público alvo. E para criar esse interesse, controlá-lo e orientá-lo para a direção desejada será preciso dominar o binômio comunicação e informação. ANTECEDENTES HISTÓRICOS Em 1972 as companhias, americanas e inglesas, que exploravam o petróleo no Iraque foram expropriadas desse país, e a partir daí, sempre desejaram findar a ditadura de Saddam. Todavia, naquela ocasião, o Estado americano considerava que seus interesses no combate à União Soviética tinham prioridade em relação aos dessas companhias. Com o fim da guerra fria, parece ter chegado a hora da vingança. Iniciou-se, nos EEUU, os planejamentos para a conquista da região vital ao fornecimento de petróleo. Nesta última guerra contra o Iraque, os interesses permaneceram quase os mesmos que existiam na época da invasão do Kuwait: • Depor Saddam Hussein e “liberar o povo do Iraque”, mesmo a custa da violação das regras do direito internacional e do princípio de não interferência nos assuntos internos de outros países; • Aumentar o grau de controle sobre os acessos às fontes de petróleo e vingar as companhias americanas e britânica expropriadas em 1972; • Combater o desemprego e a queda da atividade econômica nos EEUU, criando demanda por equipamentos, bens e serviços suficientes para aumentar tanto o nível de emprego como o dos salários necessários à manutenção do “american way of life”( estilo americano de viver). Esse objetivo parece já ter sido alcançado em face ao elevado custo diário da guerra e da solicitação já efetuada de reforço de verba no valor de muitos bilhões de dólares, apenas na primeira semana de operações; • Manter a popularidade da atual administração. Um em cada quatro americanos aprovou o ataque; • Ressaltar a importância das diversas bases militares que respondem por muitos contratos cuja manutenção é vital à saúde econômica do país. A cidade de San Antonio no Texas, apenas para citar um exemplo, somente vive em função das grandes bases militares lá localizadas. O ataque afasta a possibilidade do retorno das tentativas democráticas de downsizing (diminuição de contingente) das Forças Armadas; • Evidenciar a pouca utilidade de outras forças armadas que não a norteamericana; • Instalar bases militares no Iraque – próximo às grandes reservas de petróleo do mundo, retirando-se da Arábia Saudita; • Enviar um claro recado a países que intentem opor-se à política de dominação norte-americana, mostrando claramente ao que podem ser submetidos. A Coréia do Norte já entendeu o recado para reduzir o seu ímpeto em ameaçar o Japão, inimigo milenar, porém aliado americano; • Influenciar as mentes do povo norte-americano acerca da importância de construir -se o escudo de mísseis que garantirá a segurança de todos contra países capazes de efetuar ataques com mísseis balísticos intercontinentais conduzindo ogivas nucleares. • Tratado que proibia o desenvolvimento de armas de defesa já foi superado. É possível que estejam em desenvolvimento novos interceptadores endoatmosféricos e exoatmosféricos; • Garantir a defesa de Israel; • Gastar o máximo possível de equipamento militar de todos os tipos, de forma a assegurar o aumento das verbas a fundo perdido para a pesquisa científica que idealizará os devidos “replacements” cada vez com novas tecnologias; • Enfraquecer a idéia da união dos povos árabes; • Mostrar determinação no combate ao terrorismo; • Injetar com rapidez novo fôlego na economia. A logística envolvida na manutenção das vastas forças armadas norte-americanas em diversos países significa fabuloso gasto diário de milhões de dólares, traduzidos por milhares de contratos de prestação de serviços de todas as naturezas possíveis de imaginar; • Criar a curto prazo as condições necessárias à assinatura de contratos milionários para a reconstrução de tudo o que, foi destruído, significando outra injeção positiva na atividade econômica norte-americana; • Enfraquecer a União Européia. Após a invasão do Kuwait, muitos contratos de prestação de serviços fornecidos pelos norte-americanos foram cancelados, passando o Iraque a negociar com os franceses e os alemães. Esses países tornaram-se grandes investidores naquele país. É claro que os contratos assinados na gestão de Saddam podem perder sua validade com a queda do regime. Também a reconstrução do país, provavelmente, deixará de fora outros países