FIZO – Faculdade Integração
Zona Oeste
FIZO – Faculdade Integração Zona Oeste
Alquimy Art
CURSO DE ESPECIALIZAÇÃO EM ARTETERAPIA
“A RELAÇÃO DO PALHAÇO COM O PACIENTE ONCOLÓGICO EM
AMBIENTE HOSPITALAR: ARTETERAPIA OU ARTE EM ESPAÇOS NÃO
CONVENCIONAIS?”
Clélia Arleth da Costa.
Uberlândia /MG
2006
1
FIZO – Faculdade Integração
Zona Oeste
CLÉLIA ARLETH DA COSTA.
“A RELAÇÃO DO PALHAÇO COM O PACIENTE ONCOLÓGICO EM
AMBIENTE HOSPITALAR: ARTETERAPIA OU ARTE EM ESPAÇOS NÃO
CONVENCIONAIS?”
Monografia
apresentada
à
FIZO
–
Faculdade Integração Zona Oeste, SP e
ao Alquimy Art de São Paulo como parte
dos
requisitos
para
a Obtenção do
título de Especialista em Arteterapia.
Orientadora: Flora Elisa de Carvalho
Fussi.
Uberlândia
2006
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FIZO – Faculdade Integração
Zona Oeste
COSTA, Clélia Arleth
A relação do palhaço com o paciente oncológico em
ambiente hospitalar: arteterapia ou arte em espaços não convencionais? /
Clélia Arleth da Costa – Uberlândia; 2006
xxp.
Monografia (Especialização em Arteterapia)
FIZO – Faculdade Integrativa Zona Oeste. Alquimy Art
1. Arteterapia
MG/BGSF
2.. Arte do Palhaço.
CDV.51
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FIZO – Faculdade Integração
Zona Oeste
FIZO – Faculdade Integração Zona Oeste
Alquimy Art
Pro-Reitoria de Educação Profissional
“A RELAÇÃO DO PALHAÇO COM O PACIENTE ONCOLÓGICO EM
AMBIENTE HOSPITALAR: ARTETERAPIA OU ARTE EM ESPAÇOS NÃO
CONVENCIONAIS?”
Monografia
apresentada pela aluna Clélia Arleth da Costa ao curso de
Especialização em Arte Terapia em 11/03/2006 e recebendo a avaliação da
Banca Examinadora constituída pelos professores:
________________________________________________
________________________________________________
________________________________________________
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FIZO – Faculdade Integração
Zona Oeste
À minha filha Maria Eduarda, ao meu sobrinho João Vítor e aos meus pais pela
amizade e confiança que depositaram em mim e em meus projetos.
À todos os pacientes do Hospital do Câncer de Uberlândia pela partilha
sincera.
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Zona Oeste
Em primeiro lugar agradeço, a Deus pela força e inspiração para cumprir minha
missão.
Aos professores pelo conhecimento.
Às minhas colegas de curso pela companhia na criativa jornada da Arteterapia.
Aos colegas de trabalho do Grupo Anjos da Alegria pelo universo de Magia
partilhado e a todos que acreditam e lutam pela manutenção deste projeto.
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Zona Oeste
RESUMO
Decidi pesquisar a relação do paciente oncológico com o palhaço de
hospital, por acreditar que este envolvimento, mediado pela arte do palhaço,
produz um encontro forte e poderoso capaz de dissipar a depressão que
advêm do estado de adoecimento.
Esta pesquisa parte do seguinte questionamento: a prática de palhaços
em ambiente hospitalar, pode ser considerada arteterapia ou apenas arte em
espaços não convencionais?
Os dados coletados para esta pesquisa, foram retirados dos relatórios
diários dos atores-palhaços do Grupo Anjos da Alegria que atuam no Hospital
do Câncer de Uberlândia, feitos ao longo de cinco anos de trabalho e da
pesquisa de Morgana Masseti, Psicóloga pesquisadora dos Doutores da
Alegria.
O público é constituído de pacientes adultos, crianças e seus
acompanhantes. Apesar da equipe médica não ser nosso foco, também é
atingida por nossa prática.
Os resultados foram entendidos sob a ótica da Psicanálise tendo as
teorias de Freud e os pressupostos de Winnicott, Byington, Jung e Frankl como
base teórica.
7
FIZO – Faculdade Integração
Zona Oeste
ABSTRACT
8
SUMÁRIO
RESUMO------------------------------------------------------------------------------------------7
ABSTRACT----------------------------------------------------------------------------------------8
INTRODUÇÃO----------------------------------------------------------------------------------10
DESCRIÇÃO DA SESSÃO------------------------------------------------------------------15
FISOLOGIA DO RISO-------------------------------------------------------------------------16
O ARQUÉTIPO DO PALHAÇO-------------------------------------------------------------17
MECANISMOS PSICOLOGICOS DE DEFESA ENVOLVIDOS NA RELAÇÃO
PALHAÇO-PACIENTE ONCOLÓGICO--------------------------------------------------20
TEORIAS DO HUMOR------------------------------------------------------------------------24
CONSIDERAÇÕES SOBRE O BRINCAR-----------------------------------------------30
DIFERENCIAÇÃO
DO
TRABALHO
REALIZADO
COM
CRIANÇAS
E
ADULTOS----------------------------------------------------------------------------------------32
RELAÇÃO DO PALHAÇO COM A CRIANÇA EM TRATAMENTO DO
CÂNCER------------------------------------------------------------------------------------------33
RELAÇÃO DO PALHAÇO COM O ADULTO EM TRATAMENTO DO CÂNCER-------------------------------------------------------------------------------------------------------37
CRITICA AO TRABALHO DE PALHAÇOS EM HOSPITAIS------------------------44
CONCLUSÃO-----------------------------------------------------------------------------------46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS-------------------------------------------------------50
9
INTRODUÇÃO
O trabalho de palhaços em hospitais ficou mundialmente conhecido a
partir do filme “Patch Adams: o amor é contagioso”. Este filme narra a trajetória
de um médico que tendo sido internado em um sanatório devido uma
depressão, sente na pele o descaso médico e decide tornar-se médico para
revolucionar as relações médicas através da humanização e do humor do
palhaço.
Em sua visita ao Brasil, Patch Adams afirmou que o grande mal da
humanidade nos últimos tempos tem sido a depressão. A depressão paralisa e
isola o indivíduo. Patch culpa o capitalismo uma vez que ele promove e reforça
a individualidade, que acaba por se transformar em individualismo. As pessoas
em defesa de sua “individualidade”, deixaram de se envolverem umas com as
outras valorizando excessivamente o seu espaço. O lugar que antes eram
destinados às pessoas e às relações, passou a ser substituído pelas coisas e
por bens de consumo. O agradável passeio ao cinema deu lugar aos Home
Theathers domésticos, as saudáveis conversas de botequins foram trocadas
por salas de bate papo virtuais, a conseqüência dessa mudança de
comportamento tem sido o aumento vertiginoso dos casos de depressão que
afetam todas as faixas etárias. Para ele, a depressão é fruto da falta de amor,
combater a depressão é combater o individualismo e investir no envolvimento,
na relação humana. Nos casos de doenças graves como o câncer que é
normalmente acompanhada pela depressão, a conduta de envolvimento é uma
necessidade!
10
NA
PLATÉIA:
CLÉLIA,
LILIAN E
ROSE.
ANJOS DA
ALEGRIA
Peixoto (1994) pontua o fato de vivermos em uma sociedade dividida
onde muitas vezes a cultura e o teatro servem aos ideais das classes
dominantes, o processo criativo também deve estar presente nas classes
subalternas e estigmatizadas demandando esforços pela libertação e pela
construção de uma nova sociedade. Em detrimento desta opressão social de
11
classes, o teatro deixou de lado seu papel social contestador e se aliou às
classes dominantes patrocinadoras da cultura das pompas e dos ideais da
elite. Neste contexto, o palhaço vem resgatar esse compromisso social da arte
dando voz ao doente de câncer estigmatizado na sociedade.
