UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSO
CURSO DE CIÊNCIAS DA ATIVIDADE FÍSICA
RAFAEL CARVALHO DA SILVA MOCARZEL
ARTES MARCIAIS E JOVENS: VIOLÊNCIA OU VALORES EDUCACIONAIS?
UM ESTUDO DE CASO DE UM ESTILO DE KUNG-FU
Niterói
2011
RAFAEL CARVALHO DA SILVA MOCARZEL
ARTES MARCIAIS E JOVENS: VIOLÊNCIA OU VALORES EDUCACIONAIS?
UM ESTUDO DE CASO DE UM ESTILO DE KUNG-FU
Dissertação apresentada no curso de Mestrado em
Ciências da Atividade Física da Universidade Salgado de
Oliveira – UNIVERSO, como parte dos requisitos para
conclusão do curso
Orientador: Prof. Mauricio Murad
Doutor em Sociologia do Desporto
Niterói
2011
Ficha catalográfica elaborada pela Biblioteca Universo
Campus Niterói
M687a Mocarzel, Rafael Carvalho da Silva.
Artes marciais e jovens: violência ou valores
educacionais? Um estudo de caso de um estilo de
Kung-Fu / Rafael Carvalho da Silva Mocarzel.Niterói, 2011.
108 p. ; il.
Bibliografia: p.87-103
Dissertação apresentada para obtenção do
Grau de Mestre em Ciências da Atividade Física Universidade Salgado de Oliveira, 2011.
Orientador: Dsc. Mauricio Murad Ferreira.
1. Kung-fu. 2. Artes marciais - Aspectos sociais.
3. Jovem - Aspectos psicológicos. 4. Violência. 5.
Esportes - Aspectos sociais. 6. Educação Física I.
Título.
CDD 796.8159
Bibliotecária: Elizabeth Franco Martins CRB 7/4990
Rafael Carvalho da Silva Mocarzel
ARTES MARCIAIS E JOVENS: VIOLÊNCIA OU VALORES EDUCACIONAIS?
UM ESTUDO DE CASO DE UM ESTILO DE KUNG-FU
Dissertação apresentada ao Curso de Ciências da Atividade Física da PósGraduação Strictu Senso de Mestrado da Universidade Salgado de Oliveira como
parte dos requisitos para conclusão do curso.
Aprovada em 16 de Março de 2011
Banca Examinadora:
______________________________________________________
Mauricio Murad – Dr. em Sociologia do Desporto
UERJ / UNIVERSO
Professor Orientador
______________________________________________________
Arthur de Sá Ferreira – Dr. em Engenharia Biomédica
UNISUAM / UNIVERSO
Professor Co-Orientador / Examinador
______________________________________________________
Carlos Henrique de Vasconcellos Ribeiro – Dr. em Educação Física
FAETEC / UNISUAM
Professor Examinador
______________________________________________________
Alfredo Gomes de Faria Jr. – Pós-Dr. em Educação
UNIVERSO
Professor Examinador (Suplente)
Se hoje consegui produzir uma dissertação, foi porque no passado você me
ensinou a ler e a escrever. Obrigado por tudo e saiba que te amo muito!
Sinto tanto sua falta...
(Para minha avó, Maria Tereza)
AGRADECIMENTOS
Começo agradecendo todos meus professores, que por diversas vezes são
criticados e esquecidos pela sociedade de uma forma geral. Porém, se ela está de
pé hoje, se deve a existência desses determinados profissionais.
Meu “muito obrigado” à própria instituição Universidade Salgado de Oliveira
(UNIVERSO), pois com a bolsa de estudos (sendo ex-aluno da graduação), pude
evoluir profissionalmente, tornando-me mais capacitado e útil para sociedade
niteroiense e brasileira.
Aos nobres Doutores Mauricio Murad (Orientador) e Roberto Ferreira dos
Santos (Coordenador do curso) que venceram não só os empecilhos de um ano
difícil, mas também a dificuldade de ensinar um aluno complexo: eu!
Ao Co-Orientador da pesquisa e meu Mestre de Kung-Fu, Arthur de Sá
Ferreira, que desde o início me acolheu, me guiou e motivou, ensinando-me até hoje
“os caminhos da pena e da espada”.
Aos queridos colegas da “gangue do mestrado”, que entre um café na escada
e um lanche rápido na calçada sofriam juntamente comigo na luta diária pela busca
do saber.
Aos meus alunos da AKSN, pois na verdade, se sou professor hoje, foi
exatamente pela existência e interdependência de mim por eles e deles por mim;
uma família em união, em perfeito “equilíbrio yin-yang”.
Agradeço muito o meu “circulo menor familiar”; minha mãe Mª.Teresa, meu
avô Artur e minha maninha Caroline, que tiveram muita paciência comigo neste
longo e exaustivo período de evolução profissional.
Com muito carinho agradeço meu pai Sergio, que mesmo distante fisicamente
se faz presente sempre, me ajudando de todas as formas possíveis que encontra.
Com um grande sorriso no rosto e no coração, agradeço demais minha eterna
“arcanja da guarda”, Anna Rafaela, que me motiva e me anima com seus carinhos
mil, principalmente nos dias de exaustão física e psicológica em que as palavras não
têm mais poder, porém, seu amor expressado em uma forma singela e pura, como
um simples cafuné, me traz a vida e o sorriso de volta. Eu Te Amo!
Do fundo do meu espírito, agradeço demais toda força e vitalidade que recebi
de Oshieoyá-Samá, dos Mestres da Perfect Liberty (PL), dos Assistentes de Mestre,
dos missassaguistas e adeptos, que sempre me motivaram e não deixaram
esmorecer. Yoissá!
E com toda minha fé, expresso aqui o meu mais profundo sentimento de
respeito, humildade e gratidão por tudo que já me foi, é e ainda me será concedido.
Meu muito obrigado SENHOR DEUS!
"Se enxerguei longe, foi porque me apoiei nos ombros de gigantes"
(Isaac Newton)
RESUMO
O Kung-Fu é talvez a mais antiga arte marcial existente. Perpassou por diversas
culturas dentre séculos até hoje. Nesse período, incorporou diversas técnicas,
ensinamentos e valores éticos e morais, que são ministrados em suas aulas.
Atualmente, apresenta uma visão multifacetária, inserindo-se na área desportivocompetitiva, lazer, terapia ocupacional e no caráter educativo e disciplinador,
refletindo positivamente na vida dos praticantes. Contudo, fatos recentes noticiados
pela mídia colocaram que as artes marciais estimularam a violência por parte de
alguns praticantes chamados de “pitboys”. Portanto, foi investigado se o Kung-Fu
estimula ou não a violência de jovens praticantes entre 14 a 25 anos. Analisou-se
amplamente a natureza pedagógica e filosófica do Kung-Fu estilo “Garra de Águia”,
sendo assim, um estudo de caso (pesquisa qualitativa). Também foram averiguadas
funcionalmente as técnicas da 1ª graduação (faixa branca) observando se elas
estimulam ofensiva ou defensivamente os praticantes. Foram verificados os motivos
de ingresso e permanência dos alunos no Kung-Fu. Acredita-se na importância do
trabalho, pois o mesmo busca acrescentar dados qualitativos à comunidade
científica, já que as pesquisas produzidas nacionalmente são em maioria da área
biológica. A pesquisa se deu in loco (3 academias) utilizando observação participante
e entregando aos alunos um questionário fechado buscando dados quantitativos
complementares. Posteriormente, alunos selecionados aleatoriamente responderam
uma entrevista semi-estruturada individual para dados qualitativos. A defesa da
dissertação ocorreu em Março de 2011.
Palavras-Chave: 1. Kung-Fu. 2. Valores educacionais. 3. Violência.
ABSTRACT
The Kung-Fu is perhaps the oldest existing martial art. It pervaded cultures among
centuries until today. During this period, several techniques, teachings and ethical
and moral values are taught in their classes. Currently, presents as a multifaceted
practice, entering into the area-competitive sports, leisure, occupational therapy and
educative and disciplinary, reflecting positively on the lives of practitioners. However,
recent events reported in media that martial arts violence spurred by some
practitioners called "pitboys”. Therefore, we investigated whether Kung-Fu stimulates
the violence of young practitioners from 14 to 25 years. Pedagogical and
philosophical nature of Kung-Fu style "Eagle Claw" were considerate and therefore a
case study (qualitative research) was conducted. Functionally of techniques of the
1st grade (white belt) were also investigated, observing whether they stimulate
offensive or defensively practitioners. We al so checked motivation for entry and stay
of students in Kung-Fu classes. It is believed in the importance of this work since it
adds qualitative data to the scientific community, since the polls nationally are
produced in most of the biological area. The research took a place in loco (3
academies) using participant observation and giving students a closed questionnaire
seeking complementary quantitative data. Subsequently, randomly selected students
answered a semi-structured individual for qualitative data. The dissertation defense
took place in March 2011.
Keywords: 1. Kung-Fu. 2. Educational values. 3. Violence.
SUMÁRIO
1
INTRODUÇÃO........................................................................................................................................
1
1.1
Problemas..............................................................................................................................................
7
1.2
Objetivo Geral........................................................................................................................................
8
1.3
Objetivos Específicos...........................................................................................................................
9
1.4
Justificativas..........................................................................................................................................
9
2
REVISÃO DE LITERATURA.................................................................................................................
11
2.1
Lutas e Artes Marciais – conceituações e diferenças.......................................................................
11
2.1.1
Lutas.......................................................................................................................................................
13
2.1.2
Artes Marciais.........................................................................................................................................
14
2.2
História das Artes Marciais Chinesas – nasce o Kung-Fu...............................................................
19
2.2.1
Filosofias Orientais que influenciaram o Kung-Fu..................................................................................
27
2.2.2
O Kung-Fu no século XX........................................................................................................................
31
2.2.3
Chegada do Kung-Fu no Brasil..............................................................................................................
37
2.3
O Fenômeno da Violência....................................................................................................................
39
2.3.1
Reflexões e teorias diversas...................................................................................................................
39
2.3.2
Relação da violência com o esporte em geral e com o Kung-Fu...........................................................
43
3
METODOLOGIA.....................................................................................................................................
56
3.1
Formato da Pesquisa............................................................................................................................
56
3.2
Contexto e Participantes......................................................................................................................
57
3.3
Instrumentos de Coleta de Dados.......................................................................................................
58
3.4
Análise de Dados..................................................................................................................................
59
3.5
Procedimentos Éticos..........................................................................................................................
60
3.6
Subjetividade do Pesquisador.............................................................................................................
61
3.7
Cronograma...........................................................................................................................................
62
3.8
Orçamento da Pesquisa.......................................................................................................................
63
4
RESULTADOS.......................................................................................................................................
65
4.1
Dados da análise das técnicas da primeira graduação (faixa branca)...........................................
65
4.2
Dados das Observações Participantes.............................................................................................
69
4.3
Dados dos Questionários..................................................................................................................
71
4.4
Dados das Entrevistas Semi-Estruturadas......................................................................................
75
5
DISCUSSÃO.........................................................................................................................................
80
5.1
Discussão da análise das técnicas da primeira graduação (faixa branca)...................................
80
5.2
Discussão das Observações Participantes......................................................................................
81
5.3
Discussão dos Questionários............................................................................................................
82
5.4
Discussão das Entrevistas Semi-Estruturadas................................................................................
83
6
CONCLUSÃO.......................................................................................................................................
85
REFERÊNCIAS.....................................................................................................................................
87
ANEXOS................................................................................................................................................
104
APÊNDICES..........................................................................................................................................
108
1
1 INTRODUÇÃO
A sociedade contemporânea passa por uma fase onde a violência está
disseminada e em evidência (NASCIMENTO; ALMEIDA, 2007). Atualmente, os
fatores sócio-econômicos juntamente com o baixo nível educacional da população,
conduzem as pessoas a um estado de apreensão no que diz respeito à segurança.
Observa-se que, desde tempos remotos, a Humanidade busca métodos de
autodefesa, tanto no âmbito coletivo quanto individual, pelo aumento gradativo e
exponencial
da
violência
(BARROSO;
VELHO;
FENSTERSEIFER,
2005).
Autodefesa pode ser definida como “a resistência do indivíduo às pressões
exteriores em níveis” (DICIONÁRIO AURÉLIO, 2003), incluindo-se aqui as
agressões corporais.
Assim, a sociedade se desenvolveu e acumulou conhecimento para
proporcionar proteção coletiva e individual a seus membros. No aspecto coletivo,
formaram-se as forças armadas, guardas municipais, legislações, dentre outros. No
aspecto individual, as formas de autodefesa ganharam força ao longo dos séculos,
tornando-se inclusive práticas esportivas.
Essa convergência entre atividades físicas, esportes e processos históricos
pode ser observada em quase todas as modalidades: “A história do desporto é
íntima da cultura humana, pois por meio dela se compreende épocas e povos, já que
cada período histórico tem o seu esporte e a essência de cada povo nele se reflete”
(TUBINO apud MURAD, 2007, p.16). Assim, concorda-se com o pensamento de
Melo (1997) sobre a necessidade de estudos sobre a história do esporte para sua
melhor compreensão. Nessa perspectiva, pretendem-se abordar na presente
dissertação, relações entre dados históricos, contextos sociais e culturais com a
estruturação das diversas práticas de autodefesa.
Observa-se no contexto histórico-social contemporâneo que o aprendizado e
as práticas de autodefesa se concentram em núcleos de estudos de artes marciais
originárias de diversas culturas, sobretudo as do Oriente. Muitos adeptos praticam
2
treinamentos físicos e mentais, tendo como uma de suas principais metas o caráter
disciplinatório do corpo e da mente, treinamento este permeado pela cultura da arte
marcial em questão.
Esse tipo de organização marcial se desenvolveu a partir da necessidade de
proteção territorial contra invasões bélicas (SANTOS, D., 2008; PIMENTA, 2009;
PEREIRA; FERON, 2010), culminando com o desenvolvimento de forças armadas
para confrontos corpo-a-corpo. Tal nível de organização foi possível devido à
estruturação dos métodos de autodefesa. Na Grécia, os desportistas elênicos (ou
helenos) passavam por preparações físicas que hoje se assemelhariam a
treinamentos militares (corridas, marchas, lutas, saltos) fazendo uso de pesos e
cargas para aumentar a dificuldade intensificando o esforço; eram adeptos do
aquecimento e de massagens pós-treinamentos e ainda, faziam uso de ciclos de
treinamento (tetras) e dietas alimentares (TUBINO; MOREIRA, 2003). Níveis de
organizações marciais similares podem ser observados nos núcleos de práticas de
lutas e artes marciais atualmente.
Países orientais ainda são de um modo geral, reconhecidos no imaginário
coletivo como lares de povos muito disciplinados e zelosos, tanto com suas culturas
quanto em seu dia-a-dia, devido ao hábito da sociedade de incorporar desde a
infância, a prática de valores transmitidos pelas gerações anteriores. As artes
marciais costumam ser uma das principais ferramentas da transmissão desses
valores, permeando-se de geração em geração.
Com o grande avanço das tecnologias na sociedade mundial (incluindo as
forças militares e suas armas), as guerras foram perdendo a característica do
chamado confronto corpo-a-corpo (KOPPE, 2009). Durante a primeira metade do
século XX, a maioria das guerras e combates ocorridos neste período teve o uso de
armas de fogo, incluindo o avião (na segunda metade da I Grande Guerra Mundial –
GGM) e as armas nucleares (lançada sobre o Japão no final da II GGM1). Deste
modo, fazendo com que os fins marciais perdessem espaço para treinamentos de
tiro, uso de explosivos e técnicas semelhantes (SANTOS, P., 2006). Entretanto, o
1
A primeira bomba (Little Boy) foi lançada pelos Estados Unidos da América (EUA) na cidade de
Hiroshima no Japão em 6 ago. 1945. Posteriormente ocorreu o lançamento da segunda bomba (Fat
Man) na cidade de Nagasaki em 9 ago. 1945.
3
surgimento desse tipo de armamento não impediu a continuidade da criação,
modificação e aprimoramento das diversas modalidades de combate corpo-a-corpo
(LIMA, 2000; TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007; PIMENTA, 2009).
Desde então, o aspecto sociocultural das artes marciais tornou-se um dos
motivos mais fortes para a prática desse tipo de atividade física, já que muitas delas
sofreram diversas reformulações em relativa proximidade do período referido
(ALMEIDA; CORBETT; GUTIERREZ, 2009; KOPPE, 2009). Isso se deve, por
exemplo: à proibição do uso das espadas no antigo Japão pelo império nipônico
acarretando na “Revolta das Espadas” em 1877 (NUNES, 2008), o trauma
psicológico mundial de combates após a II GGM (OLIVEIRA, Rafael, 2006) e o
processo de adaptação das artes marciais para tornarem-se desportos populares
possíveis de serem praticados sem os danos físicos das épicas batalhas do passado
e dos antigos treinamentos militaristas, que eram determinantes à sobrevivência de
seus praticantes (LOURENÇO; GÓIS JUNIOR, 2003). Presencia-se claramente esse
fato na citação de Starepravo e Mezzadri (2003, p.50) dizendo que: “as técnicas
militares deram lugar às técnicas de debate, a retórica e a persuasão, exigindo um
maior autocontrole, caracterizando um avanço da civilização”. A isto, o sociólogo
Norbert Elias (1994) chamou de “processo civilizador” por intermédio dessa
dimensão ética para a humanidade, defendendo, segundo suas formulações, que os
esportes podem e devem ser educativos.
Os aspectos socioculturais das artes marciais ganharam relevância (de certo
modo se impuseram aos aspectos anteriores de caráter bélico) e geraram mudanças
nas metodologias dos treinamentos na formação de praticantes. Ainda hoje, é
comum observar pais, tutores e/ou responsáveis colocarem suas crianças em aulas
de artes marciais com a preocupação de que as mesmas tenham valências físicas,
cognitivas e psicossociais amadurecidas através dos treinos físicos e dos
ensinamentos filosófico-disciplinares propagados por essas artes (LANÇANOVA,
2006). É de se ressaltar que pelo elevado número de atividades, jogos e desportos
de características marciais no Oriente, já é de se notar a importância singular e
profunda que as sociedades orientais acolhem essa questão; bem mais que no
Ocidente (ALMEIDA, M.; CORBETT; GUTIERREZ, 2009).
Na sociedade oriental, as artes marciais não são apenas difundidas em
4
centros marciais e academias, mas também nas escolas dentro das aulas de
educação física, fazendo com que as valências trabalhadas, os valores e disciplinas
desenvolvidas, possam brotar já na idade infantil, tendo a supervisão de
profissionais graduados e qualificados. Na China, treinos de diversos estilos de
Kung-Fu fazem parte integrante oficialmente do conteúdo escolar desde 1925 (LIMA,
2000), embora os referidos estilos já fossem difundidos anteriormente a essa data
pelo Kung-Fu ser parte integrante da cultura chinesa. Isso faz com que seus
ensinamentos ganhem uma dimensão pedagógica importante e que deve ser
explorada e desenvolvida sempre que possível.
Em contrapartida, nas sociedades do Ocidente, a incorporação das artes
marciais nas práticas escolares e principalmente dentro das aulas de educação
física é relativamente recente e ainda pouco difundida na rede escolar. O caso
brasileiro não foge à regra dominante no Ocidente (FERREIRA, H., 2005).
Entretanto, sendo o Brasil um país de população amplamente miscigenada, a cultura
oriental é bastante presente, mais ainda nos dois maiores pólos de concentração
populacional: Rio de Janeiro e, sobretudo, São Paulo. Isso gera uma realidade
cultural que, de certo modo, traz como efeito uma aproximação com alguns valores e
hábitos do ethos2 oriental, como na religião, na culinária, nas terapias holísticas3 e
também nas artes marciais. O pensamento anterior fica claro na seguinte citação:
“As artes marciais presentes no país, desde o início do século XX, são atividades
corporais que influenciaram e influenciam a nossa sociedade com seus valores,
traços culturais e participação popular” (DRIGO ET AL., 2003, p.1). Com isso, as
técnicas marciais orientais também se fazem presentes no convívio da sociedade
brasileira desde a grande imigração oriental iniciada há um século, ou seja, em torno
de 1910 (FRANÇA; CHAVEZ; BEZERRA, 2009).
Hoje, o Brasil é uma nação reconhecida mundialmente por suas contribuições
e
produções
dentro
do
futebol4,
do
iatismo,
dos
esportes
de
2
Terminologia sócio-antropológica que indica “aspectos morais, estéticos, costumes, hábitos e
valores de uma determinada cultura. Em outras palavras, é o perfil cultural de uma comunidade”
(MURAD, 2007, p.19.).
3
Que buscam ter uma visão do todo, globalizada, analisando o ser como um só em união e não cada
parte do mesmo separadamente (LIMA, 2000).
4
Tubino, Tubino e Garrido (2007) não citam apenas o futebol de campo, mas também o futsal, futebol
de praia etc.
5
aventura/natureza/radicais e também dos métodos de autodefesa, dentre outras
práticas5, tanto no meio acadêmico quanto no desportivo (TUBINO; TUBINO;
GARRIDO, 2007). Por exemplo: possui medalhistas internacionais e olímpicos, foi
berço de criação de pelo menos seis métodos de autodefesa – Capoeira, Jiu-Jítsu
Brasileiro (JJB), Kombato6, Asamco7, Uka-Uka8 (FERREIRA, W.; MENEZES, 2009) e
Agarrada Marajoara9 (TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007; FERREIRA, W.;
MENEZES, 2009) –; é hoje referência na formação de profissionais especializados
em treinamentos de autodefesa; freqüentemente é escolhido para sediar eventos de
importância global (campeonatos mundiais, continentais e internacionais de alto
nível) e por ter aproximadamente nove milhões e meio de adeptos e/ou praticantes
em território nacional10, embora projeções de outros pesquisadores sugiram que o
número de praticantes tem aumentado consideravelmente e hoje seja bem maior
que o citado devido à dinâmica de entrada e saída de alunos dos centros de
treinamento.
Ainda no Brasil, dados recentes estimam que os cinco métodos de autodefesa
mais praticados, em ordem decrescente de adeptos sejam: a Capoeira, Judô,
Karatê, JJB e Kung-Fu (DACOSTA, 2006). Paradoxalmente, o Kung-Fu parece ser
uma das mais antigas modalidades de autodefesa ainda praticada – com possível
influência na criação ou evolução de métodos de autodefesa em outras culturas,
como: “Judô, Karatê, Aikidô, Taekwondo, Pencak Silat, entre outros” (KOPPE, 2009,
p.22). Indo mais a fundo, registros do Oriente afirmam que o Shuai Chiao, uma arte
marcial baseada em quedas e arremessos talvez seja a mais antiga do mundo
(WENG, 1984). Com o passar do tempo, esse método de autodefesa foi se
desenvolvendo e percorrendo diferentes culturas pelo mundo, agregando assim,
5
Seria possível incluir também o voleibol (na quadra e na areia) e algumas provas da natação, do
atletismo e do automobilismo.
6
Disponível em: www.kombato.org/. Acesso em: 06 set. 2010.
7
Disponível em: www.asamco.com.br/. Acesso em: 06 set. 2010.
8
Característica dos índios do Xingu.
9
Praticada na Ilha de Marajó.
10
Dado quantitativo adquirido através do somatório (efetuado pelo autor desta dissertação) do
número de praticantes de cinco das mais populares técnicas de autodefesa no Brasil (Capoeira, Judô,
Karatê, JJB e Kung-Fu). Os valores utilizados são originados da publicação organizada por DaCosta
(2006).
6
novas técnicas (como as chamadas armas brancas, isto é, armamentos que “não
são de fogo”), filosofias, preceitos éticos e costumes locais (como vestimentas e
nomenclatura dos golpes). O Shuai Chiao é hoje um dos estilos de uma arte marcial
popularizada como Kung-Fu.
O termo Kung-Fu (figura 1) tem sido utilizado para descrever um conjunto de
métodos de autodefesa de origem chinesa. Apesar do amplo emprego desse termo,
seu uso não é exclusivo para descrever a prática da referida arte marcial. Pela
tradução dos ideogramas romanizados referentes à Kung-Fu, se entende: qualquer
ação/conduta que se aprenda e se aperfeiçoe com o tempo de prática e dedicação.
Nessa descrição, fica claro o seu uso para descrever o esmero na arte marcial;
porém, também se inclui na caligrafia, no artesanato, na agricultura, na tecelagem,
na culinária e na medicina tradicional (LIMA, 2000).
Figura 1: Ideogramas chineses referentes à expressão Kung-Fu.
A subjetividade da cultura chinesa, presente inclusive na sua linguagem, é um
dos fatores que contribuem para o uso impreciso da expressão Kung-Fu na
denominação do conjunto de métodos de autodefesa que o compõem. Essa
imprecisão faz com que a sociedade (principalmente ocidental) tenha uma imagem
reducionista do que realmente abranja essa expressão; assim, sendo “sub-utilizado”.
É possível notar a subjetividade cultural chinesa desde a clássica obra oriental “Tao
Te King” de autoria de Lao-Zi (escrita séculos antes de Cristo), tendo essa
característica se perpetuado até a idade contemporânea (DESPEUX, 1993; LIAO,
1990; GRANET, 1997; LIMA, 2000; WENG, 2000; MONAHAN, 2007).
7
1.1 PROBLEMAS
Apesar das lutas e artes marciais serem práticas de grande repercussão
competitiva, populares e reconhecidas ferramentas na educação de crianças e
jovens e possuírem diversos profissionais qualificados em diferentes áreas dessas
atividades, ambas são pouquíssimo utilizadas na maioria das escolas nas cidades
brasileiras em aulas de educação física escolar; perfazendo-se uma realidade bem
diferente daquela que acontece nas aulas de educação física nas escolas dos
países orientais.
