Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto Disciplina de Cirurgia da FMUP INFECÇÃO DOS TEDIDOS MOLES Alexandre Pinto Patrícia Ferreira Rosa Gomes Tiago Gomes Turma 7 - Grupo H 5 de novembro de Infecções das Partes Moles - Superficiais Superficiais Circunscritas/focais Difusas Profundas (necrozantes) Abcesso Foliculite Furúnculo Carbúnculo Impétigo Ectima gangrenosa Linfangite Linfadenite Hidradenite supurativa Celulite Erisipela Fasceíte necrosante Miosite necrosante Outras: Úlcera de pressão Úlcera de estase venosa Pé diabético Doença Pilonidal Infecção do Local Cirúrgico (ILC) Infecções das Partes Moles - Superficiais ABCESSO Etiologia: - Anaeróbios (+aeróbios); - Staphylococcus aureus. Sinais e sintomas: Centro necrótico e edema periférico; Tumefacção; Flutuação, com pús; Eritema; Dor; Febre; Mal-estar; Arrepios; Linfadenopatia regional; Fistulização e descarga purulenta... Infecções das Partes Moles - Superficiais ABCESSO Infecções das Partes Moles - Superficiais ABCESSO Factores Predisponentes: - Foliculite, furúnculo, carbúnculo, celulite; - Trauma/queimaduras; - Cateteres intravenosos... Diagnóstico - Clínico; - Cultura da drenagem. Infecções das Partes Moles - Superficiais ABCESSO Tratamento: - Incisão e Drenagem; - Antimicrobianos. Complicações: - Extensão local da infecção; - Gangrena; - Extensão da infecção à corrente sanguínea. Infecções das Partes Moles - Superficiais FOLICULITE Infecção e inflamação dos folículos pilosos. Etiologia: - Staphylococcus aureus (+++); Str. pyogenes, Ps. aeruginosa, Gram (-), fungos... Sinais e sintomas: - Pequena pápula eritematosa/ vesícula/ pústula; Queda do pêlo; Prurido ou dor. Foliculite por St. aureus Infecções das Partes Moles - Superficiais FOLICULITE Diagnóstico: - Tratamento: - Clínico – morfologia lesões. Compressas quentes; Boa higiene; Antissépticos tópicos; Antimicrobianos. Complicações: - Furúnculo. Infecções das Partes Moles - Superficiais FURÚNCULO Infecção necrótica profunda do folículo piloso de uma área restrita. Frequente drenagem espontânea à superfície da pele. Etiologia: - Staphylococcus aureus (foliculite++). Sinais e sintomas: - Frequente evolução: foliculite → furúncul → abcesso; Nódulo profundo e adjacente ao folículo piloso; Dor; Base eritematosa; Centro purulento e flutuante; Adenopatia regional. Infecções das Partes Moles - Superficiais FURÚNCULO Tratamento: - Incisão e drenagem caso haja flutuação; Antimicrobianos. Complicações: - Furúnculo recorrente; Carbúnculo; Celulite; Gangrena; Fasceíte necrosante; Hidradenite supurativa; Flebite purulenta... Infecções das Partes Moles - Superficiais CARBÚNCULO Infecção profunda de um grupo de folículos contíguos que, separados por septos, drenam por orifícios independentes. Etiologia: - Staphylococcus aureus; Bacillus anthracis. Sinais e sintomas: - Massa de trajectos fistulosos (entre folículos infectados); Dor, eritema, flutuação; Aberturas pustulares; Febre; Mal-estar; Mialgias e linfadenopatias. Infecções das Partes Moles - Superficiais CARBÚNCULO Infecção por Bacillus anthracis - Antraz Infecções das Partes Moles - Superficiais CARBÚNCULO Infecções das Partes Moles - Superficiais CARBÚNCULO Tratamento: - Incisão e drenagem caso haja flutuação; Antimicrobianos. Complicações: - Feblite purulenta; Septicemia. Infecções das Partes Moles - Superficiais IMPÉTIGO Etiologia: - Sinais e sintomas: - Staphylococcus aureus; Streptococcus pyogenes. Eritema; Evolução pápulas → vesículas → pústulas; Ruptura