1 PERCEPÇÃO DE PROFESSORES DO CURSO DE ADMINISTRAÇÃO SOBRE AS RELAÇÕES DE INFLUÊNCIA ENTRE OS PARES Maria do Carmo Teixeira Costa1 RESUMO: O relacionamento entre pessoas, seja em nível pessoal ou profissional, estabelece relações sociais de influência capazes de promover adequações, obediência, submissão, podendo gerar conformidade, constrangimentos e conflitos. Buscou-se identificar e categorizar as formas das influências nas relações entre docentes e sua interferência no cotidiano acadêmico. A pesquisa foi realizada com base na percepção de treze docentes, todos ministrando aulas em cursos de Administração, na região de Belo Horizonte. A pergunta de partida: Como ocorrem as relações de influência entre docentes, no ambiente acadêmico? A hipótese levantada para essas relações que ocorrem num mesmo nível hierárquico dentro da estrutura organizacional é a de que elas suscitam comportamentos que refletem a realidade da dinâmica do trabalho, sob o aspecto formal e informal, e sob o ponto de vista do imaginário social. A entrevista estruturada foi o instrumento de pesquisa utilizado e os sujeitos, em amostragem não probabilística, foram indicados pela técnica da bola de neve. O desenvolvimento da análise, para a identificação dos aspectos temáticos relevantes, gerou uma plataforma capaz de destacar como resultado final as doze categorias identificadas como formas comuns das relações de influência entre docentes. Como contribuição sobre o tema, ressalta-se a necessidade de verificar em grupo docente de outras áreas do saber, o cotidiano e a vivência profissional, possibilitando comparações e ampliando o conhecimento. Palavras-chave: Cotidiano acadêmico. Dinâmica do trabalho. Gestão acadêmica. Relações de influência entre docentes. 1 Professora do curso de gestão de recursos humanos da Faculdade Infórium de Tecnologia. 2 INTRODUÇÃO As relações de influência exercidas entre professores numa Instituição de Ensino Superior (IES) vêm se tornando assunto de interesse para a gestão desse ambiente de trabalho. A organização e a gestão da IES estão cada vez mais particularizadas, em face às peculiaridades do trabalho técnico-pedagógico desenvolvido pelo grupo docente para o alcance dos objetivos instrucionais. Independentemente da nação, raça ou grau de instrução, o relacionamento entre as pessoas, seja em nível pessoal ou profissional, estabelece relações sociais de influência, podendo gerar constrangimentos e conflitos. Na antiguidade filósofos já se dedicavam ao estudo da força de expressão e da exacerbação condenando-as por considerar desmedido o desejo de mais e mais poder. Diferentes teorias buscam explicar porque o ser humano precisa exercer sua influência. Teoricamente essa manifestação se dá sob a base da mais pura emoção, mas pode-se observá-la presa aos grilhões da razão. Outras teses apresentam esse fenômeno misturado, se confundindo nas duas instâncias. Embora os avanços das tecnologias da gestão consigam transformar em incentivos as novas iniciativas e o comprometimento com o trabalho, as relações de influência e as variáveis que as envolvem mostram que não são simples as razões para explicá-las. As origens das relações de poder encontram sua trajetória descrita por autores como Clegg e Hardy (2001) que manifestam diferentes olhares sobre a temática. Duas idéias se sobressaem, segundo esses autores: as tradicionalistas e as contemporâneas. As relações tradicionais apóiam-se em idéias marxistas e weberianas, introduzidas na estrutura hierárquica, na luta de classe e na busca dos resultados da organização. Da primazia do poder nas formas das guildas às estruturas organizacionais contemporâneas sobressaem os argumentos da dominação, da submissão e da posse. Nas relações contemporâneas, considerando as organizações como mentoras e supervisoras das normas sociais, evidenciam-se a modelagem da consciência coletiva, indicando que gradativamente devem ser absorvidas e 3 processadas as alterações do avanço tecnológico e das novas formas de participação para a convivência em sociedade. Nesta forma, a norma surge como disciplinadora de condutas, demonstrando, também, que a pessoa que a percebe como adequada se sente ajustada aos parâmetros da convivência e das relações sociais. Em avaliação sobre as relações de poder, Foucault (1987) esclarece que a norma surge para o controle disciplinar, reafirmando e protegendo as relações sociais vivenciadas entre conflitos e contradições, tendo a liberdade como direito da natureza humana, numa constante confrontação entre interesses, crenças, valores e desejos. Toda estrutura social é caracterizada pela existência das relações de influência, e essas relações revelam a existência da autoridade, não só no contexto da legalidade ou das formalidades das concepções weberianas, mas também, na legitimidade das manifestações de influências nas relações pessoais e profissionais entre os pares (MELO, 1991). Os esforços desenvolvidos para a construção deste estudo foram direcionados para as relações de influência entre professores, criando comportamentos que refletem a dinâmica do trabalho, sob o aspecto formal e o informal, e sob o ponto de vista das relações sociais que se desenvolvem, diuturnamente na IES, não sendo objeto da pesquisa o poder inserido na cadeia escalar. A estratégia metodológica privilegiou a sustentação da pesquisa nos preceitos do método fenomenológico, justificando a predominância da