Esse fato ganha relevância pelos próprios Parâmetros Curriculares Nacionais
(PCN) recomendarem que as “artes marciais/lutas” (como lá descritas) devam ser
exploradas na educação física escolar, através de atividades lúdicas e também em
caráter competitivo (BRASIL, 1998), juntamente com outros temas transversais,
como: “ética, saúde, meio ambiente, orientação sexual e pluralidade cultural” (LIMA,
2000, p.53). No entanto, isso ainda é considerado por alguns autores algo raro nas
escolas brasileiras de um modo geral (GONÇALVES JR.; DRIGO, 2001; FERREIRA,
H., 2005; NASCIMENTO; ALMEIDA, L., 2007). É dito por Vertonghen (2010) que isso
ocorre nos países ocidentais como um todo por conta do imaginário popular ter a
crença que as artes marciais sejam atividades que estimulam a violência dos
educando e também por conta do desconhecimento das técnicas marciais pelos
profissionais de educação física dos colégios; embora Gomes (2008) defenda que
as mesmas sejam um conhecimento legítimo da educação física.
Coloca-se que as ocorrências de agressões noticiadas pela mídia impressa,
televisiva e digital envolvendo praticantes de métodos de autodefesa nos últimos 20
anos (LOBATO; MORAES; GULLO, 2004) podem ter causado problemas à imagem
das artes marciais no Brasil. Em contrapartida, acredita-se que essas ocorrências
foram fatos isolados e não de influência das filosofias transmitidas pelas artes
marciais como um todo. As artes marciais, de uma forma generalizada, foram de
certo modo culpabilizadas pelo imaginário coletivo da sociedade brasileira, criando
assim, uma insegurança da população face às mesmas.
8
Outro impacto potencialmente negativo sobre a sociedade foi o surgimento do
chamado “Vale-Tudo” (hoje, conhecido como Mix Martial Arts – MMA11), que em
seus primórdios tinha regras bem menos ortodoxas que nos dias de hoje, permitindo
puxões de cabelo, pisões na face e dedadas na parte interna da boca, gerando,
assim, uma imagem grotesca que foge totalmente às filosofias ministradas nos
kwans (locais de treino de artes marciais chinesas), dojos (locais de treino de artes
marciais japonesas), dojangs (locais de treino de artes marciais coreanas), nas
rodas (locais de treino de Capoeira), nos centros de treinamentos dos diversos
métodos de autodefesa existentes e outros locais.
Analisando fatos como os já relatados acima e observando o grande impacto
midiático e popular que tiveram, pode-se acreditar que os mesmos contribuíram de
maneira contraproducente para uma imagem positiva das artes marciais e dos
métodos de autodefesa como um todo. Conseqüentemente, afastou o público e os
investimentos na área, podando ingressos de alunos em diversas equipes e
academias de artes marciais no país.
1.2 Objetivo Geral
•
Investigar se as filosofias e práticas da arte marcial Kung-Fu (estilo Garra de
Águia) apresentam relação com o fenômeno da violência entre jovens
praticantes da arte.
11
Segundo Pellanda, Pastre e Augusto (2008, p.2): “a modalidade passa por uma série de processos
que visaram uma civilização do esporte, já que, ao contrário do senso comum presente nos
indivíduos, não ‘vale tudo’ no MMA. O esporte vem evoluindo e profissionalizando-se e suas regras
também acompanham esse desenvolvimento e estão cada vez mais rígidas. O intuito de toda esta
evolução é preservar cada vez mais a integridade física do atleta”.
9
1.3 Objetivos Específicos
•
Investigar os diversos métodos de autodefesa e propor uma organização
conceitual (taxonomia) através da definição de critérios relacionados à
prática dessas modalidades;
•
Descrever o embasamento histórico, filosófico e pedagógico da arte marcial
Kung-Fu e discutir se a mesma é capaz de complementar a educação ética
e moral de seus praticantes;
•
Identificar como os ensinamentos e técnicas da primeira graduação (faixa
branca) da arte marcial Kung-Fu estilo Garra de Águia relacionam-se com a
violência no dia-a-dia dos educandos;
•
Mapear os motivos que levam os educandos da arte marcial Kung-Fu a
ingressar e a permanecer em seus treinos;
•
Analisar se os educandos reconhecem a prática da arte marcial Kung-Fu
como meio contribuinte para a internalização de valores éticos e morais
importantes em vários campos sociais e que também complementam a
aprendizagem das técnicas marciais.
1.4 Justificativas
•
Acrescentar trabalhos sob um enfoque sócio-cultural de natureza qualitativa
(para além de dados históricos) às comunidades científica, acadêmica e
desportiva, uma vez que, as pesquisas produzidas e publicações em revistas
10
científicas no Brasil sobre as artes marciais, lutas e esportes de combate são
em sua maioria das áreas de fisiologia e biomecânica (CORRREIA;
FRANCHINI, 2010);
•
Acrescentar trabalhos sobre a temática “artes marciais”, uma vez que a
mesma não é explorada no meio acadêmico, como outras atividades físicas
e práticas desportivas (DRIGO ET AL., 2003)
•
Acrescentar trabalhos sobre a arte marcial Kung-Fu, uma vez que a mesma
não é explorada no meio acadêmico, como outros métodos de autodefesa
(CORRREIA; FRANCHINI, 2010);
•
Possibilitar o uso da arte marcial Kung-Fu como ferramenta pedagógica
aplicada à estimulação de valores éticos, morais e sócio-cultural em jovens.
11
2 REVISÃO DE LITERATURA
2.1 Lutas e Artes Marciais – conceituações e diferenças
Nota-se, no ambiente dos praticantes de autodefesa, que o uso intercambiado
de termos tem gerado divergência na interpretação da modalidade que realmente se
pratica. Relacionados à cultura chinesa, os termos “Kung-Fu”, “Wushu”, “Kuoshu”,
“luta”, “arte marcial”, “combate” e “método de autodefesa” são comumente tratados
como sinônimos, principalmente no Ocidente. Assim, as seções abaixo buscam
identificar e esclarecer o significado dos principais termos nessa área e conforme
serão tratados neste trabalho.
Inicialmente, julga-se necessário analisar se há diferença entre os conceitos
“lutas” e “artes marciais”, pois as duas terminologias, hoje comumente utilizadas de
modo intercambiado, na realidade apresentam sensíveis diferenças que podem ser
ressaltadas.
Analisando os dicionários “Aurélio” (FERREIRA, Aurélio, 1989) e “Globo”
(FERNANDES; LUFT; GUIMARÃES, 1993) para buscar de maneira objetiva as
etimologias das palavras, depara-se com dois consensos entre as fontes: ambos
atribuíam a característica de desporto ao conceito “lutas” e também não continham o
significado da expressão “artes marciais”. Buscando então a palavra “arte” nos
mesmos dicionários citados, encontram-se diversas expressões da mesma: artes
plásticas, arte-de-pesca, arte mágica, artes liberais, belas-artes e artes mecânicas.
Entretanto, novamente não se observa a citação das artes marciais, a não ser em
registros mais recentes (eletrônicos), o que demonstra uma maior projeção das artes
marciais em geral. Além disso, relata-se que essas noções são imprecisas e por isso
não definem conceitualmente os termos referidos.
Por exemplo, o dicionário “Aurélio eletrônico século XXI - v.3.0” inclui o
verbete “arte marcial” inserido em um conceito extremamente amplo de “arte”; “arte
marcial” está lá definida como: “repertório mais ou menos sistematizado de técnicas,
movimentos e exercícios corporais para defesa e ataque, com emprego de armas ou
12
sem ele. [A maioria das técnicas assim denominadas é de origem oriental.]”.
Algumas noções complementares de “luta” do dicionário citado ajudam a
esclarecer o que foi dito no parágrafo anterior: a) combate corpo a corpo, sem
armas, entre dois atletas que, observando certas regras, procuram derrubar um ao
outro: luta livre; luta de boxe; b) qualquer tipo de combate corpo a corpo: luta
armada; c) peleja batalha; guerra: lutas civis; d) antagonismo entre forças contrárias;
conflito: luta entre o bem e o mal; luta de classes; e) (figurativo) esforço, empenho:
luta contra o alcoolismo, luta pela vida.
Tentando ampliar a pesquisa por fontes e referências que pudessem
esclarecer os questionamentos, buscou-se na internet através do “Google
acadêmico” e nas publicações bibliográficas de periódicos e livros científicos em
biblioteca. Encontrou-se somente um trabalho que abordou a diferença entre lutas e
artes marciais e mesmo assim apenas na introdução. De acordo com Antônio et al.
(2008), as artes marciais teriam uma “filosofia” como fundamentação, ao passo que
as lutas não teriam uma referência filosófica.
Drigo (2006) relata que as artes marciais são atividades corporais de
ataque e defesa, podendo também ser caracterizadas como lutas. A
principal diferença entre as duas é que para os praticantes de artes
marciais, principalmente as de origem oriental, consideram que os
conteúdos da cultura de origem da atividade teriam uma orientação
proveniente de uma "filosofia" (de vida) que determinaria a sua
diferença com as lutas, por exemplo: o boxe (ANTÔNIO ET AL., 2008,
p.2).
Até mesmo no dicionário esportivo de Tubino, Tubino e Garrido (2007), foi
encontrado apenas descrições e conceituações sobre “artes marciais”, porém, não
sobre “lutas”. Sendo assim, por conta da escassez de informações, procurou-se
conceituar “lutas” e “artes marciais” através do entendimento do próprio autor desta
dissertação e de sua experiência empírica.
A interpretação dessas expressões apresenta estruturas sensivelmente
distintas, tanto em teoria quanto em prática. Ao refletir sobre os conceitos
mencionados, por uma linha de abrangência filosófica, pode-se identificar o que
seriam os seus contrapontos e diferenças. As seções seguintes abordam cada
conceito de maneira mais detalhada.
13
Acredita-se que seja importante explicar que a distinção entre os conceitos
dos termos “lutas” e “artes marciais” não faz de nenhuma das duas práticas nem
melhor ou pior que a outra, porém, apontam para embasamentos diferentes. Os
ideais sócio-educacionais do Kung-Fu, enquanto arte marcial, vão ao encontro dos
fundamentos pedagógicos desta dissertação.
2.1.1 Lutas
A luta faz parte da história do ser humano e mesmo do reino animal. O ato de
lutar existe desde o momento em que o “homem das cavernas” buscou se defender
fisicamente (FERREIRA, H., 2005). Maia (1989, p.207) expressa esse contexto
histórico narrando: “No antigo texto sagrado do Ramayana (cerca de 10.000 anos)
existem inúmeras referências à arte da guerra e à sua prática pela casta guerreira
dos Kshatriyas (aqueles que salvam os semelhantes da dor e do sofrimento)”. Sob
um olhar sócio-cultural, o ato de lutar faz parte da identidade do ser humano, ou
mesmo de qualquer outro ser vivo, que tenta defender tanto a si quanto a sua prole
e seu território quando atacado ou tão somente ameaçado (SANTOS, D., 2008;
PIMENTA, 2009; PEREIRA; FERON, 2010). Esse fato culminou historicamente pela
busca do aperfeiçoamento de métodos, movimentos, utensílios e ferramentas para
autodefesa (FERREIRA, F., 2008). É possível citar que isso é algo tão intrínseco aos
seres vivos, que talvez possa ser considerado como uma espécie de identidade
(MURAD, 2007). Esse é o caráter agonístico da vida humana (e também dos
esportes) preceituado pelos gregos (REID; EVANGELIOU, 2008), em sua época
clássica, isto é, o século V a.C..
Uma proposta para conceituação de “lutas” seria: conjuntos de técnicas
estruturadas para combates físicos com praticantes desarmados ou armados, que
buscam primordialmente a autodefesa e o desenvolvimento físico, sem considerar
questões filosófico-culturais no momento de criação ou utilização de suas técnicas.
14
Acredita-se que hoje, as lutas tenham adquirido uma nova conotação, pois
recentemente, as mesmas inseriram em suas aulas, metodologias que buscam o
desenvolvimento de valências físicas para boa saúde e qualidade de vida, objetivo
que, outrora, era tido relativamente como secundário.
Dessa forma, em suas manifestações culturais contemporâneas, foram
desenvolvidas diversas atividades variantes das lutas (já praticadas nas artes
marciais), elevando-se o desenvolvimento físico e a saúde como focos
fundamentais. Por exemplo: Tae Bo, Aero-Boxe, Cardio-Boxe e Body Combat.
2.1.2 Artes Marciais
O conceito de “artes marciais” sugere mais subjetividade do que a
terminologia “lutas”. Começando pela análise das palavras que articulam a
expressão, o termo “arte” envolve uma série de significados de busca firme e
disciplinada pela perfeição, pela beleza e plasticidade, em prol da satisfação pessoal
do praticante e de seus espectadores. Monahan (2007, p.42) cita que: “O próprio
corpo se torna o meio para um tipo de expressão artística que é sempre transitória e
efêmera”12.
Já na clássica e milenar obra oriental “Tao Te King” de autoria de Lao-Zi (604517 a.C.), é colocado que a cultura de forma geral é uma “arte viva”, em constante
mudança e transformação, buscando se adaptar e superar as dificuldades que
surjam em todos os momentos em prol de uma harmonia maior. Seria essa a
filosofia base do Taoísmo, uma das culturas mais antigas e populares da China com
forte influência histórica no Kung-Fu.
Em uma linha filosófico-religiosa, que se aproxima de uma visão sociológica,
o já falecido patriarca religioso Tokuchika Miki, da Instituição Religiosa Perfect
12
Tradução nossa.
15
Liberty (ou PL), dizia que “vida é arte” afirmando que essa “arte” é para a autoexpressão de forma a buscar a paz mundial. Portanto, fazia uma alusão à
personalidade humana e a capacidade da auto-expressão do ser humano em seus
meios de atuação: profissional, familiar, financeiro, político, amoroso e qualquer
outro campo de sua inserção (MIKI, 2003).
O termo “marcial” é proveniente do nome da divindade romana das guerras, o
Deus “Marte”, equivalente ao Deus “Ares” do panteão grego (LIMA, 2000; HAUSEN,
2004). Portanto, etimologicamente o termo “artes marciais” expressaria o significado
“arte da guerra” (ARAÚJO, 1997; TURELLI, 2008). Tubino, Tubino e Garrido (2007,
p.164) dizem sobre as artes marciais que: “Atualmente, têm um largo emprego como
Defesa Pessoal, Esporte, meio para Aptidão Física e saúde, meio de Educação etc.”.
Refletindo sobre as premissas anteriores, um entendimento generalizado e
amplo para o significado da expressão “artes marciais” seria um conjunto de
ferramentas sócio-educativas que contribuem para o desenvolvimento físico e na
estruturação
do
comportamento
e
do
caráter
de
seus
praticantes,
independentemente do local e/ou cultura, respeitando preceitos ético-filosóficos
durante sua prática. Ressalta-se que esse é um dos princípios essenciais desta
dissertação.
Logo, buscando conceituar e convergir o significado da expressão, ”artes
marciais” seriam: todas as técnicas marciais de caráter sócio-educativas,
estruturadas em métodos didático-pedagógicos, que por sua vez são embasados
por uma ou múltiplas filosofias que pregam harmonia, saúde, qualidade de vida e
acima de tudo a paz por seus praticantes. Aqui, é possível observar os preceitos
éticos do Kung-Fu estudado na presente pesquisa.
Dessa forma, se faz claro que o pensamento filosófico oriental vê grandes
diferenças conceituais, principalmente pelo caráter ideológico, entre os termos
“marciais” e “bélicos”; se afastando do significado literal já descrito (“arte da guerra”),
consequentemente, fugindo também do ideário de violência.
Essa idéia parece ser exatamente oposta àquela que, no senso
comum, temos das artes marciais, ou seja, a de que seu objetivo é
“gerar a violência”. Pelo contrário. O artista marcial encara, vivencia a
violência, desde suas mais evidentes até as mais sutis
manifestações. Assim, aprende a fazer uso de sua inerente
16
agressividade (instinto necessário à vida), diferenciando-a da
violência (requinte humano relacionado à morte). (LIMA, 2000, p.112)
Diferente das lutas, Apolloni (2004a) afirma que a arte marcial chinesa tem
como base a promoção da saúde de seus praticantes, desde seus primórdios.
Entende-se assim, que a promoção da saúde é uma dimensão constitutiva das artes
marciais – principalmente as de origem chinesa (ROCHA; AGUIAR; ROCKENBACH,
2008).
Partindo das premissas anteriores de conceituação e aprofundamento dos
significados das expressões “lutas” e “artes marciais”, poder-se-ia dizer aqui que,
ambas buscam primordialmente em sua essência o caráter da autodefesa.
Complementa-se ainda que, especificamente as artes marciais teriam em seu
interior ideológico um conjunto de ensinamentos filosóficos que buscariam um
ideário pacífico. Dessa forma, ambas as atividades, mesmo possuindo um conteúdo
marcial, se afastariam do fenômeno da violência, tanto no caráter educacional
quanto prático e marcial. Segue a taxonomia que ajuda a expressar essas idéias
(figura 2).
Figura 2: Proposta de taxonomia para os sistemas de autodefesa individual.
17
Buscando de forma a entender cada passo da taxonomia acima, esclarece-se
primordialmente que, sua proposta tenta não só englobar o Kung-Fu, mas também,
os demais métodos de autodefesa. Acredita-se que mesmo de uma forma ampla e
genérica, muitos (senão todos) os métodos de autodefesa são possíveis de se
encaixarem nessa proposta de taxonomia.
No “nível 1“ se apresenta o ponto mais importante da taxonomia e um dos
eixos principais desta dissertação: a diferenciação dos conceitos de autodefesa e
violência. Essa distinção será bastante exposta ao decorrer desta pesquisa.
No “nível 2” é proposta a divisão dos conceitos “arte marcial”, “luta técnica” e
“luta não técnica”. Os dois primeiros conceitos já foram descritos anteriormente à
taxonomia. No entanto, elucida-se que o terceiro conceito, “luta não técnica”, nada
mais é do que a materialização “instintiva e natural” de qualquer ser vivo buscando
sua proteção e integridade física. Este terceiro conceito se diferencia do segundo no
que diz respeito ao treinamento. No segundo, haveria um treinamento metódico e
estruturado de difusão técnica do método de autodefesa. Já o terceiro seria algo
empírico, sem qualquer estudo ou mesmo prática cotidiana metódica e/ou natural.
O “nível 3” procurou apresentar a origem cultural do referido método, pois
alguns são difundidos por todo um país, já outros, apenas são praticados por alguns
povos e/ou tribos específicas. Exemplificam-se aqui, dois métodos de autodefesa
bem diferenciados: o Krav-Magá, método de autodefesa israelita (ou israelense) que
hoje é tido como um símbolo patriótico de Israel (PIMENTA, 2007) e o Uka-Uka,
método de autodefesa brasileiro, que, no entanto, só é praticado e propagado pelos
índios do Xingu (FERREIRA, W.; MENEZES, 2009).
Já o “nível 4”, de forma mais aprofundada no que diz respeito ao Kung-Fu,
busca explanar as duas origens históricas dentro da referida arte: Kuoshu e Wushu.
Ambas serão detalhadas de forma descritiva no tópico “2.2.2 – O Kung-Fu no século
XX”.
Tentando demonstrar o padrão de treinamento utilizado na difusão da arte, o
“nível 5” apresenta as duas grandes ramificações técnicas: Interno e Externo. Apesar
de Minick (1974) ter tecido sua conceituação sobre o assunto, seu maior foco foi sob
18
o caráter físico. Defende-se aqui, que na verdade, as diferenciações das duas
ramificações permeiam esferas mais profundas.
A escola Interna (também conhecida como “suave”) busca primordialmente, o
desenvolvimento
cognitivo
e
psicomotor
através
de
técnicas
meditativas,
movimentos lentos e com respirações profundas, para então, posteriormente,
enfatizar as práticas marciais de forma mais objetiva, ou seja, de “dentro pra fora”.
Aponta-se que apenas três estilos compõem esta ramificação; são eles: Xing Yi, Pa
Kua Chuan e Tai Chi Chuan13, sendo este último, o estilo de Kung-Fu mais difundido
em todo o mundo (LIMA, 2000; TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007; MOCARZEL,
2010b, 2010c). Tem-se como um pólo histórico de difusão dos estilos Internos o
Templo Taoísta de Wudan (KOPPE, 2009).
Já
a
escola
Externa
(também
conhecida
como
“rígida”)
enfatiza,
primordialmente, os treinamentos de caráter marcial com saltos, investidas físicas
bem vigorosas e respirações mais rápidas e intensas, para então, posteriormente,
enfatizar as práticas meditativas de forma mais objetiva, ou seja, de “fora pra
dentro”. Exemplificam-se aqui como alguns estilos da ramificação Externa: Hung Gar
(Punho da Família Hung – também conhecido como Garra de Tigre), Fei Hok Pai
(Garça), Pak Ton Lon (Louva-Deus), Shaolin do Norte, Serpente Divina e Yen Jao
Fan Zi (Garra de Águia). Historicamente, o mais famoso núcleo de difusão dos
estilos Externos foi o Templo Budista de Shaolin (LIMA, 2000; KOPPE, 2009).
A origem geográfica é o tema do “nível 6” da taxonomia. Esta diferenciação
será abordada de forma descritiva no tópico “2.2 – História das Artes Marciais
Chinesas – nasce o Kung-Fu”.
Por fim, a última escala, o “nível 7”, expressa a fonte de observação e criação
do estilo criado, elevando também seus fundadores e difusores. Como por exemplo,
13
O Tai Chi Chuan, traduzido como “Arte do Punho Supremo” ou “Punho da Suprema Cumeeira”
possui 5 famílias principais e uma gama imensa de outros sub-estilos e derivações. As famílias são:
Yang (o mais praticado do mundo), Wu (o segundo mais praticado no mundo), Chen (o mais antigo
dentre eles e o terceiro mais praticado no mundo), Wu/Hao (o estilo mais lento e compacto dentre
eles e o quarto mais praticado do mundo) e Sun (criado a partir da mescla dos estilos Xing Yi e Pa
Kua Chuan e o menos difundido dentre eles). Ressalta-se ainda que, existem diversas ramificações e
sub-estilos menores do Tai Chi Chuan pelo Brasil e pelo mundo. Como exemplos existem os estilos
Macaco (Monkey) e Cardio Tai Chi, difundidos pelo Mestre Daniel Weng (EUA) e o estilo Chang
difundido pelo já falecido Grão-mestre Chang Tung Sheng (EUA) (MOCARZEL, 2010b).
19
as observações feitas por diversos Mestres do passado sobre como os animais
caçavam, lutavam e se defendiam, gerando assim uma enorme variedade de estilos
baseados na natureza. Por conta da forte filosofia oriental ou mesmo pela vitalidade
do folclore e da “auto-valorização” da cultura chinesa, muitos estilos receberam
nomes tidos como “exóticos” ou mesmo “curiosos” para culturas do Ocidente; como:
"Punho de Flor de Ameixeira" e "Palma da Mão do Pato Mandarim" (MAIDANA,
2009; NATIONAL GEOGRAPHIC, 2010). O Grão-mestre Leung Shum14 afirma que
já foram registrados historicamente mais de 1000 estilos de Kung-Fu; todavia, hoje
existiriam apenas cerca de 300 (CHIN, 2001)15, se aproximando do pensamento de
Lima (2000) que especula a existência de 360 estilos. Já Paulo dos Santos (2006) e
Tubino, Tubino e Garrido (2007) acreditam que ainda existam atualmente pouco
mais de 400 estilos. Defende-se que a grande diminuição do quantitativo de estilos
existentes se deu por muitos se fundiram com outros estilos, alguns “morreram” com
seus Mestres em batalhas e outros se perderam e/ou foram esquecidos com o
passar dos séculos.
É necessário também trazer à luz a justificativa do retângulo cinza envolvendo
os dois quadros “Arte Marcial” e “Luta Técnica” no “nível 2” estendendo-se até o
quadro do estilo Yen Jao (Garra de Águia) no “nível 7”. Como já descrito
anteriormente (porém, será mais detalhado posteriormente no tópico “2.2 – O KungFu no século XX”), a expressão Kung-Fu remete não só aos esmeros marciais, mas
sim, a qualquer dedicação empenhada por um indivíduo com seu tempo de prática,
independente da filosofia, métodos de ensino, origens culturais, origens históricas,
organização técnica, origem geográfica e fundador. Assim, filosoficamente, o
retângulo cinza buscou representar o referido pensamento de forma mais ampla e
genérica, ou seja, em um âmbito macro-sociológico.
14
15
Grão-mestre do estilo Garra de Águia que hoje reside em Nova York (EUA).
O texto foi escrito por Jeanne Chin registrando as idéias do Grão-mestre Leung Shum através de
sua própria narração feita em 1980.
20
2.2 História das Artes Marciais Chinesas – nasce o Kung-Fu
É dito por Lima (2000) que existem dois grandes obstáculos que atrapalham
muito a realização de estudos sobre tópicos histórico-culturais chineses. O primeiro
vem das repetidas ordens de destruição dadas por diversos imperadores para
apagar o patrimônio cultural anterior às suas ascensões, para assim, tornarem-se o
“marco-zero” da história da China. O segundo seria a subjetividade da cultura
metafórica chinesa envolvendo suas linguagens e escritas, que por diversas vezes,
expressam significados diferentes das palavras utilizadas, através de ideogramas
que podem ser traduzidos de diversas formas, variando de acordo com contexto
referido. Heraldo Ferreira (2005) ainda acrescenta a esses empecilhos o fato de
muitas informações e conhecimentos terem sido transmitidos oralmente de Mestre
para discípulo, dificultando a obtenção de registros históricos totalmente confiáveis
ou mesmo corretos.