A pesquisa do tema se justifica por dar suporte reflexivo para uma
prática que vem crescendo muito nos últimos tempos: os palhaços de hospitais.
Há cinco anos desenvolvo este trabalho e tive a oportunidade de entrar em
contato com muitos grupos que fazem o mesmo tipo de trabalho, com objetivos
e qualidades bem diferenciadas. Conheci grupos que primam pela qualidade de
espetáculo sem se preocuparem com a qualidade de envolvimento com o
público, já vi grupos que se dedicam ao envolvimento e deixam a desejar na
qualidade artística, assim como vi grupos que se atentam aos dois eixos de
ação: envolvimento humano e expressão artística.
Especulo que a ação terapêutica mora no envolvimento direto do
palhaço com o paciente e não no espetáculo em si. Nestes grupos pude
diferenciar dois tipos de palhaços: o primeiro provoca o riso em seu publico
ridicularizando características físicas ou psicológicas de alguém da platéia,
muitas pessoas se esquivam de palhaços por medo de se tornarem alvos de
suas brincadeiras sem limites. O segundo provoca o riso ridicularizando a si
mesmo fazendo de sua imagem, espelho para que os outros possam se ver em
seus fracassos, medos e debilidades. Essa segunda classe de palhaço é capaz
de se fazer pequeno e incapaz para que sua platéia se sinta plena de poderes,
agraciados por não estarem na pele dos palhaços. Qualquer ser humano
normal é mais sedutor, mais inteligente, mais esperto que qualquer palhaço da
12
segunda espécie. O pré-requisito para seu um palhaço de hospital é pertencer
ao segundo grupo descrito anteriormente, generosidade e atitude amorosa são
posturas imprescindíveis para promoverem encontros terapêuticos, talvez
possamos dizer arteterapêuticos entre palhaço e paciente.
Ostrower (1998), afirma que a arte como terapia anula a arte. O palhaço
não tem objetivos terapêuticos. Sou palhaça e sou psicóloga, enquanto
palhaça, meu único objetivo é comunicar-me com alegria e provocar o paciente
para que faça o mesmo. Quando me ponho a relatar os fatos em meu diário de
palhaça, concluo que esses encontros foram terapêuticos além de artísticos.
O fato do paciente expressar artisticamente e se sentir aliviado de suas
tensões, a meu ver, não pode ser desconsiderado. Também não acho que
devamos colocar os palhaços dentro de um modelo médico para ser “mais
terapêutico”.
Não só os grupos podem ser classificados, a postura dos pacientes
também diferencia a qualidade de envolvimento, e estes podem ser
enquadrados em três grupos:
1) Paciente espectador – envolve-se com a cena, mas de maneira
passiva, no plano interno, da imaginação, não se torna
personagem da proposta do palhaço.
2) Paciente personagem – envolve-se com a cena, participa
ativamente dela desempenhando um personagem coerente com
a proposta do palhaço. Este tipo de paciente é um facilitador de
13
nosso trabalho, embarca fácil na fantasia,
não só
cria
personagens para contracenar com o palhaço como cria ciladas
para
ridicularizar
e
desafiá-lo.
Esta
dinâmica
de
jogo,
normalmente aproximar as pessoas, fazendo com que elas
ganhem aliados e se fortaleçam enquanto pessoas e seres em
busca da cura.
3) Paciente indiferente – não se envolve, resiste ao contato com o
palhaço. O medo de serem publicamente ridicularizados ou a
revolta por estarem doentes em algumas vezes faz com que o
paciente assuma uma postura indiferente à figura do palhaço.
Neste caso, ele deve ser respeitado e não receber nenhuma
retaliação visto que nosso objetivo é fortalecer o ego do paciente
através do humor e generosidade, aceitando o mal momento do
paciente em questão. A indiferença possui um componente
agressivo, o comportamento de indiferença produz um sentimento
de isolamento do mundo, é desesperador para a família quando
isso acontece, fica entendido que a alegria não lhe diz respeito,
que se encontra reduzida a pulsão de vida neste paciente.
Respeitamos, mas nunca desistimos de pacientes neste estado,
mas sem dúvida, os benefícios de nossa atuação são bem
reduzidos. Quanto maior o envolvimento das partes, maior a
qualidade terapêutica do encontro.
14
DESCRIÇÃO DA SESSÃO
As sessões ocorrem nos leitos e corredores do Hospital do Câncer de
Uberlândia. Nos leitos, a atuação é sempre desenvolvida a partir de uma visita
médica de rotina onde o médico é um palhaço especialista (Besteirologista,
Risologista, Pipocolaringologista, musicopiadista) que realiza exames pouco
convencionais como medir o riso, medir assanhamento vital, indicar cirurgias
de extração de grilos na cabeça, dentre outros.
Não há um roteiro ou espetáculo pré-definido, a base da atuação dos
palhaços está nos elementos encontrados nos cenários (corredores e leitos) e
nas permissões e reações do público (Pacientes, Acompanhantes e Equipe
médica). Os atores são orientados a não serem invasivos, brincar deve ser
uma escolha livre dos envolvidos.
A duração das apresentações depende da necessidade do paciente e da
energia despendida para se divertir, o importante é que a brincadeira tenha
começo, meio, fim e nexo para encontros posteriores.
A estrutura do trabalho de palhaço, normalmente obedece a seguinte
regra: um personagem Branco e um Augusto. A personalidade destes
personagens são complementares, o Palhaço Branco é a elegância, a graça, a
harmonia, a inteligência e a lucidez, é aquele que se propõe de maneira
moralista. Normalmente está associado à imagem castradora da mãe, da
professora e do pai. O Palhaço Augusto possui em sua essência a ingenuidade
de uma criança, é aquele que erra sem perceber seu erro e continua seguindo
seus instintos básicos, já o Branco também erra, mas não admite suas falhas e
15
em geral coloca toda sua culpa, no outro, um bom exemplo desta dinâmica são
os famosos personagens conhecidos como o gordo (Branco) e o magro
(Augusto).
Trabalhando desta forma, as pessoas mais recalcadas podem estar se
identificando com o personagem Branco ao passo que as menos reprimidas
têm a chance de se identificarem com o personagem Augusto, sendo desta
forma respeitadas em sua individualidade.
A FISIOLOGIA DO RISO
Adams (1999) relata que a tensão tem efeito na fisiologia, e que
elementos como: humor, amor, surpresa, curiosidade, paixão, perdão, alegria,
entusiasmo, estimula o sistema imunológico contra infecções, fortalecem as
células que combatem o câncer e afetam a forma de como cuidamos de nós
mesmos e dos outros.
Na fisiologia do riso, as lágrimas e a saliva passam a ter mais
imunoglobinas, um anticorpo que é a primeira linha de defesa contra algumas
infecções virais e bacterianas, o cérebro e o corpo passam a produzir betaendorfinas, opiciáceos internos que ajudam a relaxar e a reduzir a dor. Os
hormônios do estresse produzidos pelas glândulas supra-renais são reduzidos.
O riso possui um efeito anti-inflamatório nas articulações e ossos, alem de
promover oxigenação do sangue. (ADAMS, 1999).