espontânea → crosta seca amarela dourada; Prurido. Factores predisponentes: - Queimaduras, picadas de insecto, humidade; Crianças em más condições de higiene e clima tropical. Infecções das Partes Moles - Superficiais IMPÉTIGO Tratamento: - Cuidados higiénicos; Antibioterapia. Complicações: - Linfadenite/linfagite; Celulite; Bacteriemia; Glomerulonefrite. Infecções das Partes Moles - Superficiais ECTIMA GANGRENOSA Etiologia - Idiopática (50%); Mecanismos imunológicos. Sinais e sintomas: - Lesão pustular com centro necrótico característico; Contorno violáceo; Eritema; Dor; Libertação de exsudado purulento e hemorrágico; Febre, mal-estar, mialgias e artralgias. Infecções das Partes Moles - Superficiais ECTIMA GANGRENOSA Infecções das Partes Moles - Superficiais ECTIMA GANGRENOSA Diagnóstico: - Clínico – Doenças associadas (DII, AR, Hepatite crónica…); Morfologia lesões; Exame histológico – exclusão de outras etiologias. Tratamento: - Glicocorticóides; Antimicrobianos; Imunossupressores; Imunoglobulinas i.v.; Desbridamento. Infecções das Partes Moles - Superficiais Celulite Qualquer idade Membros Agentes Streptococcus pyogenes (2/3) Staphylococcus aureus (1/3) Pseudomonas aeruginosa (mãos e pés) Haemophilus influenzae (face de - crianças) Factores predisponentes - Lesões cutâneas - Micoses - Diabetes - Alcoolismo - Obesidade - Gravidez - Alterações da drenagem venosa ou linfática Celulite Sinais e sintomas - Eritema - Edema - Aumento de temperatura local - Dor - Bolhas - Adenomegalia - Abcedação Terapêutica - Antibioterapia - Elevação da área atingida - Evitar outros traumatismos - Factores predisponentes Complicações - Linfangite e linfadenite - Septicemia Infecções das Partes Moles - Profundas Conjunto de várias doenças infecciosas distintas mas com patofisiologia, apresentação clínica e abordagens terapêuticas semelhantes Factores predisponentes: - Doenças crónicas e/ou imunossupressoras (diabetes mellitus, obesidade grau III, cirrose hepática…); - Alcoolismo e abuso de outras drogas; - Neoplasias malignas; - Úlceras isquémicas e de decúbito; - Traumatismos cutâneos, cirurgias e outras portas de entrada. Sinais e sintomas precoces: - Dor severa - Febre sem outra causa identificável - Vesículas da pele - Edema tenso - Eritema - Equimoses focais e/ou isquemia - Crepitações - Parestesias Infecções das Partes Moles - Profundas Celulite necrotizante - - Clinicamente semelhante à fasceíte necrotizante mas a infecção é mais superficial Envolve pele e gordura subcutânea Geralmente aparece nas 24h após uma cirurgia A toxicidade não é tão grave como na miosite necrotizante - Não necessita de terapêutica cirurgica extensa, apenas de desbridamento Infecções das Partes Moles - Profundas Miosite necrotizante (gangrena gasosa) Mortalidade 25-100% ♂:♀ 1:1 Incidência não varia com a idade Clostridium perfringens Clostridium septicum Clostridium bifermentans outros Etiopatogenia - Tecido muscular aparentemente com massa desvitalizada normal mínima (cirurgia, trauma) Colonização por Clostridium da PMN Colonização por Clostridium ambiental intestinal - Produção Forte associação de toxinas com neoplasias GI - Necrose C. septicum tecidular mais frequente e com - - associação mais forte a neoplasias Toxicidade cardíaca Miosite necrotizante (gangrena gasosa) Sinais e sintomas - Dor - Febre ligeira - Apatia - Edema e exsudação serohemática Pele adquire tonalidade azul/negra Vesículas e bolhas hemorrágicas Crepitações Odor adocicado - - Taquicardia pouco coerente com temperatura corporal - Hipotensão - Falência renal - Melhoria paradoxal do estado de consciência - Choque cardiogénico - Hemólise Miosite necrotizante (gangrena gasosa) Sinais e sintomas mais importantes - Dor intensa - Edema - Vesículas e bolhas hemorrágicas - Crepitações - Taquicardia relativa - Alterações do estado mental - Odor adocicado Estudo analítico Imagiologia (Rx eTAC) Exploração cirúrgica Miosite necrotizante (gangrena gasosa) Terapêutica - Manutenção dos sinais vitais - Antibioterapia (benzilpenincilina, clindamicina, cefalosporinas, cloranfenicol…) - Desbridamento cirúrgico - Oxigénio hiperbárico Complicações - Hemólise generalizada - Coagulação vascular disseminada - Falência renal - Síndrome de insuficiência respiratória aguda - Choque Infecções das Partes Moles - Profundas Fasceíte necrotizante Mortalidade em média 70% ♂:♀ 3:1 38-44 anos Raramente atinge crianças Etiopatogenia - Fáscias profundas com algum grau de hipóxia (traumatismos, cirurgia recente, comprometimento circulatório…) - Proliferação de bactérias aeróbias gram e anaeróbias - Comprometimento da função leucócitária pela hipóxia - Produção de gases (hidrogénio, metano, azoto…) - Necrose dos tecidos envolventes Staphylococcus aureus Bacteroides, Clostridium, Peptostreptococcus Enterobacteriaceae Bacteroides fragilis Escherichia coli Streptococcus pyogenes grupo A Fasceíte Necrotizante Sinais e sintomas - Dor e edema sobre lesão inicial - Pode não apresentar qualquer outro sintoma - - Dor evolui para anestesia Área eritematosa expansiva Bordos mal definidos Mal estar geral - Pele azulada, acastanhada ou enegrecida - Necrose - Incisões revelam fáscia com aspecto verde amarelado - Extensão muito rápida - Produção de gás e crepitações - Choque - Falência orgânica múltipla - Fasceíte Necrotizante Sinais e sintomas mais importantes - Necrose tecidular - Descargas purulentas - Dor intensa - Produção de gás - Progressão rápida através de fáscias - Ausência dos sinais inflamatórios clássicos Estudo analítico Imagiologia (TAC e RM) Biópsia tecidular Fasceíte Necrotizante Terapêutica - Manutenção dos sinais vitais - Antibioterapia empírica (cloranfenicol, cefatriaxona, metronidazol, gentamicina…) - Desbridamento cirúrgico agressivo - Oxigénio hiperbárico Complicações - Choque séptico - Colapso cardiovascular - Falência renal - Cicatrizes inestéticas Infecções das Partes Moles - Profundas Gangrena de Fournier Forma de fasceíte necrotizante Períneo, porções proximais dos MI e parede abdominal ♂ 50-70 anos com comorbilidades Sinais e sintomas - Prodromo de 2-7 dias com febre e letargia - Aumento da dor, edema e eritema - Crepitação subcutânea - Gangrena e drenagem espontânea do conteúdo purulento Terapêutica - Especial atenção à anatomia do períneo Complicações - Dor associada a erecções Outras Infecções dos Tecidos Doença Pilonidal Úlceras de Pressão Úlceras de Estase Pé Diabético Infecção do Local Cirúrgico Doença Pilonidal Infecção adquirida Abcesso/seio na região sacrococcígea, que resulta do crescimento de pêlos para dentro da pele Homens, brancos, 15-40 anos Doença Pilonidal Complicações: Recorrência; Infecção necrotizante; Degeneração maligna. Doença Pilonidal Tratamento Não cirurgico; Cirurgico: Drenagem Excisão Prognóstico Excelente Úlceras de Pressão Resultam de pressão prolongada nos tecidos moles sobre os ossos e consequente necrose isquémica. A maioria pode ser prevenida. Úlceras de Pressão Prevenção: Os pontos de