que não integram a chamada coalizão. Essa possivelmente seria a principal motivação do posicionamento da França e da Alemanha na ONU, tentando evitar a invasão. Essa é outra fonte de conflito; • Garantir o controle político do Oriente Médio, influenciando a solução da questão palestina de forma a satisfazer Israel e reduzindo as possibilidades das reações adversas a essa solução; e • Enfraquecer o Conselho de Segurança e seu incômodo poder de vetar quaisquer interesses norte-americanos, mesmo sendo esse país a maior potência militar do planeta, capaz de opor-se a todas as outras. Os bombardeios na chamada “no-fly zone” já estavam sendo feitos à revelia do Conselho de Segurança. Também é oportuno citar que Israel já ignorou impunemente 64 resoluções desse Conselho e o Iraque, 17. O novo mundo que emergirá desses conflitos fica mais fácil de entender à luz dessas motivações. Mais recentemente, espalhou-se boato acerca de possuir o Iraque a maior reserva de petróleo do mundo, superando a da Arábia Saudita. Existiriam reservas de cerca de 300 bilhões de barris. Entretanto, a riqueza da região não está pautada somente em petróleo, segundo o que foi discutido em Kyoto, no III Fórum Mundial da Água, na região do atual conflito, temos os rios Tigre e Eufrates, que formam um complexo hídrico da mais alta importância para o desenvolvimento econômico e social dos países da região. Esse complexo é compartilhado por quatro países: Turquia, Síria e Iraque e, com participação menor, o Irã. Problemas e conflitos relacionados a esse compartilhamento são históricos na região do chamado “crescente fértil” e tendem a se agravar em decorrência das guerras amiúdes. Tommy Franks, general americano que comandou as forças da Coalizão, afirmou recentemente que esta Guerra estava planejada há um ano. Pelas informações disponíveis, o seu planejamento recua a 1989, Plano 1002-90, quando Saddam Hussein se tornou, aos olhos dos USA, um verdadeiro obstáculo à consecução dos seus intentos geo-estratégicos na Região do Médio-Oriente. Conforme os trechos descritos acima, podemos perceber o claro objetivo de se definir o Iraque, de Saddam Russein, como um país pária, ou seja que se opunha às condições político-econômicas emanadas dos EUA e que, devido aos interesses americanos no Golfo Pérsico, era imprescindível retira-lo do poder, todavia, os EUA não poderiam, simplesmente através da força, realizar esse objetivo, já que a opinião pública internacional reagiria a essa ação e pressionaria seus governantes a condenar tal atitude, tendo como resultado para os EUA, a diminuição do apoio de seus aliados, com a conseqüente perda de poder mundial, o que certamente alimentaria outras nações a preencherem esse vácuo de influência criado, desestabilizando o equilíbrio mundial. Assim, era preciso fornecer “argumentos convincentes” à opinião pública mundial, mostrando o perigo representado pelo regime de Saddam. Que instrumento poderia prover tais argumentos? As Operações Psicológicas foram a resposta. PERCEBENDO A IMPORTÂNCIA DAS OPERAÇÕES PSICOLÓGICAS No desenvolvimento da Operação Iraqi Freedom 2, um aspecto chamou a atenção: a forma como a Coalizão procurou influenciar as atitudes e o raciocínio das opiniões públicas estrangeiras e, especialmente, do povo iraquiano. A essas ações chamou-se de “Gestão da Percepção”. Este conceito abrange as seguintes áreas: Diplomacia Pública, Operações Psicológicas (PSYOPS), Informação Pública, Decepção e Ação Encoberta. 2 Iraqi Freedom – Operação militar que foi conduzida pelos países que compunham a Coalizão, para retirar do poder do Iraque o ditador Saddam Hussein. De interesse, no caso especial da Operação Iraqi Freedom foram: a diplomacia pública, com o a tentativa deliberada de convencer as opiniões públicas estrangeiras do conteúdo e exatidão das políticas da Coalizão, suas intenções e ações, e, as PSYOPS, utilizando-se das diversas formas de mídia para influenciar e convencer as mesmas opiniões públicas estrangeiras e o povo iraquiano. Durante a campanha militar no Iraque, a Coalizão possuía como um de seus objetivos, tornar a percepção mundial do conflito favorável aos seus anseios. Esperava-se alcançá-la através da aplicação de algumas medidas, como por exemplo, a “inserção” de repórteres em unidades militares na frente de combate. Embora inicialmente