Carbelo (2000), conclui que os benefícios do riso abrangem tanto os
aspectos psicológicos quanto físicos, estimula o sistema cardiovascular,
16
imunológico, muscular, respiratório, endócrino, nervoso central e periférico
(simpático e parassimpático), promove a vasodilatação, melhorando a
circulação, controlando a pressão arterial, promovendo o relaxamento
muscular, uma vez que os músculos se tornam bem irrigados pelo sangue. A
liberação de endorfinas e serotoninas, elimina-se toxinas, esteróides e
hormônios. Em aspectos psicossomáticos o humor melhora a auto-estima e a
crença de cura do corpo.
Adams (1999) coloca que as pessoas precisam do riso assim como de
aminoácidos essenciais e acrescenta que necessitamos de alívio cômico
sempre que as dores da existência nos oprimem.
O ARQUÉTIPO DO PALHAÇO
A palavra “palhaço” provém da língua Celta. Originalmente designa um
fazendeiro, um campônio, visto pelas pessoas da cidade como um indivíduo
desajeitado e engraçado (MASSETTI, 2000)
17
Pensar o palhaço como arquétipo é compreender sua existência para
além da idéia de espetáculo, é pensá-lo com um papel muito bem definido
socialmente, pois a ele é dada a autoridade, o direito oficial de subverter a
ordem.
A principal característica do palhaço consiste em romper com todas as
lógicas pré-estabelecidas de maneira alegre e despreocupada. O palhaço é
regido pelo princípio do prazer (Freud, 1920), ele pode ser e ter tudo o que
quiser, ele sempre apresenta uma saída inusitada para qualquer que seja o
conflito. O palhaço tem uma característica de decompor objetos, de relativizar
tudo e quebrar toda a seriedade teórica e prática seja ela qual for. Não
reconhece os heróis e tem uma busca incansável pelo contrário, todo
sentimento e todo impulso, todo pensamento que surge no palhaço se
desdobra no contrário.
A figura do palhaço enquanto arquétipo está também associada ao
mendigo, ao beberrão, ao bobo da corte... Marcio Libar ator e palhaço dos
Doutores da Alegria em um artigo para o site Mundo ao contrário cita Jango,
um palhaço Bufão norte-americana no que diz: “Ser um bom palhaço só é
possível quando você tem ridículos e fragilidades e consegue, não ter nenhum
problema com isso: e não se levar à serio. O palhaço é o perdedor, aquele que
perdeu para o sistema. Porém quem perdeu tudo não tem mais nada a perder
e, portando, pode fazer o que quiser.”( JANGO apud LIBAR, 2004)
Reconhecer-se ridículo significa romper com o que Freud (1914) chama
de dor narcísica, é tirar de si a responsabilidade de ser perfeito, neste sentido,
a conseqüência desta postura é um maior sentimento de liberdade em ser, ou
18
seja, reconhecer-se ridículo é o caminho mais seguro para a auto-aceitação. O
palhaço, neste contexto, é o arquétipo que abre as portas, tanto para a
liberdade, quanto para a auto-aceitação.
Hugo Possolo, ator e diretor do grupo “Parlapatões Patifes e
Paspalhões” escreve em seu artigo para o site da Cooperativa Paulista de
Teatro: “O Palhaço simplesmente representa o erro humano. E o riso é a
manisfestação de alívio quando o homem se entrega totalmente à sua
natureza. Todos os caminhos no circo levam à superação da lei da gravidade,
seja a acrobacia ou o malabarismo. O arquétipo de Palhaço é o contraponto de
tudo isso. Através dos seus medos e tombos, ele mostra o quanto o homem se
torna frágil e ridículo ao querer superar a natureza já que ele é infinitamente
menor que ela essa é a grande lição que os palhaços nos dá.” ( POSSOLO,
2003)
Atualmente encontramos alguns palhaços utilizando o termo Clown para
se definir na tentativa de se diferenciar do palhaço tradicional. Federico Feline
(2005), apresenta uma diferenciação para o Clown e Palhaço. O primeiro
pertence ao espaço do circo e do palco, já o segundo está associado às feiras
e ás praças. Não gostaria de aqui levantar esta discussão, o Palhaço de que
tratarei é o que adentrou ao Hospital com o objetivo de levar sua arte e alegria
ao público doente, seja ele tradicional ou não.
19
MECANISMOS PSICOLÓGICOS ENVOLVIDOS NA RELAÇÃO PALHAÇOPACIENTE ONCOLÓGICO
De acordo com Afonso (2003) o humor é uma forma de relação entre os
sujeitos, nele encontramos maneiras de expressarmos ou de nos defendermos
contra sentimentos insuportáveis. Esta expressão pode tomar formas de ironia
e
sarcasmos
podendo
servir
para
desqualificar
pessoas,
reproduzir
preconceitos, ou ainda demonstrar amor.
Freud (1894) postula que o ego possui alguns mecanismos de defesa e
auto-regulação. Um desses mecanismos é o da projeção. A projeção é a
vivência de um fator interno como sendo externo, projetado em outra pessoa
ou outra situação que aparentemente não lhe diz respeito. Os contos de fadas
e seus personagens normalmente são alvos dessas projeções.
Em nossa prática, palhaços doutores, contracenam com pacientes e
acompanhantes na oncologia sob uma lógica particular que propicia projeções.
O palhaço passa a ser depositário de desejos e medos, permite-se intermediar,
trazer a tona conflitos inconscientes de maneira segura: através do humor.
Geralmente o interlocutor se identifica com a história desenvolvida pelo
palhaço devido a alguma semelhança com sua própria história de vida, dessa
maneira, torna-se cúmplice do agente da história sendo parceiro em sua ação.
Em uma de nossas atuações, adentramos a sala de quimioterapia
apresentando um novo doutor-palhaço especialista em massagem. Tirou de
sua maleta martelos de muitas formas, massageadores de pés, cabeça e
costas e começou suas massagens em uma enfermeira que havia dado
20
plantão na noite anterior. Certo paciente começou a criticar o palhaço que
estava fazendo sua massagem, seu acompanhante nos disse que o paciente
crítico era massagista profissional, que inclusive já havia trabalhado com
jogadores famosos. Os palhaços se dirigiram a ele estabelecendo um clima de
concorrência. Elegeu-se uma enfermeira para ser massageada, tanto pelo
paciente, quanto pelo palhaço, ao final ela deveria dizer qual deles era melhor.
Inicialmente o paciente disse que tinha deixado de ser massagista
porque havia ficado doente, uma outra doutora palhaça, encorajando-o ao
desafio disse:
- Ainda que o senhor tivesse sem suas duas mãos, seria melhor
massagista que o nosso doutor.
Num ímpeto, o paciente decidiu enfrentar o desafio demonstrando suas
técnicas apesar do soro que usava em um dos braços.
Todos presentes torciam pelo paciente tocados por sua iniciativa. O
palhaço, atrapalhado, incapaz diante de um profissional, reconheceu o seu
fracasso ao escutar da enfermeira que o paciente em questão era o melhor.
A energia que fez com que o paciente participasse da cena foi a
identificação com a história proposta pelo ator. Na verdade, acontece uma
realização simbólica, ou seja, a energia dispensada na vivência da cena é
revertida na elaboração interna dos conflitos com os quais se identificou. Neste
caso, simbolicamente o paciente retornou às suas atividades profissionais que
representava um conflito interno, deixou de ser conhecido pelas enfermeiras
como mais um paciente com câncer para ser reconhecido como o massagista
de jogadores famosos.
