Adalberto de Oliveira Souza
Universidade Estadual de Maringa
Nunca
e
demais lembrar que a traducao
extremamente controvertido.
A arte de traduzir
e
um
e
assunto
passar
uma
recer muito simples porque se considerarmos tudo que este ate
implica, concluiremos que a traducao e muito mais complexa do
que parece.
Basta fazer algumas consideracoes que isto
nos
fica claro: as diferencas culturais entre os paises: as
pos-
que levaram uma obra a ser traduzida: a habilidade do
tradu-
tor, seu grau de conhecimento da cultura dos dois paisesedas
duas linguas, a epoca em que esta obra foi traduzida.
mente, apenas estaspoucas
Real-
observacoes ja nos mostram de
an-
temao que esta tare fa nao e tao simples como pode parecer.
Segundo Roman Jakobson, traduzir e a busca da equivalencia na diferenca.
equivalente1•
e
precise que
0
tradutor interprete
Portanto, ele estabelece tras tipos de
a
tradu-
cao: a intralingual, a interlingual - a traducao propriamente
dita -, e a transposicao intersemiotica.
Este conceito
plica muito bem a reproducao da mensagem: a traducao seria
lancia de sentido, nao ha traducao.
Contudo, nao se pode esquecer que quem realiza
exa
termediario entre as duas mensagens, como bem nos mostra
Jean
Cohen, que estabelece um esquema do circuito de comunicacao:
Paul Gadenne, ao conceituar a traducao, procura a etimologia da palavra e acrescenta ai seu sentido metaforico, re-
TJU1du.z.iJL,no llenUdo pMpIUo da. palavlU1, e 6azeA PlU4aJl de
um u:t4do a outlw.
TJuuiu.UJl.a v.i..da. po-iA ten1:aJlmudtvt-lhe
a na.twl.eza, 6aze-la noua; e te.ntalt dom.inQ.-la, ap!l.OpILi.a.ndo-no4 da. 4U4 4ub.\-t4nW.3
e
mos, entao, ao velho dilema: ate que ponto uma traducao e fiel?
Na verdade, a traducao depende muito de como
tor "Ie"
0
tradu-
0
texto original, se ele conhece adequadamente a con-
cepcao com a qual
0
autor original criou a obra e sabe aplicar
as convencoes estabelecidas para a sua leitura. A traducao esta intimamente ligada
a
interpretacao que
0
tradutor
faz
do
texto original, de sua concepcao de traducao e dos objetivos a
que se propoe.
Sabemos que buscando uma fidelidade absoluta,
cair na intraduzibilidade e, a extrema liberdade em
podemos
traduzir,
pode nos levar a total desfiguracao da obra. No entanto,
pre houve adeptos de ambas as posturas, os defensores
de
semuma
1397
Acreditamos que estas posturas diante da traducao estejam muito ligadas a concepcoes de epoca e das relacoes entre
as culturas dos paises em questao.
Circunstancias geograficas, formacao historica, etnia
ou etnias de uma nacao determinam a criacao de um universo cultural. Mas ha sempre, entre diferentes culturas, caracteristicas comuns e pelas mais variadas razoes, ou de ordem geografica, ou historica, ou antropologica. As relacoes comerciais
e
economicas sac tambem fatores de afastamento ou de aproximacao
entre culturas diferentes. Em alguns periodos da historia, uma
cultura pode estar mais perto de outra e, em outras, mais distante. Por isso, uma lingua falada em paises diferentes
senta diferencas consideraveis, porque exprime cultura
apree
cessidades diferentes. As diferencas lingftisticas estao
neliga-
das as culturais.
Estas distancias culturais entre os paises
provocam
problemas enormes com relacao as traducoes. Na medida em que uma
cultura se afasta de outra, a dificuldade de retirar uma obra de
seu universo cultural original e introduzi-la em outro aumenta.
Se cada lingua
particular de ver
0
manifesta uma maneira especifica
e
mundo, uma cosmovisao diferente. Logo,
as
coisas nao so sac ditas mas vistas de forma diferente.