abordagem compreensiva na análise qualitativa, com a coleta de dados transversal (LAKATOS ; MARCONI, 1985), captando num mesmo momento a natureza e o estado do fenômeno de influência entre os pares. Buscaram-se a partir da percepção de treze docentes que ministram aulas no curso de Administração, em IES da região de Belo Horizonte, os objetivos de identificar e categorizar as formas mais comuns de influências nas relações entre docentes A entrevista estruturada serviu como instrumento, sendo utilizada a técnica da bola de neve (FLANAGAN, 1954) para a indicação seqüencial dos entrevistados em amostragem não probabilística. A consolidação dos dados deu-se a partir da extração das frases relevantes ligadas a organização e condições do trabalho, obtidas por meio da análise de conteúdo (BARDIN, 1977). As frases 4 destacadas passaram a constituir o escopo temático, para agrupar sob categorias as informações reunidas, para a sustentação da hipótese da existência das relações de influência. Na tentativa de resolução para a dúvida, a questão motivadora passou a ser: Como ocorrem as relações de influência entre docentes no ambiente acadêmico? O interesse deste estudo também se prende à idéia de tentar compreender o que alcançam essas relações ao influírem no ambiente econômico, nas disputas políticas e mesmo nas ideologias mantidas no espaço do trabalho acadêmico, pois a questão da influência, enquanto paradoxal, tanto se encaixa como pressuposto quanto se apresenta como resultado. APORTES TEÓRICOS Segundo Bourdieu (2000), pode-se perceber que as condições e a organização do trabalho vêm formar campos simbólicos de poder, à mercê dos interesses profissionais, da comunicação e dos relacionamentos interpessoais. A posição psicológica retratada por este autor vem demonstrar uma forma de identificação dos docentes com a organização, visto que a sublimação frente às pressões e suas influências nos comportamentos coletivos acabam por gerar a ocorrência das relações de influência entre os pares, não necessariamente representadas sob o binômio: dominação e submissão, que povoa o imaginário social. Enriquez (2007, p. 64) identifica e descreve as figuras do poder carismático, tecnocrático, burocrático, democrático e despótico, indicando que em todo poder “há uma hierarquia de papéis, status, comportamentos. Esclarece ainda, que “essa hierarquia pode ser facilmente observada nas sociedades animais [...] não se encontram sociedades animais sem regras, sem diferenciação fixa, sem sistema de dominação”. O autor observa que as relações de poder “em função da carga emocional que lhe é inerente, parece ser embaraçosa no dia-a-dia” (ENRIQUEZ, 2007, p. 61). Do ponto de vista da lógica, os fenômenos do poder, enquanto fenômenos integradores levam naturalmente a raciocínios contraditórios e à primeira vista irreconciliáveis. Para que sejam compreendidos, exigem ao 5 mesmo tempo uma análise racional clássica de ordem instrumental e uma análise oposta de ordem afetiva. De fato o poder só se concebe na perspectiva de um objetivo, o que significa que o jogo do poder obedece sempre de certa forma às regras de uma racionalidade fundada sobre a eficácia; mas ele introduz ao mesmo tempo certos fenômenos afetivos poderosos e o jogo do poder encontra-se igualmente condicionado pelas possíveis reações efetivas dos indivíduos que se comprometem e que não deixarão de ser afetados. (CROZIER, 1983, p. 20). Sobre as proposições gerais que caracterizam a natureza do poder, envolvendo as temáticas absorvidas em sua literatura de referência, Enriquez (2007, p. 55) esclarece que os indivíduos “tendem a colocar a fraternidade no lugar do poder. Mas, ao fazer isso, impedimos a análise dos fenômenos de dominação e favorecemos a consolidação de um poder estabelecido e oculto”. Mas aqui nos concentramos também nas dimensões psicológicas e personológicas do poder: os processos de crença, de ilusão, os mecanismos de identificação, o papel da relação libidinal e da relação mortífera entre os seres humanos, com o que realmente comportam de amor, fascinação, manipulação ou de sedução [...] a função dos excluídos ou dos bodes expiatórios, na construção do tecido social. (ENRIQUEZ, 2007, p. 7). Seguindo a corrente de pensamento de Marx (1974) e de Weber (1974), Galbraith (1984), mais recentemente, inaugura nova vertente de pensamento com a explicação de como o poder é exercido. Nem das relações de produção nem das relações na produção, mas nas relações com a organização para o alcance dos seus objetivos, sintetiza a nova vertente. A organização surge como a nova fonte do poder e os profissionais ressaltam seu nível na estrutura organizacional submetendo-se ao seu objetivo. Este, pelo menos em primeira instância, deve ser comum e buscado por todos, pois é no grau de coesão interna que se determina o poder da organização em alcançar resultados. De maneira geral a IES se apresenta como um espaço partilhado conscientemente como centro do saber, fornecendo as condições de sua existência como representativa de um universo organizacional, preparado para a formação do homem do século XXI. Sob princípios seculares da busca da verdade científica, organiza-se para prestar à sociedade os serviços relativos à pesquisa, ao ensino e extensão. Existe na sociedade e na própria comunidade acadêmica um pensamento ou representação positiva da imagem dos profissionais que se dedicam à área educativa. “[...] partimos