Atualização: Doenças Falciformes Dr. Ricardo Helman Mestre em Ciêncais da Saúde FCMSCSP Hematologista HIAE Doenças Falciformes •Classificação •Fisiopatologia •Tratamento Histórico Herrick, J.B. (1910) Peculiar elongated and sickle-shaped red blood corpuscles in a case of severe anemia. Archives of Internal Medicine, 6, 517±521. Doença Falciforme - histórico 1910 - James Herrick primeiro relato da doença 1946 - Accioly, Neel e Beet definição da base genética da doença 1949 - Pauling descoberta da “doença molecular” 1957 - Ingram substituição genética na cadeia beta Definição Doença genética, de caráter autossômico recessivo, caracterizada pela presença de duas hemoglobinas anormais, sendo que pelo menos uma delas é Hb S Hb SS (Anemia Falciforme) Hb S / ß0 Talassemia (S / ß0 Talassemia) Hb SC (Hemoglobinopatia SC) Hb S / ß+ Talassemia (S / ß+ Talassemia) Outras duplas heterozigoses com HbS Diagnóstico Hemograma + plaquetas Reticulócitos Morfologia eritrocitária Parâmetros de hemólise bilirrubinas DHL Sangue periférico Eletroforese de Hemoglobina por cromatografia líquida de alta resolução (HPLC) A s Fisiopatologia Anemia Falciforme Lesão Monogênica • Anemia hemolítica crônica • Vaso-oclusão • Estado inflamatório crônico • Lesão e falência dos órgãos Switzer et al., Lancet Neurol 2006; 5:501 Fisiopatologia da vasoclusão na anemia falciforme 1 Aderência anormal ao endotélio vascular 2 Hemólise intravascular 3 Aderência de leucócitos 4 ↑ Tônus vasomotor 5 Proliferação de células musculares lisas 6 7 8 e fibroblastos na íntima Agregação plaquetária Vasculopatia Oclusão vascular Switzer et al., Lancet Neurol 2006; 5:501 Doença Falciforme Oclusão vascular e aumento da viscosidade - Falcização Episódio vaso-oclusivo Síndrome torácica aguda Osteonecrose Hipertensão pulmonar Úlceras de membros inferiores Priapismo Acidente Vascular Encefálico Isquêmico Disfunção endotelial associada à hemólise - Doença vascular proliferativa Kato GJ, Gladwin MT, Steinberg MH. Deconstructing sickle cell disease: reappraisal of the role of the hemolysis in the development of clinical subphenotypes. Blood Reviews 2007;21:37-47 Manifestações clínicas agudas: crise dolorosa infecção síndrome torácica aguda acidente vascular cerebral crise de seqüestração esplênica/hepática crise aplástica priapismo Glu⇒Val Glu⇒ desoxigenação GVs GVs falcizados túbulo normal Infarto renal oclusão microvasculatura túbulo necrótico DIAGNÓSTICO PRECOCE – TESTE DO PEZINHO PROGRAMA NACIONAL DE TRIAGEM NEONATAL- PTNT PORTARIA MS Nº 822/GM, DE 06 DE JUNHO DE 2001 FASE I – Fenilcetonúria + Hipotireoidismo FASE II – Doença Falciforme FASE III – Fibrose Cística 15 Frequência do gene S no Brasil Pernambuco AS 4% (1:23) DF 1:1.400 PE BA Bahia AS 5,3% (1:17) DF 1:650 São Paulo AS 2,6% (1:35) DF 1:4.000 MG SP População 186,7 milhões Fonte: Ministério da Saúde do Brasil RJ Minas Gerais AS 3% (1:23) DF 1:1.400 Rio de Janeiro AS 4% (1:21) DF 1:1.200 RS Rio