Das lições de vida às lições da classe. Rosa Adriana de Oliveira Soares Dias (alfabetizadora) e Ligia Rezende Schmitt (coordenadora pedagógica setorial). UNITAU – Universidade de Taubaté. Segundo o Artigo 3º da Declaração de Hamburgo, entendese por educação de adultos “o conjunto de processos de aprendizagem, formais ou não formais, graças aos quais as pessoas, cujo entorno social considera os adultos, desenvolvem suas capacidades, enriquecem seus conhecimentos e melhoram suas competências técnicas e profissionais ou as reorientam a fim de atender às suas próprias necessidades e às da sociedade”. Atualmente, o conceito de formação de adultos adquiriu nova dimensão, passando a compreender os vários processos formais e informais de aprendizagem e educação ao longo da vida. Pensando nisso é que elaboramos o relato a seguir e achamos importante registrá-lo. Na cidade de Ubatuba/ SP, existe uma classe do PAS - Programa Alfabetização Solidária que é muito especial, pois é formada essencialmente por pessoas com mais de 60 anos. Todos da turma estão encarando com muita alegria o desafio de aprender a ler e escrever depois de tantas missões que já cumpriram em suas vidas. Na certa entendem que esta é a mais individual de todas elas, apesar de a classe conviver numa união jamais vista pela alfabetizadora. São alunos que estão vivenciando novamente todas as suas experiências e talvez seja este o motivo que faz com que esta sala fuja das estimativas e tenha mensalmente a freqüência dos alunos em 100%, além do fato da maioria deles, em apenas três meses, ter atingido a meta planejada e sonhada pela alfabetizadora, que é aprender a ler e escrever de acordo com as práticas que visam o letramento. A emoção de relembrar fatos da juventude e ver isto transformado em textos e exercícios de aprendizagem faz com que as aulas tenham um clima muito emocionante e produtivo para todos. As aulas seguem uma fórmula simples e eficiente, já que partem dos conhecimentos prévios mapeados no grupo, para que depois sejam selecionados os conteúdos da aprendizagem. Ubatuba, durante a infância e a juventude deles, vivia basicamente da pesca e da agricultura e por isso são muito pertinentes temas como os tipos de peixes da região, os tipos de embarcações, os nomes das praias, os tipos de madeiras existentes aqui, dentre outros assuntos. Em classe também é costume realizar atividades concretas como a preparação dos pratos típicos da culinária da cidade e o registro das receitas, todas devidamente documentadas; outro exemplo é a proposta de trabalho com amostras de vários tipos de madeira, com o objetivo de permitir a associação do nome de cada uma delas com o cheiro e cor respectivos. Costuma-se realizar também algumas atividades extraclasse como o passeio à beira mar até a vila em que viveram (Picinguaba). Agora estão para visitar o Aquário da cidade para rever as espécies que já foram pescadas e pesquisadas por eles. Também ocorreram atividades de costura monitoradas pelas costureiras da classe, que e em breve irão produzir um mosaico nas paredes do pátio externo da Igreja de São Benedito, que gentilmente cede a sala em que as aulas acontecem. Esta classe da Alfabetização Solidária é tão cativante que três adolescentes, amigos da alfabetizadora, o Arthur, a Natália e a Jade assumiram, por iniciativa própria, a doce tarefa de conviver diariamente num esquema de “aula particular” fora do horário da aula (que é à noite) com os alunos, pessoas tão dispostas e empenhadas em aprender que contagiam a todos que os conhecem. Recentemente os alfabetizandos foram convidados a trocar correspondência com alunos de uma classe do PAS em Lagoa Salgada – RN que também é supervisionada pela UNITAU – Universidade de Taubaté (I.E. que coordena nossa prática pedagógica). No decorrer da leitura das cartas que receberam, constataram como o Brasil é grande e, ao mesmo tempo, como são iguais os motivos sociais que os impediram de freqüentar a escola quando crianças. A alfabetizadora, muito competente, foi preparada pelo curso de capacitação dos coordenadores do Programa (equipe da Universidade) e desempenha sua função, apesar de nunca ter tido experiência em salas de aula, sempre manifestando uma vontade enorme de fazer um trabalho social. Ela nos conta que sempre sentiu a necessidade de fazer algo concreto para ajudar as pessoas e tal desejo foi atendido por esta classe, que lhe dá diariamente a experiência de viver algo incomparável a qualquer outro de sua vida social e profissional. Quanto a nós, concluímos com o devido reconhecimento deste verdadeiro exercício de cidadania, nomeando a alfabetizadora e seus alunos para que possam desfrutar da satisfação de lerem seus nomes em uma publicação da educação. A todos, parabéns... Rosa Adriana de Oliveira Soares Dias (alfabetizadora) Srs e Sras: ALBERTINA, ANA ROSA, BENEDITA GARCEZ, BENEDITA MARIA, CARMÉLIO, EDITH, IRACEMA, JAFES, JOÃO ANTONIO, JOSÉ MENDES, LAURINDO, LINDAURA, MARIA APARECIDA, MARIA CONCEIÇÃO, MARIA EUPHROSINA, MARIA DA GUIA, MARIA DE JESUS, MARIA JOSÉ, MARLI, OSANA RITA, SÔNIA REGINA e VALDIRENE. Ubatuba, maio de 2004. Bibliografia DI PIERRO, Maria Clara. Seis anos de educação de jovens e adultos no Brasil: os compromissos e a realidade. São Paulo: Ação Educativa, 2003.