Quando
ha a transferencia de determinado fato ou cena, de uma
lingua
para outrar isto implica necessariamente
uma mudanca de
pers-
pectiva, na medida em que este mundo e visto de maneira
dife-
rente. 0 tradutor, para garantir a intelegibilidade
do
texto,
e forcado a libertar-se das amarras do original.
Por este ponto de vista, as normas de uma traducao sao
ditadas pelo pUblico leitor e
ferencias do ambiente para
0
0
tradutor deveri captar as pre-
qual traduz.
Quando se da
muita
importancia ao pUblico receptor, a obra tende a se desfigurar.
Todo exagero foge ao ideal. Quando opomos estas
duas
tendencias da traducao, a livre e a literal, um problema
tigante comeca a nos preocupar,
e
0
0
ins-
da dissociacao entre a forma
conteudo. Jean Cohen afirma:
,; lIemp1l.e.poulvd
Jr.e.la.c..ioMIL 0 pe.nllame.n.to, lIobJr.e..tudo 0 pe.nlIame.nto ablltJuLto, com Up1l.e.UOu d.i.6e.Jr.e.ntu e. a tJutduz.ib.iUclade., tanto paJUl a ofLtJta .f.1.ngua. como paJUl a muma,
WII/1
p1l.Ova de. que. 0 conte.ii.do pe.Jr.mane.ce.d.ilI.ti.nto da up1l.ulliio.\.
e
De fato, a atividade da traducao agita
conflito
en-
e
um
ter-
fator comum que une aquilo que faz com que as linguas se
dis-
tre essas duas entidades, a expressao e
tingam uma das outras:
0
sentido que
e
0
0
conteudo.
·ordenado,
articulado,
formado de modo diferente segundo as linguas·5• Emseguida, es-
MlI.im como Oll gJr.iioll de. aJr.e.ia podem 6oJr.maJr.due.nholl
dUlleme.lhadoll e. 11 mUM nuvem 11lI4wn.iJL c.Onlltanteme.n.te. 60Jr.ma4 noVI1ll,
do mumo modo 0 mumo lIe.nt.ido que. lie. 6oJr.maou 4e. u.tlw.tWu1
d.i.6e.Jr.e.nteme.n.te.em angUl1ll d.i.6e.Jr.e.ntu '.
e
prova a indissociabilidade entre eles.
Por conseguinte, otra-
dutor deve estar muito atento na traducao do estilo de um
au-
dem ser esquecidas, sob pena de a obra ficar mutilada.
Nos dias de hoje, teoricos defendem um tipo de
tradu-
gico estetizante de urna traducao mas tambem
transparencia:
A ituhao da ~n6paAencia
~enee
ao ~~tema
ideotogieo
eaJuleteJliza.do petM nocou inteJtJt.eta.dona.dM da heteJlo~enudade entJt.e 0 pen6amento e a. Ungua.gem, de genio da Ungua., do mUtvuo da aIlte, nocou bMea.dM numa.UnglLUtiea.
da pa.ta.VJu1
e nao do ~~tema, em ang~
eOn6ideJu1dM a.tW1-
Uza.cou paAtic.u.laJtu de urn ~igniMea.do
~n6eendenta.t
l~jeC4o
6ito~o6iea. do p~o
eu4Opoee~eo,
eotonia.~ta. do pen6amento oeidenta.tl.
uta.6 nocou a.ea.bam poll
OpOIltexto e ~duC40,
poll meio de uma. ~a.e!U1UZa.C40
da UteJULtulta.. uta. ~a.e!U1UZa.C40 e: eompen6a.tolUacom Ileta.C40 a.
~ua. neutJr.a.U..dade
poauea.. uta. ~a.e!U1UZa.C40
e uta.
eompen6a.c4o deMnem 0 pa.pet ~oc..Utt da utetic.a..