Grande do Sul AS 2% (1:65) DF 1:10.000 Tratamento Antibióticos (infecção) Hidroxiuréia Transfusão de hemácias Quelação de ferro Transplante de medula óssea Profilaxia Infecciosa Tratamento profilático: Penicilina oral ou intraintra-muscular Vacinas • pneumococo - meningococo • haemophilus influenzae • hepatite B Ácido fólico Redução significativa da mortalidade em crianças ≤ 5 anos de idade após início da triagem neonatal Transfusões de hemácias Anemia Hemolítica Crônica Sobrevida média do eritrócito: 5 a 20 dias Hiperplasia eritróide: 6 a 8 x Hemoglobina média: 7 a 8 g/dl Aumento da [2,3-DPG] Objetivos das Transfusões Melhorar a capacidade de transporte de oxigênio pelo aumento da concentração da hemoglobina total Diminuir a viscosidade sangüínea e aumentar a saturação de oxigênio com o objetivo de prevenir fenômenos trombo-embólicos Suprimir a eritropoese endógena Métodos de Transfusão de Hemácias Método Indicação Complicações Transfusão Simples Anemia Sintomática Perdas Agudas Pré-operatório Hemólise Aguda Sobrecarga de Ferro Transfusão Troca Parcial AVC Sd Torácica Aguda ICC Priapismo Aloimunização Infecções Virais Sobrecarga de Ferro Eritrocitoaférese AVC Sd Torácica Aguda ICC/IRC Aloimunização Sobrecarga Ferro Infecções Virais Josephson CD et al. Transf Med Rev 2007;21:118-33 Aloimunização Genotipagem Genotipagem N= 45 Helman e cols Santa Casa SP 2011 Genotipagem • 8 (17%) pacientes não foi possível realizar fenotipagem pela hemaglutinação • Aloanticorpos em 11 (29%) pacientes • anti-D, -C, -CW, -E, -Jka, -Jkb, -Fya, -Dia, -s. • Fenotipar maior número de Antígenos. •Discrepâncias entre fenótipos em 8 (17%) pacientes. •Genotipagem – padrão-ouro? Helman e cols Santa Casa SP 2011 Sobrecarga de Ferro • Concentrado de hemácias: – 1 ml = 1,16 mg ferro – Uma unidade = 200–250 mg de ferro – Ex.: 10 U (1U ± 1mg/ml, ± 200ml): acúmulo de 2 g Porter JB. Br J Haematol. 2001;115:239–252 Kushner JP, et al. Hematology. 2001;47–61 Sobrecarga de ferro • Pacientes transfundidos regularmente – acúmulo de ferro: 0,4 - 0,5 mg/Kg/dia (70 Kg: 28-35 mgdia) – Acúmulo anual médio: 7 a 8 g de ferro – Sinais de sobrecarga de ferro: após 10 a 20 transfusões Porter JB. Br J Haematol. 2001;115:239–252 Kushner JP, et al. Hematology. 2001;47–61 1. Porter JB. Br J Haematol 2001;115:239–252 2. Kushner JP et al. Hematology 2001;47–61 Terapia Quelante de ferro Quando iniciar ? • Ferritina sérica > 1000 ng/ml • pelo menos 2 determinações seriadas Número de transfusões: 10 a 20 Sobrecarga de Fe e Quelação Two-year analysis of efficacy and safety of deferasirox treatment for transfusional iron overload in sickle cell anemia patients. Cançado RD et al. Acta Haematol, 2012 Sobrecarga de Fe e Quelação Two-year analysis of efficacy and safety of deferasirox treatment for transfusional iron overload in sickle cell anemia patients. Cançado RD et al. Acta Haematol, 2012 Sobrecarga de Fe e Quelação Quelação Ferro Sobrecarga de Fe e