21
A identificação é conhecida pela Psicanálise como a mais antiga
expressão de um laço emocional com outra pessoa. O laço mútuo entre os
membros de um grupo está na natureza de uma identificação baseada numa
importante qualidade emocional comum. (ROTHGEB, 2001)
Algumas vezes, o personagem/paciente que contracena com o palhaço
encontra saídas e soluções que orienta o interlocutor que internaliza esta
qualidade de ação. Freud chama este processo de internalização de introjeção,
colocar dentro o que está fora. O interlocutor passa a incorporar o padrão de
ação do personagem, ainda que seja só no plano das idéias. Essa elaboração,
na maioria das vezes é feita de maneira inconsciente. A arte é uma forma de
comunicação e de linguagem simbólica, de acordo com Freud (1915), o
inconsciente se manifesta mais por imagens do que por palavras, as imagens
são mais livres da censura da mente que as palavras. Dessa forma, a arte e
seus simbolismos permitem ao homem expressar suas angústias individuais
sem descrições reais comprometedoras.
Criar é uma forma de externar e viabilizar uma nova apreensão da
realidade. Ao utilizar as práticas artísticas com função terapêutica, postula-se a
capacidade da vida psíquica organizar-se em suas percepções, sentimentos e
sensações. (ANDRADE, 2000)
Ser criativo promove sanidade mental, consiste em uma forma do
indivíduo diferenciar-se. Criar é para o criador uma maneira de reeditar-se.
Quando o paciente entra na cena e cria um personagem para contracenar com
o palhaço, que na maioria das vezes é o próprio paciente numa versão mais
22
livre, ele cria uma oportunidade de reeditar-se, de se enxergar de maneira
diferenciada.
Em resumo, os mecanismos psicológicos mais evidentes na relação
palhaço-paciente são a identificação, projeção, introjeção e a elaboração
simbólica.
Para Freud (1908), a criação artística é produto da sublimação. A
energia psíquica primária (desejos sexuais e agressivos) estaria canalizada
para a criação artística, ocorrendo à satisfação por outros meios através da
representação simbólica.
Jung na década de 20 utiliza a arte como tratamento acreditando que
elas sejam representações do inconsciente individual ou coletivo. Para ele, a
criatividade é uma função psíquica natural da mente humana, uma outra
necessidade básica e não a sublimação de outros impulsos. O recurso da arte
aplicado à psicopatologia originou-se, quando Jung passou a trabalhar com o
fazer artístico, em forma de atividade criativa e integradora da personalidade.
”Arte é a expressão mais pura que há para a demonstração do inconsciente de
cada um. É a liberdade de expressão, é sensibilidade, criatividade, é vida.”
(JUNG, 1920 )
Felini (2005), diferencia Freud de Jung dizendo que o primeiro
representa um Clown Branco (superego) e o segundo um Clown Augusto (id).
Seja a arte uma sublimação ou uma necessidade psíquica humana,
nosso objetivo enquanto propagadores da arte do Clown, é promover saúde
através de nossa arte.
23
TEORIAS DO HUMOR
A primeira teoria do humor que temos registro data do séc. IV a. C.,
trata-se da teoria humoral de Hipocrates que constitui o principal corpo de
explicação racional da saúde e doença que teve respaldo cientifico até o séc.
XVII. Esta teoria diz que a vida é mantida pelo equilíbrio dos 4 humores:
Sangue, Fleuma, Bílis amarela e Bílis negra, procedentes respectivamente do
coração, cérebro , fígado e baço. O predomínio natural de um destes humores
na constituição do individuo, teríamos os tipos fisiológicos: o sanguíneo, o
fleumático, o bilioso ou colérico e o melancólico. O papel da terapêutica seria
ajudar a physis a seguir os seus mecanismos normais ajudando a expulsar o
humor em excesso ou contrariando suas qualidades. Atualmente muitos
profissionais de saúde defendem a importância de se estimular o bom humor
tendo em vista a saúde. (LAMBERT,1999)
Viktor Frankl (1997) psiquiatra judeu que sobreviveu ao campo de
concentração, em sua autobiografia conta que a arte se fazia presente nas
noites difíceis no campo, apresentações musicais, recitais de poesias e teatros
cômicos com sátiras alusivas à vida no campo de concentração eram
realizadas entre os prisioneiros para ajudar a esquecer o horror do Nazismo.
Prisioneiros exaustos da labuta do dia se reuniam para apreciar estes teatros
muitas vezes perdendo a distribuição da sopa do dia. Não só a arte se fazia
presente neste lugar de terror como também o humor. Para Frankl o humor
constitui uma arma da alma na luta pela auto preservação, a partir desta
24
vivência, teoriza a vontade de humor, a tentativa de enxergar as coisas numa
perspectiva engraçada constituindo um truque útil para a arte de viver.
Freud possui dois significativos trabalhos sobre o humor. O primeiro
constituído em 1905 sob o título “Os chistes e sua relação com o inconsciente”,
onde afirma que e chiste funciona como um meio de driblar a censura do
inconsciente, descarregando o impulso reprimido. Os chistes são gracejos
pesados, não amáveis que para Freud ser de duas naturezas: agressiva ou
sexual.
Basicamente, a metapsicologia do chiste se descreve da seguinte forma
alguém constrói uma frase que desafia as leis da convenção social, a partir
dela o ouvinte recebe uma permissão para rir e desvalorizar o objeto do chiste.
Isto significa que o impulso proibido existia neste ouvinte e permanecia
reprimido até a oportunidade de ser liberado através do riso. Em outras
palavras, “ri-se com o chiste porque, apesar de deseja-lo, não se pode bolinar
ou agredir ágüem diretamente, e ri-se porque algo tornou permitido ao menos
manifestar a intenção de fazer o que não se pode.” (BOGOMOLETZ,1995).
Rothgeb (2001) define chiste como sendo habilidade em encontrar
semelhanças entre coisas dessemelhantes, ou ainda semelhanças ocultas. Os
chistes se caracterizam pelo julgamento jocoso, idéias contrastantes, o sentido
do nonsense, a sucessão da confusão e da compreensão, trazer a tona que se
achava oculto. A técnica do chiste consiste em substituições de palavras que
são ininteligíveis em si mesmas, mas compreensível em seu contexto, quanto
mais leve a modificação, melhor a piada, um bom exemplo são as palavras
com duplo sentido ou condensadas que promove interpretações cômicas. As
25
diferentes técnicas dos chistes se resumem em: condensação com formação
de palavras compostas ou com modificações, uso múltiplo do mesmo material
como um todo, representação pelo oposto.
Os efeitos que levam ao riso são atingidos de diversas maneiras:
a) bola de neve, os acontecimentos vão numa crescente;
b) repetição, um mesmo acontecimento pode ocorrer diversas vezes, seja com
o mesmo personagem ou com outros;
c) inversão, consiste em uma armadilha preparada para outro e o próprio autor
da armadilha acaba por cair nela, e;
d) a interferência das séries ou o qüiproquó, “uma situação que apresenta ao
mesmo tempo dois sentidos diferentes, um simplesmente possível: o que os
atores lhe atribuem, e o outro real: o que o público lhe dá”. ( BÉRGSON, 1983)
Em seu segundo trabalho, “O humor – 1927, Freud revê seu
pensamento sob o cômico passando a abranger a sua pesquisa direcionando-a
ao humor e não mais o chiste. Diferencia o chiste do humor descrevendo o
primeiro como tendo sempre conotação agressiva, ausente no humor, já o
segundo,
provoca
o
riso
por
sua
natureza
estapafúrdia,
ridícula
e
inconvencional.“Freud não se aventura a explicar porque razão o cômico é
cômico. Ele acredita que a gênese do humor esta na comparação de alguma
situação com aquilo que é caracteristicamente infantil: assim como rimos de
uma criança quando vemos a grande importância que ela dá ao que aos
nossos olhos é irrisório, assim nos rimos de algo adulto que nos parece
incongruente ou inadequado. “(BOGOMOLETZ,1995)
26
De acordo com a psicanálise, a motivação básica do homem para rir é a
descarga dos impulsos reprimidos, levando-nos acreditar que o humor obedece
ao modelo das necessidades fisiológicas como comer, dormir...