Quando se analisa a história dos métodos de autodefesa, a realidade descrita
acima não é diferente. A história narra diversos momentos em que os seres
humanos lutaram entre si. Desde o “homem das cavernas” que lutava
constantemente por sua sobrevivência e sustentação, aos antigos gregos que se
degladiavam em competições “esportivas” de embates corpo-a-corpo16 para assim,
afirmarem heróis e ídolos populares dentre seu povo. Tang (1935) narra que em uma
viagem a Tóquio, ouviu o doutor Zheng Wulang, renomado especialista em Ciências
Naturais da época, dizer que possuía uma cópia de uma escultura em pedra talhada
de origem egípcia com aproximadamente 5000 anos que apresentava ilustrações de
duzentos indivíduos praticando um tipo de técnica marcial de agarro e queda.
Contudo, quando se fala em registros de uma técnica marcial criada e
estruturada, posteriormente treinada e difundida por alguma cultura, um dos
primeiros apontamentos é direcionado para uma arte marcial, natural da região onde
16
Este tipo de embate, após sofrer adaptações para ser “esportivizado”, hoje é praticado como Luta
Greco-Romana, Wrestling e/ou Luta-Olímpica. Essas práticas se diferenciam em maioria apenas no
regulamento desportivo-competitivo; porém, abordam as mesmas técnicas, bases e posturas.
21
hoje se encontram os países da China e Mongólia. Esta arte recebeu o nome Shuai
Chiao17, um estilo de Kung-Fu, baseado primordialmente na observação das quedas
e arremessos em duelos entre os animais córneos, isto é, possuidores de chifres
como búfalos, alces e bois (TONG, 2005).
No primeiro dos cinco prefácios da obra de Tong (2005), é pontuado por Chen
(1931) que o Shuai Chiao adveio da junção de duas técnicas de autodefesa que já
existiam: uma de natureza mongol (Guan Jiao) e outra de procedência tibetana (Bu
Ku). Com a união das duas formou-se uma terceira técnica (Jiao Di, Jiao Li ou Chiao
Ti). Após os períodos Wei e Jin (aproximadamente entre os séculos II e III), a técnica
passou por uma significativa reestruturação metodológica incluindo a mudança do
seu nome (vindo a se chamar Xiang Buo ou Xiang Pu). Posteriormente, a
nomenclatura variava de acordo com a Dinastia reinante, a região ou mesmo a
escrita de cada povo e tribo. Somente em 1928 o governo chinês determinou a
unificação da nomenclatura (Shuai Chiao) para toda a nação (FERREIRA, Arthur,
2003).
Na obra de Arthur Ferreira (200318, p.1) coloca-se ainda que o:
Shuai Chiao é uma das mais antigas artes marciais chinesas.
Originou-se há mais de 2000 anos, embora alguns afirmem que sua
origem é próxima de 2000 a.C. Apesar da arte ser praticada há muito
tempo, ela tem sido conhecida por muitos nomes. Só recentemente,
em 1928, foi determinado que todos os chineses a chamariam Shuai
Chiao. Antes de 1928, o nome variou de acordo com a Dinastia ou
região.
No segundo prefácio da mesma obra citada acima, o Grão-mestre Li Wing
19
Kay
defende que o Shuai Chiao na verdade teria 6000 anos de existência, mas
que apenas 4000 anos estariam documentados. Rafael Oliveira (2006) por sua vez,
alude sobre a China ser a nação precursora da arte marcial mais antiga e complexa
do mundo com mais de 5000 anos, tendo tido sua origem no período da Dinastia
17
A escrita da nomenclatura da arte pode variar também para Shuai Jiao ou Liao Jiao pela
diferenciação dos dialetos locais chineses ou mongóis (JIN, 1933).
18
Primeiro livro sobre o Shuai Chiao na língua portuguesa. Esclarece-se que o texto foi traduzido,
adaptado e atualizado nas regras desportivas de outra fonte (WENG, 1984).
19
Introdutor dos estilos Garra de Águia, Louva-Deus Sete Estrelas e Shuai Chiao no Brasil em 1970.
22
Shang, época apontada por diversos pesquisadores da área histórica das artes
marciais como o “marco-zero” do referido tema através de fontes primárias.
Na imagem seguinte (figura 3), Apolloni (2004a) e Rafael Oliveira (2006)
apresentam uma linha cronológica das diversas Dinastias e formas de governo que
comandaram ao longo da história o que vem a ser o atual território chinês.
Figura 3: Cronologia das antigas Dinastias chinesas até o atual período republicano.
No trabalho de Minick (1974), é feito um apontamento sobre treinamentos de
katis20 com objetivos marciais. O autor cita que essa prática já ocorria a mais de
5000 anos, podendo então ser até mesmo anterior ao Shuai Chiao. Já Hausen
(2004) afirma que os katis são oriundos da era neolítica e eram utilizados
inicialmente por povos orientais primitivos como danças ritualísticas para a obtenção
de sorte nas batalhas, agradecimento de colheitas fartas e proteção contra
adversidades da natureza, perfazendo assim, um primitivo pensamento sobre
manutenção da qualidade de vida e boa saúde (FARINATTI; FERREIRA, 2006). Em
uma visão contemporânea, Gomes (2008) diz que os katis também são uma
manifestação esportiva em competições de alto rendimento e/ou de ensaios
20
Kati é uma coreografia marcial que simula os combates de indivíduos armados ou não. Paulo dos
Santos (2006) ainda coloca que a dificuldade do kati é de acordo com o nível técnico do praticante.
Assim, é possível desenvolver valências físicas e aperfeiçoar a qualidade técnica dos golpes para
obter um bom desempenho marcial. Hoje, após a prosperidade da comunicação mundial e da
propagação da arte como esporte, o kati também pode ser chamado de: taolu, rotina, sequência e/ou
forma. Pimenta (2009) esclarece que o nome kati é utilizado nas artes marciais chinesas, kata nas
japonesas e poom see nas coreanas.
23
esportivos durante o ensino-aprendizagem para o aperfeiçoamento das técnicas
marciais.
No entanto, para fins de esclarecimento, o Shuai Chiao será aqui abordado,
como arte marcial primogênita, pois detêm registros mais fidedignos do que as
outras técnicas mencionadas, e mais do que isso, possui uma estruturação definida,
constituído com vários exercícios e movimentações marciais integradas, perfazendo
uma totalidade física e mental (holismo), o que faz dele uma arte marcial arquitetada,
diferente dos katis que seriam apenas mais um conjunto de exercícios marciais e
não uma “arte marcial completa”.
Além disso, acredita-se que o Shuai Chiao tenha sido a primeira técnica
marcial a adotar filosofias que buscassem a disciplina marcial em prol da educação e
do “autocombate” ao ego de seus praticantes. Defende-se que todo artista marcial
treina para cessar a violência, incluindo a gerada por ele mesmo, o que Lima (2000,
p.114) chama de “guerra interior”. Toda essa proposta é trazida aqui nesta
dissertação através da conceituação da expressão “artes marciais”. Como exemplo
disso, observa-se um antigo ditado chinês derivado da filosofia que constitui até os
dias de hoje os treinamentos de Shuai Chiao: “o orgulhoso será derrotado”21 (TONG,
2005, p.223). Mesmo que de forma ampla e subjetiva, posiciona-se conclusivamente
que: “A prática de artes marciais é sobre a viagem em si, não sobre o destino”
(MONAHAN, 2007, p.43).22
O estilo Shuai Chiao, que é originalmente da região fronteiriça entre a China e
Mongólia, conforme já referido, atravessou diversas fronteiras (tanto físicas quanto
culturais) e por conta disso, surgiram diversas variações de suas técnicas. Os
métodos originais foram adaptados, modificados, ou mesmo, reformulados, tendo
diversos fatores a influenciar estes acontecimentos. É possível destacar influências
geográficas, culturais e mesmo religioso-filosóficas na evolução das artes marciais
chinesas (LIMA, 2000).
Em caráter geográfico, técnicas derivadas do sul da China têm por
característica apresentarem uma gama considerável de movimentos de braços e
21
Tradução nossa.
22
Tradução nossa.
24
posturas23 altas de pernas (pequenos ângulos de flexão do quadril e joelho), pois a
região costumava ser alagadiça e vasta em rios e lagos, ficando impossível o
trabalho de quedas e arremessos dentro d’água ou mesmo em um solo
escorregadiço. Já observando o norte da China, suas técnicas costumam
demonstrar práticas de saltos acrobáticos e chutes amplos com posturas baixas de
perna (grandes ângulos de flexão do quadril e joelho), dando-se pelo motivo que o
tipo de terreno de característica montanhosa exigia pernas fortes e bem móveis para
o deslocamento, no entanto, o frio da região fazia com que os indivíduos se
agasalhassem bastante e usassem enormes gibões de pele que dificultavam e muito
a movimentação dos braços e ombros.
Em suma, os estilos derivados do sul possuem realce em técnicas com
membros superiores, como socos e tapas, enquanto estilos do norte enfatizam
membros inferiores, como chutes e saltos (CHIN, 2001). Ressalta-se que, todos os
estilos tradicionais de arte marcial chinesa treinam todas as partes do corpo, porém
há uma concentração de técnicas conforme as características abordadas.
Em caráter cultural, as diferentes educações, roupagens e vestes, costumes
de cada local, proporcionavam modificações consideráveis a essa arte. Cada cultura
acresceu conhecimentos diversos: a influência de seus ethos. Nota-se dentre eles a
preparação corporal para exercícios físicos com o besuntar de óleo vegetal
levemente aquecido pelo corpo para a dilatação da musculatura dos praticantes, na
tentativa de prevenir lesões osteomio-articulares; a mescla de práticas respiratórias
meditativas junto aos exercícios físicos para o desenvolvimento do Qi24 em níveis
microscópicos e macroscópicos – técnica essa chamada de Qigong25 – (LIMA, 2000;
JEFREMOVAS, 2003; TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007; FERREIRA, Arthur,
2009); e também o uso de diferentes armas de cada tribo ou nação e mesmo novas
técnicas marciais, que de certa forma, complementavam as anteriores. Segue um
23
Essas posturas são mais conhecidas dentro do meio das artes marciais como “posições básicas”
ou “bases”.
24
Lima (2000, p.50) conceitua como: “energia vital (interna), elã ou sopro”. A escrita da nomenclatura
Qi pode variar de acordo com as diferentes culturas e dialetos de diversos locais do mundo oriental.
Na China, encontram-se os termos Qi (cantonês) e Chi (mandarim). No Japão é adotada a palavra Ki.
Já na Índia é utilizada a terminologia Prana.
25
Sua nomenclatura pode variar para Chi-Kung. Técnica conhecida principalmente por três
finalidades: meditação profunda, terapia holística (físico, mental e emocional) e aspectos marciais.
25
comparativo de imagens (figura 4) que ajudam a expressar visivelmente essas
diferenças.
Figura 4: À esquerda, monges budistas praticam técnicas do sul da China – roupagens leves e bases
altas. À direita, lutadores praticam técnicas do norte da China – roupagens pesadas e bases baixas.
Por fim, o caráter religioso-filosófico. Este último, de fundamental importância
para a divulgação e expansão das artes marciais em toda Ásia e posteriormente,
para o mundo. Foi no Templo Budista de Shaolin26 que um homem indiano
conhecido na China pelo pseudônimo de Tamo27, apresentou para os monges dessa
linhagem dois conhecimentos que viriam a ser grandes marcos históricos: o primeiro
era um método de autodefesa indiano chamado Vajramushti28, já o segundo, o
conhecimento (da época) da anatomia e fisiologia do corpo humano (incluindo seus
aprimoramentos através de exercícios físicos e mentais). Dentro do mosteiro, Tamo
desenvolveu junto ao clero budista do templo, a arte chamada atualmente de “KungFu Shaolin” (LIMA, 2000; TAIGEN, ca. 2000). As duas ciências trazidas por Tamo
foram extremamente úteis aos monges de Shaolin, pois, com o método de
autodefesa, o clero pode se defender dos constantes assaltos que o templo sofria de
bandidos e bandoleiros armados; já com o conhecimento biológico do corpo humano
26
Mosteiro budista localizado na província de Henan (China) ao pé do monte Shao (que significa
“pequena ou jovem floresta”) (MAIDANA, 2009). Lima (2000) pontua que o mosteiro foi fundado em
495 d.C..
27
Seu nome real era Bodisatva Avalokistevara Bodhidarma. Também foi conhecido no Japão por
Daruma Taishi ou Bodai Daruma. Provavelmente nascido no ano 460 d.C., sendo ele o terceiro filho
do grande Rei Brahamam das terras ocidentais da Índia (TAIGEN, ca. 2000). É dito por Paulo dos
Santos (2006) que Bodhidarma foi o 28º. sucessor de uma ordem de ensinamentos budistas.
28
Este também, um dos métodos de autodefesa mais antigos que se tem registro (SOUZA JR.,
2007). O Vajramushti provavelmente teve sua origem entre 3500 a.C. a 1500 a.C. pelos drávidas,
povo de pele escura que habitou a Índia nesse período. Hoje, o Vajramushti é conhecido pelo nome
de Kalarippayat (PIMENTA, 2009).
26
puderam se exercitar e se reabilitar de diversas mazelas que possuíam por orarem
muito e não fazerem qualquer atividade física, portanto, encontravam-se fisicamente
muito debilitados (LIMA, 2000; KOPPE, 2009).
Futuramente, os monges de Shaolin viriam a ser considerados como
membros do mais alto escalão marcial já visto até então (SHAHAR, 2003). É
contado por Lima (2000) que posteriormente a fama de Shaolin, diversos jovens
determinados e alguns mestres de artes marciais buscaram ingressar na irmandade
do templo para poderem se aperfeiçoar e defender melhor suas aldeias. Embora
Rafael Oliveira (2006) traga à luz que a qualidade super estimada da técnica de
Shaolin seja equivocada e que esse engano deve-se ao grande imaginário popular
ocidental influenciado pelos diversos filmes e seriados televisivos difundidos no
século XX fazendo uso da imagem e do nome de Shaolin. Maidana (2009) afirma
que foi através desses meios midiáticos que o Kung-Fu se fez famoso no Ocidente.
Atualmente, por sua importante relevância histórica, religiosa, filosófica e
mesmo científica e política na antiga China, o Templo de Shaolin foi reconhecido em
02 Ago. 2010 como “Patrimônio da Humanidade”29 pela United Nation Educational,
Scientific and Cultural Organization (UNESCO30). Em níveis arquitetônicos, o Templo
de Shaolin conta com 11 construções, como: o Mosteiro, o Observatório de
Dengfeng, a Academia Songyang, as Torres Taishi e o Templo Zhongyue.
É importante enaltecer que o Templo de Shaolin não era o único lugar de forte
difusão do Kung-Fu na China antiga. Koppe (2009) esclarece que outro famoso
ponto e grande alicerce de projeção das artes marciais chinesas foi o Templo
Taoísta de Wudan na província de Hubei. De forma ainda mais ampla, Shahar
(2003, p.136) apresenta outros menos famosos, porém, importantes núcleos que
colaboraram com a propagação do Kung-Fu por todo território chinês:
Shaolin não foi o único mosteiro onde artes marciais foram
praticadas. Fontes dos séculos XVI e XVII aludem ao treinamento
29
Disponível em: <www.oecumene.radiovaticana.org/bra/Articolo.asp?c=412660>. Acesso em: 08 set.
2010.
30
Em português: “Organização para Educação, Ciência e Cultura das Nações Unidas” (Tradução
nossa). Órgão vinculado às Nações Unidas (ONU), fundado em 1946 e está instalado oficialmente no
Brasil desde 1964. Disponível: <http://www.unesco.org/pt/brasilia/about-the-unesco-brasilia-office/>.
Acesso: 31 Dez. 2010.
27
militar em outros centros budistas que também merecem ser
pesquisados: Monte Emei (em Sichuan), Monte Wutai (em Shanxi) e
Monte Funiu (na parte sul de Henan). Além disso, combates eram
praticados em vários templos locais que ofereciam abrigo para
artistas marciais itinerantes. Ainda assim, os clérigos de Shaolin eram
considerados os melhores monges lutadores. Uma razão para seus
expressivos conhecimentos marciais era a localização de Shaolin, na
área central de Henan. Pobreza e violência desenfreada integraram o
treinamento militar à estrutura da sociedade em Henan, o que explica,
em parte, a contribuição daquela província para as artes marciais do
período imperial tardio.
2.2.1 Filosofias Orientais que influenciaram o Kung-Fu
Os ensinamentos do Taoísmo (ou Daoísmo), criado por Lao Zi (604-517 a.C.),
por sua vez, precederam e fundamentaram o Confucionismo instituído por Kung-FuTse31 (551-479 a.C.), e o Budismo estabelecido sobre os ensinamentos de
Siddhartha Gautama (563-483 a.C.) – o mais famoso “Buda”32. Esta última filosofia,
posteriormente, foi convertida em religião e adquiriu grande aceitação em toda Ásia
ao decorrer da história (FERREIRA, Arthur, 2009).
Ainda sobre o Budismo, diversas outras variações religioso-filosóficas deste,
surgiram posteriormente aos primeiros séculos após Cristo. No I Congresso
Internacional de Artes Marciais e Medicina Chinesa (2009) foram expostos vários
31
Líder chinês que no Ocidente ganhou fama com seu nome latinizado: Confúcio (OLIVEIRA, 2006).
Foi talvez o primeiro grande defensor na história da Etocracia; ideologia que, segundo Murad (2009),
busca a elevação do poder dos “valores” éticos, morais e educacionais, fundamentalmente tendo os
líderes do povo como exemplos para seus subordinados. O que reforça o seu caráter pedagógico,
especialmente para a infância e juventude.
32
Derivado dos dialetos sânscrito e pāli, o termo atualmente tornou-se um título religioso-filosófico
que tem por significado “Iluminado” ou “Desperto”. A nomenclatura também pode ser encontrada na
escrita “Buddha”. A terminologia faz alusão ao ser humano que teria atingido um alto nível de
espiritualidade, desprendimento material, sentimento de ajudar ao próximo e consciência da
democratização da religiosidade – antes sujeita às imposições da poderosa casta Brâmane na antiga
Índia. Posteriormente, o título “Buda” ganhou repercussões religiosas, sendo o centro do budismo,
contando hoje com o número entre 300 a 400 milhões de adeptos em todo o mundo, além de
inúmeras derivações e ramificações dessa religião (DHARMANET, 2010). Lima (2000, p.32) expõe
que: “’Iluminação’ seria a perfeita compreensão dos processos e das relações universais, na qual; o
corpo, como forma, tem uma participação fundamental”.
28
exemplos: o Budismo Ch’an (ou Zen), Budismo Ch’en Yen, Escola das Leis
(Legalistas), Taoísmo Religioso, Escola da Razão e Natureza, Neo-Taoísmo, Escola
Empírica e Escola da Mente. Acrescentam-se também, através de conhecimentos do
autor, outros exemplos como: Budismo Vajrayana, Igreja Seicho-No-Ie, Instituição
Religiosa Perfect Liberty (ou PL), Lamaísmo e ainda diversas outras escolas, ou
mesmo, religiões, seitas e filosofias independentes.
Todas as três filosofias primordiais (Taoísmo, Confucionismo e Budismo)
também serviram (e ainda servem) como base da disciplina e da ética das artes
marciais chinesas, indianas, coreanas e japonesas (TAIGEN, ca. 2000; FERREIRA,
Arthur, 2009). Com ajuda delas, buscaram proporcionar aos artistas marciais uma
“visão educacional holística”33 para a prática dos exercícios, elevando também não
só as técnicas de autodefesa, mas também a qualidade da saúde, a boa
alimentação e o enriquecimento cognitivo através do ganho de conhecimentos
gerais. Miranda (2008, p.5) aborda que: “A China aplicava métodos aperfeiçoados
de luta; a sua filosofia, a sua medicina e a sua ciência em geral, haviam originado
um terrível método de combate”.
Existem evidências empíricas nas aulas de Kung-Fu que corroboram as
influências tanto filosóficas quanto pedagógicas nas artes marciais chinesas, que se
perpetuam até os dias de hoje (SHAHAR, 2008). Ressaltam-se algumas observadas
pelo próprio pesquisador desta dissertação, como: a reverência feita em todo início e
término das aulas a “Placa Votiva”34 (figura 5), assim demonstrando uma forma de
respeito e gratidão por suas contribuições no passado (OLIVEIRA, Rafael, 2006); a
progressão pedagógica das técnicas ensinadas para os alunos (sendo as mais
simples e fáceis ministradas antes e as mais complexas e difíceis ministradas
depois); progressão também observável no aprendizado das técnicas do Kung-Fu,
das mais brandas para as mais contundentes (HAUSEN, 2004). Estas últimas, para
que não sejam absorvidas como “ensinamentos violentos” exigem maturidade,
reflexão e assimilação da disciplina e da ética preconizadas nos preceitos da arte;
assim aproximando-se da teoria do “processo civilizador” de Elias (1994). Despeux
33
Visão educacional esta, que Lima (2000) acusa não estar sendo utilizada (ou mesmo ter sido
esquecida) pela educação escolar mundial, refletindo-se também no setor profissional.
34
Placa ou quadro que pode conter fotos, ilustrações ou mesmo a caligrafia dos fundadores,
ancestrais e antepassados da referida arte marcial (OLIVEIRA, 2006).
29
(1993, p.7) ilumina a maior preocupação marcial do Kung-Fu; a defesa: “Na tradição
chinesa, a força guerreira destina-se menos a atacar do que a defender-se e a
instaurar a ‘grande paz’ (...)”.
35
Figura 5: Placas Votivas nas academias de Lee Chung Deh, Chan Kowk Wai e Rogério Leal Soares ,
praticantes do estilo Shaolin do Norte.
Refletindo sobre essa possível dicotomia do “bom” ou mesmo do “mau” uso,
dos conhecimentos práticos marciais que um indivíduo pode fazer, Monahan (2007,
p.42) esclarece que: “É o descaso com a eficiência prática que cria um espaço para
transformar as artes marciais em uma avenida para a criatividade humana e autoexpressão”.36 Assim, entende-se que a percepção do mestre ou professor como
orientador, ou mesmo, como avaliador do comportamento de seus alunos, é mais do
que fundamental para a construção de valores positivos de forma unificada ao galgar
os diversos níveis de técnicas ministradas.
De forma mais convergida ao estilo Garra de Águia, as filosofias descritas
anteriormente se materializam dentro do referido estilo (e consequentemente
permeando-se por seus praticantes) através dos seus “9 preceitos”, expostos e
posteriormente interpretados pelo autor desta dissertação a seguir (tabela 1):
PRECEITO 1 – “EU ME COMPROMETO A TREINAR CORPO E ESPÍRITO PARA PAZ”
Este preceito é o primeiro não ao caso. Seu significado expressa, mesmo que de forma sucinta, toda
a ideologia pacífica que permeia a filosofia milenar da arte marcial Kung-Fu. Suas palavras deixam
claro que a violência não é algo objetivado dentro dessa arte.
35
Disponível em: <http://www.shaolincuritiba.com.br/votiva.html>. Acesso em: 29 Dez. 2010.
36
Tradução nossa.
30
PRECEITO 2 – “EU ME COMPROMETO A REVERENCIAR NOSSOS ANCESTRAIS E RESPEITAR
MESTRE, PROFESSORES E COLEGAS”
Tendo como base não só a hierarquia marcial, mas também a hierarquia familiar, o segundo preceito
expressa o respeito ao superior, ao colega que está em igual posição e ao que se encontram
subordinado ou em posição inferior. Todos devem ser tratados e respeitados de maneira louvável,
pois cada indivíduo pode passar pelos diversos níveis citados, sendo exemplo ao próximo (Etocracia).
PRECEITO 3 – “EU ME COMPROMETO A NÃO SER FALSO E SEGUIR O CAMINHO DA
VERDADE”
O significado do terceiro preceito vai bem além do que só não mentir. Sua postura inclui um
comportamento honesto, assumindo conseqüência dos próprios atos, honrando sua palavra, ouvindo
críticas e buscando seu amadurecimento contínuo através das percepções próprias e de terceiros.
PRECEITO 4 – “EU ME COMPROMETO A PERSISTIR NO APERFEIÇOAMENTO FÍSICO,
MENTAL E ESPIRITUAL”
De forma holística, o quarto preceito eleva as diversas áreas de desenvolvimento do ser humano; do
mais externo ao mais interno. Representa também a constante busca do aprimoramento de todo
artista marcial. Enfatiza-se aqui que os benefícios adquiridos não só se limitam ao caráter físico, mas
extrapolam para o nível social, garantindo saúde, lazer, condições de trabalho e qualidade de vida.
PRECEITO 5 – “EU ME COMPROMETO A SER PACIENTE E HUMILDE, GALGANDO UM A UM
OS DEGRAUS DO CONHECIMENTO”
Por motivos diversos (profissionais, financeiros, culturais, pessoais etc.) essas duas virtudes
(paciência e humildade) são extremamente “colocadas à prova” em tempos atuais. Dentro da filosofia
do Kung-Fu, elas passam a ser focos importantes no desenvolvimento e amadurecimento de cada
praticante, elevadas aqui no quinto preceito. Este preceito evidencia que a prática da arte marcial
Kung-Fu é um processo contínuo (como por exemplo, as graduações, que expressam um marco
referencial de evolução do praticante).
PRECEITO 6 – “EU ME COMPROMETO A CONTRIBUIR PARA QUE NOSSO MEIO NÃO
OFEREÇA ABRIGO AOS MAL INTENCIONADOS”
Acreditando que os ensinamentos ministrados pelo Kung-Fu criem a união entre seus membros, o
sexto preceito narra a prudência de resguardar a fonte transmissora desses ensinamentos (os
núcleos de difusão do Kung-Fu) para que esse legado se perpetue, refletindo de forma que os
indivíduos com intuito de violência não se sintam parte do grupo.