pressão devem ser aliviados; Mudar de posição a cada 2 horas; Camas com sistemas de flutuação. Pesquisa diária de possíveis áreas eritematosas. Úlceras de Pressão Tratamento: Difícil e prolongado Desbridamento de todo o tecido desvitalizado Recobrir Locais cirurgicos devem ficar livres de pressão 2 a 3 semanas Cura espontânea (úlceras pequenas) Pé Diabético Aumento da susceptibilidade a infecções por: Neuropatia diabética Diminuição da sensibilidade dolorosa Deformidades ósseas (pé de Charcot) Doença arterial periférica Isquemia crónica Imunodeficiência Pé Diabético Profilaxia e tratamento Controlo da diabetes Uso de calçado adequado Antibioterapia Cirurgia Infecção do Local Cirúrgico Resulta da contaminação bacteriana durante ou após um procedimento cirúrgico. Infecção do Local Cirúrgico A maioria das feridas cirúrgicas é contaminada. A infecção raramente se desenvolve se: a contaminação for mínima, a lesão for pequena, houver boa perfusão e oxigenação do tecido subcutâneo, não houver espaço morto. Infecção do Local Cirúrgico Risco de infecção: Factores de risco do doente Contaminação da ferida Limpa (<2%) Limpa-contaminada (2%-5%) Contaminada (5%-30%) Infectada Infecção do Local Cirúrgico Clínica: 5º e 10º dias Febre Dor Edema Infecção do Local Cirúrgico Prevenção: Cirurgia cuidadosa e limpa; Redução da contaminação; Promover as defesas do doente. Suturas. Infecção do Local Cirúrgico Tratamento: Abrir a ferida e deixá-la drenar Antibioterapia nas infecções invasivas Prognóstico Abordagem do doente com infecção das partes moles História Clínica – Doença Actual Modo de aparecimento; Evolução cronológica; Dor, prurido, alterações da sensibilidade; Escorrências (supurativas, sanguinolentas, serosas); Causa aparente… História Clínica – Exposições Idade Viagens; Ocupação profissional; Passatempos; Cirurgia recente; Produtos tópicos; Medicação; Plantas irritantes; Higiene pessoal; Alcool e drogas; História Clínica – Exposições Residência; Stress fisio/psicológico Marisco ou água de mar; Parto recente; Traumatismo; Mordeduras animais ou humanas; Estado imunológico; Contacto com animais; … História Clínica – Comorbilidades História traumática acidental ou iatrogénica; Patologia adjuvante: Cardiovascular; Respiratória; Hepática; Endócrina; Imunológica; Neurológica… História Clínica – Comorbilidades Diabetes mellitus; Eczema; Psoríase; Dermatomicose; Bypass com veia safena; Linfedema crónico; Estáse venosa; Antecedentes locais; … Comorbilidades Atenuam a clínica, encobrindo a severidade da infecção: A DM – estreptococcias e infecção do pé diabético; A obesidade - infecção profunda com poucas manifestações cutâneas; A cirrose hepática - infecção por V. vulnificus. Comorbilidades A imunossupressão aumenta a vulnerabilidade à infecção, particularmente na neutropenia e hospitalização recente: Colonização por organismos multi-resistentes; Pseudomonas - ectima gangrenosa (neutropenia). Diabetes Mellitus Possíveis alterações do quadro clínico: Ausência de febre e leucocitose; Hiperglicemia marcada e toxicidade sistémica sugerem infecção agressiva/profunda; Ausência de taquicardia; História natural: aeróbios/anaeróbios estreptococcos do grupo B grupo A; Gás nos tecidos - infecção mista ou Clostridia (as estreptococcias não produzem gás). Diabetes Mellitus DM Hiperglicemia Vasculopatia Imunidade Neutrófilos Neuropatia Regeneração Inflamação: Eritema; Edema; Calor; Dor, Antibióticos Comorbilidades Exame físico cuidado e consulta precoce