do princípio de que as instituições de ensino superior, como 6 instituições educativas, são parcialmente responsáveis pela formação de seus membros como cidadãos (seres humanos e sociais) e profissionais competentes” (MASSETO, 1998, p. 13). O docente promove a sustentação da atividade-fim dessa organização, e no imaginário social seu desempenho se reveste de qualidade e excelência, quanto maior for a sua experiência e seu envolvimento com o conhecimento específico. (MASSETO, 1998). Essa imagem idealizada do docente diz respeito ao reconhecimento que a sociedade lhe confere, em face à nobreza atribuída a sua finalidade e aos seus resultados, juntamente com o reconhecimento da IES. Possivelmente, esse imaginário de excelência não absorve o contexto das dificuldades enfrentadas no cotidiano de trabalho, sejam elas geradas pelo paradoxo da autonomia ou das relações político-pedagógicas, seja incorporando as questões burocrático-administrativas, sendo por isso mesmo revestida de dissimulações que surgem na tentativa de ocultar o poder. O docente, enquanto uma pessoa que domina técnicas e fazeres específicos, pode utilizar determinadas estratégias e agir de forma a manipular e seduzir, a partir das relações com pares, atingindo o psiquismo e envolvendo o imaginário profissional. (ENRIQUEZ, 1974). PERCEPÇÕES DE PROFESSORES SOBRE AS RELAÇÕES DE INFLUÊNCIA Na construção das categorias relativas às relações de influência entre professores observou-se a existência do fenômeno implícito-explícito, tendo em vista a ênfase e diversidade de fatos, situações e argumentos presentes nos relatos dos entrevistados. A análise do conteúdo vem confirmar a forma explícita, retratando como os entrevistados percebem em si e nos outros as influências, e, na leitura das entrelinhas, observa-se a forma implícita, com o efeito sobre si próprio. Ambas as formas de expressão encontram respaldo e podem ser verificadas nas fontes de poder indicadas por Enriquez (2007). Os relatos destacam o incomodo causado pelas estratégias formais e informais de influência e 7 monitoramento, muitas vezes de maneira velada, formando um viés de mal estar, por envolver situações que interferem no desempenho docente. Identificam-se, a seguir, as doze categorias de manifestação das influências de prática comum entre os pares, ressaltando a percepção dos professores entrevistados como a fonte primária para a sua descrição. As categorias identificadas nas entrevistas e retratadas a seguir serão ilustradas de maneira a esclarecer como se dão as suas ocorrências: As citações foram identificadas por código alfa-numérico, segundo a ordem cronológica das entrevistas. Desta forma E1 corresponde ao primeiro entrevistado e E13, ao último. 1 Jogos de interesse A idéia dos jogos de interesse permeia o cotidiano, em face da força atribuída ao grupo que forma a rede de relacionamentos. Situações que não se resolvem por si ou pelo interesse do docente acabam chegando ao grupo para que este, segundo seus valores e julgamentos, faça seu juízo de valor e defenda ou não a causa. É um jogo que é permanente de que, qual panelinha vai conseguir ter maior capacidade de influenciar o conjunto e que essa... Esse jogo, ele vai passar pela capacidade de formalizar. O jogo, ele normalmente, é traçado na informalidade. [...]. Legitimado na formalidade... [...] deixa de ser até parte só do jogo de relacionamento, mas que seja uma imposição, e ai, essa rede, esse grupo conseguiu e essa maior influência acaba sobressaindo sobre as demais, mas é um jogo que é permanente. (E7, p. 8). [...] vou falar mais ou menos como eu acho que se dá essa relação de poder, entre essas pessoas. Elas são reais, elas são... [...] vão se dar nesse [...] esse jogo, ele vai se dar em função de várias coisas... Eu acho que a gente joga com isso. Quem te falar que não joga está mentindo para você. [...] defende uma dissertação sai no jornal, as pessoas, os professores se cumprimentam uns aos outros. [...] o tempo inteiro é esse jogo [...] a gente sabe mais ou menos quais são os papéis aqui, não é? (E1, p. 3). Os interesses mais favorecidos para envolver os pares nos jogos apresentam as formas de influência por meio das parcerias indicando ações de ajuda com o material bibliográfico, recursos audiovisuais, orientação sobre metodologia, didática, avaliações dentre outros auxílios. 8 2 Ação pessoal e profissional em benefício próprio A situação de influência por meio da ação pessoal e profissional em benefício próprio foi constatada nos relatos, por se constitui fator determinante da natureza do profissional docente influir sobre outra pessoa. A maneira com que o ensino é ministrado resulta em aprendizagem, mas a relação de ensino pressupõe certa ascendência, importância, crédito e prestígio. Nos moldes tradicionais, é possível que a influência surja em forma de inspiração, entusiasmo, apoio, embora seja difícil amenizar o sentido de que ela é exercida de uma pessoa sobre a outra. Seja qual for a natureza da influência, positiva ou negativa, invariavelmente haverá uma ação, um comportamento sobre o outro. Registram-se ocorrências tanto de cunho pessoal quanto da rotina profissional. Pela especificidade e pelas próprias circunstâncias em que cada situação ocorre considera-se que há dificuldade em apreender as inúmeras variáveis indicativas das ações desenvolvidas pelos docentes em seu próprio benefício. Sob este pressuposto, para