PRECEITO 7 – “EU ME COMPROMETO A RESPEITAR AS DEMAIS FILOSOFIAS E ARTES
MARCIAIS”
O sétimo preceito se faz bastante atual na importância do respeito e tolerância aos diferentes
pensamentos, opiniões e crenças do próximo. A expressão “filosofia” é capaz de abranger reflexões
sobre política, cultura, credo, ideologia, educação; assim, se fazendo presente também o respeito às
outras artes marciais.
31
PRECEITO 8 – “EU ME COMPROMETO A ZELAR PELO RESPEITO DEVIDO AO KUNG-FU”
Acreditando que o respeito à arte marcial Kung-Fu representa respeitar todos os esforços e
dedicações dos ancestrais e gerações antecessoras, o oitavo preceito traz à luz que, o nome e a
concepção dessa arte marcial, têm ao praticante um valor por significado histórico
incomensuravelmente maior do que seu significado literal. Em outra dimensão, significa também as
técnicas de autodefesa, através do ensinamento do uso adequado das técnicas marciais em caso
real de necessidade. Se expressa ainda a manutenção da tradição da técnica ao longo das gerações
não como uma forma permanente, mas sim adaptada a individualidade de quem a transmite.
PRECEITO 9 – “EU ME COMPROMETO A SER EXEMPLO VIVO DA FILOSOFIA E DA ÉTICA DOS
MESTRES”
Por fim, o nono e propositalmente último preceito busca representar a materialização prática e
histórica da Etocracia, ou seja, sendo os mestres e professores indivíduos de caráter ético e moral
louváveis, fazendo com que naturalmente, seus discípulos os terão como exemplos a serem
seguidos, permeando todos os princípios relatados nos preceitos anteriores, gerando um permanente
“ciclo de valores”; princípio essência do Tao.
Tabela 1: Descrição e interpretação dos “9 Preceitos do estilo Garra de Águia”.
2.2.2 O Kung-Fu no século XX
A arte marcial Kung-Fu, como é chamada nos dias de hoje, nem sempre
recebeu essa nomenclatura. Seu nome original é Wushu, que tem por significado
“arte marcial” (KOPPE, 2009) ou “arte da guerra” (TUBINO; TUBINO; GARRIDO,
2007). Porém, o termo “Kung-Fu” ficou mundialmente conhecido quando o cinema
no século XX incluiu em diversos roteiros cenas de acrobacias e lutas com atores
chineses praticantes de Wushu. Quando os mesmos eram indagados como
conseguiam
efetuar
movimentos
de
grande
plasticidade
e
beleza,
os
atores/lutadores apenas respondiam: “Kung-Fu!”.
A expressão tem por significado: “tempo e esforço desprendido numa
atividade” ou “grau de perfeição alcançado em qualquer área de atuação”, ou ainda,
“conhecimento profundo de um assunto” (HIRATA; DEL VECCHIO, 2006, p.3). Já
32
Apolloni (2004b, p.74) coloca que o termo “expressa uma habilidade intuitiva obtida
pela repetição intencional de uma ação”. De forma mais generalista, Lima (2000)
alude ser a busca constante da perfeição. Alguns ainda conceituam resumidamente
como “trabalho duro” (JEFREMOVAS, 2003, p.16). Recentemente, Koppe (2009,
p.22) posicionou-se dizendo que Kung-Fu seria “habilidade adquirida através de um
longo período de treino”. Portanto, conclui-se nesta pesquisa que, a expressão
“Kung-Fu” denota: qualquer grande conhecimento e/ou prática alcançados após
muito esforço, trabalho e treino árduo e que se aperfeiçoam com o tempo de prática,
incluindo-se aqui a caligrafia, pintura, escultura, e claro, arte marcial. Por conta
disso, Apolloni (2010) ressalte que essas outras atividades artísticas estão, mesmo
que de forma sutil, ligadas ao espírito marcial dos praticantes de Kung-Fu.
Brownell (2008) afirma que o Barão de Coubertin37 declarou abertamente que
havia consultado Confúcio, dentre outros pensadores, para então estruturar o que
viria a ser a “pedagogia esportiva” que o mesmo defenderia com tanto esmero.
Talvez, poder-se-ia dizer aqui, que a busca constante do aprimoramento e da
perfeição, base da filosofia que tece a estrutura conceitual do Kung-Fu, é uma
“versão oriental” do Lema Olímpico, que por sua vez, também prega o
desenvolvimento humano.
O LEMA OLÍMPICO CITIUS, ALTIUS, FORTIUS pode ser traduzido
por “mais veloz, mais alto, mais forte”. Significa uma mensagem de
aperfeiçoamento humano, expressando a conclamação do Comitê
Olímpico Internacional (COI) a todos os participantes do Movimento
Olímpico, convidando-os a uma superação pessoal, de acordo com o
Espírito Olímpico. (TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007, p.652)
O referido termo (Kung-Fu) vem do Cantonês, um dos dois principais dialetos
chineses juntamente ao Mandarim. Esse dialeto é amplamente utilizado na região
sul e sudeste da China, mais especificamente na região de Cantão, onde se
encontrão grandes centros urbanos que possuíam imensa influência estrangeira
como Hong Kong (de colonização inglesa) e Macau (de colonização portuguesa).
Citações informais de vários mestres durante suas aulas, afirmam que foram
exatamente os estrangeiros no início do século XX, que de maneira leiga e inocente,
37
Seu nome era Pierre de Fredy. Idealizador e organizador dos Jogos Olímpicos da Era Moderna
(CAPINUSSÚ, 2007).
33
“batizaram” a arte marcial chinesa de forma popular com a expressão “Kung-Fu”. De
tal modo, esclarece-se o ocorrido de uma confusão de terminologias históricas,
tendo feito com que a arte praticamente assumisse duas nomenclaturas.
Para conflitar ainda mais essa conturbada conceituação da nomenclatura da
arte, em 1928, o governo republicano chinês, com a intenção de incentivar o espírito
nacionalista do país, utilizando as artes marciais como ferramenta política, alterou
por lei o nome Wushu (já sendo conhecido internacionalmente por Kung-Fu) para o
nome Kuoshu, que significa “arte nacional” (LI, 1993).
Hoje, a arte ainda se faz conhecida principalmente no Ocidente como KungFu (MOCARZEL, 2010a). O nome Wushu foi redirecionado para o estilo de Kung-Fu
idealizado
pelo
governo
republicano
chinês
para
ser
o
“estilo
olímpico”
(FEDERAÇÃO DE KUNG-FU DO ESTADO DE GOIÁS, 2009). Isso se deu após uma
equipe de nove praticantes (6 homens e 3 mulheres), atletas integrantes da elite da
arte na China (membros da renomada Nanking Central Martial Arts Academy),
apresentarem-se e impressionarem o público presente dos Jogos Olímpicos de
Berlim (1936), como esporte de demonstração, incluindo o ditador Adolf Hitler que os
aplaudiu em pé38.
Perante esse fato, o governo chinês, de forma oficial, objetivou ingressar o
Kung-Fu (estilo Wushu) como mais uma modalidade desportiva nos Jogos Olímpicos
(KOPPE, 2009) efetuando movimentações de caráter educacionais, econômicas,
políticas e desportivas em 1949 (MAIDANA, 2009). Já o termo Kuoshu foi alcunhado
para classificar todo estilo tradicional de Kung-Fu. Assim sendo, há hoje duas linhas
de Kung-Fu, a tradicional (Kuoshu) e a moderna que pleiteia uma vaga nos Jogos
Olímpicos (Wushu Moderno).
Com referência ao Wushu Moderno conseguir tornar-se um desporto
olímpico, grandes metas já foram alcançadas. Apontam-se aqui dois fatores que
propiciaram e muito a difusão em larga escala do Wushu: a estruturação e
consolidação do curso de graduação acadêmica em Wushu pelo governo chinês e a
38
Estas informações detalhadas foram narradas pela Mestra Fu Shu-Yun, integrante da delegação
que se apresentou em Berlim (1936) e posteriormente colocadas na internet. Tradução nossa.
Disponível em: http://www.chinesemartialarts.eu/FU%20SHU-YUN.html. Acesso em: 18 Ago. 2010.
34
fundação39 da International Wushu Federation – IWUF (órgão que passou a reger o
Wushu desportivo competitivo em nível mundial). Somam-se a essas, outras
conquistas da arte marcial chinesa, decorrentes da própria IWUF, como conquistar a
vinculação40 ao Comitê Olímpico Internacional (COI) e o ingresso41 na World AntiDoping Agency (WADA). Apolloni (2004a), Rafael Oliveira (2006), Tubino, Tubino e
Garrido (2007) e Mocarzel (2010a) ainda pontuam a inclusão do Wushu como
desporto “permanente” nos Jogos Asiáticos em 1990.
Os Jogos Olímpicos de 2008 foram realizados em Pequim (China).
Entretanto, apesar dos inúmeros esforços do governo chinês, o Wushu Moderno não
foi aprovado como desporto olímpico oficial. É dito por Brownell (2008) que a razão
principal desse fato se deve ao COI ter mudado sensivelmente sua postura com
relação à inserção de novos esportes no programa olímpico.
O sistema de adição e exclusão de esportes que foi desenvolvido
pela Comissão considerou apenas o universalismo geográfico do
esporte e não seu caráter cultural. Um dos resultados foi que o wushu
chinês (artes marciais) foi desconsiderado e eliminado como um
esporte olímpico oficial do Jogos Olímpicos de Pequim (...)
42
(BROWNELL, 2008, p.70-71)
A mesma autora ainda grifa veementemente que o fato do esporte chinês não
ter sido aceito pelo COI gerou grande comoção e frustração ao povo chinês (e claro,
aos atletas praticantes de Kung-Fu por todo mundo), pois já haviam presenciado o
Japão inserir o Judô em Tóquio (1964) (OLIVEIRA, Ronald, 2007) e a Coréia do Sul
o Taekwondo43 em Sydney (2000) (MARTA, 2004). É criticada também a “postura
ocidentalizada” do COI para com os Jogos Olímpicos de Verão, segundo Brownell
(2008), pois existem apenas dois esportes de origem claramente não-ocidentais nos
39
Em 03 out. 1990.
40
Em 20 jun. 1999, na sessão 109 em Seul (Coréia do Sul).
41
Em 10 dez. 2001.
42
Tradução nossa.
43
Eleva-se a rápida evolução e avanço global que o Taekwondo (arte marcial coreana) atingiu. Marta
(2004) pontua três datas marcantes para o Taekwondo: seu ano de criação (1955), sua chegada ao
Brasil (1970) e sua inserção nos Jogos Olímpicos de Sydney (2000).
35
Jogos Olímpicos de Verão, Judô e Taekwondo; havendo também o “Caiaque” como
único esporte representante das raízes culturais indígenas.
Indiscutivelmente, o processo de “esportivização” de qualquer atividade física
gera “transformações” em seu âmbito (TUBINO; TUBINO; GARRIDO, 2007). Dentro
do Kung-Fu, tendo o foco voltado para sua possível inserção nos Jogos Olímpicos,
ocorreram adaptações em prol da segurança dos praticantes. Na área marcial de
“Combate” (Sanda ou Sanshou) os atletas são obrigados a utilizar equipamentos de
proteção corporal (luvas, peitoral, bucal, capacete, caneleira e especificamente a
coquilha para o sexo masculino). Já na área marcial de “Formas” (Wushu Moderno)
os atletas trajam roupas tradicionais chinesas de fácil movimentação corporal e
fazem uso de armas brancas tradicionais adaptadas para o esporte, não possuindo
pontas e cortes afiados.
Sendo algo importantíssimo de se salientar sobre a temática do Olimpismo,
Gomes (2008) deixa claro que diversos métodos de autodefesa são possíveis de
adaptação,
tornando
os
mesmos
capazes
de
abranger
praticantes
com
necessidades especiais – participantes dos Jogos Paraolímpicos (COMITÊ
OLÍMPICO BRASILEIRO, 2010).
É de se salientar que mesmo com as mudanças e adaptações sofridas, o
Kung-Fu e seus artistas marciais mantêm suas características tradicionais de
respeito e disciplina. Exemplifica-se essa premissa com as saudações feitas pelos
atletas, árbitros e técnicos uns aos outros durante as competições.
Observa-se que até a saudação utilizada no Kung-Fu tem um profundo
significado subjetivo derivado das filosofias orientais, representando respeito,
harmonia e humildade. À frente do coração, os braços se alongam a um nível
submáximo formando um círculo com os braços, enquanto isso, a mão esquerda
aberta com os dedos juntos e alongados se une à mão direita em punho cerrado.
Essa diferenciação das mãos representa respectivamente: a energia yang, a
masculinidade, o calor, o sol, o ataque, a lâmina, a agressividade, o homem – lado
esquerdo; a energia yin, a feminilidade, o frio, a lua, a defesa, o escudo, a
docilidade, a mulher – lado direito. Em outras palavras, a perfeita dualidade do Tao.
36
A relevância dessa filosofia é de tamanha importância que a referida
saudação é representada nos símbolos da maioria dos órgãos e entidades que
dirigem em nível esportivo o Kung-Fu no Brasil. Como exemplo, a logomarca da
Confederação Brasileira de Kung Fu/Wushu – CBKW (figura 6).
Figura 6: Logomarca símbolo da CBKW.
Lima (2000, p.118) afirma claramente que: “Esse misto de esporte, medicinal,
espiritualidade, folclore
e
estratégia
de
combate
foi
sendo
sistematizado
gradativamente e, hoje, é identificado pelo nome de kung-fu”. O pensamento narrado
anteriormente se materializa na imagem (figura 7) que a mesma autora estruturou.
Figura 7: Sub-divisões do Kung-Fu e artes a ele incorporadas (LIMA, 2000).
37
2.2.3 Chegada do Kung-Fu no Brasil
A influência das artes marciais orientais dentro da cultura brasileira de modo
geral, provavelmente teve seu início na segunda década do século XX; com mais
exatidão em outubro de 1915 com a chegada e a ocorrência da primeira
apresentação pública de dois mestres de Judô, chamados Sanshiro Satake e
Mitsuyo Maeda (este último mais tarde chamado de “Conde Koma”). Góis Junior e
Lourenço (2003) dizem que os dois Mestres apresentaram-se marcialmente
desafiando outros lutadores em diversas cidades do Brasil (Porto Alegre, Rio de
Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, São Luís e Belém). Todavia, apenas viriam
fixar residência na cidade de Manaus em Dezembro de 1915. Lá, no ano de 1917,
ambos conheceram e criaram laços fraternais com Gastão Gracie, pai de dois jovens
rapazes, Carlos e Hélio Gracie, que após treinarem anos sob a tutela de Maeda,
viriam a se tornar os precursores do chamado JJB, hoje mundialmente conhecido.
No ponto de vista da inserção do Kung-Fu no Brasil, Blaser, Silva e Marrera
(2006), em seu trabalho de levantamentos de dados históricos observaram que a
arte marcial chinesa levou bem mais décadas que o Judô para sua introdução no
país. A fuga e migração de diversos Mestres da China para diversas partes do globo,
principalmente para Hong Kong, Taiwan, América e Europa, foram desencadeadas
em massa a partir da Revolução Cultural Chinesa em 1966, comandada por Mao
Tsé-Tung (APOLLONI, 2004a). No entanto, muitos deixaram poucos anos antes seu
país, pois já percebiam a crescente onda de conflitos internos, tanto de ordem
política quanto ideológica, dentro da nação chinesa, elevando extremamente a
tensão entre o povo e governo.
Vários mestres foram obrigados a fugir de seus países de origem
para não sofrerem e até serem mortos pela Revolução Cultural
Chinesa. Isso implicou na disseminação do Kung-Fu por todo o
mundo e, no Brasil, na chegada do estilo Shaolin do Norte,
(oficialmente, o primeiro a ter um representante tradicional no país).
(OLIVEIRA, Rafael, 2006, p.19)
38
Os primeiros mestres de Kung-Fu chegaram ao Brasil apenas quarenta e
quatro anos mais tarde que os de Judô, ou seja, em 1959. Sobre personalidades do
Kung-Fu que migraram para o Brasil, Blaser, Silva e Marrera (2006) abordam nomes
bastante relevantes para o desenvolvimento da cultura sino-marcial no país.
Exemplos de renomados mestres como: Wong Sun Keung (estilo Tai Chi Chuan),
Chan Kowk Wai (estilo Shaolin do Norte), Chiu Ping Lok (estilo Fei Hok Pai), Li Wing
Kay (estilos Garra de Águia, Louva-a-Deus Sete Estrelas e Shuai Chiao), Li Hon Ki
(estilos Hung Gar e Wing Chun) e Hu Chao Tien (estilo Serpente Divina). Buscando
enriquecer os dados e nomes já elevados anteriormente, complementam-se ainda
através de conhecimentos e experiência empírica do autor, nomes de outros mestres
não citados, como: Hu Hsin Shan (estilo Tai Chi Chuan), Lee Tat Yan (estilo Wing
Chun e Shaolin do Norte), Wu Jyh Cherng (estilo Tai Chi Chuan), Lee Chung Deh
(estilo Shaolin do Norte), Huang Hu Piao (estilo Hung Gar), Wu Chao Hsiang (estilos
Xing Yi e Tai Chi Chuan), entre outros. A vinda maciça de Mestres ao Brasil ocorreu
entre 1959 a 1980 e a maioria estabeleceu residência nas cidades do Rio de Janeiro
e São Paulo.
Ainda, sobre Blaser, Silva e Marrera (2006), avaliando o caráter estrutural de
entidades e órgãos para ajudarem na organização e difusão da arte marcial chinesa
no Brasil, apontam que a primeira Federação criada no país foi do estado de São
Paulo no ano de 1989 (Federação Paulista de Kung Fu Wushu – FPKF) e em níveis
nacionais, a primeira Confederação surgiu três anos após, em 1992 (Confederação
Brasileira de Kung Fu/Wushu – CBKW).
Assim, observa-se de forma clara que o Kung-Fu é novo em níveis
organizacionais no Brasil, tendo aproximadamente cinqüenta anos do início da
imigração dos primeiros mestres vindos ao país e menos de duas décadas na
formação da primeira entidade nacional que rege a arte. Acredita-se que esse fator
histórico, mesmo em curto prazo, seja relevante e que não tenha conseguido até o
momento influenciar de forma expressiva a população na busca de praticantes no
Brasil; diferentemente da Capoeira, que segundo Sergio Vieira (2006), é a técnica de
autodefesa mais praticada na nação e já faz parte do ethos brasileiro há séculos,
possuindo em território nacional mais de seis milhões de adeptos e recentemente
39
tombada como “Bem ou Patrimônio Imaterial do Brasil44 e do estado do Rio de
Janeiro45.
Hoje, o Brasil é considerado pela comunidade marcial mundial o país com o
melhor Kung-Fu do hemisfério ocidental. Essa titulação se deve a qualidade dos
resultados das delegações e atletas brasileiros em competições internacionais
incluindo mundiais.
2.3 O Fenômeno da Violência
2.3.1 Reflexões e Teorias Diversas
A temática “violência” é extremamente ampla. Murad (2007) descreve a
violência como assunto presente em épocas e sociedades diversas e que
independentemente da sua escala dentro das sociedades, tanto arcaicas quanto
contemporâneas, ela se faz presente. Minayo e Souza (1998) dizem que a violência
é um conceito polissêmico e controverso, ponderando que suas especificidades
necessitam de esclarecimentos para haver alguma discussão. Botelho e Souza
(2007, p.59) alegam que: “(...) a violência pode ser caracterizada como problema
crônico e recorrente”. Hayeck (2009) afirma que a violência pode abranger
pensamentos e reflexões de abordagens políticas, teológicas, econômicas, culturais,
educacionais,
psicológicas,
dentre
outras.
Nesta
dissertação,
se
buscará
prioritariamente pesquisar a violência sob um olhar sócio-educacional.
Durante a pesquisa de Minayo e Souza (1998) é exposto que a Organização
Pan-Americana de Saúde (OPAS) considera desde 1995, que a violência alcançou
um caráter endêmico. Hoje, tornou-se um problema de saúde pública em diversos
44
Decreto do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN) em 15 ago. 2008.
45
Lei Estadual (RJ) nº 2.414 oficializada em 20 nov. 2009.
40
países, inclusive o Brasil. Apesar de ser um dado relevante da área da saúde, sob o
ponto de vista desta dissertação, acredita-se haver correlações sociais e
educacionais, que influenciam em diversos momentos essas práticas de violência.
Os diversos entendimentos e estudos sobre o fenômeno da violência
divergem em múltiplas esferas. Murad (2007) esclarece que a etimologia da palavra
“violência” é derivada do latim violentia. Sua raiz semântica (vis) remete à imposição
e/ou opressão a pessoas por uso da força em qualquer forma, sentido ou natureza.
Dadoun (1998, p.12), classifica o conceito de violência como: “todo sinal
extremo, ou de algum modo excessivo, (que) implica uma pressão, uma coação,
uma força – resumindo, uma violência”. A conceituação trabalhada por Dadoun é de
caráter filosófico, portanto mais genérico. Qualquer estudo sobre a violência
direcionada a um setor particular da vida social, como é o caso desta dissertação,
necessita teórica e metodologicamente fazer adequações de ordem mais concreta.
Em alguns pontos de suas reflexões, Dadoun adota o pensamento
biologicista, que coloca o ser humano como detentor da “maldade” (homo violens),
sendo esta, uma dimensão “natural” e formadora de sua constituição. Esta dimensão
é a geradora de conflitos e guerras, de preconceitos, exclusões e agressões.
Observando a conceituação de Dadoun do “homo violens”, pode-se, num certo
sentido, relacioná-la com a clássica “Teoria do Instinto” estruturada por Freud
(SANTOS, R., 1996; BECKER JÚNIOR, 2000), segundo a qual a violência do ser
humano é tão intrínseca a ele, que deve ser direcionada para fora, pois caso
contrário, poderia acarretar doenças psicossomáticas ou até mesmo levá-lo ao
suicídio, à autodestruição.
Além disso, Dadoun (1998) classifica três divisões do fenômeno da violência,
nomeando-as “figuras extremas da violência”: Gênesis, Extermínio e Terrorismo.
Não se compartilha aqui do pensamento da figura inicial do autor (Gênesis), no qual
se coloca que todos os seres humanos seriam descendentes do homicida Caim, que
mesmo no paraíso, não se importou em ceifar a vida de seu irmão Abel, desafiando
a autoridade e soberania das leis Divinas. Daí é que conclui ser a violência, um
elemento estruturante dos humanos. O autor ainda tece um polêmico pensamento
crítico sobre a expressão bíblica “feitos à imagem de Deus”, pois, se os humanos
41
são realmente forjados à Sua semelhança, seriam ambos, Deus e humanos, “Pai e
filhos”, “violentos por natureza”.
Se a violência é mesmo algo natural nos humanos, então será necessário que
as instituições criem “freios”, para conter essas agressividades e destruições. A isto,
Elias (1994) chamou de “processo civilizador”, no qual os esportes têm um papel
destacado, na contenção das práticas “naturais” da violência.
A segunda e terceira divisões do fenômeno da violência de Dadoun (1998),
“Extermínio” e “Terrorismo” respectivamente, diferem qualitativamente do ato
descrito antes. Enquanto o “Extermínio” teria uma visão quantitativa, buscando o
maior número de mortos e feridos, o “Terrorismo” buscaria uma ação com fins
qualitativos, objetivando abalar a moral, a coragem, a autoconfiança e a esperança
de seus inimigos. Exemplifica-se este ato de violência com os atentados em 2001 ao
World Trade Center (núcleo americano de empresas capitalistas), ao Pentágono
(núcleo americano de inteligência militar) e a Casa Branca (núcleo americano
político presidencial). Desta forma, o grupo terrorista responsável por essas ações
buscou atingir a diferentes esferas do governo americano, objetivando assim, um
sistemático e poderoso abalo da referida nação norte-americana.
Observando as conceituações de Dadoun (1998) sobre “Extermínio” e
“Terrorismo”, poderiam ser feitas correlações com a noção de “violência simbólica”
(BOURDIEU, 2000). Isto porque, a simbologia acaba sendo um instrumento de
ameaça e opressão quando se trata do terrorismo e de justificativa, no que concerne
ao extermínio. É importante sublinhar que os impactos psicológicos e morais da
“violência simbólica” também podem ser vistos nas práticas esportivas, de diferentes
modalidades, como por exemplo, nos métodos de autodefesa.
Adverte-se que o choque psicológico causado na população também é
estimulado pelos diversos veículos da mídia, que ostentam uma posição de poder e
influência na sociedade mundial (MACHADO, 2006). A mídia, mesmo indiretamente,
colabora com a construção de estereótipos, em relação às variadas ações culturais,
inclusive em relação aos esportes, atividades físicas e culturas corporais. José
Santos (2002) esclarece que a mídia que deveria ter apenas o papel de reportar, por
42
vezes de forma sensacionalista, passa a ter a postura de criar a realidade e em
vários momentos gerando uma realidade de caos e medo.
Entende-se que o “preconceito” é uma razão e das mais fortes, para a
ocorrência das práticas de violência, em distintos setores da sociedade (DADOUN,
1998). Historicamente, o ser humano se agrupa em uma crença, opinião e/ou ideia,
constituindo assim o conceito de etnocentrismo (MURAD, 2009). Se por ventura,
houver semelhantes seus que discordem dele, serão vistos como seres diferentes e
até mesmo
como oponentes;
percepção
esta
que poderá “justificar” as
transgressões, os vandalismos e as violências em diversas esferas (socialmente,
culturalmente e mesmo fisicamente).
É de se observar que o preconceito fere diretamente a filosofia taoísta de
igualdade de importância e interdependência fundamental dos seres, para
ambientes naturais e sociais; processo cíclico da natureza (LIMA, 2000).
No pensamento chinês, o ser humano – integrante do universo – é
tão importante quanto um inseto, uma montanha, o ar, as estrelas...