Vu~e
jog 0
de Opo~iC40ideotOgiea. entlte texto e tJu1duC40IlUuUa uma.
nociio meta.6Lsiea., nao hUtoltidza.da, a. noC40 de intlta.duzI.vet7•
muito solicitada pelas sociedad~s receptoras de obras traduzidas, fica, ai, nitido
0
desnivel entre
0
original e
0
traduzi-
do. Assim sendo, estampa-se a nocao de intraduzibilidade,
"objecao prejudicial", como chamou
J .R.
ve a traducao como aprioristicamente
a
Ladmiral, a postura que
impossive18•
Cremos que seja preciso fazer urn esforco para que
No entanto, nao podemos deixar de notar aqui que
ter Benjamin tem urnoutro olhar sobre a transparencia
de
0
pii-
Waluma
traducao, ele diz:
A veJLdade..iMtJu1duC40 e: ~n6paAente,
eta. nao ueonde 0 oltigina.t, eta. n40 ~e eotoea. diante de ~ua. tuz, mM e: a. pWta.
Ungua.gem que ~imptumente, como que lle6oltca.da peto HU pltOp1tio muo, eta. ~e jog a. a..i.nda~
ptenamente ~oblte 0 oltigina.t'.
se opoem.
Entretanto, ambos tentam propor e buscar uma tradu-
cao ideal, que esclareca e ilumine
0
t interessante
original.
perceber que esta "pura linguagem" mencionada por Benjamin esta ligada aquele sentido, de que fala Hjelmslev, que se
Antoine Berman reforca
0
forma
ponto de vista de Meschonnic,
observando outros aspectos que dizem respeito
a
traducao.
No
seu livro L'tpreuve de l'etranqer, estudando a traducao durante
0
periodo do romantismo alemao, periodo este em que
0
inte-
• •• ~.(muUa.neamen.te 0 c.ampo da tJuldu.ciio no ~uo
de ou.tJl.o~
c.ampo~ de c.omwu.c.aciio bttel!.Ung!LUtic.o~,
.in.teJLU..teJliJUo~ e
.in.teJl.C.u.U:uIu:Li.ll,
a hi6tOJUa da tJuldu.ciio e a teoJUa da tJuldu.ciio WeJliJUa,
"WeJliJUa",
englobando tan.to a WeJuttUJUJ.,
no ~en.t.ido utJUto,
c.omoa 6.ilo406.ia, M cien~
huma~
e
o~ teuo~ lLe.Ug.io~o~10 •
a tJuldu.ciio uta. a pJUoJU plLuen.te em todo i!1Li;1l.inal: toda
oblLa, tao longe qUiln.tO pudelLmo~ lLemon.taIL, e ja, em d.ive!L40~ glLaU6, urn tecido
de tJulducou
ou uma c.Il.iaciio que
tem
alguma c.o~a a VeIL c.om a opelLaciio tJulduz-itlva,
na med.ida
em que eta .6e c.otoc.a a.omo ":tJtadu.zZvet", 0 que .6'<'~IU6.<.c.a4.i.mu.Ua.neamen-te "cUgna de .6eJLtlw.duz.<.da", "PO.6.6.(.vet
de tAaduz.iJt" e "devendo 4eJt tlw.duz.<.da" paIUl ailng.iJt a .6ua
pienUu.de enquan-to ObJulll.
mumo
Ele quer dizer que a relacao entre texto-fonte e texto-alvo se caracteriza por urnengendramento
reciproco.
Mas
neste engendramento reciproco, fica pressuposta umaetica, uma
a busca da "fidelidade" da traducao apesar de todas as
liaridades e emboscadas que este termo encerra.
que
0
E
pecu-
lembramos
respeito ao postulado lingUistico que comprova a indis-
sociabilidade entre a forma e
0
conteudo muito
pode
nesta atitude.
(1) "Aspects linguistiques de la traduction".
In Essais de
linguistique generale. Paris, Seuil, 1977, p.79.
(2) Structure du langage poetique. Paris, Flammarion,
1966,
p.34.
(3) A propos du roman. Arles, Actes Sud, 1983, p.14.
"Traduire, au sens propre du mot. c'est faire passer d'un etat a un
autre. Traduire la vie. c'est donc tenter d'en changer la nature, de
la faire notre; c'est essayer de la dominer, en nous appropriant la
substance".
(4) Op. cit., p.34.