a compreensão das ações pessoais e profissionais em benefício próprio, estabeleceu-se uma distinção, pois se misturam resultados gerados pela ajuda a terceiros e resultados alcançados com as ações premeditadas e calculadas. Desta feita, expõem-se inicialmente as formas de influências sob o cunho pessoal e profissional, para após, agregar as situações que se desenvolvem em benefício próprio. Um docente explica, retratando um contexto semelhante ao campo de força simbólico explorado por Bourdieu (2000), que no ambiente acadêmico existem espaços que legitimam a relação de poder de um ou de outro grupo, embora o argumento mais utilizado seja o da tentativa de influência, pois poucos são os docentes que admitem as influências dos pares. [...] você sente que alguns professores tentam te influenciar de uma certa forma, por que toda faculdade tem seus grupos, não é? Quer te puxar, te levar para um grupo, para um outro, tentam influenciar as suas relações dentro da escola. (E13, p. 2). [...] criam-se sugestões, criam soluções para todos os problemas de relacionamento que houver. (E10, p. 6). [...] eu realmente quero aquilo que o colega pode me ajudar a entender, a melhorar a visão... (E1, p. 5). 9 Observa-se que nas situações de interação do dia-a-dia, as influências são constantes podendo servir de escudo e de justificativa para o exercício do poder simbólico, onde os colegas se submetem às orientações e solicitações mútuas como ‘bons’, ‘amigos’ e ‘compreensivos’, deixando transparecer que não existem imposições, mas posicionando-se como ‘arautos’ do conhecimento. Ocorrem situações indicativas de uma relação mais dirigida para o resultado a ser alcançado, vista a partir da colocação de alternativas, do pedido de esclarecimento que, eventualmente, é feita ao colega, conforme retratado a seguir: [...] Quando os pares, os colegas, não estão dispostos. Repetidas vezes ele fala vou fazer porque sou obrigado, mas eu sei que não vai funcionar, eu sei que não vai funcionar. Gosto muito de conversar informalmente, tomo café, bato um papo, o que você acha disso. (E8, p. 5/7). Outra manifestação é relatada na influência pelo carisma, constatando a admiração pelo colega: Controle do saber. Eu noto muito isso. Controle do saber. (E13, p. 2). [...] marca presença, que detém um conhecimento de um assunto muito específico, [...] conhecimentos pouco comuns à classe como um todo. (E9, p. 3). Garantir seu próprio espaço e se possível ampliar. [...] quem participa dessa construção tem uma tendência a abandonar inclusive o equilíbrio que deveria existir entre as disciplinas no curso de administração e nas várias áreas de administração para ter uma tendência a garantir os espaços para esses mesmos profissionais a longo prazo. (E7, p. 3). No que se refere à prevalência do interesse de um docente sobre o de outro de forma a facilitar a manipulação de situações em benefício próprio, encontrou-se respaldo em situações onde os docentes se sentem influentes ao indicar um colega a uma vaga, seguida pelas ações que são feitas para atender às solicitações de substituição. [...] já pude contar com várias situações em que os professores me substituem na boa vontade sem cobrar nenhum honorário é... sempre tem um docente que se propõe estar na sala de aula para você. (E12, p. 1). [...] no primeiro semestre eu tive que apresentar um trabalho em um congresso [...] tive que faltar em função dele e solicitei a alguns colegas que pudessem estar em sala de aula passando alguma atividade. (E9, p. 1). [...] tive num grupo onde a amizade prevalecia. [...] se indicavam mutuamente. (E4, p. 2). [...] precisava aplicar prova e conversei com um colega meu para que ele viesse no meu lugar, que me substituísse aqui na aplicação de prova. [...] aconteceu isso comigo em relação a outros professores. (E2, p. 2). 10 3 Dissimulações As temáticas que envolvem as dissimulações são as mais variadas possíveis, mas, em alguns momentos, encontram ressonância e aderência entre os pares seja para disfarçar, encobrir ou mesmo fazer parecer diferente algo que socialmente não é oportuno nem procedente manifestar. A dissimulação e as práticas veladas podem ser verificadas nas seguintes frases: Que bom seria se eu não tivesse que estar submetido a determinadas relações. (E12, p. 4). O docente finge que ensina e o aluno finge que aprende. (E9, p. 4). Não vou transformar latão em ouro. (E2, p. 5). Os docentes entrevistados envolveram-se com as temáticas muitas vezes utilizando os ditados, frases de efeito e metáforas, para encobrir e camuflar o que gostariam de expressar numa clara indicação de compensação. As citações que registram essas dissimulações são breves e assertivas, retratando certas situações ditas mascaradas, supérfluas, repletas de subterfúgios, mas que causam preocupação, pois em seu entendimento podem ser utilizadas com segundas e terceiras intenções. Você pode estar no meio de um grupo muito difícil, eu já vivi situações assim, estar no meio de um grupo de professores extremamente difíceis, mas se você vê que aquilo ali é coisa passageira, que aquilo não te incomoda muito... mas se você... se pisa no seu ego, se aquilo te incomoda, seu narciso... (E13, p. 3). Uma posição diferente. [...] complementa mais efetivamente, a gente divide. [...] para explicar o que tem a ver essa complementaridade, é óbvio que isto chega ao ouvido do colega e da coordenação, dessa forma indireta e importante. [...] ficar de olho. (E1, p. 5). Os relatos sobre dissimulação destacam o aspecto puramente profissional, pois o que se sobressai são as formas de mostrar serviço e evidências, e questionamentos sobre o projeto pedagógico. 