Cada qual tem seu papel a desempenhar nos ciclos pelos quais
passa o universo. Ao dar a si mesmo importância superior à dos
demais integrantes da natureza, colocando-se numa posição
dominante, o homem se esquiva da responsabilidade pela
manutenção da vida em harmonia consigo mesmo e, por conseguinte,
com o mundo. (LIMA, 2000, p.30)
Murad (2007, p.121) também diz que a “intolerância, que pode ser definida
como a dificuldade ou a impossibilidade de conviver e lidar com as diferenças (...)”, é
mais um forte meio de propagação da violência. Foucault apud Murad (2007) afirma
que a intolerância permeia a humanidade fazendo com que a mesma sempre
conviva com a criminalidade. No âmbito macro-sociológico, tem-se como um dos
mais evidentes exemplos históricos do preconceito e da intolerância, o Holocausto,
genocídio de 6 milhões de judeus pelos nazistas (II GGM). Já no âmbito microsociológico, poder-se-ia aqui, ser incluído como um dos exemplos, a violência
decorrente das práticas esportivas, conforme o que será visto a seguir.
43
2.3.2 Relação da Violência com o Esporte em geral e com o Kung-Fu
Capez (2003, p.XI) afirma que “a violência constitui uma das expressões
primitivas do ser humano. Em todas as épocas e em todas as sociedades sempre
houve violência. No campo desportivo não poderia ser diferente”. Calhoun (1987)
cita quatro interpretações de como a violência se insere no meio esportivo: a) o
desporto contribuindo para a diminuição da violência; b) o desporto contribuindo
para o aumento da violência; c) a violência desportiva é o reflexo da violência da
sociedade; e d) o simbolismo como evidência.
No pensamento inicial é dito que o esporte pode servir como válvula de
escape da tensão e do estresse, funcionando também como mecanismo de controle
da violência e da agressividade do dia-a-dia. Assim, proporcionaria ao indivíduo, um
meio de catarse, que consequentemente, oferece alguma parcela de “prazer” a
quem realiza o ato catártico.
No segundo aspecto, coloca-se que a experiência desportiva é um meio que
possibilita a estimulação do ego para os vitoriosos e proporciona decepções aos
derrotados. Assim, o meio desportivo seria um “ninho de sentimentos conturbados”
que poderiam alimentar manifestações antagônicas e estas causarem práticas de
violência.
Na terceira reflexão posiciona-se a hipótese que a violência no desporto é o
reflexo da manifestação de violência, permeada já de forma sólida, na sociedade. O
autor ainda faz alusão sobre as similaridades da “guerra” com os chamados
“desportos guerreiros”, considerando que ambos caminham de forma paralela e até
convergentes, um estimulando e auxiliando no treinamento e no desenvolvimento do
outro.
Finalmente, na quarta parte, é trazida à luz que a violência manifestada no
meio esportivo deveria ser expressa abertamente na sociedade. Entretanto, por
algum motivo, foi reprimida. Deste modo, ela se materializa em diferentes formas de
44
agressão, como por exemplo, as brigas de galo, representando ali uma defrontação
simbólica entre os indivíduos espectadores.
A classificação descrita acima é interessante e ao mesmo tempo discutível.
Interessante, porque instrumentaliza a reflexão e a investigação, sistematizando-as.
Discutível, porque como quase toda classificação parece ser, de certa forma,
dicotômica, cartesiana, onde um pólo da reflexão acaba por excluir o outro. Talvez, a
melhor forma de compatibilizar essas duas dimensões seja aproximar as quatro
interpretações. Neste caso, os fatores operariam modos de convergência e
interseção, onde cada um pode e deve influenciar os demais. Barroso, Velho e
Fensterseifer (2005) concluem que, equipes esportivas como um todo são um tipo
de micro-sociedade contendo suas decorrências (frustrações, culturas, sentimentos,
história e grupos sociais).
Para fins de esclarecimento, busca-se nesta dissertação adotar o primeiro
pensamento descrito: o esporte (uma das vertentes do Kung-Fu) é capaz de ser uma
ferramenta útil para contribuir na diminuição da violência. Faz-se necessário
acrescentar ainda, que o referido pensamento pode ser estendido do esporte, para
outras atividades físicas e culturas corporais.
Todavia, o primeiro pensamento citado, não deve excluir a possibilidade da
convergência com outro elemento assinalado na classificação: que a sociedade
também influencia as práticas corporais e esportivas, bem como seus sentidos éticos
e morais. Não é demais reforçar que o pensamento anterior sintetiza uma das
principais metas da presente dissertação.
Aprofundando o assunto no âmbito esportivo, Elias (1994) sugere a
possibilidade da “violência natural” poder e dever ser contida pelos mecanismos
civilizatórios, como a lei, as instituições e a educação. Também se lembra aqui de
um dos clássicos fundadores da sociologia enquanto ciência, Dürkheim (1968), que
chegou a trabalhar sobre a ideia de que a educação é “uma segunda natureza”, no
sentido de conter e “civilizar” a natureza de origem dos seres humanos.
Compartilhando com a ideia anterior, Antônio Santos (2005, p.14) diz que:
A organização e prática do esporte sem considerar a ética e a moral,
podem levar as pessoas a desacreditarem nos valores positivos que
45
podem ser agregados quando da prática do esporte em todas as suas
dimensões: educacional, comunitário, recreativo, adaptado e no alto
rendimento, a partir de uma prática orientada para a valorização e
respeito da pessoa humana.
O mesmo autor ainda correlaciona as discussões sobre a ética e a moral
dentro do meio esportivo com o aumento da violência em diferentes esferas sociais.
A visível mercantilização dos diferentes setores sociais, incluindo o meio esportivo,
nas últimas décadas, pode ser um dos aspectos dessa temática. É importante não
esquecer a valorização da imagem dos desportistas como seres humanos, nunca
ignorando seus sentimentos, emoções, limites físicos e psicológicos (BENTO, 1989;
SANTOS, A., 2005). Assim, perfaz-se novamente o conceito de holismo.
De forma muito clara e direta, Antônio Santos (2005, p.18) afirma que:
em relação à ética no esporte é necessário o empenho de todas as
pessoas envolvidas com esse fenômeno, através de ações como: a
defesa de uma prática esportiva pautada em valores morais éticos e
deontológicos; que sejam dotados dentro do ponto de vista de uma
ética de responsabilidade, situando-nos no interior do esporte para
criticá-lo; e finalmente, criticar o universo do esporte moderno em
nome de promessas que ele faz e não cumpre.
Acredita-se que as filosofias de paz e os “9 preceitos do estilo Garra de
Águia”, servem como base pedagógica e educacional do Kung-Fu no referido estilo,
posicionando-se de forma a suprir alguns dos pontos problemáticos relatados acima.
A discussão sobre valores educacionais, ética e moralidade no universo
desportivo, traz à luz a temática do Fair-Play, filosofia que busca a elevação do
chamado
“espírito
esportivo”,
dentro e fora
dos eventos e
competições
(CAPINUSSU, 2004). Tubino, Tubino e Garrido (2007, p.52) entendem que Fair-Play
é o movimento de entidades/associações e esportistas no sentido de
enfrentarem a exacerbação e os abusos cometidos no campo do
esporte que arranham a própria essência da prática esportiva, a qual
deve estar sempre referenciada em padrões éticos em todas as suas
manifestações.
46
Dessa forma, procura-se atingir ações de violência indireta, como: racismo,
abuso de autoridade política e financeira, agressões físicas e simbólicas (como
cuspir no adversário e em algumas práticas dos movimentos Hooligans e Ultras46),
ofensas verbais, bullying47, dopping48, dentre outros.
Antônio Santos (2005) também coloca que o “espírito esportivo” estrutura as
normas do esporte, mesmo que não descritas nos estatutos e regulamentos do
mesmo. São pautadas em um “código de ética popular”, objetivando respeito,
tolerância e igualdade. Esse pensamento converge com o de Bento (1990, p.27),
que em um ponto de vista sociológico, cita que: “A ética do desporto é parte de uma
problemática que abrange todos os domínios da actividade humana”.
Relacionado ao fenômeno da violência, identifica-se o fenômeno do “Poder”.
Arendt (2009) afirma que a violência é um fenômeno diretamente imerso na questão
do poder, pois manifestações violentas acontecem em realidades em que o poder foi
abalado ou desintegrado de alguma forma, ocasionando rebeliões diversas no
sistema vigente.
Sartre apud Arendt (2009, p.52) tece o conceito de “poder”, que
ao que tudo indica, é um instrumento de domínio, enquanto o
domínio, assim nos é dito, deve a sua existência a um ‘instinto de
dominação’. (...) ‘um homem sente-se mais homem quando se impõe
e faz dos outros um instrumento de sua vontade’, o que lhe dá um
‘prazer incomparável’. ‘O poder’, disse Voltaire, ‘consiste em fazer
com que os outros ajam conforme eu escolho’.
46
Classificação de torcedores extremistas. Seriam eles: “(...) adeptos que fazem qualquer sacrifício
pessoal, financeiro ou mesmo familiar por sua equipe. Possuem profundo orgulho em ter essa postura
e conseqüentemente, adquirem um comportamento radical e violento”. (MURAD, 2007, p.36)
47
“O fenômeno bullying compreende todas as formas de atitudes agressivas, intencionais e repetidas
(de maneira insistente e perturbadora), que ocorrem sem motivação evidente e de forma velada,
sendo adotadas por um ou mais estudantes contra outro(s), dentro de uma relação desigual de
poder.” (BOTELHO; SOUZA, J., 2007, p.58).
48
O termo varia entre Dopping, Doping e Dopagem. O Comitê Olímpico Brasileiro (COB) define
através de seu Departamento Médico (2003, p.4) que: “Considera-se dopagem a utilização de
substâncias ou métodos que seja potencialmente prejudicial à saúde do atleta, ou capaz de aumentar
artificialmente sua performance, o que se caracteriza pela presença no corpo do atleta ou por
evidência de uso de substâncias proibidas, ou ainda por evidência de uso de métodos proibidos,
conforme relação divulgada pelo Comitê Olímpico Internacional (COI) e pela Agência Mundial
Antidoping (WADA)”.
47
O poder na verdade, é constituído bilateralmente, caracterizando-se como um
equilíbrio de necessidades (ELIAS; DUNNING, 1992; ELIAS, 1994). Se um primeiro
grupo detém a posse de algo que um segundo grupo deseja, é possível o primeiro
ter poder de barganhas sobre o segundo, estruturando-se um processo de
exploração, que de acordo com a índole e os valores morais dos detentores do bem
em questão, pode chegar a níveis desumanos (ALMEIDA, S., 2009). É argumentado
por José Santos (2002) que a própria violência é um instrumento do poder de
múltiplas formas de utilização. Assim, é realizada uma imposição sobre o outro,
fazendo uso da repressão ou mesmo da força física, denegrindo dessa forma a
sociedade em questão.
Elias apud Lucena (2007, p.2) explica que
o equilíbrio de poder não se encontra unicamente na grande arena
das relações entre os Estados, onde é freqüentemente espetacular,
atraindo grande atenção. Constitui um elemento integral de todas as
relações humanas.
É importante notar que a ênfase de Elias recai sobre todas as relações
humanas, portanto, em todas as suas atividades, econômicas, políticas e culturais.
Sendo assim, o esporte e o Kung-Fu como atividades culturais e relações humanas,
não estão isentos desses contextos de violência.
Correlacionando o conceito de “Poder” com teorias da violência no meio
esportivo, para direcionar as reflexões ao foco sócio-educacional (objetivo da
pesquisa), estabelecem-se relações entre o “Poder” e a “Teoria da Aprendizagem
Social” (SANTOS, R., 1996; BECKER JÚNIOR, 2000), a qual se concretiza através
de dois meios: sucesso e imitação.
O formato do sucesso expõe-se claramente quando um indivíduo é agressivo
ao extremo com seu adversário durante uma prática esportiva e consegue assim,
fazer com que o mesmo poste-se submisso a si. Atingindo esse objetivo o agressor
sempre repetirá essa ação em uma situação semelhante. Por outro lado, o formato
da imitação faz-se bastante presente no caráter educacional e mesmo cultural de
atletas de esportes em geral, refletindo na representação de valores, símbolos e
ídolos de sua educação e cultura. Um exemplo desse pensamento é a reprodução
48
da conduta agressiva de jovens desportistas (ou mesmo do cidadão), fãs de atletas
reconhecidamente violentos pela sociedade (BENTO, 1990).
Avalia-se sociologicamente a vinculação (ou a não-vinculação) da “Teoria da
Aprendizagem Social” com as ponderações de Murad (2009) sobre a Etocracia.
Assim sendo, se a Etocracia é mesmo a melhor forma de se educar líderes
(políticos, profissionais, esportivos e familiares), necessita-se de fundamentos éticos
e morais, para sustentar sua formação e de preferência que esses preceitos éticos
estejam enraizados na cultura, no habitus49 do povo (BOURDIEU, 1990). No caso
em estudo, o Kung-Fu, pode-se exemplificar com o preceito “número 9 do estilo
Garra de Águia”50,
elemento filosófico da cultura do povo do Oriente, que foi
incorporado a essa arte marcial.
Trazendo essa reflexão para a realidade brasileira, é possível comprovar que
a temática “violência” não foge à rotina do cidadão comum. Atualmente, observa-se
a discussão da violência, não só em estudo nos meios acadêmicos, mas também,
sob o dia-a-dia da população através de noticiários, jornais e veículos da mídia.
Pontua-se que a agressão e a violência humana são dois dos principais assuntos
nas conversas cotidianas na sociedade brasileira (BOTELHO; SOUZA, 2007).
Segundo o pensamento de José Santos (2002, p.22): “Na vida cotidiana, realiza-se
uma inter-relação entre mal-estar, violência simbólica e sentimento de insegurança”.
Tem-se como exemplo da repercussão desse impacto na atualidade, a revista
“Veja”51 noticiando como uma de suas principais reportagens o tema “Civilidade”,
diretamente ligado às questões da violência no cotidiano do cidadão brasileiro.
Durante o transcorrer da matéria, são feitas pontuações com o objetivo de, segundo
a própria revista, “segurar o monstro interior”. São descritas posturas de valor moral
e educacional que buscam a harmonização do ser humano em seu cotidiano com
fatos ocorridos e com seus próximos: honradez, integridade, boas maneiras,
49
Segundo Bourdieu, “(...) é uma matriz cultural que predispõe o indivíduo a fazer suas escolhas”
(MURAD, 2009, p.123).
50
Preceito “número 9 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a ser exemplo vivo da filosofia e
da ética dos mestres”.
51
Edição nº 44, publicada com dez páginas em 4 Nov. 2009. A escolha dessa revista se deve pela
mesma deter o posto de revista com a maior circulação na América Latina, demonstrando assim, sua
importância em meio à sociedade brasileira.
49
tolerância, autocontrole, civilidade, honestidade, contenção verbal, desculpar-se e
decoro. Essas posturas disciplinares tentam ser alcançadas através da prática dos
ensinamentos nos preceitos marciais do estilo Garra de Águia por seus praticantes,
objetivando assim, serem exercitadas habitualmente por adeptos dessa arte marcial.
Miki (2003) coloca que o ser humano por muitas vezes toma atitudes de forma
egoística pensando somente em si e não no próximo, movido levianamente pelas
emoções, ignorando por muitas vezes o raciocínio lógico e a visão do “outro”. Por
isso desenvolve práticas de violência; uma clara representação do ego humano.
Acredita-se que a “Teoria da Frustração” (SANTOS, R., 1996; BECKER
JÚNIOR, 2000), conecta-se diretamente ao sentimento egoístico do ego humano
relatado anteriormente, pois o egoísmo se caracteriza pela imposição das vontades
pessoais sobre quase tudo e quase todos. Desta forma, quando essas vontades não
são realizadas é possível brotar o sentimento de frustração, o qual pode ser o
prenúncio de práticas violentas. Berkowitz apud Becker Júnior (2000, p.253)
expressa que: “a frustração estimula um estado emocional que pode ser de raiva,
criando uma predisposição para um ato agressivo”. Em outras palavras, uma prédisposição para as diversas práticas de violência, que hoje permeiam a sociedade,
inclusive no mundo esportivo.
Jefremovas (2003) afirma que o Kung-Fu já foi utilizado como ferramenta de
combate ao vício do uso de drogas em adolescentes do sexo masculino. Observouse que não só o exercício físico, mas todos os ensinamentos filosóficos ajudaram os
jovens participantes a enfrentarem as dificuldades que passavam, auxiliando-os no
controle de suas ansiedades, raivas e angústias. Na mesma obra, relata-se que nos
Estados Unidos da América (EUA), houve casos do Tai Chi Chuan ser utilizado, sob
ordem judicial, como forma de controle da “raiva”, para jovens infratores.
A partir das conceituações citadas acima, é possível criar um elo com a
“Teoria das Agressividades Benigna e Maligna” (FROMM apud MURAD, 2009), que
tocam em um assunto relevante, quando se pretende fazer a diferença entre
violência e autodefesa, dimensão presente no Kung-Fu estilo Garra de Águia.
Direcionando esse raciocínio para o meio esportivo, observa-se a
“agressividade benigna” em atos vistos algumas vezes como bruscos e de grande
50
aspereza. Podem ser ações legalizadas pelo regimento do desporto em questão e
com maior ligação a autodefesa do que a violência. Essas atitudes muitas vezes não
são estimuladas pela violência e sim pela competitividade. Segundo a Psicologia
Esportiva, isso seria um comportamento assertivo, respeitando as regras, porém
tendo uma atividade intensa, ao tendo intenção de lesionar os colegas esportistas
(BARROSO;
VELHO;
FENSTERSEIFER,
2005).
Concordando
com
esse
pensamento, Lima (2000, p.113) diz que: “Sermos agressivos ao compreendermos
algo significa termos determinação e energia direcionada para uma tarefa específica
(o que é bastante diferente de sermos violentos ao cumprir essa mesma tarefa)”.
Já
analisando
a
chamada
“agressividade
maligna”,
presencia-se
a
manifestação de atitudes que ferem o regulamento e a ética do desporto em
questão, destacando que essas ações são “cruéis e violentas”, desprezando a
integridade e o bem-estar do colega adversário (que neste caso é confundido e
tratado como se fosse inimigo).
Focando a “violência no esporte”, Dunning (1990) traz múltiplas avaliações e
divisões sobre a temática da chamada “violência calculada”. Identificando as razões
da causa ou mesmo da origem da violência no meio esportivo, o referido autor
coloca a violência com três divisões estruturais: instrumental, manifesta e endêmica.
A “violência instrumental”, também conhecida como “violência calculada”,
remete a razões lógicas da violência, podendo ter características de estratégia e
planejamento, com intuito de intimidação psicológica e moral, ou mesmo ainda, de
agressão física de uma forma específica, visando prejudicar seus adversários, desta
forma, lhe dando vantagens.
Posteriormente, a “violência manifesta” toca na questão emocional do
indivíduo, manifestando-se quando o mesmo se deixa levar pelo calor das emoções
que venham a surgir durante as diversas práticas do desporto. Reforça-se
novamente aqui, uma manifestação do ego humano.
Finalmente, a “violência endêmica” representa o referido fenômeno da
violência disseminado sociologicamente pelas esferas de uma sociedade. Entendese assim, que essa manifestação atinge um nível “doente” e sem controle do
fenômeno da violência, tornando-se um dos fatores que alimentariam a barbárie.
51
Novamente esclarece-se que, não se tem aqui o objetivo utópico de que as
atividades físicas, culturas corporais, esportes ou mesmo as artes marciais podem
“curar a sociedade” do comportamento violento que a mesma manifesta diariamente
em todo o mundo; pois, como afirmaram Minayo e Souza (1998, p.522), a violência:
“é um fenômeno histórico, quantitativa e qualitativamente, seja qual for o ângulo pelo
qual o examinemos (conteúdo, estrutura, tipos e formas de manifestação)”.
Entretanto, concorda-se com o pensamento de Elias e Dunning (1992), que
as três divisões citadas são capazes, sim, de chamar a atenção para a necessidade
de processos de educação, que visem o aprendizado do controle de sentimentos
turbulentos
(como
raiva,
euforia,
frustração
e
egoísmo),
por
meio
das
regulamentações, das leis e regras das referidas atividades. E neste caso, os
esportes são campo de experiências favoráveis ao “controle civilizacional” (ELIAS;
DUNNING, 1992) das violências humanas.
Poder-se-ia dizer então, que em tempos atuais, os esportes, incluindo as
artes marciais, podem ser um meio de “curialização52 contemporânea” para seus
praticantes, servindo diretamente para elevar o caráter sócio-educacional objetivado
no início deste capítulo.
Em 2004, o Campeonato Europeu de Futebol (Eurocopa) realizado em
Portugal, apresentou como lema de seu evento esportivo, um pensamento que só
vem a confirmar as reflexões de Elias e Dunning (1992), que mesmo sendo
originária de um evento de futebol é plausivelmente possível de relacioná-lo com
todo o meio do esporte e da cultura corporal: “A atividade desportiva é um fator
cultural indispensável na formação plena da pessoa humana e no desenvolvimento
civilizacional das sociedades” (MURAD, 2007, p.54).
Essa é uma das metas da filosofia educacional que permeia o Kung-Fu,
inclusive o estilo Garra de Águia. É bom reiterar que os esportes, atividades físicas e
culturas corporais não serão a solução para as diversas práticas de violência que
permeiam a sociedade. Todavia, poderão contribuir para a educação e reeducação,
especialmente de crianças e adolescentes. O preceito “número 1 do estilo Garra de
52
“(...) processo de transformação da nobreza guerreira em nobreza de corte (...)” (VIEIRA, M., 2003,
p.3).
52
Águia”53 é trabalhado sobre a ideia da paz. Murad (2007) esclarece que o Fair-Play
caminha de mãos dadas com a cultura e a educação. Bento (1990, p.29)
complementa dizendo que: “O desporto é um campo de cultivo de ‘fair-play’, do
respeito pela pessoa humana”.
Acredita-se também que os esportes são parte integrante de qualquer cultura
e sociedade. Porém, as variantes sócio-educacionais que permeiam essas
sociedades influenciam diretamente no meio desportivo, podendo alterar a imagem,
as regras ou mesmo os valores morais que os esportes transmitiriam. Portanto,
defende-se que não só os esportes podem influenciar uma sociedade, mas também
uma sociedade pode solidamente influenciar os esportes, constituindo assim o que
se nomeia aqui “bilateralidade sócio-esportiva”. Dessa forma, acredita-se também
que haja um combate direto sobre a manifestação da violência na questão da práxis
sócio-política (MINAYO; SOUZA, 1998).
Por fim, para além das expectativas que recaem sobre as “culturas
esportivas” (esportes, atividades físicas e culturas corporais), a arte, em toda sua
magnitude, também é um dos alicerces histórico-culturais, a partir dos quais as
sociedades humanas constroem as suas identidades coletivas (MURAD, 2007).
O esporte (e também a arte) tem sido isto, preponderantemente
(apesar de suas contradições e mazelas), na humana história de
nossa espécie: para além de uma atividade lúdica de alta
fecundidade simbólica, tem-nos apontado aprendizagens éticas, por
vezes superiores às de outras instituições sociais. (MURAD, 2007,
p.106)
Dentro dessa perspectiva, a presente dissertação parte da hipótese que as
artes marciais, incluindo o Kung-Fu, seriam instrumentos de grande valia para
abordagens sócio-educacionais, pois:
a) Integram objetivamente tanto o universo das Artes quanto das Culturas
Esportivas;
53
Preceito “número 1 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a treinar corpo e espírito para a
paz”.
53
b) São conhecidas e difundidas ao longo da história em diversas sociedades
do mundo;
c) São estudadas, desenvolvidas e propagadas não somente através do
conhecimento tácito e empírico, mas através de centros de produção de
conhecimento e pesquisa (Universidades, Faculdades e Escolas);
d) Suas práticas buscam quase que constantemente trabalhar em prol do
aperfeiçoamento de seus praticantes, de modo generalizado e holístico,
perfazendo assim as áreas afetiva, cognitiva e psicomotora;
e) Suas temáticas perpassam diversas esferas que constituem muitas
sociedades
ao
redor
do
mundo,
tornando-as
assim,
temáticas
transdisciplinares;
f) Toda
conduta
e
postura
adotadas
por
qualquer
praticante,
independentemente de seu nível de graduação, deve ser norteada pelos
conceitos éticos e morais, que fazem parte da estruturação históricofilosófica das artes marciais.
Partindo-se da premissa que o Kung-Fu seja não só uma arte marcial, mas
também uma “cultura esportiva”, objetivando não apenas a autodefesa, mas a
promoção da saúde e o amadurecimento comportamental, possuindo movimentos
de plasticidade e elegância, talvez a presença feminina em diversas equipes pelo
Brasil tenha se tornado mais visível. Apolloni (2004b) diz que sob sua observação
empírica, as mulheres são minoria em equipes das cidades de Curitiba, São Paulo,
Campo Grande e Florianópolis. No entanto, sob a experiência do autor desta
dissertação, há que se ressaltar que o quantitativo feminino em eventos e
competições de Kung-Fu pelo país é crescente e significativo, principalmente
quando comparado a outros métodos de autodefesa.
Segundo Pimenta (2009, p.1), hoje,
as artes marciais são reconhecidas popularmente como práticas
relacionadas a manifestações corporais tendo suas variações
centradas em métodos que exercem sua influência ‘técnica’ em
defesa pessoal, ‘bem estar’ e esporte de alto nível.
54
O referido autor esclarece também, que a teoria do “processo civilizador” de
Elias (1994) relaciona-se diretamente com o aprimoramento do autocontrole.