controversa, essa decisão foi, posteriormente, considerada como acertada por várias razões. Primeiro, os repórteres foram submetidos a um treinamento militar para adquirirem a noção da realidade vivida pelo soldado na cena de ação. Segundo, essa convivência comum criou um elo inevitável de dependência entre os repórteres e as unidades por eles cobertas. E, terceiro, o intercâmbio transmitia a sensação de segurança ao repórter, proporcionada pelas forças da Coalizão. Entretanto, todas essas ações não conseguiram limitar, como esperado, a disseminação das matérias elaboradas, pois a proliferação das fontes de notícias prejudicou esses esforços. O aumento significativo do número dessas fontes permitiu aos espectadores tomar conhecimento de notícias que reforçavam os seus próprios preconceitos e opiniões. Por exemplo, um espectador árabe, ao perceber que as reportagens transmitidas pela rede de televisão americana, CNN, e- ram desfavoráveis à sua expectativa de notícias, poderia tranqüilamente selecionar um canal de televisão árabe via satélite, como a Al-Jazeera, com uma perspectiva do conflito mais compatível com a sua . A Agência de Informação Iraquiana ao perceber o poder de influência da Al-Jazeera na sociedade árabe, decidiu infiltrar agentes naquela emissora, a fim de que, a cobertura do conflito tivesse um caráter mais favorável às forças iraquianas. Analogamente, a Coalizão tentou impedir as transmissões da televisão iraquiana, por meio de bombardeios de seus prédios e de ações de interferência eletrônica, em uma tentativa de diminuir sua influência junto ao público interno e externo ao Iraque. (3) Enquanto a diplomacia pública, atuando a nível estratégico obteve, na melhor das hipóteses, resultados diversos, o emprego das PSYOPS no Iraque a nível militar operacional e tático foi melhor sucedido. A utilização da mídia de massa como: transmissões de televisão e rádio , panfletos (Anexo A), e-mails dirigidos contra autoridades civis e militares iraquianas, bem como de alto-falantes durante as operações terrestres (Anexo B), parece ter tido um impacto decisivo. (4) Mais de 40 milhões de panfletos foram lançados sobre o Iraque antes do primeiro ataque de 20 de Março e outros 40 milhões foram lançados durante a campanha. Alguns panfletos ameaçavam destruir qualquer formação militar que resistisse e combatesse, enquanto outros encorajavam a popula- ção e os militares iraquianos a ignorarem as ordens emanadas dos dirigentes do Partido Baath 3. A análise atual dessas ações nos mostra que atingiram o efeito desejado. O problema, assim como de todas as ações das PSYOPS, é a dificuldade de determinar a ligação causa/efeito de uma ação durante a guerra, como por exemplo, o “desaparecimento” dos militares iraquianos, quando da chegada das tropas americanas e inglesas, foi resultado: das PSYOPS, dos bombardeios efetuados pelos aviões da Coalizão, da falta de apoio logístico ou foi o resultado da conjugação destes três fatores?. Quantificar o efeito das PSYOPS no controle das atitudes e comportamento iraquianos, de forma favorável para a Coalizão, continua a ser uma variável importante a se determinar. Efetivamente, a Coalizão não assistiu a um nível de rendições iraquianas análogo ao da Guerra do Golfo em 1991, que atingiu 70.000 homens. Embora 250 iraquianos tenham se rendido no primeiro dia, durante a tomada de Umm Qasr, esse número não se mostrou expressivo nos ademais dias do conflito. No início do confronto, a forma como a Coalizão abordou toda a campanha militar pode, como já mencionado, ser considerada psicológica, pois era esperado que o emprego de uma força esmagadora e de munições de precisão “chocaria e aterrorizaria” o inimigo, e que o regime iraquiano seria facilmente derrubado. 