Para Freud (1908) o estado de seriedade é normal e o riso um acidente.
Para ele, a brincadeira de criança é determinada por um único desejo que
auxilia sua evolução: o de crescer e ser adulto. O oposto da brincadeira não é o
que é sério. Ao crescer, as pessoas renunciam ao prazer que obtinham
brincando, passam a fantasiar e a envergonhar-se de expor suas fantasias.
Winnicott (1990) afirma sua crença na terapêutica do humor e do lúdico
dizendo: “No meu entender, a análise não começa até que consigo ensinar o
paciente a brincar”. Esta fala nos leva a pensar que Winnicott, diferentemente
de Freud, acredita que o self verdadeiro é um self que ri.
O self verdadeiro é a porção da psique que é livre, diferentemente do
falso self, que é organizado inconscientemente de acordo com uma fachada
para ser aceito socialmente. Apesar de ser uma defesa eficaz, não constitui um
componente de saúde. (WINNICOTT, 1989)
Nos momentos de luto e depressão, a atenção está voltada inteiramente
para o interior. O paciente oncológico, na maioria das vezes, encontra-se em
processo de enlutamento. Ao receber a notícia da doença, o paciente passa
por um processo normal de enlutamento não só pela reflexão da possibilidade
da própria morte, mas pela adaptação obrigatória ao tratamento e às perdas
advindas da doença. De acordo com Baldessi (2000), a pessoa enlutada
atravessa dez estágios do luto, acionando algumas defesas de ego.
27
1) CHOQUE: A pessoa sente-se temporariamente anestesiada, submersa
pela experiência que enfrenta. Nesta fase, utiliza-se da defesa de
negação, importante para que ela não compreenda de imediato a
grandeza de sua perda e tenha tempo para elaboração e adaptação à
nova realidade.
2) SOLTURA EMOCIONAL: Essa fase acontece quando a pessoa aceita a
realidade da doença e age em consonância com ela, manifestando seus
sentimentos de dor e de perda com autenticidade. Freud (1894) nomeia
este momento em que o paciente se permite entrar em contato com a
dor como catarse. A catarse bem vivida é bastante benéfica ao
tratamento visto que a explosão de sentimentos alivia tensões além de
organizar os sentimentos confusos.
3) DEPRESSÃO, SOLIDÃO E SENSAÇÃO DE ISOLAMENTO: O indivíduo
sente-se sozinho ao perceber que nem todas pessoas ao ser redor
conseguem lidar positivamente com sua doença e que qualquer esforço
que venha do outro, por mais bem intencionado que seja, ainda é
pequeno diante de sua dor e de suas perdas. Sentindo-se só, passa a
se preocupar consigo mesmo, este acontecimento é um bom indício,
mostra que a pessoa está preparada para buscar dentro de si, recursos
para reagir à doença.
4) SINTOMAS FISICOS DE TRISTEZA: A situação de perda desencadeia
sintomas físicos advindos dos sentimentos de tristeza, normal dentro do
processo de enlutamento. O individuo neste estágio, normalmente
28
sensibiliza e instiga a compaixão de familiares e amigos a agirem de
maneira mais presente e acolhedora.
5) PÂNICO: O paciente por estar obsessivamente concentrado em sua
doença, sente-se ameaçado psiquicamente pela hipótese de estar
enlouquecendo,
por
muitas
vezes,
assustam
com
o
próprio
comportamento frente às diversidades da nova situação confundindo
também seus amigos e familiares entrando em um processo de crise de
identidade.
6) CULPA COM TUDO RELACIONADO AS SUA PERDA: A culpa atinge
tanto o paciente quantos seus familiares. Em alguns casos o
acompanhante se sente culpado por estar saudável e não poder fazer
quase nada, os casos de desafetos passados são revividos pelo
paciente. O paciente por sua vez sente-se culpado pelo descuido com a
própria saúde e com todo comportamento errado do passado.Neste
estágio, o exercício do perdão é altamente terapêutico.
7) HOSTILIDADE: A vivência da culpa é muito dolorosa desencadeando
um processo de hostilidade com as pessoas que imagina que possa ter
contribuído para o problema que ora enfrenta, com as pessoas
saudáveis que lhe causa inveja, com a equipe médica e com Deus. A
hostilidade é uma espécie de defesa onde o paciente catarticamente
compartilha sua culpa com outrem.
8) INCAPACIDADE PARA RETORNAR AS FUNÇOES NORMAIS: Por
mais que as pessoas se esforcem para voltar a sua vida normal, não
conseguem faze-lo. Uma das razões é que a sociedade tem muito medo
29
da doença do câncer e tendem a reagir negando a existência dela
impedindo que o paciente oncológico manifeste abertamente a sua dor,
levando-o a se excluir de atividades rotineiras.
9) INICIO DA SUPERAÇÃO DO LUTO: Se a pessoa for sustentada e
encorajada por aqueles que a rodeia, voltará a seu equilíbrio emocional,
mas pra tanto, é necessário que ela não reprima seus sentimentos.
10) REAJUSTAMENTOS A REALIDADE: O ser humano jamais será o
mesmo depois de uma experiência de grande dor. As pessoas se
diferenciam, se tornam mais fortes, mais profundas e mais capazes de
ajudar outras pessoas por causa da experiência vivida.
Em resumo, o processo de enlutamento instiga o paciente a acionar
recursos internos que muitas vezes transcendem sua condição humana,
estabelece uma constante luta entre as pulsões de vida contra as pulsões de
morte, neste sentido, surge a figura do Palhaço no hospital com a função de
burlar a lei da seriedade trazendo a atenção do indivíduo para fora de si até
que alcance o riso.
CONSIDERAÇÕES SOBRE O BRINCAR
Winnicott tem uma ampla pesquisa sobre a importância do brincar para a
criança, através da brincadeira ela absorve e compreende o mundo, brincar é
uma necessidade e uma forma de comunicação.
30
Para Winnicott (1990) é através do ato de brincar que o indivíduo,
criança ou adulto, pode ser criativo e utilizar sua personalidade integral: e é
somente sendo criativo que descobre o eu (self). Viver criativamente constitui
um estado saudável de vida. Apenas no brincar, que a criança ou o adulto
fruem sua liberdade de criação.
Winnicott (1990) diz que as crianças brincam algumas vezes para dar
vazão a sua agressividade e ao seu ódio que podem ser encarados pela
criança como uma coisa má dentro delas. A importância do brincar para elas
está associada ao fato destes impulsos coléricos e de agressividade poderem
se expressos num meio conhecido sem retorno do ódio e da violência contra si.
Na brincadeira, este impulsos são melhor aceitos.
As crianças brincam para dominar angústias e para controlar idéias e
impulsos que levam a angústia. Cabe ao adulto compreender e respeitar esta
necessidade de brincar da criança.
A criança adquire experiência brincando, a personalidade dos adultos se
desenvolve através de suas experiências de vida, a criança se desenvolve a
partir da brincadeira que é de grande riqueza para o seu crescimento pessoal,
principalmente quando a brincadeira fornece uma organização para a iniciação
de relações emocionais e assim propicia o desenvolvimento de contatos
sociais. (IWINNICOTT, 1990)
A criança que brinca, trabalha o seu inconsciente sem repressões, com
o passar do tempo essa naturalidade no brincar se reduz.
Desse modo, crianças e palhaços são uma química perfeita, ambos
anseiam por momentos descontração. O palhaço quando visita uma criança no
31
hospital, não se relaciona com a doença dela e sim com a sua porção saudável
que tem necessidade de brincar. Assim como a criança não fica adulta porque
ficou doente e continua sendo criança, com pensamentos e desejos de criança,
o palhaço é uma figura adulta que não perdeu a sede de se divertir. O palhaço
respeita essa sua condição de criança e é por isso que são tão queridos nos
hospitais.