de cirurgia; A variação da resistência aos antibióticos torna a terapia empírica ineficaz e exige cultura e antibiograma seriados como guia; A doença por Gram (-) em pessoas saudáveis é rara, mas bastante frequente nos imunocomprometidos. Exame Físico - Pele A relação anatómica dos diferentes tipos de lesões; Sinais inflamatórios: Eritema, calor, dor e edema. Sinais de infecção: Flutuação; Drenagem; Odor… Exame Físico - Pele Simetria; Crepitações; Vesículas/Bolhas; Pápulas/Pústulas; Nódulos/Densificações; Manchas/Cor; Úlceras; Lacerações… Exame Físico – Sinais de Alerta Sinais de infecção severa: Epidermólise; Bolhas violáceas; Necrose; Ulceração cutânea; Angeoedema; Alterações sensitivas e dor profunda: Síndrome do compartimento… Toxicidade Sistémica Dor local severa e progressiva; Febre; Taquicardia/Palpitações; Fadiga/Astenia; Hipotensão/Afundamento mental; Taquipneia/Dispneia; … Exames Laboratoriais Obter amostras para coloração imediata por Gram (morfologia); Na suspeita de toxicidade sistémica, realizar: Exames culturais específicos e antibiograma; Hemocultura (dois ensaios); Hemograma; Gasimetria; Ionograma: Bicarbonato; Cálcio. Creatinina; CPK (creatine phosphokinase); Glicose; Albumina… Biópsia Biopsia na celulite: Só 20% das culturas é positivo; A IF é muito sensível nas estreptococcias, mas cara e complicada. Biópsia Infecção não associada a lesão de entrada: 50% das fasceítes necrosantes e mionecroses estreptocóccica; 100% das gangrenas gasosas por C. Septicum; Disseminação hematogénia com exteriorização cutânea tardia; O dx e tx definitivo precoces reduzem a mortalidade e morbilidade; A preparação extemporânea de biopsia cirúrgica reduz: O tempo de dx de 6 dias → 21 horas; Mortalidade de 72,7% → 12.5%. Imagiologia Radiografia simples; Ecografia; TC; RMN; … Radiografia Simples Gás: Músculo; Tecido subcutâneo. Alterações ósseas: Osteolíticas; Desformações. Osteomielite. Ecografia Abcesso Tomografia Computorizada Fasceíte necrosante complicada com mediastinite. Ressonância Magnética Nuclear Infecção do compartimento dos adutores, complicado por Síndrome de Compartimento. Diagnóstico Cirúrgico O apoio de Cirurgia pode ser crucial na presença de: Sinais de toxicidade sistémica; Bolhas arroxeadas, equimose ou epidermólise; Sinais de necrose na TC ou RMN; Trauma, cirurgia ou parto recentes; Evidência de síndrome do compartimento; Dor severa progressiva, mesmo se apirética; Evidência clínica ou imagiológica de gás nos tecidos… Diagnóstico Cirúrgico Inspecção directa de fáscias e músculos; Colheita de material de qualidade superior para: Preparação extemporânea e coloração Gram; Histopatologia; Cultura; Antiobiograma… Desbridamento cirúrgico imediato do tecido necrótico; Melhorar o prognóstico da lesão profunda grave, pouco sintomáticas e tardiamente diagnosticada. Dx Diferencial A inflamação acompanha a infecção, mas é inespecífica e associa-se a patologia não infecciosa (ex., alergias), podendo mimetizar ou ser causa adjuvante da infecção; A histopatologia (imunofluorescência) é útil no dx de processo não infeccioso, mas a simetria no exame físico é um sinal forte. Diagnóstico OBJECTIVOS E ALERTAS: Obter (história clínica e exame físico) os elementos chave para determinar a potencial causa da infecção; Avaliar (exame físico) a profundidade e a severidade da infecção; Atentar no potencial de certas terapias e comorbilidades alterarem o quadro clínico clássico; Realizar testes laboratoriais para caracterizar e