3 Partido Baath – partido político oficial do Iraque, ao qual pertencia Saddam Hussein. A falha na aplicação da teoria do “choque e terror” 4 obrigou as forças militares convencionais dos EUA a modificarem a sua abordagem e, sem dúvida, fez com que as forças das PSYOPS reexaminassem os seus temas e mensagens, alterando o enfoque, agora, baseado mais em uma forma de pressão constante, do que na esperança de que um simples golpe de nocaute fosse resolver o assunto. Além do lançamento de panfletos, o outro tipo de PSYOPS muito usado foi o rádio. Na emissão, a partir de estações fixas, ou de plataforma aérea (o avião Command Solo EC-130E), a Coalizão usou uma programação semelhante à Radio Sawa,5 com muita música popular intercalada com notícias e alguns anúncios. Estações de rádio fixas, também voltadas para as atividades de PSYOPS, foram estabelecidas fora dos grandes centros populacionais – sendo uma delas a estação de rádio PSYOPS do Reino Unido, Radio Nahrain (Dois Rios), uma estação de rádio de FM criada nos arredores de Baçorá. Além de montar as suas próprias estações transmissoras, a Coalizão tentou interferir eletronicamente nas transmissões das estações de rádio iraquianas, nos mesmos moldes realizados com as estações de televisão, a fim de deter o monopólio da informação e controlar a influência desse meio na população do Iraque. 4 A teoria prescreve duas táticas para conseguir a vitória: o “choque” imediato da destruição maciça e o mais duradouro “pavor” que leve o inimigo a se sentir confuso, fraco e impotente. Os impactos buscados são “intimidação e obediência”. Esta teoria foi arquitetada em 1996 pelos estrategistas militares americanos Harlan Ullman e James Wade. (1) 5 Uma estação americana chamada Radio Sawa, que funciona 24 horas por dia, começou a ecoar música pop pelo mundo árabe no exato mês em que a guerra EUA-Iraque começou. Os grandes hits da Sawa, segundo milhões de jovens árabes, que apreciaram a programação, são Madonna e Britney Spears. A rádio mistura música pop e notícias na língua árabe e foi sucesso em Bagdá, a terra de Saddam Hussein.(5) As táticas PSYOPS descritas até agora são exemplos das chamadas “PSYOPS brancas”, aquelas que declaram abertamente e com rigor quem patrocina a ação. Durante o conflito do Iraque, as chamadas “PSYOPS negras”, aquelas que teoricamente são produzidas por uma entidade, mas na realidade são criadas por outra, também foram usadas. Consta que a Agência Central de Inteligência dos EUA (CIA) teria instalado estações de PSYOPS Negras, já, em Fevereiro de 2003. Uma destas estações, Radio Tikrit, tentou estabelecer a sua credibilidade junto à população local, através do seu guarnecimento ter sido feito somente por iraquianos, da área de Tikrit, leais à Coalizão e mantendo uma linha editorial submissa apoiando Saddam Hussein. Contudo, passadas poucas semanas, o tom mudou e a estação tornouse crescentemente crítica de Saddam. Um dos cuidados na aplicação das PSYOPS negras é que o público alvo não descubra o estratagema e acredite sempre, que a informação está sendo originada na entidade erroneamente pretendida, a qual já está sendo considerada pelos ouvintes cativos a mais crível. Evidentemente, que o risco é grande, pois se o estratagema for descoberto, o fator confiança alcançado até então, será perdido e o cumprimento das tarefas alocadas às estações, na prática das PSYOPS tanto brancas como negras, será prejudicado. Um dos meios mais inovadores usados pelas PSYOPS na preparação da Operação “Iraqi Freedom” foi a utilização de mensagens escritas enviadas para telefones móveis e de e-mails transmitidos diretamente para as au- toridades civis e militares iraquianas. No princípio de 2003, só existiam 60 “cibercafés” no Iraque e a taxa de ligação de 25 dólares excedia as possibilidades da maior parte dos população. O regime iraquiano também era cauteloso em permitir o acesso à internet em todo o país. Assim, enquanto muitos iraquianos comuns não tinham acesso à WEB, a maior parte dos dirigentes do Partido Baath o possuíam e, a Coalizão usou estes meios para descrever, a cada uma das autoridades, o custo da manutenção do seu apoio a Saddam, tanto para o Iraque coletivamente, como para eles próprios. O emprego táticos de meios nas PSYOPS, como um veículo com alto-falante e um tradutor ( Anexo B) também foram realizados diretamente pelas unidades do exército e dos fuzileiros. Estes veículos mostraram a sua valia ajudando: a convencer elementos iraquianos isolados a render-se; na manutenção do controle de prisioneiros; e, conduzindo operações de embuste contra elementos militares iraquianos através de efeitos sonoros simulando carros de combate e helicópteros. Estranhamente, parece que os responsáveis pelo planejamento militar da Iraqi Freedom não se preocuparam, o suficiente, com o desenvolvimento prévio de uma capacidade PSYOPS pós conflito. Em conseqüência, agentes