S e a voz d e i x a de se fazer ouvir a c r i a n ç a
g r i t a , c o m o p r i v a d a do b e m - e s t a r q u e esper a v a . O m e s m o desejo a n d a l i g a d o ao
r u í d o dos p a s s o s , ao do a b r i r ou fechar
d u m a p o r t a . T r a t a - s e d u m «simples a g r u p a m e n t o de reflexos c o n d i c i o n a d o s à v o l t a
d a s n e c e s s i d a d e s i n t r o c e p t i v a s » . A s impressões auditivas correspondem à passivid a d e d a c r i a n ç a : é a r a z ã o pela q u a l s ã o
as p r i m e i r a s a a p a r e c e r .
A vista, p e l o c o n t r á r i o , é e s s e n c i a l m e n t e
um sentido activo, investigador. Desde o
n a s c i m e n t o os olhos r e a g e m à luz pela cont r a c ç ã o d a s p u p i l a s e a oclusão d a s p á l p e b r a s . M a s só ao 2.° d i a ó q u e a c r i a n ç a
se fixa e a t e n t a n u m a d a d a m a n c h a lumin o s a c o m e x c l u s ã o d o u t r a . M a s n ã o se
p o d e dizer n e s t e m o m e n t o q u e a c r i a n ç a
v ê : há uma sensação luminosa, não há
p e r c e p ç ã o . A s aquisições pela v i s t a n ã o
começam senão por altura da J l . semana,
p o r q u e só n e s t e m o m e n t o os olhos s e g u e m
u m o b j e c t o q u e se d e s l o c a . E o m o v i m e n t o
c o n j u g a d o dos olhos e da cabeça, cuja exist ê n c i a é n e c e s s á r i a à p e r c e p ç ã o do e s p a ç o ,
só a p a r e c e ao 5.° ou 6.° m ê s . A d a t a r
deste m o m e n t o a c r i a n ç a acede ao «espaço
p r ó x i m o » p e l a s i n e r g i a dos m o v i m e n t o s e
p r i n c i p a l m e n t e p e l o s dos olhos e da c a b e ç a .
A o s e g u n d o mês, p o r u m a p r i m e i r a m a n i festação d a a t e n ç ã o , ( m a s de a t e n ç ã o p a s siva), p r o c u r a c o m o o l h a r os objectos q u e
m e c h e m . A p a r t i r d o 6.° m ê s a c r i a n ç a
interessa-se pouco a pouco pela contemplação dos objectos que vê. E ' ainda atenção
p a s s i v a , p o r q u e a a t e n ç ã o a c t i v a n ã o pert e n c e à i d a d e q u e e s t u d a m o s : ela será u m a
d a s c a r a c t e r í s t i c a s da s e g u n d a infância.
A sensibilidade fornece ao l a c t e n t e ensin a m e n t o s de p r i m o r d i a l i m p o r t â n c i a p a r a
a f o r m a ç ã o da p e r s o n a l i d a d e . N ã o s o m e n t e
a s e n s i b i l i d a d e í n t i m a lhe t r a n s m i t e as
s e n s a ç õ e s t o m a d a s nos s e u s p r ó p r i o s ó r g ã o s ,
mas existe t a m b é m u m a sensibilidade prop r i o c e p t i v a , p e r t e n c e n t e ao l a b i r i n t o d o
o u v i d o i n t e r n o , aos m á s c u l o s , às a r t i c u l a a
ções, q u e parece t e r u m a influência c o n s i d e r á v e l s o b r e as disposições e os e s t a d o s
p s í q u i c o s . Mas e x i s t e a i n d a u m a sensibilidade mais diferenciada: a que é devida ao
t a c t o ; ó muito tardia. P a r a que a criança
reaja ó p r e c i s o q u e a r e g i ã o e x c i t a d a seja
muito extensa. Nos primeiros meses, picad a s de a g u l h a b a s t a n t e p r o f u n d a s p a r a
fazer p e r l a r u m a g o t a de s a n g u e n ã o ocasionam reacção qúàsi nenhuma.
Enfim o l a c t e n t e vai c o n s e g u i r m a t e r i a i s
p a r a se c o n s t r u i r p o r si m e s m o o m o v i m e n t o . D e s d e as p r i m e i r a s h o r a s d a v i d a
a o p o s i ç ã o e n t r e as e x p r e s s õ e s de b e m e s t a r
e as d e m a l - e s t a r é s i g n i f i c a t i v a ; sob a
influência d e i m p r e s s õ e s a g r a d á v e i s , os
olhos a b r e m - s e e n o r m e s , os m e m b r o s agitam-se. H á uma sensação agradável porque
e n t r e a e x c i t a ç ã o e o t ó n u s , o t ó n u s e as
descargas musculares, h á um equilíbrio
c o n s t a n t e . P o u c o a p o u c o , os p r ó p r i o s
m o v i m e n t o s da v i d a de r e l a ç ã o f o r n e c e m
n o v a s n o ç õ e s . E n t r e a 17.* e a 3 0 . sem a n a a criança c o m e ç a a e s t e n d e r as m ã o s
e os l á b i o s n a direcção de o b j e c t o s q u e o
r o d e i a m como se eles a c o r d a s s e m o s e u
desejo. O c o n t a c t o dos o b j e c t o s com as
s u a s m ã o s e os seus l á b i o s , os reflexos de
p r e e n s ã o , de sucção e m a i s t a r d e o u t r a s
m a n i f e s t a ç õ e s d e a c t i v i d a d e , oferecem à
e x c i t a ç ã o inicial u m a p o r t a de s a í d a s a t i s fatória.
A ú l t i m a fonte de q u e a c r i a n ç a t i r a a s
excitações que vão produzir emoções, é a
sensibilidade
afectiva.
N o l a c t e n t e , a alegria e a dôr, parecem constituir estados
c o n s c i e n t e s a d a t a r do 3.° m ê s . A a l e g r i a
e a sua manifestação exterior, o sorriso, ó
a primeira marca da personalidade humana.
Os p r i m e i r o s s o r r i s o s , a n t e r i o r e s ao 3.° mês,
são o r e s u l t a d o de reflexos p o s t u r a i s ; o
q u e m a r c a a e n t r a d a n a v i d a ó o q u e ó dirig i d o a u m objecto e x t e r i o r , s o b a influência d u m a p e r c e p ç ã o , e n ã o s o m e n t e o q u e
n ã o é m a i s q u e u m a modificação d o t o n u s
muscular.
a
O papel da educação
T a i s s ã o as f o n t e s d a s emoções q u e
pela sua repetição vão criar n o lactente
u m a m a n e i r a d e ser, u m a r e a c t i v i d a d e e s p e c i a l q u e s e r á a d o m i n a n t e do seu c a r a c -
ter. M a s , p e r g u n t a se, o c a r a c t e r d a c r i a n ç a
ó i n t e i r a m e n t e c r i a d o p e l a s condições sociais
e i n d i v i d u a i s o n d e se e n c o n t r a colocado, ou
c h e g a ao m u n d o com u m c a r a c t e r i n a t o ?
Download

Síntese N11-12, 1940_30