Quelação Principais Efeitos Adversos Eventos Adversos N (%) Diarréia 7 (22.6) Cefaléia 7 (22.6) Náuseas 5 (16.1) Aumento de Creatinina 2 (6,5) Sonolência 3 (9,7) Rash cutâneo 2 (6,5) Dor abdominal 2 (6,5) Vômitos 3 (9,7) Aumento de ALT 2 (6,5) Cançado RD et al. Acta Haematol, 2012 Acidente Vascular Cerebral • Incidência : 8 a 10 % (3 a 10 anos) • Isquêmico: crianças • Hemorrágico: adultos • Localização carótida interna (segmento distal) artéria cerebral média e anterior (segmento proximal) Ultrassom Doppler Transcraniano Normal: < 170 cm/sec “Suspeito Suspeito”: ”: > 170 e < 200 cm/sec Anormal:: > 200 cm/sec Anormal Adams et al, NEJM 1992; 326:605-10 Probability of Remaining Stroke Stroke-Free Risco de AVC e fluxo cerebral 1 <170 cm/sec 170–199 cm/sec 0.9 P = .0001 0.8 0.7 0.6 >200 cm/sec 0.5 0.4 0 5 10 15 20 25 30 35 Time (months) 1. Adams RJ, et al. N Engl J Med. 1992;327:1062. 2. Adams RJ, et al. Control Clin Trials. 1998;19:110. Doppler Transcraniano Anormal- velocidade >200 cm/sec Angio-RNM Efeito da Transfusão regular de hemácias sobre Recorrência de AVC Probabilidade de não recorrência 1.0 0.8 Com Transfusão (n-63) STOP I 0.6 p=0.002 0.4 1 evento neurológico (AVC) (braço transfusão) versus 11 eventos neurológicos (10 AVC e 1 Hematoma) no grupo sem transfusão, Taxa de AVC = 10% por ano (braço sem transfusão) Redução do risco de AVC de 92% (p<0.001) STOP I foi descontinuado. Sem Transfusão (n=67) 0.2 O 10 20 30 40 50 60 70 (meses) Tempo até o segundo AVC Transfusões e sobrevida livre de AVC 1.0 Sobrevida livre de AVC Transfusão 0.8 Sem Transfusão 0.6 STOP II Transfusão x Sem Transfusão • 35% sem transfusão voltaram a apresentar elevado risco de AVC • 2 crianças tiveram AVC (± 5m) p=0.002 0.4 Recomendação: não parar as transfusões 0.2 0.0 0 5 10 15 20 25 30 Meses Adams RJ et al. (STOP II) N Engl J Med, 2005; 353:2769-2778 Hidroxiuréia Hidroxiuréia Hidroxiuréia Redução Episódios de STA, Eventos VO, Redução de 40% da mortalidade Steinberg et al. 2003 Hidroxiuréia longo prazo Pacientes SS Voskaridou e col, blood 2010; Vol 115 Hidroxiuréia longo prazo Voskaridou e col, blood 2010; Vol115 Variáveis Categoria n Idade Média Mediana 29 anos 17 – 52 anos Sexo Masculino Feminino 21 26 44,6 55,4 Grupo étnico Branco Negro Pardo 1 15 31 2,1 31,9 65,9 Tempo de uso HU(meses) Mediana Min. – Max. 23,5 7 - 68 Dose de HU (mg/kg/dia) <20 20 – 24 25 -30 23 23 1 Cançado RD & LIMA MCC Santa Casa de São Paulo/SP 2011 % 48,9 48,9 2,1 Indicações e Efeitos Adversos Indicação N (%) Dor recorrente 3 (6,3) Hb < 7,0 g/dl 17 ( 36,1) DHL > 1000 26 (55,3) Priapismo 3 (6,3) AVC 3 (6,3) Dose Cefaléia Alopécia Melaníquia Rash mg/kg/d SIM NÃO SIM NÃO SIM <20 1 30 2 29 4 = ou >20 4 1 15 0 P 0,02 12 0,79 0,13 NÃO TGI SIM NÃO SIM NÃO 27 2 29 6 25 16 0 16 2 14 0,54 0,55 Avaliação da eficácia Laboratorial do uso de HU Variável Baseline Média (DP) 6 meses Média (DP) 12 meses Média (DP) Hb (g/dl) 7,5 (1,1) 8,9 (1,2) 8,8 (1,4)* VCM 90,7 (7,6) 101,7 (14,3) 105,3 (10,9)* HbF 2,53 (3,69) 7,73 (4,72) 13,79 (7,85)* Reticulócitos 13,63 (8,31) 9,08 (6,05) 8,66 (6,79)* Bilirrubina Indireta 3,75 (3,08) 2,33 (2,97) 2,37 (2,3)* DHL 1326 (439,6) 910 (365) 814 (344)* * Basal versus 12 meses - P< 0.05 Resultados Hidroxiuréia na Infância Wang c e cols, Lancet 2011: 377: 1663-72 Hidroxiuréia na Infância Hydrea é segura e deve ser utilizada em crianças >8m Wang c e cols, Lancet 2011: 377: 1663-72 Hidroxiuréia: Medicação Ideal? • Aspectos Gerais: Agente único, barato, VO, uma vez ao dia. • Eficácia Laboratorial: aumenta HbF e Hb e diminui Leucócitos, DHL, reticulócitos • Eficácia Clínica: melhora anemia, menos Vaso-oclusão, hospitalizações e hemólise. • Eficiente para todas as faixas etárias, previne eventos agudos e complicações crônicas • Benefícios se mantém ao longo do tempo, sem resistência ou tolerância • Poucos efeitos colaterais que podem limitar a aderência • Seguro e sem complicações crônicas da terapia TMO e Doença Falciforme Critérios de Inclusão: Menor de 16 anos e doador HLA idêntico Ter tido um dos seguintes eventos: • AVC ou evento neurológico agudo com duração superior a 24 horas • Síndrome torácica aguda Sem resposta a hidroxiureia Aloimunização TMO e Falciforme ◦ ◦ ◦ ◦ ◦ N = 50 (48 SS) Idade med 9,9 (3,3 a 15,9) Indicações Acidente Vascular Cerebral Síndrome Torácica Aguda Crise Vaso-Oclusiva Evolução 3 óbitos 1 AVC 2 GVHD Quimerismo 5 casos rejeição e recaída Walters M, 2000 Blood TMO e Falciforme • • N=67 Idade – 10 (2 – 27) • Principais indicações: – – – • • 42% AVC prévio 35% STA prévio 36% > 3 CVO ultimos 12 m Avaliação pós- TMO – DECH aguda 10% – DECH cronica Óbitos – 3 casos – 1 AVC – 5 meses após TMO – 1 falencia múltiplos órgãos – 1 ano após TMO – 1 causa desconhecida – 8 anos após TMO Panepinto JA, Br Journal Haematology 2007 Projeto TMO Doença Falciforme Critérios Inclusão: • • • • anemia falciforme (HbS homozigoto), S-BETA talassemia. Idade < 21 anos. Apresentar um doador familiar HLA idêntico. Apresentar uma das complicações descritas abaixo – Crises vaso-oclusivas recorrentes e/ou priapismo (pelo menos dois episódios no ano precedente ou no ano anterior ao início de um programa de transfusão crônica) após uso de hidroxiuréia por 6 meses sem resposta ou contra-indicação ao uso da mesma – Presença de vasculopatia cerebral demonstrada por ressonância nuclear magnética (RNM) e requerendo um programa de transfusão crônica – Presença de qualquer anormalidade à ressonância magnética angiográfica (RMA)/RNM ( – Doença Pulmonar falciforme graus I e II – Nefropatia falciforme (TFG entre 30 a 50% da esperada) – Doppler Transcraniano anormal – Infarto Cerebral Silencioso – S beta talassemia dependente de transfusões Conclusão Elevada incidência e prevalência Elevada morbidade e mortalidade O diagnóstico precoce é fundamental Acompanhamento clínico e laboratorial periódico Centros de Referência Obrigado! [email protected]