4 Utilização da rede de relacionamento A utilização da rede de relacionamento como uma das formas de influência exercida pelos docentes tornou-se a prática mais freqüente demonstrada na pesquisa. A distinção feita pelos entrevistados em relação à percepção sobre esta forma de controle sobre os pares destaca uma diferenciação por conta da dimensão 11 da própria rede. Algumas indicações recaíram sobre a utilização da rede de relacionamento de forma mais abrangente e outra salientou as pequenas redes, os grupinhos e as famosas panelinhas. A julgar pelas situações retratadas nos jogos de interesse, a utilização da rede de relacionamentos mostra-se consistente, pois, por intermédio dela, os docentes podem viabilizar desejos, afetos, necessidades, enfim suas realizações. [...] existe sim, essa formação de pequenos grupos de interesse e que isso daí, obviamente, acaba tendo privilégios, ou vantagens, ou desvantagens... (E7, p.2). [...] eles se juntam para formar o poder na reivindicação das suas necessidades, dos seus desejos, dos seus objetivos. (E6, p. 5). Observou-se a presença constante de manifestações emocionais e expressão de sentimentos destacando os relatos de situações que envolvem angústia, ciúme, inveja, vaidade, arrogância, bem como indiferença aos pares, no que se refere à rede de relacionamentos. Ressaltam-se as sensações de insegurança, insatisfação, desconfiança e seus opostos. Como fenômeno percebido, os relatos sobre as emoções receberam contribuição de Enriquez (2007) que concorda com a presença dos sentimentos, ressaltando maiores dificuldades caso a organização não lhes dê crédito. Segundo este autor a reação emocional pode ser percebida nas organizações em que os papéis de cada um estão bem definidos e são reconhecidos como pautados em relações representativas do núcleo familiar. Desta forma há o necessário consentimento para a sua instauração, pois, inerente a sua natureza, a influência tanto pode ser por uma recusa ou por uma sanção em potencial. Por meio da influência as pessoas definem o que deve ser realizado e por quem, revelando posições simétricas ou assimétricas, devido à busca da sua legitimidade, pois passou a ser compromisso de realização, uma obrigação de fazer ou não o que foi comentado. As interações entre os pares ocorrem a todo o momento em uma organização tornando o relacionamento entre as pessoas mais freqüentes e próximas. [...] a rede de relacionamentos ela é tão importante. (E8, p. 7). [...] precisei contar com a parceria... (E6, p. 1). [...] buscar colegas que às vezes o compreenderam melhor. (E3, p. 2). 12 Acho que é relativamente comum esse tipo de coisa. É sempre muito apoiado em relações sociais. Em relações de amizade. [...] você não pede para qualquer pessoa fazer esse tipo de coisa, mesmo porque você não pode contar esperar que qualquer pessoa se predisponha te ajudar só por ela ser sua colega de trabalho. (E2, p. 2). [...] ai você sempre procura um colega, olha só. [...] mas não é qualquer colega. [...] um que você confia. (E1, p. 10). A fim de ilustrar como são estabelecidas as redes de relacionamento como forma de influência, apresenta-se algumas citações: Então o que é bom, é que todos os professores tenham uma relação bem estreita entre os outros professores, porque a gente sempre esta mudando de faculdade, para outras Instituições e nós sempre vamos encontrar com esses colegas em outras Instituições. Agora, instrumento de controle é ter um bom relacionamento e controlar esse lado do professor e da instituição. (E11, p. 1/4). A maneira mais comum junto ao corpo docente onde eu trabalho é a questão de pertencer ao ciclo de amizade de quem detém o poder, pertencer ao ciclo de contatos. (E9, p. 5). Uni muito amigos. [...] os grupinhos, [...] no conjunto é um corpo unido. [...] do curso de Administração. Os grupinhos. [...] aqueles grupinhos. (E5, p. 5). 5 Utilização do relacionamento com superiores A forma encontrada para que a relação de influência seja mantida e confirmada acaba criando esta nova forma, pois o que chega a valer são a posse e a legitimidade da influência exercida. A prática da utilização do relacionamento com as instâncias superiores vem à tona, mostrando a preocupação dos docentes, indicando unanimidade no que se refere às interações estabelecidas pelos colegas com a coordenação de curso, a direção, os proprietários, enfim a cúpula. Esta interação mais próxima com a direção pode ser vista nas citações a seguir: Mostrando que ele pode [...] primeiro que ele é intimo da direção. E é o que mais ocorre. (E13, p. 5). [...] um relacionamento bom, positivo com alguém em uma posição mais alta na hierarquia, tem uma simpatia. [...] que haja uma simpatia entre esse professor e esse, digamos suposto coordenador, ou reitor ou pró-reitor. (E9, p. 4). [...] poder de relacionamento com... os donos das mantenedoras. [...] essa política tem se intensificado [...]. (E4, p. 3). [...] quando está próximo da reestruturação da instituição. (E3, p. 4). 