E Leonardo - [email protected] lá estava Chicona na primeira página de um jornal de grande circulação da cidade. Do lado de fora do meu carro, com os dois pés na porta, tentando abrir. Sim, a situação era hilária. Se a porta se abrisse, de uma hora para outra, ela voaria pelos ares, tamanha a força que colocava na maçaneta de fora, para tentar me tirar de dentro do automóvel. Àquela altura, de apavorada já achava graça da situação. Chicona, não. Ela chegou a chorar de raiva por não conseguir me salvar daquela prisão. “Victória, você não consegue sair pelo lado do passageiro?”, perguntava nervosa. E eu respondia incessantemente: “Quantas vezes terei de falar que estou entalada aqui. Como vou passar do outro lado do banco com um vestido longo, justo nas pernas e essa minha gordurinha extra?”. Ela então retrucava: “Só estou tentando arrumar um jeito de você sair daí, oras!”. Eu novamente entrava em cena: “Chicona, você já repetiu isso umas 40 vezes!”. O que nos levou a essa situação? Bom, a história é um pouco longa. Numa sexta-feira, na hora do almoço, fomos convidadas gentilmente por um grande amigo restaurateur para provar os seus famosos pratos. Entusiasmadas, aceitamos o convite. Lucy ficou no nosso restaurante, não sem antes reclamar: “Vocês duas sempre me deixam aqui trabalhando no TôchiqueTô e vão passear nos outros restaurantes!”. Chicona não agüentou e foi logo dizendo: “Lucy, Cozinha Profissional 100 querida, cada um tem uma função dentro deste restaurante. Victória cuida da cozinha, você da parte administrativa e eu do marketing. Por esse motivo, preciso levar a nossa sócia para ver a apresentação dos pratos do chef Gigi Saladinha. Cada um na sua, my darling! Faça a sua parte que faremos a nossa!”. Claro que Lucy chorou e tive de voltar para acalmar os ânimos. Chicona me aguardou no carro. Aproveitei o percurso até o restaurante para conversar um pouco sobre o ocorrido e o nervosismo de Lucy. “Prometa-me que não vão mais discutir assim.” Sim, chegamos. Não, Chicona não prometeu... Os manobristas muito solícitos guardaram o carro e uma recepcionista veio nos receber. Ela apontou a mesa em que Gigi nos aguardava e fomos nos sentar. Nem preciso dizer a maravilha que foi o almoço. A apresentação das comidas era algo espetacular. Ele se aproveita dos próprios ingredientes da receita para enfeitar os pratos. Nada muito sofisticado, nem difícil de fazer. Tudo muito natural e prático, porém original. Gigi sempre foi um chef que evitou molhos nas bordas dos pratos ou em cima de algum alimento simplesmente para enfeitar. “Non tem cabimento, gurudar molha nas bordas para a cliente sujar os mãos!” Gigi também explicou que sempre vale a pena decorar o prato, porque isso dá um grande apelo de venda aos produtos do cardápio, entretanto observou que são necessárias apenas duas palavras para o passo a passo da “decoraçon”: “Bom senso!”. Segundo Gigi, alguns restaurantes colocam temperos que alteram o gosto original do prato, enfeites de plástico, que podem enganar o cliente na hora de comer e ocasionar acidentes, sem contar algumas especiarias de que nem todas as pessoas gostam. Falou ainda das folhinhas ou ervas usadas em demasia nos pratos, que na hora de comer, o freqüentador do restaurante precisa quase de uma “lixeira” para tirar de cima da refeição! “Coloque-se na lugar do cliente, sempre! Pergunte se a decoraçon do parrato irá agradar ou irritar a sua apetite.” Chicona estava entusiasmada com a explica- w w w . c o z i n h a p r o fi s s i o n a l . c o m . b r ção. Entretanto, comecei a ficar preocupada com o temporal que se anunciava. Chamei-a para ir embora dezenas de vezes e nada. Até que a venci pelo cansaço. Agradecemos Gigi e fomos até o estacionamento. Ao sair do restaurante, os pingos começaram a desabar. O manobrista foi buscar o meu carro, enquanto o outro preparou o enorme guarda-chuva para nos levar. Quando o carro chegou, o motorista não saia de dentro. Então o rapaz, que nos livrava da água que caia, foi até a porta e abriu para perguntar o que estava acontecendo. “Nada”, disse ele. Saí do restaurante e fui em direção à casa de Chicona. Quando ia sair do carro para dar um abraço, qual foi minha surpresa? O manobrista havia quebrado a maçaneta e a porta não abria. Nesse momento, Chicona começou a procurar uma maneira de me fazer sair daquele enrosco com dignidade. Em vão. Uma viatura de polícia se aproximou e nos ofereceu ajuda. Chicona mais do que depressa aceitou. Foram muitas pancadas até que a porta se rompesse e saísse todinha do lugar. O prejuízo foi só meu. Contudo, poderia ter sido maior. Imagine você, leitor, se um assaltante armado me pega no farol, dá voz de assalto, e me manda descer? A porta emperrada e eu desesperada sem fazer o que ele pediu. O final não seria hilário, com certeza. O manobrista falhou mais em não ter me informado da quebra da maçaneta interna do que do próprio dano que causou ao meu veículo. Fiquei muito chateada por Gigi. Tanto esforço para decorar os pratos, oferecer um ótimo atendimento e, um colaborador sem atenção, de repente, coloca quase tudo a perder do lado de fora do estabelecimento... Longe das vistas do dono... Isso não pode acontecer. É preciso conscientizar os colaboradores de que a transparência e a honestidade com o cliente são sempre o melhor caminho! Com ou sem decoração dos pratos. [email protected] Palavras-chave para busca no site: Manobrista – decoração – atendimento Vovó Victória é uma personagem criada para os leitores da revista Cozinha Profissional Vovó Victória em: A verdade acima de tudo!