iranianos, especialmente no Sul do Iraque, puderam em alguns casos, preencherem o “vazio de informação” deixado. Os EUA reagiram através da contratação de empresas de mídia para, rapidamente, colocarem no ar qualquer coisa que preenchesse tais “vazios”. CONCLUSÃO Com o término da Guerra Fria, o governo dos EUA, pressionado pelas empresas petrolíferas, principalmente as que foram retiradas do Iraque em 1972, voltou a dar a importância ao controle estratégico do petróleo. Para aumentar as razões da presença americana na região, surge outro elemento de vital interesse estratégico. Segundo as conclusões discutidas em Kyoto, no III Fórum Mundial da Água, em um futuro não muito distante, a água será um item de acirrada disputa internacional e a bacia do Tigre – Eufrates, no interior do Iraque, detém a maior parte dessa riqueza. No desenvolvimento da Operação Iraqi Freedom, a aplicação do conceito da “Gestão da Percepção” permitiu atingir a vontade de lutar do oponente, bem como fornecer os meios para proteger a própria sociedade americana, sendo que, as PSYOPS foram as ferramentas para se alcançar tal intento. Um dos componentes da Gestão da Percepção, a diplomacia pública mostrou-se de difícil aplicação e os resultados podem levar anos a aparecer, entretanto, quanto às PSYOPS nos níveis militar operacional e tático seu emprego foi melhor sucedido. Nesse níveis foram utilizados, entre outros, os seguintes meios: rádio, televisão, panfletos e carros com auto-falantes. A conjugação de emprego de repórteres e tropa trouxe um fator muito positivo para as forças da Coalizão, haja vista que, o convívio criava uma aproximação entre esses componentes tendo como conseqüência a veiculação de uma imagem positiva da Coalizão nos diversos tipos de mídia. Todavia, esse procedimento não produziu o efeito desejado de limitar as notícias nos meios de comunicação, já que um novo ator apareceu: a emissora de TV árabe, Al- Jazeera proporcionando uma outra ótica da guerra. Este fato gerou uma série de represálias por parte dos EUA, entre elas, a interferência e bloqueio eletrônico das transmissões de televisão e rádio iraquianas. Na cena de ação foram lançados folhetos com mensagens instigando as tropas a deporem as armas, carros com auto-falantes concitando a população a colaborar com os invasores, aviões transmitindo programas de TV e rádio, estações fixas de rádio sejam elas do tipo “branca” ou “negra”, todos esses meios voltados para a persuasão da vontade do povo iraquiano, todavia, ainda há dificuldade de se afirmar concretamente se, por exemplo, o “desaparecimento” dos militares iraquianos por ocasião da chegada das forças da Coalizão foi fruto das PSYOPS ou da conjugação de vários outros fatores. O esforço para conquistar os corações e os espíritos não diminuiu no Iraque atual e provavelmente continuará nos próximos anos. Na verdade, é em parte o resultado desta luta que determinará, em última análise, se valeu a pena desencadear o conflito ou não. As idéias apresentadas nos manuscritos de “A Arte da Guerra” de Sun Tzu permanecem cada dia mais atuais, na medida em que o conflito do Iraque e os conceitos de “enfraquecer ou destruir a vontade de lutar do inimigo” podem ser perfeitamente nele ser aplicados. B IBL IOGRAFIA Blinde, Caio, Guerra testa teoria do “Choque e Pavor”, texto obtido no endereço: http://www.bbc.co.uk/portuguese/iraque/030324_iraquecaiodb.shtml, no dia 08/SET2003; Cambese, Manuel Junior, Cel Av R/R, Conferencista Especial para Assuntos Internacionais da Escola Superior de Guerra, texto obtido no endereço: http://www.esg.br, no dia 24/AGO/2003; Collins, Steve, Tem Cel, Chefe das PSYOPS na Divisão de Operações do Quartel- General Supremo das Potências Aliadas na Europa (SHAPE) em Mons, Bélgica; Gestão da Percepção; texto obtido no endereço: http://www.nato.int/docu/review/2003/issue2/portuguese/art4_pr.html, no dia 27/AGO/2003; DefenseNews, Info-Ops War Planning, pag 54, publicado em 09/JUN/2003; e Ribeiro, Lúcio, Folha OnLine, texto obtido no endereço:http://www.radiobase.blogspot.com/2003_03_01_radiobase_archive.html, no dia 08/SET2003. ANE XO A Exemplos de panfletos distribuídos à população iraquiana durante a Operação Iraqi Freedom. ANE XO B Veículo modelo Hamme empregado para apoiar as PSYOPS Tradutor portátil utilizado pelas tropas da Coalizão na guerra do Iraque