13 No que se refere à utilização do relacionamento com o coordenador, o grupo de docentes entrevistados expressou seu pensamento, mostrando preocupação com a situação de outros colegas que se aproximam da coordenação buscando favorecimentos. Essa proximidade contribui para gerar inveja, desconfiança e promover a desestabilização entre os pares temerosos das reações ou mesmo de conversas inconseqüentes. [...] nesta época as coisas ficam um pouco mais explícitas... as pessoas que estavam afastadas se aproximam lá da coordenação. (E9, p. 4). [...] estar sempre do lado da coordenação e das decisões da escola. (E8, p. 6). [...] disputa de poder de relacionamento com o coordenador. (E4, p. 3). [...] há professores que fazem negociatas com a coordenação. (E3, p. 4). 6 Utilização do relacionamento com o discente A forma de manifestação da influência percebida pelos docentes como muito ameaçadora é aquela exercida com a utilização do relacionamento com o discente. São relatadas situações onde se manipulam informações: [...] é através dos alunos que o coordenador fica sabendo o que está acontecendo em sala de aula. (E10, p. 3). A maioria dos docentes entrevistados já passou pela experiência de ser argüido após reclamação do aluno. Sabe-se que os discentes cuidam de seus interesses e optam por privilegiar a si próprios, pedindo ajuda aos colegas, unindo forças. Eles apresentam sua visão sobre o fato, comentam e iniciam boatos. Esta situação gera influência de um colega sobre o outro, tornando-se uma ameaça, de certa forma velada: Então o relacionamento com os colegas sempre tem que ser muito próximo. [...] tenho uma rede que vai me auxiliar, me re-posicionar... na própria legitimação do trabalho que você faz, às vezes, de um colega que é... um aluno seu ou que vai dar aula para o mesmo aluno. Ele reforça as coisas que você fala. (E7, p. 1). O aluno, hoje, é inimigo do professor.” [...] isso varia de escola para escola e varia de tempo para tempo, [...] eles reúnem e seguram todas as informações. Distorcem e filtram as “informações. (E5, p. 7). Os docentes entendem que os discentes surgem como um vértice do triângulo capaz de concentrar a atenção de toda a comunidade acadêmica, não só 14 por suas necessidades de aprendizagem, mas também pelas ações que são capazes de desencadear. Nas relações de influências desenvolvidas no cotidiano acadêmico, nenhum docente está livre das formas de utilização do relacionamento com os discentes, principalmente pela natureza da relação que é mantida entre ambos. [...] afetam a partir de que elas inibem a atuação do docente tornando uma atuação muito mediana eu diria em muitos casos até... até certo modo medíocre, porque você acaba é... forçando a existência de um jogo entre docente-aluno. Controle mais implícito e como esse controle é exercido, talvez assim os professores controlam os outros... é conversando com os alunos sobre como que é a atuação daquele professor ou não, eu acho que uma maneira de saber, de controlar... num... não vejo, não é tão fácil, não é tão explícito quanto o controle que instituição faz. (E9, p. 4/6). O aluno... você usa para poder analisar o próprio professor. Qualquer coisa que faça principalmente quando é contra o que ele quer, ele se manifesta. A favor nem sempre, mas contra ele se manifesta rapidamente. [...] você começa, a saber, se o professor sai mais cedo ou se ele chega atrasado, se ele deu a aula bem dada ou não deu, se ele preparou a aula, se a prova foi coerente, se não foi, tudo isso dai se manifesta com o aluno, então... Esse relacionamento que você acaba desenvolvendo com os próprios alunos te auxilia no sistema de controle. [...] nem sempre são muito adequados ao meio não. [...] o próprio aluno participa dessa avaliação e que nem sempre está isento o suficiente para responder. (E7, p. 8/7). 7 Atuação em atividades integradas e práticas interdisciplinares A atuação em atividades integradas e práticas interdisciplinares têm suscitado situações nas quais as relações de influência se mostram presentes, conforme os relatos dos docentes entrevistados. A ausência de convite para a atuação conjunta ou seu excesso tem mostrado que os trabalhos interdisciplinares acabam por promover relações de influências entre os pares. Como a ação é integrada, se algo não ocorre como o planejado um dos docentes se sente alijado do processo, não adiantando as desculpas do colega para as eventuais falhas. Aqueles que dominam esse tipo atividade acadêmica compartilhada acabam por exercer influência sobre os demais, sendo preferidos e mais solicitados. O formato institucionalizado para a aplicação dessas atividades envolve a parceria com o intuito de proporcionar aos discentes novas e inovadoras oportunidade de aprendizagem. Com a exigência por parte da IES para que essas atividades tenham uma curva ascendente, os docentes de diferentes disciplinas se unem e planejam a integração dos conteúdos, visitas técnicas ou trabalhos, conjugando as mesmas diretrizes. 15 Neste sentido, os docentes entrevistados destacam esta categoria de influência, explicitando a ajuda necessária para o desenvolvimento das ações: [...] estudo dirigido e [...] um outro estudo que a gente fazia com os alunos, era a instrução programada. (E4, p. 1). [...] estratégias bem definidas em algumas interdisciplinaridade, de estratégia conjunta. (E2, p. 2). instituições, de Sustentam também os relatos que ocorrem comportamentos inadequados por parte de colegas, revelando contradições e ônus de natureza profissional ao docente que realmente se envolve na parceria, quando: [...] alguns docentes atuam sonegando participações, por exemplo, em disciplinas afins, evitando participar de atividades que o outro professor está criando ou desenvolvendo para não enriquecer o trabalho do seu par, né? (E13, p. 5). A atividade era proposta em conjunto e um professor não a realizou. (E12, p. 1). [...] dificilmente a gente trabalha em projetos comuns. (E4, p. 2). 