Defende-se que o trabalho de Elias deixa clara a necessidade de domar os instintos
violentos (ALMEIDA; CORBETT; GUTIERREZ, 2009). Portanto, as manifestações
das artes marciais em meio ao reconhecimento da sociedade possuem utilidades de
autodefesa, promoção da saúde e atividades desportivas aos seus adeptos,
afastando-se da hipótese de ser, diretamente, um meio gerador de violência. É
possível que essa visão torne-se um exemplo das reflexões de Elias (1994) sobre o
“processo civilizador”, neste caso utilizando o Kung-Fu como a ferramenta esportiva
e civilizadora, conforme referido neste trabalho.
Além disso, é possível efetuar uma ligação dos princípios já relatados das
artes marciais e do Kung-Fu, com o pensamento de Murad (2009) sobre o “zeitgeist”,
expressão alemã que significa “espírito de época”, remetendo à questão de
mudanças de pensamentos de acordo com o período de tempo vivido. Nota-se que
mesmo com o passar de séculos, o Kung-Fu, com seus princípios e ensinamentos
que objetivam a paz, espírito essencial da autodefesa, manteve-se firme em suas
filosofias e posturas, sendo ministrado até os dias de hoje sob essa perspectiva
pacificadora. Elias (1994) defende o pensamento que os esportes, em tempos
atuais, elevaram as questões disciplinares e de caráter civilizacional. Contudo,
acredita-se que o Kung-Fu desde seus primórdios possui esses objetivos, sendo os
mesmos desenvolvidos paralelamente com o aprendizado de autodefesa e a
superação física e mental.
Mesmo sob uma perspectiva desportivo-competitiva, que não objetivamente
preza pelo ministrar das filosofias de forma explícita, esses princípios e
ensinamentos estão mesclados ao treinamento54, a postura comportamental dentro
da área de aula55 e respeito aos colegas praticantes56 (mesmo que sejam de outra
54
Preceito “número 4 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a persistir no aperfeiçoamento
físico, mental e espiritual”.
55
Preceito “número 8 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a zelar pelo respeito devido ao
Kung-Fu”.
56
Preceito “número 2 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a reverenciar nossos ancestrais
e respeitar mestre, professores e colegas”.
55
equipe, luta ou arte marcial)57, tendo em mente que o praticante passa a não só
representar a si mesmo, mas também, toda sua equipe e seus superiores58,
mantendo vivo o “espírito” da arte marcial (ALMEIDA; CORBETT; GUTIERREZ,
2009). Concordando, Lima (2000, p.35) deixa claro que:
(...) esta arte não pode ser considerada apenas como um esporte que
exige treinamento de alto nível ou como técnica de defesa pessoal,
enfocando seu lado puramente “mecânico”. Se isto ocorrer, o lado
mais importante e diferencial do kung fu, que é o aspecto filosófico,
correrá o risco de ficar em segundo plano, invertendo os valores nas
artes marciais.
Partindo para o ponto de vista do educador, não só é de preocupação
profissional, mas de preocupação civil e mesmo humana, que seus alunos “moldem”
mais que seus corpos; mas sim, suas atitudes e comportamentos. Busca-se o
amadurecimento de suas condutas e posturas dentro da sociedade, perfazendo
novamente o conceito pedagógico do Kung-Fu de forma holística59 (LIMA, 2000).
Finalmente, de pleno acordo com o pensamento de Lima (2000), as diversas
filosofias educacionais observadas dentro do Kung-Fu colaboram para que o mesmo
possa servir de “ferramenta educacional” em temas de diversas interseções
culturais, como filosofia, história, sociologia, ética, saúde, esporte, autodefesa, arte e
ecologia60. Isso faz do Kung-Fu uma cultura transdisciplinar.
57
Preceito “número 7 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a respeitar as demais filosofias e
artes marciais”.
58
Preceito “número 9 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a ser exemplo vivo da filosofia e
da ética dos mestres”.
59
Preceito “número 6 do estilo Garra de Águia”: “Eu me comprometo a contribuir para que nosso meio
não ofereça abrigo aos mal intencionados”.
60
“(...) o tradicional conceito chinês de "seres humanos e a natureza como um só" (tian ren he yi)
enfatiza a ligação do corpo com o ambiente ao seu redor, uma filosofia que é evidente na medicina
tradicional chinesa. Este é um conceito "verde" para o esporte, que poderia fornecer algo à filosofia
do Olimpismo que carece desse ponto”. (BROWNELL, 2008, p.76-77) (Tradução nossa).
56
3 METODOLOGIA
3.1 Formato da Pesquisa
Seguindo como referência Thomas, Nelson e Silverman (2007), o trabalho foi
efetuado principalmente com técnicas de caráter qualitativo, porém, fazendo uso de
elementos e dados quantitativos complementares.
A arte ministrada que é o objeto de estudo desta pesquisa é o estilo Garra de
Águia (Yen Jao Fan Zi), fundada pelo então General Ó Fei (1103-1142), tendo sido
introduzida e transmitida na América Latina pelo Grão-mestre Li Wing Kay em 1970.
Em meio a tantos estilos e ramificações dentro do Kung-Fu, foi selecionado o estilo
Garra de Águia por ser este o campo principal de observação, experiência, pesquisa
e análise do autor desta dissertação.
Para alcançar os objetivos já propostos, foram descritas e conceituadas as
técnicas da primeira graduação (faixa branca), sob os pontos de vista sócio-cultural
e funcional, isto é, a funcionalidade da técnica. A graduação faixa branca foi
escolhida para a investigação por ser nela que o educando tem seu primeiro contato
com a arte marcial e com seus princípios primordiais, valores éticos e morais,
descritos nos “9 preceitos do estilo Garra de Águia” e no “programa pedagógico” da
equipe estudada – ambos nos anexos desta dissertação.
A investigação in loco nas áreas de atuação da citada associação, buscou
adequar-se aos moldes de um estudo de caso objetivando a convergência entre
duas dimensões complementares: a) dimensão quantitativa, para contextualizar com
dados numéricos as informações e resultados da pesquisa e b) dimensão qualitativa,
a fim de analisar os limites entre práticas de violência e valores educacionais no
Kung-Fu estilo Garra de Águia e no dia-a-dia de seus jovens praticantes.
Além disso, Thomas, Nelson e Silverman (2007, p.30), assinalam que:
O estudo de caso serve para fornecer informações detalhadas sobre
um indivíduo (ou instituição, comunidade etc.). Seu objetivo é
57
determinar características singulares de um sujeito ou de uma
condição. Essa técnica de pesquisa descritiva encontra-se
amplamente disseminada em áreas como medicina, psicologia,
aconselhamento e sociologia. O estudo de caso também é utilizado
na pesquisa qualitativa.
Concordando com as conceituações técnicas metodológicas citadas, Faria Jr.
e Farinatti (1992), esclarecem que o estudo de caso deve ter suas limitações muito
claras e definidas. Mesmo o caso sendo semelhante a qualquer outro, o mesmo é
sempre único, ímpar e singular por possuir um interesse particular. De forma
concreta, procura-se esclarecer o tema pesquisado, como dito na seguinte citação:
“O estudo de caso é considerado qualitativo quando se desenvolve numa situação
natural, com rica descrição, segundo um plano aberto e flexível e focaliza a realidade
de forma complexa e contextualizada” (FARIA JR.; FARINATTI, 1992, p.31).
3.2 Contexto e Participantes
Realizou-se a pesquisa de campo em três núcleos (academias) onde são
ministradas as aulas do estilo Garra de Águia da Associação de Kung-Fu Shaolin de
Niterói (AKSN). A pesquisa envolveu três momentos com os participantes: a) no
primeiro, todos os alunos praticantes durante as aulas (observação participante); b)
no segundo, os alunos de mais de 1 ano de prática da arte (questionário); e por fim,
c) no terceiro, 6 alunos que possuam mais de 5 anos de prática da arte selecionados
de maneira aleatória (entrevista).
O primeiro momento foi escolhido para observar de maneira generalizada e
ampla os praticantes dentro de seu ambiente de treino (kwan). O segundo momento,
para coleta de dados quantitativos analisando os motivos de ingresso e permanência
na arte marcial Kung-Fu de alunos que ainda possuem pouco tempo de prática (1
ano), porém defende-se aqui a hipótese que os mesmos já apresentem alguma
58
mudança comportamental creditada aos ensinamentos derivados das aulas de
Kung-Fu. O terceiro e último momento, para tentar captar de praticantes mais
experientes (ao menos 5 anos de prática) as possíveis mudanças comportamentais
que a prática do Kung-Fu possa ter gerado em seus cotidianos.
Justifica-se a necessidade do uso de menores de idade (ou seja, indivíduos
com menos de 18 anos de vida), pois a presença majoritária dessa faixa etária nas
academias e outros centros de treinamentos de artes marciais (principalmente em
Niterói) se faz visível. Indo ao encontro da afirmação narrada anteriormente, pontuase que a conceituação de “jovem” estipulada para esta pesquisa foi de 14 a 25 anos.
3.3 Instrumentos de Coleta de Dados
Para a captação dos dados da pesquisa de campo, se fez uso de três
instrumentos diferenciados: a) uma “observação participante” durante os treinos da
AKSN para analisar se a prática dos alunos dentro de aula condiz com as teorias
levantadas na revisão de literatura; b) um “questionário fechado” para captação de
dados estatísticos concretos; e c) uma “entrevista semi-estruturada” individual e em
profundidade, como relata Bauer e Gaskell (2007), para o levantamento das
informações qualitativas.
A “observação participante” foi eleita como ferramenta por ser um
instrumental técnico e metodológico de vivência na realidade sócio-institucional,
onde acontecem as redes de relacionamento entre pessoas que fazem parte do
campo da investigação. Aqui, poder-se-ia fazer conexão com o chamado método
axiológico (THOMAS; NELSON; SILVERMAN, 2007, p.205) que trata “dos valores
gerais das coisas”. Nesse sentido, a utilização dessa metodologia ajudará na
consistência da análise dos preceitos do estilo Garra de Águia, uma vez que esses
preceitos são os valores (axiologia) mais gerais da modalidade em questão e serão
59
referências para a observação.
Selecionou-se também o “questionário fechado”, pois com sua utilização
pode-se
obter
dados
matemáticos
e/ou
estatísticos
concretos
fornecendo
informações palpáveis (logo, credibilidade) para a pesquisa. Observa-se que o
referido questionário foi validado por 3 professores doutores do programa de
mestrado Strictu Senso em que se encontra o autor desta dissertação.
Por fim, também foi utilizada uma “entrevista semi-estruturada” (ou
focalizada), pois, através dela, o entrevistador faz questionamentos específicos
objetivamente focados no tema principal da pesquisa. Todavia, permite que o
entrevistado responda aos questionamentos de forma livre e espontânea (ALVESMAZZOTTI; GEWANDSZNAJDER, 2002) permitindo, “explorações não-previstas,
oferecendo liberdade ao entrevistado para dissertar sobre o tema ou abordar
aspectos que sejam relevantes sobre o que pensa” (NEGRINE, 1999, p.74).
3.4 Análise de Dados
Os dados quantitativos foram obtidos através da “observação participante” e
do “questionário fechado”, que buscaram respectivamente, analisar quantas vezes
os alunos efetuam ações que teoricamente vão contra os ensinamentos do Kung-Fu
grifados na revisão de literatura e quais foram os motivos que levaram os alunos a
ingressarem e permanecerem nos treinos da referida arte.
Posteriormente, os dados qualitativos adquiridos pela “entrevista semiestruturada” foram interpretados fazendo uso da técnica de análise de conteúdo
descrita por Bardin (2004).
60
3.5 Procedimentos Éticos
Tendo como referência o Manual para Elaboração de Trabalhos Acadêmicos
(META) da instituição (UNIVERSO, 2006), os dados fornecidos pelos alunos
selecionados para a pesquisa serão mantidos em inteiro anonimato e sua captação
apenas teve início após a aprovação do Conselho de Ética da Universidade Salgado
de Oliveira. A pesquisa foi autorizada com o devido termo de consentimento da
AKSN assinado por um de seus membros responsáveis. Os alunos receberam um
“Termo de Consentimento Livre e Esclarecido” (TCLE), sendo que o mesmo teve de
ser assinado por um responsável legal quando o educando fosse menor de idade
(menos de 18 anos).
Com o objetivo de elevar a consistência e credibilidade da pesquisa, foi
efetuado o método “checagem pelos participantes” não só defendido por AlvesMazzotti e Gewandsznadjer (2002), mas também por Negrine (1999). Nesse método,
se entrega a transcrição das entrevistas aos participantes avaliados para
corroborarem se o que realmente expressaram está descrito de forma fiel nos
documentos.
Pontua-se também que as entrevistas foram feitas em locais que sejam
considerados pelos entrevistados de ambiente cordial, como orientam Thomas,
Nelson e Silverman (2007), para estimular respostas francas e verdadeiras em seu
inteiro teor, sem intimidar os participantes.
61
3.6 Subjetividade do Pesquisador
O pesquisador (figura 8) iniciou sua vida desportiva marcial aos 6 anos de
idade, quando praticou Karatê (estilo Shotokan). Posteriormente, com 8 anos,
mudou sua prática para o Judô estimulado pelo sucesso em competições de um
primo mais velho. Dentro das aulas de Judô desenvolveu sua disciplina e respeito
aos antepassados, aos superiores e zelo ao local de treino. Por motivos de choques
de horários do cotidiano, abandonou os treinos de artes marciais.
Na adolescência, enveredou-se para o Atletismo e principalmente para o
Handebol, esporte que atuou por 8 anos. Porém, aos 14 anos, sua curiosidade sobre
a cultura oriental e a vontade de voltar a praticar uma arte marcial oriental ganharam
força. Sendo assim, buscou juntamente com sua irmã e seu melhor amigo alguma
aula de arte marcial em várias academias em Niterói/RJ. De forma determinante,
optaram pela prática do Kung-Fu por sua plasticidade e diversidade de movimentos
e estilos (fato que alimentava a curiosidade e decisão de prática dos três jovens).
Os três iniciaram uma ascendente primorosa. Foram campeões estaduais e
nacionais com aproximadamente 1 ano de treino. Chegaram a graduações de nível
“Instrutor” (faixa marrom) com pouco menos de 3 anos de prática. Posteriormente,
quando tinha aproximadamente 7 anos de prática, já sendo faixa preta nos estilos
Garra de Águia e Tai Chi Chuan, o pesquisador observou com amadurecimento da
idade e com as experiências adquiridas, que somente a prática física e seus
conhecimentos marciais não saciaram totalmente seus desejos de progredir dentro
da filosofia e do conhecimento do Kung-Fu.
Seguindo essa vertente, procurou graduar-se academicamente na área de
Educação Física buscando novos conhecimentos que pudessem ser correlacionados
com sua arte marcial. Infelizmente, observou que o número de trabalhos sobre esse
tema, mesmo em nível nacional era pobre, principalmente sobre o foco sóciocultural. Desse modo, após sua formatura, buscou a inserção no programa de
Mestrado em “Ciências da Atividade Física”, enfatizando sua pesquisa na área da
62
“sociologia do desporto”, para assim investigar os ensinamentos e filosofias que
permearam seu passado, tanto em caráter educacional, quanto no caráter
disciplinador da arte marcial chinesa (Kung-Fu).
Figura 8: Professor Rafael Mocarzel (pesquisador desta dissertação) demonstrando uma postura do
“estilo Garra de Águia” em uma apresentação no Parque dos Patins (Lagoa) – Rio de Janeiro – 2004.
3.7 Cronograma
Seguindo o planejamento idealizado, os dois quadros seguintes abaixo têm
OUTUBRO
NOVEMBRO
DEZEMBRO
X
SETEMBRO
X
AGOSTO
X
JULHO
X
JUNHO
X
MAIO
Levantamento bibliográfico
X
ABRIL
Definição do tema
X
MARÇO
Inscrição e Processo seletivo
FEVEREIRO
ETAPA 2009
JANEIRO
como função esboçar de maneira clara a linha de tempo desta pesquisa.
X
X
X
X
X
X
X
X
63
Introdução
X
X
X
Metodologia
X
X
X
X
Revisão de literatura
X
X
X
X
Fechamento do projeto
Revisão de literatura
X
X
X
X
X
Qualificação
X
X
X
X
Comitê de ética
Coleta de dados
X
Análise de dados
JANEIRO
FEVEREIRO
MARÇO
Revisão
Revisão
X
X
Cumprimento das exigências
ETAPA 2011
X
DEZEMBRO
X
NOVEMBRO
X
OUTUBRO
MAIO
X
SETEMBRO
ABRIL
X
AGOSTO
MARÇO
X
JULHO
FEVEREIRO
Metodologia
ETAPA 2010
JUNHO
JANEIRO
X
X
X
X
Defesa da dissertação
X
Correções finais
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
X
3.8 Orçamento da Pesquisa
Este projeto não contou com qualquer incentivo de verbas externas
(governamental e/ou empresarial). O único apoio foi fornecido pela Universidade
Salgado de Oliveira (UNIVERSO) através da bolsa de estudos (50% de abatimento
64
do valor da mensalidade do curso de Strictu Senso Ciências da Atividade Física).
Em complemento, o restante dos custos da pesquisa foi arcado somente com
recursos financeiros do próprio pesquisador.
65
4 RESULTADOS
4.1 Dados da análise das técnicas da primeira graduação (faixa branca)
Para analisar as técnicas da primeira graduação (faixa branca) do estilo Garra
de Águia, ministrado na AKSN, viu-se a necessidade da criação de uma
“conceituação funcional técnico-marcial” para alcançar esse objetivo de maneira
comprobatória.
Partindo daí, foram sintetizados no quadro abaixo, cinco objetivos técnicomarciais observados pelos professores e instrutores da arte em questão que
integram a referida associação. Avaliou-se a natureza funcional das técnicas passo a
passo, definindo também de forma descritiva seus objetivos. São eles:
OFENSIVO
Técnicas que possuem pelo menos 90% de sua função direcionada ao aspecto ofensivo.
PREDOMINANTE OFENSIVO
Técnicas que possuem de 89% a 60% de sua função direcionada ao aspecto ofensivo.
HÍBRIDO
Técnicas que possuem um grande equilíbrio técnico de sua função direcionada tanto ao aspecto
defensivo quanto o aspecto ofensivo, ou seja, tendo um dos aspectos no máximo em 59% e o outro
no mínimo em 41%.
PREDOMINANTE DEFENSIVO
Técnicas que possuem de 89% a 60% de sua função direcionada ao aspecto defensivo.
DEFENSIVO
Técnicas que possuem pelo menos 90% de sua função direcionada ao aspecto defensivo.
Quadro 1: Proposta de conceituação funcional técnico-marcial.
66
Desse modo, descrevem-se abaixo as técnicas já citadas e suas propostas de
conceituação:
JURAMENTOS (1 a 9) – Kau Kun Kuai
(Preceitos do estilo Garra de Águia, descritos nos anexos desta dissertação)
Defensivo – Princípios éticos e morais que são os norteadores disciplinares dos praticantes dessa
arte. Buscam objetivamente a educação social, a força de vontade e o respeito a tudo e a todos.
AQUECIMENTO / RESISTÊNCIA – I San Van Tun / Tai Lan
(1minuto em Base Cavalo com braços pronados em posição isométrica em crucifixo; 10
flexões de braço; 10 abdominais)
Híbrido – Conjunto de exercícios físicos holísticos que buscam propiciar aos praticantes melhorias na
qualidade de vida, na forma física, na concentração mental e na preparação técnica dos mesmos.
POSIÇÕES DE PÉ (1 a 5) – Kei Poun Hum Sec Ma Bo
(Bases Cavalo; Arco e Flecha; Gato; Joelhada; Rasteira)
Defensivo – Posturas corporais básicas que estruturam todas as demais técnicas ministradas no
estilo Garra de Águia. Suas posições buscam proporcionar segurança tanto no caráter técnico quanto
marcial.
SOCOS BÁSICOS (1 a 6) – Lo Sec Kei Poun Kuen Fa
Predominante Ofensivo – Movimentos com os membros superiores que constituem em sua maioria
ataques diretos e em sua minoria defesas posteriormente seguidas de ataques.
CHUTES (1 a 8) – Paa Sec Kei Poun Te Fa
Predominante Ofensivo – Movimentos com os membros inferiores que constituem em sua maioria
67
ataques diretos e em sua minoria técnicas que servem tanto pra caráter ofensivo quanto defensivo.
ROLAMENTOS (1 a 2) – Fan Tii
(Cambalhotas para frente e para trás, ambas sem apoiar a cabeça no solo)
Defensivo – Movimentos que buscam a segurança corporal em quedas e saltos acrobáticos.
COTOVELADAS (1 a 6) – Tcham Sa Fa
Híbrido – Movimentos com os membros superiores, com ênfase nos cotovelos, que servem tanto pro
caráter defensivo quanto ofensivo.
JOELHADAS (1 a 3) – Tcham Sa Fa
Híbrido – Movimentos com os membros inferiores, com ênfase nos joelhos, que servem tanto pro
caráter defensivo quanto ofensivo.
GUARDAS & ESQUIVAS – Si Pou Chau Ma
(Vira; Gira; Salto; Recuada)
Defensivo – Posturas corporais básicas que buscam o deslocamento do praticante de forma segura
tanto no caráter técnico quanto marcial.
BATE-BRAÇO – Saan Sem Kiu
(Sem garra; Com garra)
Defensivo – Técnica em dupla. Movimentos com os membros superiores, efetuando contato com o
antebraço do parceiro com a intenção defensiva tanto na altura abdominal quanto da face do rosto.
68
SOCO 1 – A, B e C – Tcheck Tchoie
Híbrido – Técnica em dupla. Educativo técnico que mescla ensinamentos de posturas de guarda,
pegadas em garra, soco e defesas na face do rosto.
FORMA “PUNHO DA RECONQUISTA” – Kati “Fu Xi Chuen”
Híbrido – Seqüência que congrega as demais técnicas ministradas na primeira graduação. Forma
marcial que mescla ensinamentos de posturas de guarda e defesas e ataques com membros
superiores e inferiores em diferentes alturas.
Tabela 2: Descrição e proposta de conceituação funcional técnico-marcial da primeira
graduação (faixa branca) do estilo Garra de Águia ministrado na AKSN.
De forma a convergir os dados da classificação feita e apresentada acima,
dão-se abaixo os resultados do somatório das conceituações:
OBJETIVOS TÉCNICO-MARCIAIS
QUANTITATIVO
OFENSIVO
0
PREDOMINANTE OFENSIVO
2
HÍBRIDO
5
PREDOMINANTE DEFENSIVO
0
DEFENSIVO
5
Tabela 3: Resultado do somatório da proposta de conceituação funcional técnico-marcial da primeira
graduação (faixa branca) do estilo Garra de Águia ministrado na AKSN.
69
4.2 Dados das Observações Participantes
Efetuada
a
“observação
participante”,
tendo
como
parâmetros
comportamentais os “9 preceitos do estilo Garra de Águia” e as filosofias orientais
permeadas pela história, concluiu-se que os alunos tiveram certa facilidade a se
adequar ao sistema das aulas. Repreensões foram efetuadas de forma verbal e
algumas vezes de forma punitiva (como exercícios de flexões de braço – punição
comumente vista dentro das aulas de métodos de autodefesa) até os alunos se
acostumarem com o caráter disciplinar ministrado.
Correlacionando os ensinamentos derivados das filosofias do Kung-Fu com o
dia-a-dia dos jovens praticantes, notou-se que as maiores incidências de
comportamentos não correspondentes com os ensinamentos ministrados se deram
durante o período de provas e avaliações dos jovens em seus colégios e/ou
faculdades. Muitos se mostravam insatisfeitos ou mesmo indignados com suas
notas, avaliações ou métodos de ensino de seus professores nas referidas
instituições de ensino. De forma direta, buscando seguir os ensinamentos dos “9
preceitos”, foi explicado para as turmas que o aluno deve buscar se harmonizar com
seu superior (seja do campo profissional ou familiar), objetivando tornar-se um bom
subalterno e olhar as dificuldades não só como problemas mas como oportunidades
de progredir e se aperfeiçoar (LIMA, 2000; MIKI, 2003; TANIDA, 2006).
Traz-se à luz que a relação mestre-discípulo é diferente da relação professoraluno: na primeira o subalterno não costuma questionar ou criticar os superiores,
pois o mestre tem a total confiança do aluno (DALMASO, 2010); porém, não é
verdade que os mestres não ouvem seus discípulos e nem eles devem ser omissos.
A questão é que, o mestre, por ter mais experiência [Kung-Fu!], costuma ter razão. É
necessário “tempo de vida” para que o discípulo compreenda por si mesmo as
razões pelas quais o mestre deu tal ensinamento, que, por conseguinte, fará o
discípulo
crescer
como
futuro
líder
e/ou
superior
dentro
da
sociedade,
independentemente do campo em questão. Esses ensinamentos são permeados
pelas antigas filosofias orientais até os dias de hoje.
70
Sob o mesmo ponto anterior, o descontentamento dos alunos por algumas
vezes se estendia também aos seus pais e/ou responsáveis, pois, por questões de
notas baixas em suas respectivas instituições de ensino, algumas vezes os jovens
foram punidos, sendo proibidos de freqüentar temporariamente as aulas de Kung-Fu
(ou qualquer outra atividade tida como lúdica) até que suas notas se elevassem.
Seguindo o mesmo ideal de acatar o superior (nesse caso, de âmbito familiar),
orientou-se que os alunos deveriam não só obedecer aos seus pais e/ou
responsáveis por serem seus superiores, mas sim, pela filosofia inserida no Kung-Fu
originária das filosofias orientais, dizendo que todo conhecimento é importante e
fundamental para a auto-expressão do ser humano (MIKI, 2003; TANIDA, 2006).
Tendo sido apontado ainda que, na juventude, boa parte dos conhecimentos
adquiridos pelos alunos, deveria ser oriunda das instituições de ensino, pois lá se
adquiriria grande quantidade de conhecimentos diversos; e ainda, que existem
graduações no Kung-Fu que só são alcançadas com níveis de formação escolar e
acadêmica61,
os
jovens
adotaram
uma
sensível
mudança
de
postura
comportamental, gerando harmonia em relação aos seus pais e/ou responsáveis62.