determinar a etiologia da infecção, e guiar a antibioterapia empírica/definitiva; Reconhecer os dados clínicos/laboratoriais de toxicidade sistémica; Reconhecer que as infecções das partes moles possuem etiologia variada e podem ser confundidas com doenças não infecciosas. Hospitalização Angeoedema; Febre ou síndrome gripal; Taquicardia (exagerada para a temperatura); Hipotensão (basal ou ortostática); Taquipneia; Afundamento mental; Progressão rápida da infecção; Sinais de necrose: equimose, bolhas violáceas, epidermólise, crepitações, ulcerações; Hospitalização Linfangite; Dor contínua, severa, evolutiva, fixa, de difícil controlo; Evidência de síndrome de compartimento; Sinais de I.R.: creatinina e CPK elevadas, hipoalbuminemia, acidose metabólica; Hipocalcemia; Hiperglicemia (marcada nos diabéticos); Falência multi-orgânica… Ambulatório Obter o consentimento informado do paciente (ou responsável legal); Assegurar a existência do ambiente domiciliário apropriado; Acesso fácil e capacidade de recorrer a cuidados de saúde; Disponibilidade de pessoal de enfermagem creditado na administração e.v. e cuidados médicos 24h por dia… Ambulatório Contra-indicações: Infecção grave (necrose, disseminação); Toxicidade sistémica; Diabetes Mellitus; Doença arterial oclusiva periférica (DAOP); Terapia imunosupressora/corticoterapia; Obesidade; Doença varicosa grave ou linfedema; Prótese; Alcoolismo; Idade avançada; … Tratamento Empírico Sem sinais sistémicos ou comorbilidades, usar antibioterapia anti estafilococcica e estreptococcica: Mediante baixo risco de MRSA: Nafcilina/dicloxacilina e.v.; Cefalosporina oral (cefuroxima, cefpodoxima, cefadroxil…); Azitromicina/claritromicina e.v.; Ampicilina/sulbactam e.v. e depois amoxicilina/clavulanato oral; Nova fluroquinolona (levofloxacina, moxifloxacina…); Clindamicina… Tratamento Empírico Mediante alto risco de MRSA: Vancomicina e.v.; Oxazolidinona (linezolido) e.v. ou oral; Regime ambulatório: Cefalosporina: ceftriaxona (1x dia) ou cefazolina (2x dia ou 1x dia + probenecide oral); Infusão de 24h com outros antibióticos, com acesso i.v. adequado (ex. catéter venoso central); Dar prioridade ao tx ambulatório sempre que possível. Tratamento Cirúrgico Remoção cirúrgica da fáscia friável e músculo escurecido não sangrante e sem abalos; Alargar o desbridamento cirúrgico até atingir tecido viável; Reparar possíveis danos vasculares. Tratamento Cirúrgico Amputação: Infecção invasiva e virulenta de comportamento maligno; Inviabilidade tecidular por lesão vasculonervosa… Tratamento Cirúrgico Cirurgia plástica… Desbridamento Cirúrgico; Mecânico; Autolítico; Enzimático. Desbridamento Fasciotomia Terapia adjuvante Na infecção grave com toxicidade sistémica: Fluidoterapia na hipotensão, azotemia e acidose metabólica; Hipertensores quando sem resposta aos fluidos; Monitorização intensiva (UCI); Oxigenoterapia; Ventilação mecânica; Hemodiálise (IRA); Oxigénio hiperbárico; Plasmaferese; Imunoglobulinas IV; PCR. Prevenção Prevenir a infecção secundária a lesão traumática; Traumatismo ligeiro: Queimaduras, escoriações, abrasões ou lesões de impacto; Flora cutânea (S. aureus e estreptococcos do grupo A); Limpeza simples com sabão bactericida é suficiente em pessoas saudáveis. Pé diabético: Limpeza agressiva e antibioterapia; Educar para lesões de causa neuropática, higiene, calçado protector, inspecção e tx precoce. Prevenção Lesão profundas (esmagamento ou fracturas expostas), com lesão vascular ou contaminação