A brincadeira nunca é técnica, mas a maneira de brincar dos palhaços
de nosso grupo com crianças é diferente da maneira de brincar com adultos.
A DIFERENCIAÇÃO DO PALHAÇO COM A CRIANÇA EM TRATAMENTO
DO CÂNCER
O sujeito desta pesquisa se encontra em tratamento oncológico no
Hospital do Câncer de Uberlândia em seus diversos estágios, inclusive
terminal. Para melhor compreensão, o publico será dividido em dois grupos
para serem caracterizados:
1 – Crianças em tratamento
2 – Adultos em tratamento.
32
1 – A RELAÇÃO DO PALHAÇO COM A CRIANÇA EM TRATAMENTO DO
CÂNCER
As
reações
das
crianças
hospitalizadas
dependem
do
seu
desenvolvimento psíquico, do grau de apoio da família, do tipo de doença e das
atitudes do médico. (BALDINI, 2006)
Como já foi considerado anteriormente, o brincar é uma necessidade
básica da criança, esteja ela saudável ou não, no caso da criança doente, o
brincar ajuda a elaborar os conflitos de seu adoecimento, neste contexto, os
palhaços são responsáveis por garantir este espaço dentro do hospital.
Nas brincadeiras, utilizamos o universo da criança para nos comunicar
com ela, suas preferências e sua rotina nos dá um amplo repertório de ação.
Para comunicar com crianças existem inúmeras formas, mas quando o
33
palhaço, um ser adulto, utiliza uma lógica tola, quando desrespeita um pedido
ou tem um entendimento torto da situação, o jogo está garantido.
Neste processo, o acompanhante da criança é fundamental, quando a
criança não quer brincar isso é um péssimo sinal, diríamos um sinal de doença
geral, não só do corpo mas da psique. Quando isso acontece, utilizamos o
acompanhante para ser a ponte entre a criança e o palhaço, fazendo dele um
personagem na cena proposta pelo palhaço. Para ilustrar, transcreverei um
trecho do diário de um palhaço de nosso grupo:
“ Oba!!! Hoje é dia das crianças... tem guaraná, salgadinho, bala, sorvete...
Epa!!! Porque o Gui tá de cara fechada em nossa super festa?
Vou mostrar meu grilo saltador para ele!
_ Oi Gui, vim mostrar o Teobaldo meu grilo salteador. (O grilo salta
muitas vezes e Gui não ri)
_ Você não gostou do Teobaldo?
A mãe responde:
_ Não quer mais saber do Hospital, avisou ao médico que não virá mais
e quer parar o tratamento.
_ Como assim?! Não nos veremos mais?! (Chora, desmaia, limpa
catarro na blusa da mãe, enxuga as lágrimas no cabelo da mãe...)
O menino ri e consola o palhaço:
_ Ta bom, não precisa deste escândalo todo eu volto semana que vem.
Quando a criança não quer brincar, nós não a violentamos, mas
entendemos que há algo errado e não nos entregamos a este fato. No relato
acima, a criança não queria brincar em decorrência de sua decisão de
34
abandonar o tratamento, em outras palavras, desistir de brincar significa
desistir de viver. A mãe ao nos contar o que estava acontecendo, nos
comunicou sua impotência diante da decisão do filho, nós captamos este
sentimento da mãe e o exageramos até o ponto da comicidade. A criança
através do riso se rende, libera uma tensão, encontra uma força para continuar,
compreende o sofrimento da mãe através do exagero do palhaço e modifica
seu comportamento.
Os melhores resultados deste tipo de trabalho se dão quando o palhaço
se faz espelho para que as pessoas possam se ver.
Um outro exemplo que me vem à mente onde o acompanhante
funcionou como ponte entre o palhaço e o paciente é o de O.T. estava
acompanhado do pai e também não queria brincar nos mandando sair do
quarto. Dissemos que iríamos depois de fazermos uma perguntinha a seu pai.
Fizemos uma cúpula de palhaços dizendo que ele não nos enganava mais, que
já tínhamos certeza que ele era o super-man.
Tiramos os seus óculos, amarramos um lençol de uma das camas em
seu pescoço e o fizemos subir em um banco e pular, a partir daí
desenvolvemos uma divertida trama de aventuras onde o paciente participava
passivamente, como espectador, mas com alegria e profundidade até que nos
mandou ir embora dizendo ser o filho do super-man e que poderia nos destruir
com seu olhar infra-vermelho. Soubemos depois, que contava a todos os
familiares a cena do super-man.
O acompanhante entende o sorriso de sua criança como sinal de saúde
e isto reforça sua crença no sucesso do tratamento, a força da esperança do
35
acompanhante aumenta a confiança da criança na equipe médica e no seu
restabelecimento, dessa maneira, provocar o riso, significa aumentar a
esperança dos envolvidos no tratamento. O contrário também é verdadeiro,
quando o acompanhante, principalmente os pais, desanimam no processo de
tratamento, as crianças absorvem este sentimento. Se até mesmo as pessoas
que eles mais confiam estão sem esperanças, é sinal de que não há
possibilidade de cura. A partir desta compreensão, estimular o humor do
acompanhante é tão importante quanto estimular o humor da criança.
Um processo natural de brincadeira Palhaço/criança possui os seguintes
indicadores de mudanças:
Antes da visita do doutor /palhaço
As crianças se encontram entediadas, apáticas sem parceiros para brincarem,
logo, sem ninguém para os acolher enquanto crianças.
Durante a visita do doutor/palhaço
È como se a doença não existisse e a porção saudável saísse para brincar e
fortalecer os músculos e o ego da criança que brinca.
Depois da visita dos doutores/palhaços
Fica assunto a ser comentado com os outros que não estavam presentes,
ficam as lembranças do momento mágico deste encontro e o bem estar de ter
vivido intensamente, ainda que por poucos minutos e entre aparelhos de
hospitais, além do desejo de rever novamente o amigo que entende que brincar
é tão importante quanto à agulhada.
De acordo com Massetti (2000), o resultado do trabalho de palhaços dos
Doutores da Alegria com crianças hospitalizadas consiste na melhora da
36
comunicação, diminuição da ansiedade, melhora na aceitação dos alimentos,
aceleração da recuperação no pós-operatório, maior colaboração com o
tratamento médico e melhoria na imagem da hospitalização.
Segundo Françani (1998), utilizando a arte como instrumento na
assistência à criança hospitalizada, pode-se observar algumas transformações
no dia a dia, o espaço hospitalar torna-se mais informal e descontraído, o riso
pode ser ouvido com maior freqüência e objetos, sons, movimentos, cores,
espaços e personagens podem se tornar brinquedos.
2 – A RELAÇÃO DO PALHAÇO COM O ADULTO EM TRATAMENTO DO
CÂNCER
Não é fácil romper com as cristalizações sócio-emocionais dos adultos.
O adulto tem uma compreensão maior e mais clara dos processos de seu
adoecimento. Para o grupo de palhaços do Hospital do Câncer de Uberlândia,
isto não configura um problema e sim um desafio. Byinton (1996), afirma que a
situação de dor não deve ser ignorada ou reprimida. Pela própria força
emocional a dor passa a ser uma ótima oportunidade para resignificar a vida e
a qualidade dos afetos. É importante saber que o amor inclui, tanto a
afetividade quanto a agressividade, se conseguirmos disponibilizar meios para
que a agressividade seja vivenciada de maneira criativa, estaremos ensinando
não só elaborar um conflito mas também a estruturar o ego deste paciente.