Outro fato interessante deu-se em uma aula que duas alunas adolescentes
apresentaram cólicas menstruais e humor alterado63. Alguns exercícios geravam
desconforto fisiológico às jovens; consequentemente, causando desmotivação para
a prática. Esclareceu-se que dentro das antigas filosofias orientais, que servem
como norteadoras pro caráter comportamental de praticantes de Kung-Fu, os
exercícios deveriam ser propostos e não impostos; e ainda, adaptados a cada um
em cada situação diferente. O cerne da questão seria primordialmente o conforto,
bem-estar e promoção da saúde de cada praticante de forma individual.
61
A oitava graduação (faixa marrom – nível “jovem instrutor”) só pode ser concluída com o aluno
formado no ensino fundamental; a nona graduação (faixa marrom com ponta preta – nível “jovem
instrutor”) só pode ser concluída com o aluno formado no ensino médio; a décima graduação (faixa
preta – nível “instrutor”) só pode ser concluída com o aluno ingressado no ensino superior e ter se
formado em um curso de “primeiros socorros”; a décima primeira graduação (faixa preta com ponta
dourada – nível “instrutor”) só pode ser concluída com o aluno formado em um curso de “arbitragem
de Kung-Fu”; já a décima segunda graduação (faixa preta com duas pontas douradas – nível
“professor”) só pode ser concluída com o aluno formado no ensino superior.
62
Relatos informais de 4 pais e/ou responsáveis proferidos aos professores sobre as mudanças
comportamentais dos alunos após as orientações de natureza filosófica dadas pelos professores.
63
Essa ocorrência não foi especulada pelo pesquisador, mas sim, confirmada e relatada pelas
próprias alunas participantes da referida pesquisa logo no início da aula.
71
Tendo em vista que o Kung-Fu (tanto marcial quanto filosoficamente) prega a
adequação e a flexibilidade de técnicas e comportamentos para o alcance da
superação em todas as situações possíveis, foi explicado às jovens que, se as
mesmas não se sentissem bem em praticar os exercícios naquele momento não
haveria problema. Naturalmente, as alunas ficaram satisfeitas e praticaram os
exercícios em menor intensidade. Assim, houve uma consideração mútua, tanto dos
professores com o momento vivido pelas alunas, quanto das mesmas buscando
seguir o orientado por seus superiores respeitando os limites dos seus corpos.
E por fim, apontam-se os dois fatos mais recorrentes observados pelo
pesquisador, que necessitaram de uma atenção mais intensa dos professores quase
que diariamente: atrasos e zelo com o uniforme. Em ambos os casos analisou-se
que a maior ocorrência se dava com jovens menores de idade (ou seja, menores
que 18 anos) e que ainda não estavam inseridos no mercado de trabalho.
Colocou-se que ter e expressar o respeito ao próximo está também no ato
nobre de honrar seus compromissos firmados, incluindo os horários préestabelecidos e também trajar as vestes de acordo com o regulamento de cada
órgão, local e/ou instituição envolvida no assunto. Dessa forma, chegar atrasado não
só demonstra falta de respeito com o próximo, mas também, é a clara depreciação
de sua própria palavra e promessa. Foi exposto ainda, que não demonstrar zelo com
seu uniforme é uma grande falta de respeito para com os objetos, com sua própria
aparência e com o compromisso de utilizar a roupa padrão estipulada. Ter o hábito
de cuidar das suas próprias coisas, incluindo seu uniforme, faz com que a pessoa
“reflita” uma melhor aparência, sendo muito provavelmente, mais bem vista no futuro
quando inserido no mercado de trabalho.
4.3 Dados dos Questionários
Parte-se agora para segundo instrumento de pesquisa: o questionário. O
instrumento foi distribuído, respondido e devolvido por 21 alunos da AKSN com pelo
72
menos 1 ano de experiência nos treinos do estilo Garra de Águia. Destaca-se
novamente que os questionários foram entregues ao pesquisador mantendo o
anonimato dos participantes para que desta forma não houvesse macula nos
resultados adquiridos. O pesquisador tinha duas hipóteses: na primeira acreditavase que a mídia teria grande peso no ingresso dos alunos e que os ensinamentos
filosóficos não teriam a mesma relevância; a segunda remetia ao motivo de
permanência, cogitando que os ensinamentos filosóficos ganhassem grande
relevância aos olhos dos alunos após adquirirem experiência, tendo em vista que as
filosofias embasam todas as técnicas ministradas (marciais ou não).
A tabela abaixo expressa o resultado total da pesquisa com o questionário.
Nela, encontram-se os motivos de ingresso e permanência (lado esquerdo) e suas
classificações de forma discriminada e quantificada (lado direito) fornecida pelos
alunos participantes. Cada aluno foi orientado para marcar apenas uma classificação
por categoria. O motivo “outros” (número 9) ficou como somatório total, pois foi
ramificado em cinco sub-tópicos discriminados através dos chamados “motivosresposta” dos alunos participantes.
MOTIVOS
NADA
POUCO
MUITO
IMPORTANTE
IMPORTANTE IMPORTANTE
IMPORTANTE
INGR PERM INGR PERM INGR PERM INGR PERM
1
MÍDIA – ídolos, filmes, seriados, desenhos
animados, revistas em quadrinhos etc.
1
7
8
7
4
4
8
3
2
PROMOÇÃO DA SAÚDE – praticar
exercícios, liberar a tensão do dia-a-dia,
qualidade de vida
0
0
5
1
8
6
8
14
3
ESTÉTICA – definição muscular, diminuição
do percentual de gordura etc.
3
2
6
5
8
10
4
4
4
FILOSOFIA – ensinamentos filosóficos e
culturais de origens milenares.
3
0
10
1
5
8
3
12
5
AUTODEFESA – manter sua segurança e
integridade física, elevar autoconfiança e
auto-estima
0
0
1
2
8
9
12
10
6
PARTICULARIDADES DO KUNG-FU –
armas, saltos, técnicas baseadas nos animais
etc.
2
0
1
2
8
8
10
11
7
ESPORTE – lazer competitivo, esportivização,
vontade de se destacar num esporte
2
0
6
3
5
9
8
9
8
LAZER – prática esportiva realizada no tempo
livre de trabalhos com objetivo lúdico e de
satisfação pessoal
0
0
4
6
9
7
8
8
9
OUTROS (Total)
2
1
2
2
6
3
1
0
9.1
AMIGOS
1
1
1
0
5
3
0
3
9.2
SOCIABILIZAÇÃO
0
0
0
0
0
0
1
1
9.3
PREÇO ACESSÍVEL
0
0
0
1
1
0
0
0
73
9.4
CONCENTRAÇÃO
1
0
0
0
0
0
0
1
9.5
HORÀRIOS
0
0
0
0
1
0
0
1
Tabela 4: Resultados do questionário de motivos para ingresso e permanência dos alunos na prática
do Kung-Fu.
Pontuando a partir de agora os resultados adquiridos, será ressaltado abaixo
cada valor de forma a clarear as interpretações futuras que serão concluídas no
capítulo seguinte (Discussão).
Inicia-se pela observação clara que a primeira hipótese ressaltada
anteriormente (que toca na questão da “influência midiática” sobre o ingresso de
alunos no Kung-Fu) é realmente sólida e massiva. A diferença na importância de
ingresso para a de permanência após 1 ano de treino é extremamente considerável.
Outra diferença fortemente visível é derivada dos resultados do segundo
motivo. Pelos dados adquiridos, a “promoção da saúde” realmente ganhou
importância para os alunos, como já frisado anteriormente que esse ponto era
bastante elevado durante as aulas.
A “estética”, como terceira razão ou motivo, teve um resultado quase estável.
No entanto, como quase que metade de todos os participantes o definiu como motivo
“importante” já após 1 ano de treinos, acredita-se que o Kung-Fu tenha fornecido
resultados positivos nessa área. Recomendam-se estudos futuros sobre o assunto.
O que demonstrou a maior diferença nos resultados da pesquisa foi o quarto
motivo, que também é o protagonista da segunda hipótese já pontuada; as
“filosofias”. Inicialmente, os alunos ingressavam sem dar importância (ou mesmo
desconhecendo) às diversas filosofias ministradas dentro do Kung-Fu, muitos por
desconhecimento. No período de ingresso, mais de metade dos alunos não às
achavam relevante, contudo, após 1 ano de treinamentos, a mudança do
pensamento dos alunos foi dantesca. Mais de metade dos alunos consideraram as
filosofias “muito importantes”, demonstrando claramente o significado e peso que as
mesmas exercem. Portanto, corrobora-se a segunda hipótese.
O quinto motivo tem como foco a “autodefesa”. O quesito se demonstrou
74
praticamente estável com relação aos motivos de ingresso e permanência. Também
chama a atenção o alto índice de procura e permanência por conta deste tópico.
As “particularidades do Kung-Fu” constituíram o sexto motivo. Sua grande
diversidade técnica, marcial e cultural, fez muito alunos ingressarem e também
permanecerem na arte marcial chinesa.
O sétimo tópico traz à luz a questão desportista no Kung-Fu. Boa parte dos
alunos participantes da pesquisa já via o Kung-Fu como “esporte competitivo”,
tornando-se relevante para a questão do ingresso. Após 1 ano de treinos, o
quantitativo de alunos que dão importância ao tema só aumentou.
A visão sobre o Kung-Fu ser um meio de “lazer” é descrita no oitavo tópico. O
quantitativo de alunos que utiliza o Kung-Fu como fonte de prazer nos tempos livres
é bem significante desde o motivo de ingresso até o motivo de permanência,
mantendo-se praticamente estável.
Por fim, o último motivo, nomeado de “outros” era um quesito aberto; ou seja,
os alunos poderiam colocar o que os mesmos achassem que fosse relevante, porém
que não se encaixasse nos quesitos anteriores. Caso não houvesse, bastava deixálo em branco. Através da descrição e da interpretação das respostas dos
participantes, estruturou-se cinco sub-tópicos: amigos (9.1), sociabilização (9.2),
preço acessível (9.3), concentração (9.4) e horários (9.5).
No primeiro é ressaltada a questão de amigos presentes no grupo de alunos.
O nível de importância foi significante no ingresso, porém ganhou força no motivo de
permanência. Acredita-se que a filosofia de “espírito de equipe” e união dos alunos
tenha fortalecido este “laço fraternal”.
No segundo sub-tópico é apontado o uso do Kung-Fu como meio de
“sociabilização” para o praticante, justificando que a referida arte marcial engloba
diversos praticantes em diferentes idades, culturas e perfis sócio-econômicos.
O terceiro sub-tópico narra a questão da “acessibilidade financeira” do valor
da mensalidade do Kung-Fu na academia em que pratica suas aulas. Comparado a
algumas outras atividades oferecidas (como “Pilates” e “Spinning”), a arte marcial
chinesa possuía um preço mais acessível.
75
O quarto sub-tópico demonstra os treinamentos cognitivos de “concentração”.
Entende-se que o aluno não tinha ciência dos treinamentos de foco e resistência
mental praticados no Kung-Fu. A diferença da marcação nos motivos de ingresso
(“nada importante”) para os motivos de permanência (“muito importante”) já
demonstra por si só sua relevância.
Concluindo, o quinto e último sub-tópico; “horário”. O motivo exalta a
congruência do horário de treinos do Kung-Fu com os horários livres no dia-a-dia do
aluno participante da pesquisa.
4.4 Dados das Entrevistas Semi-Estruturadas
Partindo para o último instrumento de pesquisa, foram efetuadas 5 das 6
entrevistas semi-estruturadas com os alunos com mais de 5 anos de prática em
Kung-Fu estilo Garra de Águia. Um dos alunos saiu do país por motivos pessoais no
período de estruturação desta pesquisa e não retornou dentro do período possível
para sua participação na mesma. Logo, a pesquisa teve continuidade e foi efetuada
apenas com os outros 5 participantes.
As entrevistas continham as seguintes perguntas:
a) De uma forma geral, o que você entende por Kung-Fu?
b) De uma forma geral, o que o Kung-Fu representa pra você na sua vida?
c) O
Kung-Fu
proporcionou
mudanças
na
sua
vida?
Comente
independentemente de a resposta anterior ter sido sim ou não.
d) Você visualiza correlações entre os ensinamentos das antigas filosofias
orientais com os ministrados dentro das suas aulas de Kung-Fu? Comente
independentemente de a resposta anterior ter sido sim ou não.
76
e) Você vê utilidade nos ensinamentos filosóficos ministrados nas suas aulas
de Kung-Fu para sua vida cotidiana como um todo? Comente
independentemente de a resposta anterior ter sido sim ou não.
De forma a facilitar o desenvolvimento do tema, foram expressos abaixo,
trechos das entrevistas efetuadas, enfatizando por partes, cada pergunta estruturada
da pesquisa, contando também, esporadicamente, com perguntas extras, que
buscaram complementar e acrescentar ao objetivo da pesquisa, como se caracteriza
a “entrevista semi-estruturada”.
Nas respostas da pergunta “a”, podem-se observar pontuações feitas pelos
alunos, reconhecendo o Kung-Fu como uma arte marcial (seguindo o conceito de
“arte marcial” descrito nesta dissertação) e um meio de transmissão das filosofias
orientais. As respostas abaixo de três dos alunos deixam claro esse entendimento.
ALUNO ENTREVISTADO: “– Kung-Fu é uma arte marcial, uma atividade física que
ensina a autodefesa e também a filosofia oriental.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Entendo o Kung-Fu primeiramente como uma arte
marcial, ou seja, um sistema de técnicas de defesa, no caso, o Kung-Fu armado e
desarmado, como prática esportiva para saúde e bem estar e também Kung-Fu no
sentido da expressão: atitude do treinamento; treinar arduamente, em prol da
‘postura do Kung-Fu’.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Entendo o Kung-Fu por uma série de técnicas e
filosofias baseadas na perfeição.”
Nas respostas da pergunta “b”, foram exaltados os progressos físicos e
cognitivos dos praticantes. Uma das respostas resume a idéia de todas as outras.
ALUNO ENTREVISTADO: “– Nesses 6 anos que eu pratico, percebo melhoras na
minha parte física e na parte mental e tudo se mantêm até hoje. Melhorei na
atenção, na prática de outros esportes pelo desenvolvimento da minha forma física,
mas além de tudo isso no estudo, pois ele facilita muito você se concentrar e ter
menos problema em pegar uma atividade mental pesada como é o estudo da minha
faculdade de física.”
77
PESQUISADOR: “– Ou seja, você está falando principalmente de aspectos
cognitivos?” (Pergunta complementar)
ALUNO ENTREVISTADO: “– Exatamente!” (Apontou para o pesquisador com o
dedo indicador da mão esquerda exclamando)
Partindo para as respostas da pergunta “c”, pontua-se que todos os
entrevistados disseram ter havido mudanças na sua vida cotidiana após seu
ingresso no Kung-Fu. Interessante dizer que praticamente todos os alunos
destacaram tópicos diferentes de mudanças tanto no aspecto físico quanto
psicossocial, como se vê abaixo em trechos de 3 das respostas.
ALUNO ENTREVISTADO: “– Proporcionou, mas... {silêncio de 4 segundos}... eu
comecei no Kung-Fu muito cedo com 10 anos, então a minha vida foi construída
junto com a participação do Kung-Fu. Eu comecei quando era pequeno, entrei junto
com meu irmão. Foi aí que eu tive contato com as filosofias, com os treinamentos
mentais e tudo mais”.
PESQUISADOR: “– Você percebe mudanças e diferenças de postura entre você e
colegas da sua idade por causa do Kung-Fu?” (Pergunta complementar)
ALUNO ENTREVISTADO: “– Acho que sim. Principalmente na questão do
autocontrole, tentar manter a calma em diversas situações por exemplo. Vejo
algumas diferenças desse tipo de mim para a maioria deles.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim. Mudou principalmente no grau do relacionamento
social. Mas a principal mudança foi na minha confiança tanto com pessoas do
mesmo sexo quanto do sexo oposto. Consigo me portar de outra maneira (...), sendo
pessoas conhecidas ou desconhecidas.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim, grandes mudanças. Quando comecei eu era
fisicamente muito magro e tinha muito problema com meu fôlego, mas agora já estou
muito melhor. Conheci muitas pessoas também. Virou parte da minha rotina.”
Nas respostas da pergunta “d” pode-se ver a grande variedade de assuntos e
temáticas discutidas nas aulas de Kung-Fu e diferentes formas de visualização da
presença das antigas filosofias orientais nos ensinamentos ministrados, como
78
demonstram as frases a seguir.
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim, nas aulas de Kung-Fu, eu aprendi muita coisa da
Medicina Chinesa, que vê não só o corpo físico, mas também o nível mental e
espiritual (...) indivíduo como um ser plural. O treinamento do Qigong, de práticas
que não são só físicas, mas que mexem com o mental e o espiritual para o próprio
bem estar. Então, eu vejo uma correlação com o Budismo, com o Taoísmo na parte
mais holística. Mais profundamente na idéia Confucionista, eu passei a ter uma idéia
de hierarquia que é ensinado na sala de aula, de compreender você como ser social,
sua relação com os outros (...), você não só praticando sozinho, está com um grupo
inteiro. (...) Eu sou um aluno graduado então eu tenho uma atitude em relação aos
outros, que no Confucionismo é bastante presente, que procura dizer sobre o ‘ser
social’(...). Eu vejo o Confucionismo bastante presente (...).”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Parcialmente. Muitas dessas questões de filosofia
oriental têm muita passividade, agir pela ‘não-ação’, que eu vejo pelo Kung-Fu como
trata isso com muita consideração (...). Eu vejo o Kung-Fu como uma parcela de
toda filosofia oriental.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim. Tem várias correlações e para mim tem haver
com o Kung-Fu ter embutido em si as filosofias orientais na atividade. Com isso você
passa a ter contato com elas em todas as atividades padrões: ensinamentos de
técnicas, combates, katis, conversas, orientações, nos exercícios físicos a serem
cumpridos, no treinamento não só físico e muscular, mas na parte mental e de
concentração. Acho que tudo isso se correlaciona com as antigas filosofias e os
ensinamentos desses sábios que construíram a filosofia clássica oriental.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim. Uma das principais filosofias no Kung-Fu vem do
Taoísmo, o Yin-Yang, preza que se você tem uma coisa muito ruim por um lado você
tem também uma coisa muito boa por outro. Então, dentro das aulas de Kung-Fu, os
exercícios que me cobram mais do fôlego, da resistência física, eu tenho certa
dificuldade. Mas isso se equilibra nas técnicas que tenho muita facilidade, como por
exemplo, nos exercícios mentais que cobram da atenção, técnicas meditativas que
uso a mente como ‘ferramenta-chave’ (...).”
PESQUISADOR: “– Antes você falou de aspectos cognitivos; agora você falou de
79
capacidade de aprendizado. Então, as filosofias orientais nas aulas de Kung-Fu te
ajudaram no seu aprendizado como um todo?” (Pergunta complementar)
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim. Eu tenho vantagens em algumas coisas e
desvantagens em outras. Aceito isso muito bem. Tenho essa auto-avaliação muito
clara por causa das filosofias.”
Por fim, as respostas da pergunta “e” trazem um conjunto de conclusões
práticas dos pensamentos tecidos nesta dissertação, buscando expressar a utilidade
dos antigos ensinamentos ministrados até os dias de hoje.
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim. O fato do próprio Taoísmo e do Kung-Fu me
ensinarem a ter respeito, responsabilidades e também não tomar vantagem das
pessoas na minha vida cotidiana, mesmo que seja um simples ‘furar de fila’.”
PESQUISADOR: “– Como ensinamentos morais?” (Pergunta complementar)
ALUNO ENTREVISTADO: “– Moral, ética, civilidade, tudo isso.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim. A filosofia foi extremamente importante, (...) a
filosofia me ensinou a ver as coisas de outra forma principalmente em relação à
justiça e a razão. Eu acho que a filosofia oriental no Kung-Fu me fez ver que a
justiça não é tão óbvia quanto parece ser. A verdade não é tão óbvia quanto parece
ser. Sempre tem os dois lados da moeda. Sempre tem a mentira pra um que é a
verdade pra outro. (...) Me tornei mais flexível com a opinião dos outros.”
ALUNO ENTREVISTADO: “– Sim, em muitos aspectos. Os ensinamentos do
pacifismo, da não violência, na diplomacia. No Kung-Fu a gente aprende a se
defender, mas também, a hora correta de utilizar a defesa, não só na esfera física,
mas na esfera de debate, de discussão (...) tudo se torna mais ‘calmo’ com esse tipo
de atitude.”
80
5 DISCUSSÃO
5.1 Discussão da análise das técnicas da primeira graduação (faixa branca)
Desde já, é aludido que a proposta de conceituação funcional técnico-marcial
foi desenvolvida por 3 profissionais com mais de 10 anos de experiência na arte
(incluindo aqui o pesquisador desta dissertação). A proposta da referida
conceituação nasceu através da observação, discussão e interação desses
profissionais sobre as técnicas da primeira graduação.
Discutindo aqui o aspecto quantitativo pontuado na conceituação, ele vai ao
encontro da afirmação feita no terceiro capítulo (Metodologia), a qual diz que apesar
desta pesquisa ser classificada como qualitativa, a mesma contou com dados
quantitativos para ajudar em seu desenvolvimento, estudo e embasamento teórico e
prático. Portanto, mesmo tendo tido 3 profissionais experientes em observação e
discussão sobre as referidas técnicas, reconhece-se aqui que os valores percentuais
citados na proposta de conceituação são uma estimativa por sua natureza subjetiva.
Analisando e discutindo o somatório efetuado no capítulo anterior das
propostas de conceituação das técnicas da primeira graduação (faixa branca), é de
se observar uma maioria quantitativa considerável do aspecto técnico-marcial de
âmbito defensivo. Não deve ser esquecido também o conceito “Híbrido” que envolve
em praticamente metade de sua natureza os aspectos defensivos, somando-se
assim ao conceito “Defensivo” na afirmação anterior. Apesar de uma forma menos
significante, até mesmo as técnicas de conceituação “Predominantemente Ofensiva”
contribuem nesse somatório para a conclusão já citada.
Logo, poder-se-ia acreditar aqui, que não só os aspectos filosóficos e
teóricos, mas também as técnicas marciais iniciais ministradas aos alunos da
primeira graduação, também buscam a “não-violência” por seus praticantes.
81
5.2 Discussão das Observações Participantes
A “observação participante” foi a primeira técnica utilizada diretamente junto
aos alunos participantes. Nela, foi possível adquirir uma visão generalizada e ampla
dos fatos que ocorrem dentro das aulas analisadas.
Foi visível que mesmo os alunos sem muita experiência, já buscavam
rapidamente se enquadrar e seguir as orientações dos superiores (professores,
instrutores e alunos mais graduados). Essa rápida homogeinização era base
fundamental para uma maior harmonia entre os praticantes. Talvez aí, têm-se um
forte motivo do caráter socio-fraternal entre os membros da equipe.
A etocracia, vista em diversas passagens do quarto capítulo (Resultados), era
algo visível nos treinos, podendo ser dito aqui, que havia uma grande preocupação
da postura dos superiores para de exemplo com seus alunos. Esse zelo era
ponderado já aos alunos de baixa graduação, independentemente da idade, sexo
e/ou personalidade dos praticantes.
A visão do ser humano em uma forma holística pôde ser testemunhada
através da “observação participante”, quando em diversos momentos e com
diferentes casos pessoais dos alunos, foi possível presenciar a adequação e o
respeito dos superiores para com o momento que seus alunos viviam.
O fato citado também serve para reafirmar que, mesmo com a influência
histórica militar que muitas artes marciais possuem (incluindo alguns estilos de
Kung-Fu), o formato dos treinamentos marciais hoje, não são como os treinamentos
militares nas forças armadas e o professor de Kung-Fu não tem (ou mesmo não
deveria ter) um comportamento inflexivel e absolutista.
82
5.3 Discussão dos Questionários
Tendo o resultado da pesquisa através do questionário, puderam-se
comprovar as duas hipóteses do pesquisador. Ficou clara a forte influência da mídia
como motivo de ingresso dos alunos no Kung-Fu e com o passar do tempo, os
ensinamentos filosóficos, outrora não tão relevantes, passaram a ser um dos
principais motivos de permanência, lembrando que as filosofias embasam todas as
técnicas ministradas (marciais ou não); logo, permeadas por todo o Kung-Fu.
Pontua-se também a elevada procura pelo Kung-Fu (motivo de ingresso)
objetivando a promoção da saúde e qualidade de vida. Esse ponto ganha ainda mais
força quando analisado novamente após 1 ano de treino (motivo de permanência).
Aparentemente, os alunos participantes desta pesquisa, reconhecem fortemente o
Kung-Fu como um meio de alcance do referido objetivo. No entanto, há
pouquíssimas pesquisas sobre o assunto no Brasil, sendo a maioria delas sobre os
benefícios biodinâmicos e fisiológicos do estilo Tai Chi Chuan para o público
praticante em idade avançada (idosos). Por conta disso, recomendam-se aqui mais
pesquisas sobre o assunto, já que o mesmo apresentou grande importância para os
participantes desta pesquisa.
A elevada importância do motivo de autodefesa, tanto no ingresso quanto na
permanência, demonstra a grande preocupação da sociedade brasileira sobre a
violência, casando com os pensamentos tecidos no capítulo dois (Revisão de
Literatura). Como os valores continuaram praticamente inalterados, acredita-se que
realmente os alunos passaram a se sentir mais seguros e autoconfiantes sobre o
referido assunto após 1 ano de treino. Recomendam-se estudos futuros sobre a
necessidade de segurança e a confiança adquirida pelos praticantes de Kung-Fu
baseando-se nos pensamentos e na atual conjuntura econômico-social brasileira.