evidente pelo solo com: Limpeza cirúrgica profunda da ferida; Remoção de todo o material estranho; Re-anastomose vascular; Irrigação abundante com soro fisiológico; Antibioterapia; Deixar a ferida aberta; Assegurar-se da imunização activa contra o tetano… Prevenção Educar os pacientes com comorbilidades adjuvantes nas medidas de higiene preventivas: O pé diabético na DM; Bypass da veia safena; Linfedema crónico mastectomia, prostatectomia radical e radioterapia; Insuficiência venosa crónica; Infecção fúngica crónica dos pés. Seguimento Avaliação cautelosa antes, durante e após o tx, procurando sinais de recidiva: Sinais de drenagem persistente; Cultivar a drenagem para identificação do agente e antibiograma; Rx ou TC para excluir infecção profunda, corpo estranho ou osteomielite; A fisioterapia é vital na recuperação dos sobreviventes sujeitos a limpeza radical ou amputação; A consulta de medicina física e de reabilitação avalia a necessidade de prótese, reabilitação, reaprendizagem… Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto Disciplina de Cirurgia da FMUP CASO CLÍNICO 5 de novembro de Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto IDENTIFICAÇÃO MJCM ♂ 60 anos Caucasiano Profissão: Reformado (comerciante de produtos alimentar) Residência: Gondomar ANTECEDENTES PESSOAIS Ex-fumador há 20 anos; DM II diagnosticada há 10 anos; Dieta, exercício e ADO, o qual suspendeu 1 ano. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 HISTÓRIA DA DOENÇA ACTUAL 2006/03/30 – 1ª vez que se desloca ao S.U do HSJ - PORTO. MOTIVO DA URGÊNCIA Grave dispneia de esforço e astenia de agravamento contínuo com 1 mês de evolução. Edema dos M.I., inicialmente à direita e depois também à esquerda de evolução mais recente. Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 EXAME FÍSICO Pálido, hidratado, sem sinais de cianose ou icterícia; Sem tiragem. AP: sons simétricos, com crepitações inspiratórias e expiratórias, mais abundantes nos QS e reduzidas no 1/3 inferior direito. Sibilos bilaterais. Tempo de expiração ligeiramente prolongado; AC: S1 e S2 normais, sopro aórtico e taquicardia; FC: 100/110 bpm; TVJ a 45º positiva; PAS: 90/100 mmHg; PAD: 60/80 mmHg; Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 EXAME FÍSICO Abdómen: globoso e distendido, sem outras alterações; MI: edema bilateral até à extremidade proximal da coxa mais acentuado do lado direito; MS: Contractura de Dupuytren em ambas as mãos; Dx: Infecção respiratória inferior; Tx: Penicilina G; Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 2006/04/04 - 2ª vez que recorre ao S.U. do HSJ - PORTO Manutenção do estado geral e manutenção do esquema terapêutico. 2006-04-10 - 3ª vez que recorre ao S.U. do HSJ - PORTO MOTIVO DA URGÊNCIA Manutenção da sintomatologia respiratória e agravamento do edema dos M.I., particularmente à direita, com sinais inflamatórios na face anterior do 1/3 médio da coxa. Refere dor à palpação e à mobilização activa e passiva do membro. Aparente presença de flutuação local. Tentativa de aspiração local. Dx: Abcesso; Tx: Sem alteração; Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 2006/04/13 - 4ª vez que recorre ao S.U. do HSJ - PORTO MOTIVO DA URGÊNCIA Manutenção da sintomatologia respiratória e agravamento do edema dos M.I., em particular à direita, com acentuada inflamação da face anterior-interna do 1/3 médio da coxa. Drenagem espontânea de colecção purulenta, sugestiva de abcesso fistulado. Mancha de tonalidade azulada sugere possível hematoma infectado; Realização de ecografia à coxa direita e recolha de sangue para análises clínicas; O doente regressa a casa com o acordo de voltar no dia seguinte para ser internado no Serviço de Cirurgia do HSJ – Porto. Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 ECOGRAFIA – S.U. Densificação dos tecidos moles da coxa direita, em particular da face antero-interna com colecção complexa medindo 10X3,6cm de maior diametro sugestiva de volumosa formação abcedada ou hematoma infectado. Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 2006/04/14 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO MOTIVO DE INTERNAMENTO Abcesso em drenagem espontânea no 1/3 médio da face anterointerna da coxa direita com 2 semanas de evolução. ANÁLISES CLÍNICAS Leucócitos – 23000; PCR – 278; Glicose – 356; Tx: Drenagem cirúrgica do abcesso, ferida aberta; Suspensão da penicilina G e início de ciprofloxacina, metronidazol e insulina. Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 2006/04/17 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO Manutenção da sintomatologia respiratória, redução do edema da coxa; ANÁLISES CLÍNICAS Leucócitos – 14000; PCR – 232; Glicose – 236; Tx: Sem alteração. 2006/04/19 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO Manutenção da sintomatologia respiratória, redução significativa do edema e processo inflamatório da coxa; Tx: Suspende metronidazol, mantém de ciprofloxacina. Realiza Rx torácico. Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto Rx TORÁCICO Broncopneumonia e consolidação de grandes dimensões no 1/3 médio do pulmão esquerdo, (pneumonia lobar), dx diferencial carcinoma broncogénico. Sinais de derrame pleural nos ângulos costofrénicos. Pedido de TC torácico para esclarecimento. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 2006/04/21 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO Melhoria da sintomatologia; Anemia NC/NC; ANÁLISES CLÍNICAS Hemoglobina – 9; Leucócitos – 5000; PCR – 46; Glicose – 140; Tx: Sem alteração. Realização de TC torácico. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto TC TORÁCICO Consolidação pulmonar lobar dos lobos superiores, com broncograma aéreo. Derrame pleural bilateral de médio volume. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto TC TORÁCICO Achados sugestivos de hemorragia e infecção pulmonar em fase de resolução, ainda de considerar carcinoma broncoalveolar. Pedido de broncoscopia para despiste de neoplasia. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 5 de novembro de 2015 2006/04/27 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO Sem queixas. Melhoria franca do estado geral, com exame físico e análises clínicas dentro do normal. Diabetes controlada. Bom processo de cicatrização da ferida cirúrgica aberta, sem sinais de infecção. Tx: Sem alteração. Realização de TC torácico de controlo. Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto Rx TORÁCICO Sem imagens significativas de consolidação lobar e sem sinais de derrame pleural. Alguns sinais de fibrose do 1/3 médio do campo pulmonar esquerdo. Desaparecimento da imagem sugestiva de massa neoplásica. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 2006/05/04 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO Bem estar geral. Sem queixas. Tx: Sem alteração. 5 de novembro de 2015 Serviço de Cirurgia do Hospital de S. João – Porto 2006/05/04 – internado no S. de Cirurgia do HSJ - PORTO 5 de novembro de 2015