A função estruturante da agressividade é tão importante quanto à função
estruturante da afetividade. Neste sentido, perceber a agressividade na relação
37
transferencial é aproveitar situações para extrair a sua criatividade e evitar sua
destrutividade.
Pulsionar veias é parte do tratamento mais temida pelos pacientes e é
sempre carregada de hostilidade em relação às enfermeiras. Neste momento a
agressividade fica mais aflorada. Certo dia, na qualidade de palhaços,
resolvemos
agredir
verbalmente
uma
enfermeira
e
posteriormente
transformamos nosso diálogo agressivo na canção mais cantada do hospital:
“Ei doutor,
esta enfermeira precisa se casar
Ela não dorme bem
Só quer saber de me picar.
Ei doutor.
Ela é séria mas pode desencalhar
se ela dormisse bem
Eu poderia sossegar.”
38
A partir dessa canção, muitos sentimentos agressivos destinados às
enfermeiras puderam ser resignificados tendo a criatividade como base de
elaboração, o que antes tinha uma atmosfera de silêncio e ódio, hoje se
transformou em música e humor, além de longas conversas e brincadeiras
sobre o tema da música.
Este exemplo foi uma relação de transferência e contra-transferência
medida pela arte do palhaço que se deu de maneira criativa, simbólica, intensa
aproveitando o conteúdo agressivo original.
O palhaço nunca ignora o que vê e o que sente, sua ação consiste em
emprestar sua lógica, que não nasce na lógica linear, para que as pessoas
passam ver as situações sob outra ótica diferente das pré- concebidas.
Como já foi dito, tanto a agressividade quanto a afetividade tem função
estruturante do ego. Byinton (1996) fala da relação transferencial professoraluno e aconselha aos professores que busquem um relacionamento individual
por menor que seja, com cada aluno da classe. Podemos dizer que este seria o
caminho para a humanização escolar. No hospital, o processo de humanização
é semelhante. Transferindo a situação professor-aluno para palhaço-paciente,
quanto mais individualizada for a intervenção, melhores são os resultados. O
paciente oncológico normalmente sente-se fragilizado em sua auto-estima,
neste sentido a figura do palhaço galante que corteja a paciente ou da palhaça
casamenteira que vê no paciente terminal uma possibilidade de se casarem e
serem felizes num apartamento em Nova York, cria uma atmosfera de fantasia
capaz de fazer renascer a força de auto-estima.
39
A auto-estima é a confiança na capacidade de pensar, na habilidade de
dar conta dos desafios básicos da vida e confiar no direito de vencer e ser feliz,
confiar na sensação de ter valor e de merecê-lo, poder afirmar as necessidades
para alcançar metas, colhendo os frutos dos esforços. Quanto mais elevada a
auto-estima, mais ambiciosa será a pessoa em relação ao que espera
experimentar na vida emocional, intelectual, criativa e espiritual.(BRANDEM
apud ALVES 2004)
Duas energias são exploradas na relação palhaço-paciente adulto: a
energia da afetividade e da sexualidade.
Segundo Freud (1940), a sexualidade está associada à pulsão de vida.
É com a pulsão de vida do paciente que o palhaço gosta de estabelecer
diálogo, de acordo com a permissão do paciente o palhaço vai explorando o
universo da sexualidade humana e canalizando-a para o humor. O melhor
instrumento de que dispõe é a ambigüidade. Perguntas como : Você quer ver
minha perereca? Você viu o meu pintinho por aí? Você também está
encalhada? Dentre outras, dão margem para longos diálogos de conteúdo
ingênuo com componente sexual.
Uma das palhaças mais queridas de nosso grupo possui um jogo que
faz alusão ao ato sexual. De acordo com sua percepção, escolhe um paciente,
pergunta se é solteiro, casado, desquitado ou viúvo e logo em seguida diz que
gosta de ir direto ao que interessa e lança uma pergunta que ficou famosa no
hospital: Você quer ver minha perereca? (perereca em nossa região é
pejorativa do órgão sexual feminino).
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Depois do constrangimento inicial e das risadas, a atriz retira de dentro
da calçola uma perereca de borracha e brinca com a questão da ambigüidade.
No momento da brincadeira, o prazer da risada, arriscaria dizer ser um prazer
sexual. Este jogo permite que muitos conflitos de natureza sexual sejam
expressos, comumente escutamos de mulheres mastectomizadas que não
mostram a “perereca” porque ficariam feias, que ninguém as desejam mais,
algumas relatam a dor de terem sido trocadas por seus companheiros, os
homens por sua vez brincam que já nem lembravam mais como era... São
comentários reais que só encontraram espaço para serem expressos na
presença do palhaço. O palhaço ouvinte resignifica a fala deste paciente
ressaltando sua auto-estima. A freqüência deste assunto me fez compor uma
música para dedicar as paciente que traziam este conflito. O título da música:
Mulher fogosa:
Fogo, fogo, fogo
Que fogo é este que esta mulher tem
Fogo, fogo, fogo
Apague antes que incendeie alguém
Fogo, fogo, fogo
Se aproxime quem quiser queimar
Porque é muito fogo, muito fogo
É muito fogo que esta mulher tem.
Esta canção é interpretada em ritmo de marcha de carnaval. Com a
freqüência das apresentações, pude perceber que este ritmo foi escolhido
intuitivamente par representar a energia sexual que está associada à imagem
41
do carnaval. Quando homenageamos nossas pacientes cantando esta música,
nós dizemos através dela que nós as vemos de maneira completa, com direito
de desejar e serem desejadas, com vida o bastante para provocarem o desejo
do outro. O efeito desta canção na auto-estima delas é visível.
O paciente deve ser compreendido em sua individualidade e nem
sempre se identifica com o humor escachado, para tanto temos outra atriz que
trabalha o romantismo da sexualidade. Ao invés da perereca, mostra o coração
para conquistar o paciente pretendido, faz serenatas e no máximo mostra a
canelinha em sinal de compromisso. Esta atriz resgata os costumes e
comportamentos da moça de nossa região, nossa atual idosa. Sempre que
atua, recebe identificação dos idosos principalmente quando canta uma canção
que é bastante representativa para os idosos de nossa região: “ O beijinho
doce”
“Que beijinho doce, que você tem
Depois que beijei ele nunca mais amei ninguém
Que beijinho doce, foi ele quem trouxe de longe pra mim
Um abraço apertado um sorriso dobrado de amor sem fim
Coração quem manda, quando a gente ama
Se fico um só dia sem dar um beijinho coração reclama
Que beijinho doce foi ele quem trouxe de longe pra mim
Um abraço apertado, um suspiro dobrado de amor sem fim.”
42
Ao ouvir esta música, muitas lembranças da mocidade são expressas,
os bailes da roça são relembrados, os namoros escondidos, os beijos roubados
são relatados com euforia e prazer. Nestas cenas, são claras as manifestações
da pulsão de vida a partir do componente sexual.
Através da arte do palhaço, visitamos momentos marcantes da história
como marchinhas de carnaval da década de 50, passamos pela Jovem Guarda
e percebemos que as pessoas vão trazendo boas lembranças de si que
reforçam sua auto-estima, neste momento em que revivemos com o paciente o
seu passado, temos a nítida imagem de um ser saudável, transfigurado.
Quando saímos de corredor ou do quarto, o local fica impregnado de fantasias
e boas memórias.
43
CRÍTICA AO TRABALHO DE PALHAÇOS EM HOSPITAIS
Normalmente o trabalho de palhaços em hospital associado a doenças graves
como é o câncer é criticado pelo risco desta prática desenvolver defesas
maníacas de negação da realidade. Suponho que Winnicott (1990) tenha
sofrido a mesma crítica quando afirma que começa a analise só depois que
consegue ensinar seus pacientes a brincar.