"On peut toujours attacher la pensee. et particulierement la pensee
abstraite.
des expressions differentes, et la traductibilite. soit
dans une autre langue, soit dans la meme, est bien la preuve que le
contenu reste distinct de l'expression".
a
(5) prolegomenes a une theorie du langage. Paris, Les
Editions de Minuit, 1968, p.69. Trad. del dinamarques por Una
Canger. "Ordonne • articule, forme de maniere different selon
les
differentes langues".
(6) Id. ibidem., p.70.
"Tout comme les memes grains de sable peuvent former
des
dissemblables. et les meme nuage prendre constamment
des
nouvelles, ainsi, c'est egalement le meme sens qui se forme
structure differemment dans differentes langues".
dessins
formes
ou
se
(7)
Pour la poetique
II.
Paris, Gallimard,
1973, p.308!309.
"L'illusion de 1a transparence appartient au systeme
ideologique
caracterise par les notions Uees d'heterogeneite entre1a pensee et
Ie langage, de genie de la langue, du mystere de l'art
notions
fondees sur une linguistique du mot et non du systeme, sur 1es langues comme actualisations particulieres d'un signifie transcendantal
(projection philosophique du primat europeocentrique, logocentrique.
colonialiste de la pensee occidentale). Ces notions aboutissent
a
opposer texte et traduction. par une sscralisation de la litteraturc.
Cette sacralisation est compensatoire par rapport a sa
neutralisation politique. Cette sacra1isation et cette compensation definissent Ie role social de l'esthetique. II ressort du jeu de
l'opposition ideologique entre texte et traduction une notion
metaphysique. non historicisee, de l'intraduisibie.
(8)
Traduire:
theoremes
pour la traduction.
Paris,
Payot,
1979. p.8S.
(9) "La Tache du traducteur".
1m My the et violence.
Paris,
Deno~l, 1971, p.272.
Trad. do
alemao por M. de
Gandilhac. "La vraie traduction est transparente. e11e ne cache
pas
l'original. e11e ne se met pas devant sa 1umiere, mais c'est Ie pur
1angage que simp1ement. comme renforce par son propre medium,
e11e
fait tomber d'autant plus p1einement sur l'origina1".
(10) Paris, Gallimard,
1984, p.291.
"••• simu1tanement Ie champ de 1a traduction au sein
des
autres
champs de communication interlinguistiques. inter1itteraires et intercu1turels. l'histoire de 1a traduction et 1a theorie de 1a
1itterature au sens strict que 1a phi1osophie, 1es sciences humaines et
1es textes re1igieux".
(11) Id. ibidem., p.29.
"••• 1a traduction est a priori presente dans tout original:
toute
oeuvre. aussi loin qu'on puisse remonter. est deja a divers
degres
un tissu de traductions ou une creation qui a quelque chose a
voir
avec l'operation traduisante, dans 1a mesure meme ou elle
se pose
comme "traduisib1e". ce qui signifie simu1tanement: 'digne
d'etre
traduite'. 'possible a traduire' et 'devant . etre
traduite' pour
atteindre sa plenitude d'oeuvre'~.
BENJAMIN,
Walter - "La Tache du traduteur".
In
My the
et
violence.
Paris, Deno~l, 1971. Trad. de M. de Gandilhac.
BERMAN, Antoine - L'Epreuve
de l'etranger.
Paris, Gallimard,
1984.
COHEN, Jean - Structure
du 1angage poetique.
Paris,
Flammarion, 1966.
GADENNE, Paul - A propos du Roman. ArIes, Actes Sud, 1983.
HJELMSLEV,
Louis - Prolegomenes
a une theorie
du
langage.
Paris, Les Editions de Minuit,
1968. Trad. de.pna Canger.
JAKOBSON,
Roman - "Aspects 1inguistiques
de la traduction"
In
Essais de linguistique
genera1e.
Paris, Seuil, 1977.
LADMlRAL,
Jean-Rene
- Traduire:
theoremes
pour la traduction.
Paris, Payot, 1979.
MESCHONNIC,
Henri - Pour la Poetique
II.
paris,
1973.
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