8 Compartilhamento de conhecimento e material acadêmico Na categoria da influência sobre o compartilhamento de conhecimento e material acadêmico, é destacado no relato dos docentes pesquisados o grande movimento proporcionado pelas trocas de informações sobre as disciplinas, as práticas didáticas e metodologias usadas, permutas de material instrucional, leituras de artigos de colegas para eventual publicação, dentre outras. O compartilhamento vem demonstrar o compromisso dos docentes com as condições e a organização do trabalho, no cotidiano acadêmico. Os relatos destacam o movimento em torno da inovação, da flexibilidade, da criatividade, das participações conjuntas. Esse ajuste à própria performance profissional envolve, às vezes, a atualização, agregando novo valor ao conhecimento dos pares. Os relatos seguintes mostram a forma prática com que se desenvolve a ação de compartilhamento do conhecimento e de material didático: [...] essa interação, discutir o conteúdo seu com o de outros colegas e o que está sendo feito e que acaba afetando o restante do curso como um todo. (E7, p. 3). [...] às vezes um colega vem na sua sala para te perguntar alguma coisa que não tem nada a ver, uma bibliografia, uma coisa de um aluno, bate o olho em outra coisa, vê um texto que está ali. Eu disponibilizo material... (E1, p. 5). 16 9 Publicações e participações em congressos As publicações e participações em congressos também foram indicadas como forma de manifestação da influência sobre os pares. Esta prática é referenciada não só pelos múltiplos saberes que o docente pesquisador vai adquirindo ao longo de sua carreira, mas também por que traduz a notoriedade alcançada por meio da produção de textos, divulgação de artigos ou capítulos de livro e pela apresentação de seus trabalhos e participação em congressos: [...] o professor, ele marca espaço diferenciado no corpo docente, ele marca ainda, por exemplo, quando ele tem uma forte publicação, ele acaba se diferenciando. [...] ele tenta ter um poder na atuação através da produção acadêmica e científica, da titulação e da atuação em sala de aula. (E9, p. 2). 3). [...] saber fazer pesquisa e pesquisar e publicar é importante. (E1, p. 10 Titulação e formação continuada A titulação alcança destaque como forma de influência entre professores, dada a sua importância para a carreira docente. As questões sobre a formação, titulação e educação continuada são tratadas nas citações como motivadoras, para manter os pares mais aptos, atualizados ou mais habilitados a lecionar, numa perspectiva de influência positiva mútua. [...] por ter um título superior, que eles... de certa forma... a palavra não é essa, mas, são superiores a seus pares. (E13, p. 5). [...] eu acho que a titulação tende a dar uma proteção ao professor. [...] é a questão de é... o valor do docente ele é muito atrelado à titulo, então assim o professor, o mestre hoje nem tanto, mas o professor doutor ele tem...ele marca espaço diferenciado no corpo docente. (E9, p. 2). [...] caso da Administração, que é o jogo da formação acadêmica. O jogo de poder, ele também envolve nisso da própria formação, porque é um dos instrumentos que vão tentar usar para garantir espaço ou eliminar espaço dos outros, para ter influencia ou para ter retirar influencia de outros. (E7, p. 8). O poder que existe, ele está muito alinhado hoje, às vezes à titulação. (E6, p. 5). 17 11 Experiência profissional No conjunto das categorias destacadas para as formas de influência entre os docentes, a experiência profissional absorve num só contexto os temas sobre a autonomia profissional, tempo de exercício, especificidade do conteúdo ministrado e o status que a carreira proporciona, mostrando a importância atribuída a essa forma de influência. Sobressaem as citações sobre status e este nivelamento se dá na estrita obediência aos espaços do imaginário social, distinguido pelos anos de profissionalização, número de turnos de trabalho, trocas e substituições e aos conhecimentos de conteúdos específicos. [...] quando ele é constantemente homenageado [...] e vários utilizam da reincidência da homenagem... Até para se segurar no cargo. Eu já convivi com vários colegas que utilizam dessa estratégia da homenagem para se destacar. (E8, p. 5/6). [...] pelo tempo que você tem de convívio na área acadêmica. Até o momento traz uma condição diferenciada que é a questão da própria sobrevivência, a manutenção da capacidade de articulação que você tem com os colegas, isso daí vai influenciar a instituição, a aceitação, os conhecimentos, e toda essa permanência. (E7, p. 4). A experiência profissional é muito forte dentro da grade do curso de Administração, principalmente nas disciplinas de formação profissional, as disciplinas chamadas profissionalizantes. (E6, p. 5). p. 4). [...] ser o professor homenageado, para ser o patrono da turma. (E6, [...] por que você tem prestígio, como mais antigo e mais prestigiado da escola. E sou o professor mais homenageado que tem lá dentro. (E5, p. 4). Ele é uma autoridade no conhecimento. (E3, p. 4). 