Bogomoletz (1995), reflete sobre esta possível critica a Winnicott e o
defende dizendo que seu brincar está mais próximo da generosidade que da
negação. Afirma que a pessoa bem humorada tem um olhar livre da inveja e da
depressão cotidiana e possui uma maior capacidade em aceitar a perda da
onipotência.
Padre Júlio Lancelotti, Coordenador da Pastoral do Menor, no III
Congresso Internacional de Tanatologia e Bioética realizado em São Paulo no
ano de 2004, disse em uma conferência que o mecanismo da negação no
adoecimento de doenças graves não é um fator ruim e sim uma fase natural e
necessária ao processo de adaptação à nova situação, é nesta fase que a
pessoa se fortalece para suportar as fases posteriores.
Em nosso trabalho é fácil distinguir uma situação da outra. Não
objetivamos que o paciente ignore sua realidade, mas que saiba lidar com suas
dificuldades com criatividade e humor, que ele possa retornar para sua
realidade depois de ter visitado o nosso mundo de fantasia com a qualidade de
vida e com a sensação que encontrou por lá.
44
Certa vez, fomos para o Hospital como se estivéssemos indo para uma
sauna. Tínhamos patinhos de banho, shampoo, esponjas, toalhas nos cabelos
e todos os aparatos necessários para uma boa hora de sauna, entramos no
saguão da quimioterapia com nossos apetrechos perguntando às pessoas se
elas estavam gostando da sauna (era um dia de muito calor), conversamos
sobre assuntos que se conversa em uma sauna, oferecemos sabonetes,
dissemos que algumas pessoas precisavam de cremes anti-acnes que na
sauna era bom retirá-los, ensinamos receitas caseiras de cremes hidratantes
para cabelo, em contrapartida aprendemos outros... foram uns bons momentos
em uma sauna.
Quando já estávamos nos despedindo, uma senhora me puxou pelo
braço e me disse espantada que estava se sentindo como se realmente tivesse
estado em uma sauna, que seu relaxamento era equivalente à pelo menos uma
hora de sauna e que se sentia revigorada. Sua fala tinha tanta expressão e
verdade que me comoveu enquanto pessoa mostrando-me a profundidade de
nosso trabalho, este é nosso objetivo: trazê-los de nossas fantasias para a
realidade com um olhar mais positivo frente suas histórias pessoais ou
simplesmente com mais disposição para enfrentá-la.
45
CONCLUSÃO
A maioria dos autores definiram Arteterapia, com conceitos semelhantes
ao que diz respeito à auto-expressão. A Arteterapia resgata o potencial criativo
do homem, buscando a psique saudável e estimulando a autonomia e
transformação interna, para reestruturação do ser. Partindo do princípio, de que
muitas vezes não consegue-se falar de conflitos pessoais, a Arteterapia possui
recursos artísticos para que sejam projetados e analisados, todos esses
processos, obtendo uma melhor compreensão de si mesmo, e podendo ser
trabalhado no intuito de uma libertação emocional. É através da expressão
artística que o homem consegue colocar seu verdadeiro self da maneira mais
pura e direta para que possa existir.
A Arteterapia tem como objetivo, favorecer o processo terapêutico, de
forma que o indivíduo entre em contato com conteúdos internos e muitas vezes
inconscientes.
A Arteterapia hospitalar visa:
. Resgatar o desejo de cura, auto regeneração;
. Fornecer ao paciente meios para catarse (liberação de sentimentos de raiva e
revolta por estar doente);
. Desenvolver formas criativas de se lidar com a doença e diminuir o stress;
Ao final deste trabalho, concluo que é possível fazer arteterapia a partir
da técnica do palhaço pelos seguintes motivos:
46
1) Trata-se de uma arte que atravessa milênios. Andrade (2000) aponta
uma condição “sine qua non” que a arte esteja no centro do trabalho
para este poder ser considerado como arteterapia.
2) Obtém
resultados
terapêuticos
apresentando
os
seguintes
indicadores de mudanças: melhora da comunicação, diminuição da
ansiedade, melhora na aceitação dos alimentos, aceleração da
recuperação no pós-operatório, maior colaboração com o tratamento
médico e melhoria na imagem da hospitalização. (Massetti, 2000)
Além do espaço hospitalar torna-se mais informal e descontraído.
(Françani,1998)
Reis (2000) acredita que frente ao adoecimento, o Psicólogo, através do
encontro com o paciente, pode leva-lo a transcender seu sofrimento levando o
individuo a ter uma identidade. Estando doente, o ser humano busca outros
sentidos para a sua existência a não ser no ser doente, ele também é outras
possibilidades enquanto pessoa e pode encontrar sua integridade através do
encontro com o outro. Quanto mais diferenciado este paciente se sente, maior
a disponibilidade para se atirar a situações novas, muitas vezes ameaçadoras,
e maior capacidade em buscar recursos próprios para curar-se ou para a
aceitação de um processo de doença.
O que Reis (2000) valida para a ação do Psicólogo pode ser aplicável a
alguns trabalhos de palhaços em hospitais, dando nos sinais de que esta
prática é no mínimo terapêutica.
3) Por contemplar o objetivo da arteterapia no que diz respeito a facilitar
a expressão e o autoconhecimento do paciente.
47
4) Porque se trata de uma arte de fácil acesso e de identificação social,
a comunidade aceita, valida e consegue interagir artisticamente
expressando seus conflitos espontaneamente como se espera em
setting arteterapêutico.
Penso
também
que
este
trabalho
não
pode
ser
considerado
indiscriminadamente arteterapia, acredito que o trabalho de palhaços em
hospitais para ser considerado arteterapia deve obedecer dois critérios:
1) Domínio da técnica e arte do palhaço aplicado ao hospital.
2) Embasamento nos pressupostos da arteterapia.
A arteterapia se firmou e se desenvolveu a partir das artes plásticas e
para se consolidar terá que abranger outras formas de arte. Penso que a
arteterapia está em construção e para tanto necessita da pesquisa e da
colaboração das pessoas que tem utilizado a arte em caráter terapêutico em
suas diversas formas, música, artes plásticas, dança e teatro. Além de expandir
para outros espaços que não os convencionais como a clínica e a escola onde
são mais comumente encontradas.
Para ser arteterapeuta é preciso ter uma atitude amorosa acreditando no
potencial do outro e facilitando o encontro dele consigo mesmo. É preciso
acompanhar o outro na sua busca de um sentido para a vida, estar com o
outro, e agir com cuidado, responsabilidade, respeito e conhecimento.
Os pacientes precisam acreditar no seu potencial criativo, na capacidade
de se sentirem fortalecidos por sua própria força. Por meio de uma intervenção
poderão, através das imagens mentais positivas, atribuir um significado positivo
para continuarem vivendo.
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Para Viktor Frank (1997) na medida que as pessoas encontram um
sentido para continuarem vivendo, vão se tornando mais fortes, mais
conscientes, e mais seguras em busca a sua auto-realização.
Acredito que as atitudes amorosas do arteterapeuta facilitam o
desenvolvimento do potencial de amor do cliente, e assim uma relação de amor
se desenvolve. Nessa relação de confiança, mediada pela arte, pode brotar no
indivíduo o que Viktor Frankl chama de “sentido da vida”, força interna para
superar qualquer que seja o conflito, inclusive um câncer.
Levando em consideração a técnica e postura profissional do grupo
estudado: Anjos da Alegria, diria que sua prática pode ser considerada
arteterapêutica podendo inclusive sua técnica se concretizar em um
instrumento
para
a
arteterapia.
49
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