12 Resultados das avaliações Como última categoria submetida às relações de influência entre docentes, encontra-se o resultado das avaliações. Essas avaliações são realizadas por uma comissão específica para desenvolvê-las, a fim de coletar os dados e analisar informações que envolvem discentes, docentes, funcionários técnicoadministrativos, direção e coordenação. Pela abrangência das ações e o foco no desempenho, compreende-se a influência e o temor gerado pela divulgação das avaliações, principalmente quando 18 os docentes obtêm de forma escusa o conhecimento dos resultados e os utiliza para provocar pressão e constrangimento. Observa-se a preocupação dos docentes com o vazamento de informações, pois embora sejam revestidos de sigilo, muitos colegas se declararam conhecedores dos resultados obtidos pelos pares, sabendo apontar motivos e especificidades, informando quem foi bem ou mal avaliado. Existe monitoramento do rendimento do professor, da sua aceitação. (E12, p. 5). Então existe às vezes esse tipo de... de pressão. Uma certa influência para que o resultado do seu trabalho não seja exatamente o que você gostaria naquele momento, mas às vezes para beneficiar uma questão econômica da instituição. (E7, p. 3). As situações relatadas pelos entrevistados vêm corroborar os aspectos destacados como manifestações das relações de influência e, neste particular, atendem ao objetivo de identificar, no cotidiano da função docente, as formas como os pares revelam sua ascendência sobre os demais, segundo a percepção do grupo pesquisado. Essas situações foram descritas como sendo realizadas tanto em nível individual quanto coletivamente. Um professor assim se posicionou e expressou sua reflexão sobre a vida acadêmica: Acho que é isso. Se tiver um elemento que dificulta é o próprio professor. Ele se sente com medo... com medo de realizar essa troca, por que se ele trocar o outro vai se apropriar também disso e vai gerar uma dissimetria, uma divergência, ali na relação de poder. [...] por aquilo que vai garantir a permanência na instituição. Eu acho que o que mais dificulta é o próprio professor, os medos, receios, suas ações, é isso que dificulta. (E1, p. 6). Para a diversidade das contingências e as complexidades impostas aos pares no cotidiano docente, não lhes bastam o contexto da legalidade e formalidades, mas eles sustentam seus interesses, se estruturam e organizam suas redes de relacionamento. “[...] o jogo, ele normalmente é traçado na informalidade e legitimado na formalidade.” (E7, p. 6). Na percepção deste entrevistado as ocorrências e as formas como as relações de influência interferem no trabalho docente, revelam que os meios formais são estrategicamente utilizados para construir situações que evoluem sob o viés informal. Esse enlaçamento ocorre de forma a propiciar a coexistência das especificidades do imaginário social, em face da demanda de cada situação, buscando a legitimação e o apoio das ações exercidas, conforme expõem teóricos como Crozier (1983), Melo (1991) e Enriquez (2007). 19 CONSIDERAÇÕES FINAIS Em face das exigências do cotidiano acadêmico, a pesquisa mostrou a pressão e as idiossincrasias das relações de influências entre os professores. Revelou que os docentes nutrem emoções ambivalentes, influenciando e deixandose influenciar pelos colegas, no intuito de afirmar suas realizações, manter a integridade e alcançar objetivos organizacionais. A atuação docente revela-se pela busca do sucesso, prestígio e reconhecimento e, por isso, muitos se sujeitam, até inconscientemente, às imposições informais de seus pares. As relações de influência, na percepção dos entrevistados, se apresentam no conjunto das doze categorias listadas, sendo a ordenação uma simples seqüência de abordagem dos temas, não representando graus de importância ou intensidade. Muito mais do que a simples transmissão de informações, a análise dos relatos dos entrevistados traduz, também, suas aflições e angústias, às quais se submetem para se ajustar ao cotidiano acadêmico e permanecer atuando. Os resultados alcançados nesta pesquisa, em face aos argumentos revelados, não estão restritos ao saber técnico que os docentes dominam na prática educativa, mas descrevem situações críticas, que geram sentimentos e estes acompanham o professor em todos os ambientes nos quais ele convive, inclusive em sua vida particular e familiar. Pela densidade dos problemas relatados e efetivamente enfrentados pelos docentes com relação às influências dos pares, conclui-se que há dificuldades em se identificarem para além do imaginário social, embora se mantenham ajustados ao discurso e aos objetivos organizacionais. Como contribuição, sugere-se o estudo sobre as relações de influência em grupos docentes de outras áreas do saber, possibilitando comparações e expansão deste conhecimento, ainda pouco explorado no ambiente acadêmico. 20 REFERÊNCIAS BARDIN, Laurence. Análise de Conteúdo. Lisboa: Edições 70, 1977. BOURDIEU, Pierre. O poder simbólico. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil Ed., 2000. 311 p. CLEGG, S.R.; HARDY, Cynthia. Alguns ousam chamá-lo poder. In CLEGG, S.R.; HARDY, Cynthia; NORD, Walter R. (Orgs.). CALDAS, M. ; FACHIN, R. ; FISCHER, T. (Org. ed. bras.) Handboock de estudos organizacionais. São Paulo: Atlas, 2001. v.2, pp. 260-289. CROZIER, Michel. A sociedade bloqueada. Brasília: UnB, 1983. 280p. ENRIQUEZ, Eugène. 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