As particularidades do Kung-Fu, que para a maioria das culturas ocidentais
são vistas como exóticas e muitas vezes magníficas, muito provavelmente foram
base essencial da promoção e propaganda midiática sobre a arte marcial chinesa. É
possível observar isso na vasta lista de obras cinematográficas internacionais no
83
século XX e início do século XXI. Também se identifica esse fato em diversas
novelas brasileiras nos últimos 15 anos, que fizeram uso de técnicas e coreografias
marciais originárias do Kung-Fu por conta de sua reconhecida plasticidade e riqueza
cultural. Dentro desta pesquisa, a elevada importância dada pelos alunos, tanto no
motivo de ingresso quanto no de permanência, torna possível a crença que essa
pluralidade marcial e cultural, tendo em vista que é uma arte marcial muito versátil
(movimentos de pernas, quedas, movimentos de braços, saltos, rolamentos,
alongamentos, meditações, armas brancas, técnicas respiratórias, filosofias etc.),
satisfaz e muito seus praticantes.
Sem dúvida, a grande relevância encontrada nos resultados do questionário
em relação ao Kung-Fu como meio esportivo competitivo, destaca uma vertente já
muito observada informalmente por seus praticantes: os campeonatos de Kung-Fu
no Brasil têm crescido consideravelmente, qualitativa e quantitativamente. Hoje, o
Brasil já realiza um dos maiores campeonatos de Kung-Fu do mundo, o “Brazil
International Kung Fu Championship Tournament”, sob organização e regência do
Mestre Gabriel Pires Amorim na cidade de São Paulo. Recomenda-se que o grande
interesse desportivo competitivo visto nos resultados do questionário aplicado nesta
pesquisa, seja mais explorado em pesquisas futuras; como possibilidade e exemplo,
estudos de caso de eventos e competições de Kung-Fu.
Por fim, após analisar os resultados, pondera-se que o lazer possa estar
intrínseco em muitos dos tópicos abordados no questionário. Talvez isso, tenha
gerado seu alto nível de importância, tanto no ingresso quanto permanência.
5.4 Discussão das Entrevistas Semi-Estruturadas
Ao estudar as narrativas efetuadas pelos alunos nas “entrevistas semiestruturadas”, destacaram-se alguns pontos que vão ao encontro das propostas
elevadas e estudas nesta pesquisa.
84
Quando um dos alunos entrevistados utiliza em sua resposta a expressão
“postura do Kung-Fu”, defende-se que o mesmo vem ressaltar o lado ético e
filosófico da arte, reconhecendo que um comportamento não violento e pacífico é
educação
base
dos
ensinamentos
ministrados
no
Kung-Fu.
Logo,
esse
comportamento deve se difundir pelos praticantes, buscando ajudar no prosperar da
sociedade de uma forma geral, de maneira ordeira e civilizada. Acredita-se que esse
seria mais um exemplo do processo civilizador pontuado de Elias (1994).
É possível notar também no aspecto psicológico dos alunos uma postura mais
tranquila e serena com os fatos ocorridos na sociedade e com eles mesmos. Isso
demonstra uma sensibilidade para autocrítica mais amena e pacífica como pode-se
ver na passagem da entrevista: “– Sim. Eu tenho vantagens em algumas coisas e
desvantagens em outras. Aceito isso muito bem. (...)”.
O mesmo apontamento pode ser feito em outro trecho da entrevista de outro
aluno quando o mesmo cita que aprendeu a ponderar mais a opinião alheia e refletir
antes de criticar tudo e a todos: “– (...) Eu acho que a filosofia oriental no Kung-Fu
me fez ver que a justiça não é tão óbvia quanto parece ser. A verdade não é tão
óbvia quanto parece ser. Sempre tem os dois lados da moeda. Sempre tem a
mentira pra um que é a verdade pra outro. (...) Me tornei mais flexível com a opinião
dos outros.”
Seguindo a idéia que o Kung-Fu realmente seja uma cultura transdisciplinar,
envolvendo em sua natureza a transmissão de valores educacionais e que os
mesmos auxiliem na estruturação do caráter educacional de seus praticantes, a
narrativa feita por um dos alunos entrevistados, sublinha claramente esse
pensamento quando ele fala que o Kung-Fu ensina: “– Moral, ética, civilidade, tudo
isso.”
85
6 CONCLUSÃO
Durante toda esta pesquisa, diversas informações de naturezas mil foram
apresentadas,
interpretadas
e
estudadas
aprofundadamente,
para
tentar
correlacionar os ensinamentos das antigas filosofias orientais com o cotidiano dos
praticantes de Kung-Fu.
Comprovou-se que é possível propor uma taxonomia para estudo sobre a
temática discutida e espera-se que a mesma possa ser útil para estudos futuros
sobre o assunto.
De forma clara e objetiva, foi possível observar que os referidos ensinamentos
realmente ajudaram a combater emoções alimentadas pelo ego humano (raiva,
frustração, ira, mágoa, ciúme, dentre outros). Conseqüentemente, isso gerou maior
harmonia no dia-a-dia dos educandos desses ensinamentos, auxiliando direta e
indiretamente, a redução dos diferentes tipos de manifestação do fenômeno da
violência dentro da sociedade nas diferentes áreas de atuação dos referidos alunos.
Desse modo, vê-se que mesmo com o passar de milênios, diversos dos
ensinamentos filosóficos orientais que são ministrados até os dias de hoje nas aulas
de artes marciais, enfatizada nesta pesquisa a arte Kung-Fu estilo Garra de Águia,
se fazem ainda atualíssimos, perfazendo talvez, a necessidade do repensar dos
valores e comportamentos educacionais recebidos pelo cidadão em tempos atuais.
Aponta-se principalmente, que esta pesquisa foi focada e desenvolvida com
educandos jovens; idade essa que sofre diariamente os transtornos e complicações
da fase transitória entre a infância (a qual possui emoções extremamente afloradas)
e a idade adulta (que carrega consigo o ato de assumir todas as responsabilidades
que a sociedade, de certa forma, impõe).
Funcional, marcial e filosoficamente, comprovou-se que as técnicas da
primeira graduação (faixa branca) do estilo Garra de Águia, realmente buscam
86
estimular a não-violência, incentivando o caráter educacional e pacífico logo na fase
de primeiro contato do aluno com a arte marcial.
Descobriu-se também que a mídia é a principal motivadora do ingresso dos
alunos no Kung-Fu nesta pesquisa, fazendo uso do Kung-Fu com uma face massiva
de humor (desenhos animados e filmes cômicos) ou de poder de autodefesa (filmes
de ação). No entanto, com o passar de 1 ano de prática, todos os alunos
participantes da pesquisa apontaram que a importância das filosofias era elevada ou
mesmo essencial, reconhecendo a mesma como base de toda cultura ministrada na
arte marcial chinesa.
Por fim, espera-se que os diversos ensinamentos filosóficos orientais
transmitidos pelos grandes Mestres do passado, famosos ou desconhecidos, tenham
maior relevância e reconhecimento no Ocidente. E ainda sim, que as artes marciais,
especialmente aqui o Kung-Fu, possam ter seu aplauso perante as sociedades
brasileira e ocidental, pois mais do que auxiliar na segurança e/ou na saúde de seus
praticantes, essas artes ajudam a gerar uma cultura de respeito, harmonia e paz,
algo que, aparentemente, sempre se fez necessário na história da humanidade.
87
REFERÊNCIAS
ACADEMIA SENDA - CULTURA, FILOSOFIA E ARTES MARCIAIS PARA SERVIR
O MUNDO. Disponível em: <http://www.shaolincuritiba.com.br/votiva.html>. Acesso
em: 29 Dez. 2010.
ALMEIDA, Suenya Talita. Poder e violência em Norbert Elias. In: SIMPÓSIO
INTERNACIONAL PROCESSO CIVILIZADOR: CIVILIZAÇÃO E
COMTEMPORANEIDADE, 12., 2009, Recife. Anais eletrônicos... Recife: 2009.
Disponível em: <http://www.uel.br/grupoestudo/processoscivilizadores/portugues/sitesanais/anais12/artigos/pdfs/workshop/W
_Almeida.pdf>. Acesso em: 3 Abr. 2010.
ALMEIDA, Marco Antônio Bettine; CORBETT, Claus Augustus; GUTIERREZ,
Gustavo Luiz. O Processo Civilizador da Marcialidade e a Figura Feminina.
Movimento & Percepção, Espírito Santo de Pinhal, v.10, n.14, jan./jun. 2009. p.161179.
ALVES-MAZZOTTI, Alda Judith; GEWANDSZNAJDER, Fernando. O método nas
ciências naturais e sociais: pesquisa quantitativa e qualitativa. 2.ed. São Paulo:
Thomson, 2002.
ANTÔNIO, Claudio. et al. Artes marciais no auxílio do controle do comportamento
em adolescentes praticantes. 2008. Trabalho apresentado como requisito parcial
para a avaliação do curso de Bacharel em Educação Física, Centro Universitário
Celso Lisboa, Rio de Janeiro, 2008.
APOLLONI, Rodrigo Wolff. “Shaolin à brasileira”: estudo sobre a presença e a
transformação de elementos religiosos orientais no Kung-Fu praticado no Brasil.
2004. Trabalho apresentado como requisito parcial para a avaliação do curso de
88
Mestrado em Ciências da Religião, Pontifícia Universidade Católica de São Paulo,
São Paulo, 2004 (a).
______. Eu Sou a Invencível Deusa da Espada – A Representação da Mulher na
"Cultura Marcial" Chinesa e seus Possíveis Reflexos sobre as Relações de Gênero.
Revista de Estudos da Religião – REVER. São Paulo, n.1, 2004 (b), p.71-90.
Disponível em: <http://www.pucsp.br/rever/rv1_2004/p_apolloni.pdf>. Acesso em: 17
Maio 2010.
______. Nossa experiência com a dança do leão. Revista Tai Chi Brasil. Curitiba,
n.8,nov./dez. 2010, p.18-20. Disponível em: <http://www.revistataichibrasil.com.br>.
Acesso em: 2 nov. 2010.
ARAÚJO, Paulo Coêlho de. Abordagens Sócio-Antropológicas da Luta/Jogo da
Capoeira. PUBLISMAI – Departamento de Publicações do Instituto Superior de
Maia, Maia, 1997. p.365.
ARENDT, Hannah. Sobre a violência. Tradução de André de Macedo Duarte. Rio
de Janeiro: Civilização Brasileira, 2009. p.167.
ASAMCO – Sistema ASAMCO de Artes Marciais. Disponível em:
<www.asamco.com.br>. Acesso em: 06 set. 2010.
BARDIN, Laurence. Análise de conteúdo. Tradução Luis Antero Reto e Augusto
Pinheiro. 3.ed. Lisboa: Edições 70, 2004. p.223.
BARROSO, Mário Luiz. C.; VELHO, Nívia Marcia; FENSTERSEIFER, Alex
Christiano Barreto. A violência no futebol: revisão sócio-psicológica. Revista
brasileira de cineantropometria e desempenho humano. Florianópolis, n.1, v.7,
2005. p.64-74.
89
BAUER, Martin W.; GASKELL, George. Pesquisa qualitativa com texto, imagem e
som: um manual prático. Tradução de Pedrinho A. Guareschi. 6.ed. Petrópolis:
Vozes, 2007.
BECKER JR., Benno. Manual de Psicologia do Esporte & Exercício. Porto Alegre:
Novaprova, 2000. p.399.
BENTO, Jorge Olímpio. À procura de referencias para uma Ética do Desporto. In:
Forum desporto. ética. sociedade. 5, 6 e 7 dez. 1989, Porto. [Acta do Forum].
Porto: Faculdade de Ciências do Desporto e de Educação Física – Universidade do
Porto, 1990. p.23-39.
BLASER, Mariana Nascimbem; SILVA, Luiz Carlos Nascimento; MARRERA,
Aparecido. Kung-Fu – Wushu. In: DACOSTA, Lamartine Pereira (Org.). Atlas do
esporte no Brasil – atlas do esporte, educação física e atividades físicas de saúde e
lazer no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2006. p.924.
BOTELHO, Rafael Guimarães; SOUZA, José Maurício Capinussú de. Bullying e
educação física na escola: características, casos, conseqüências e estratégias de
intervenção. Revista de Educação Física, Rio de Janeiro, n. 139, p.58-70, dez.
2007.
BOURDIEU, Pierre. Programa para uma sociologia do esporte. São Paulo:
Brasiliense, 1990.
______. A dimensão simbólica da dominação. Rio de Janeiro: Graal, 2000.
BRASIL. Secretaria de Educação Fundamental. Parâmetros curriculares
nacionais: educação física / Secretaria de educação fundamental. Brasília: MEC
/ SEF, 1998. p.114.
90
BROWNELL, Susan. Multiculturalism in the Olympic Movement. In: Olympic Studies
Reader. Editores: Hai Ren, Lamartine DaCosta, Ana Miragaya e Niu Jing. Beijing:
Beijing Sport University Press, 2008 (volume 1). p.67-80.
CALHOUN, Donald W. Sport, Culture and Personality. Illinois: Human Kinetics,
1987.
CAPEZ, Fernando. Consentimento do ofendido e violência desportiva: reflexos
à luz da teoria da imputação objetiva. São Paulo: Saraiva, 2003.
CAPINUSSU, José Maurício. Análise de condutas éticas e anti-éticas na prática
desportiva. Revista de Educação Física, Rio de Janeiro, n. 128, p.73-78, 2.
Quadrimestre, 2004.
______. Jogos olímpicos: da criação e evolução aos dias atuais. Niterói: IEG,
2007.
CHEN, Jiaxuan. Foreword by Chen Jiaxuan. In: TONG, Zhongyi. The Method of
Chinese Wrestling. Tradução Tim Cartmell. Berkeley: Blue Snake Books, 2005. p.12.
CHIN, Jennie. The Secrets of Eagle Claw Kung Fu: Ying Jow Pai. Contado pelo
Grão-mestre Leung Shum. Boston: Tuttle, 2001. p.216
COMITÊ OLÍMPICO BRASILEIRO. Olimpismo: suas origens e idéias. Correalização
das Organizações Globo. Set. 2010. p.22.
91
CONGRESSO INTERNACIONAL DE ARTES MARCIAIS E MEDICINA CHINESA, 1.,
ago. 2009, São Paulo. [Revista do Congresso]. São Paulo: ZHI - Sabedoria
Oriental, 2009. p.16.
CORREIA, Walter Roberto; FRANCHINI, Emerson. Produção acadêmica em lutas,
artes marciais e esportes de combate. Motriz, Rio Claro, v.16 n.1 p.01-09, jan./mar.
2010.
DACOSTA, Lamartine Pereira. Apresentação. In: ARAÚJO, Paulo Coêlho de.
Abordagens Sócio-Antropológicas da Luta/Jogo da Capoeira. PUBLISMAI –
Departamento de Publicações do Instituto Superior de Maia, Maia, 1997. p.3.
______ (Org.). Atlas do esporte no Brasil – atlas do esporte, educação física e
atividades físicas de saúde e lazer no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2006. p.924.
DADOUN, Roger. A violência: ensaio acerca do “homo violens”. Tradução de
Pilar Ferreira de Carvalho e Carmem de Carvalho Ferreira. Rio de Janeiro: Difel,
1998.
DALMASO, Arthur. As relações Mestre e Discípulo, Professor e Aluno na Cultura
Oriental. Revista Tai Chi Brasil. Curitiba, n.8,nov./dez. 2010, p.22-24. Disponível
em: <http://www.revistataichibrasil.com.br>. Acesso em: 2 nov. 2010.
DE ROSE, Eduardo Henrique. et al. Uso de Medicamentos no Esporte. 3. ed. Rio
de Janeiro: Departamento Médico do Comitê Olímpico Brasileiro, 2003. p. 20.
DESPEUX, Catherine. Tai-chi chuan: arte marcial, técnica da longa vida. 5 ed.
Pensamento. São Paulo: 1993.
92
DHARMANET. Disponível em: <http://www.dharmanet.com.br/buddha/resumo.php>.
Acesso em: 1 abr. 2010.
DRIGO, Alexandre Jonotta, et al. A organização do "campo" das artes marciais e sua
estruturação profissional: da "escola de ofício" ao modelo acadêmico das Escolas de
Educação Física. In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE,
13., 2003, Caxambu. 25 anos de história: o percurso do CBCE na educação física
brasileira. Anais... Caxambu: Colégio Brasileiro de Ciências do Esporte, 2003.
DUNNING, Eric. et al. Football on Trial: spectator violence and development. In: The
football world. London: Routledge, 1990.
DÜRKHEIM, Émile. Las formas elementales de La vida religiosa. Buenos Aires:
Editorial Schapire, 1968.
ELIAS, Norbert. O processo civilizador: uma história dos costumes. Rio de
Janeiro: Jorge Zahar Editores, 1994.
______; DUNNING, Eric. A busca da Excitação. Lisboa: Difel, 1992.
FARIA JR., Alfredo Gomes. Pesquisa em Educação Física: enfoques e paradigmas.
In: ______; FARINATTI, Paulo de Tarso (Orgs.). Pesquisa e produção do
conhecimento em Educação Física. Rio de Janeiro: Ao livro técnico, 1992. p.13-33.
FARINATTI, Paulo de Tarso Veras. Saúde, promoção da saúde e educação
física: conceitos, princípios e aplicações. Paulo de Tarso Veras Farinatti, Marcos
Santos Ferreira. Rio de janeiro: EdUERJ, 2006. p.288.
93
FEDERAÇÃO DE KUNG-FU DO ESTADO DE GOIÁS. Wushu Moderno. Disponível
em: < http://www.fkfego.com.br/Wushu%20moderno.html>. Acesso em: 19 out. 2009.
FERNANDES, Francisco; LUFT, Celso Pedro; GUIMARÃES, F. Marques. Dicionário
Brasileiro Globo. 30 ed. São Paulo: Globo, 1993.
FERREIRA, Arthur de Sá. Fundamentos da Filosofia Chinesa. In: SEMINÁRIO O
KUNG-FU ONTEM E HOJE FILOSOFIAS, CONCEITOS, ARMAS E TÉCNICAS DA
ARTE, 2009, Niterói: Universidade Salgado de Oliveira. p.18.
______. Fundamentos do Shuai Chiao. Niterói: 2003. Mimeografado. p.64.
FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Minidicionário da Língua Portuguesa. 2
ed. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.
FERREIRA, Fernando Dandoro Castilho. Possibilidades de aproximação entre o
processo civilizador e as artes marciais: o caso do Kung-Fu tradicional. In:
ENCONTRO DA ALESDE, 1., 2008, Curitiba. p.8.
FERREIRA, Wagner Souza; MENEZES, Paulo Fernando de. Lutas, potencial
educativo e formativo das lutas. Rio de Janeiro: 2009. p.160.
FERREIRA, Heraldo Simões. As lutas na educação física escolar - parte do bloco de
conteúdos... na prática ou apenas no papel? ENCONTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO E
PESQUISA DA UNIVERSIDADE DE FORTALEZA, 5., 2005, Ceará. Anais... Ceará:
Universidade de Fortaleza, 2005.
FRANÇA, Andréa Paes; CHAVEZ, Simone Gusen; BEZERRA, Patrícia Rangel
Moreira. A influência da imigração japonesa na sociedade brasileira: Culinária,
Esporte e Religião. In: PRÊMIO EXPOCOM 2009 – EXPOSIÇÃO DA PESQUISA
94
EXPERIMENTAL EM COMUNICAÇÃO. 16., 2009, São Paulo: Intercom – Sociedade
Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. p.9.
FU, Shu-Yun. One of China's top wushu experts who performed at the 1936
Olympic Games. Disponível em: http://www.chinesemartialarts.eu/FU%20SHUYUN.html. Acesso em: 18 Ago. 2010.
GÓIS JUNIOR, E.; LOURENCO, T. G.. Cultura e Ressignificação do Judô no Brasil.
In: CONGRESSO BRASILEIRO DE CIÊNCIAS DO ESPORTE, 2003, Caxambú.
Anais do XVIII Conbrace. Campinas: Autores associados, 2003. p.4.
GOMES, Mariana S. P. Procedimentos pedagógicos para o ensino das lutas:
contextos e possibilidades. 2008. 139f. Dissertação (Mestrado em Educação
Física) - Faculdade de Educação Física. Universidade Estadual de Campinas,
Campinas, 2008.
GONÇALVES JR., Luiz; DRIGO, Alexandre Janota. A já regulamentada profissão
educação física e as artes marciais. Motriz (UNESP), Rio Claro, v. 7, n. 2, p. 131132, 2001.
GRANET, Marcel. O pensamento chinês. Tradução Vera Ribeiro. Rio de Janeiro:
Contraponto, 1997. p.416.
HAUSEN, Iano Tolomei. Artes marciais nas escolas – Taekwondo pedagógico –
o resgate da arte marcial formativa como recurso de apoio educacional
infanto-juvenil em ambiente escolar. Niterói, 2004. p.36.
HAYECK, Cynara Marques. Refletindo sobre a violência. Revista Brasileira de
História e Ciências Sociais, [S.I.], n.1, Jul. 2009. Disponível em:
<http://www.rbhcs.com/index_arquivos/Artigo.Refletindo%20sobre%20a%20viol%C3
%AAncia.pdf>. Acesso em: 3 Abr. 2010.
95
HIRATA, Daniel Shenji; DEL VECCHIO, Fabrício Boscolo. Preparação física para
lutadores de Sanshou: Proposta baseada no sistema de periodização de Tudo O.
Bomba. Movimento & Percepção, Espírito Santo de Pinhal, v.6, n.8, jan./jun. 2006.
p.2-17.
INSTITUTO DO PATRIMONIO HISTÓRICO E ARTÍSTICO NACIONAL – IPHAN.
Disponível em:
<http://portal.iphan.gov.br/portal/montarDetalheConteudo.do?id=13983&sigla=
Noticia&retorno =detalheNoticia> Acesso em: 25 ago 2008.
JEFREMOVAS, Jorge. A Arte Marcial Chinesa “Kung-Fu” como forma de
prevenção primária ao uso de drogas entre adolescentes do sexo masculino.
Trabalho apresentado como requisito parcial para a conclusão do curso de
Especialização em Dependências Químicas, Pontifícia Universidade Católica do
Paraná, Curitiba, 2003. p.42.
JIN, Yiming. Foreword by Jin Yiming. In: TONG, Zhongyi. The Method of Chinese
Wrestling. Tradução Tim Cartmell. Berkeley: Blue Snake Books, 2005. p.3-4.
KOMBATO – Sistema de autodefesa. Disponível em: <www.kombato.org>. Acesso
em: Acesso em: 06 set. 2010.
KOPPE, Vinício Renner. O Kung Fu Tradicional e o Wushu Moderno. Trabalho de
conclusão de curso apresentado como requisito final para obtenção de título de
bacharel em Educação Física pela Escola de Educação Física da Universidade
Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, 2009. p.58.
LANÇANOVA, Jader Emilio da Silveira. Lutas na educação física escolar:
alternativas pedagógicas. [S.I.]: 2006. p.70.
96
LAO, Tsè. Tao Te King. 5, versão integral e comentários. São Paulo: Attar, 3 ed.,
2001.
LI, Wing Kai. Kung-fu (Wushu) - Sanshou. São Paulo: Século XX, 1993.
LIAO, Waysun. CLÁSSICOS DO T’AI CHI. Pensamento. São Paulo: 1990. p.214.
LIMA, Luzia Mara Silva. O Tao da educação – a filosofia oriental na escola
ocidental. São Paulo: Ágora, 2000. p.220.
LOBATO, Eliane; MORAES, Rita; GULLO, Carla. ISTOÉ Online, São Paulo, 31 mar.
2004. Disponível em:
<http://www.terra.com.br/istoe/1799/comportamento/1799_onde_vamos_parar.htm>.
Acesso em: 07 jan. 2009.
LUCENA, Ricardo de F. O Poder e tudo mais: uma breve discussão sobre o conceito
de poder para Norbert Elias. In: SIMPÓSIO INTERNACIONAL PROCESSO
CIVILIZADOR: SOCIABILIDADE E EMOÇÕES, 10., 2007, Campinas. Anais
Eletrônicos... Campinas: 2007. Disponível em: <http://www.uel.br/grupoestudo/processoscivilizadores/portugues/sitesanais/anais10/Artigos_PDF/Ricardo_L
ucena.pdf.>. Acesso em: 3 Abr. 2010.
MACHADO, Afonso Antonio. Psicologia do esporte: da educação física escolar
no esporte de alto nível. Editoras da Série Irene Conceição Andrade Rangel,
Suraya Cristina Darido. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2006.
MAIA, José. Ética e Artes Marciais. In: Forum desporto. ética. sociedade. 5, 6 e 7
dez. 1989, Porto. [Acta do Forum]. Porto: Faculdade de Ciências do Desporto e de
Educação Física – Universidade do Porto, 1990. p.206-210.
97
MAIDANA, Wagner. Os primórdios do Wushu em Porto Alegre (1975 – 1992).
Trabalho de conclusão de curso apresentado como requisito final para obtenção de
título de licenciado em Educação Física pela Escola de Educação Física da
Universidade Federal do Rio Grande do Sul – UFRGS, Porto Alegre, 2009. p.51.
MARTA, Felipe Eduardo Ferreira. O caminho dos pés e das mãos: taekwondo
arte marcial, esporte e a colônia coreana em São Paulo (1970 – 2000). 2004.
p.148. Dissertação (Mestrado em História Social) - Pontifícia Universidade Católica
de São Paulo, São Paulo, 2004.
MELO, Victor Andrade. Por que devemos estudar história da Educação
Física/Esportes no curso de graduação? Motriz. v.3, n.1, jun. 1997.
MIKI, Tokuchika. Vida, isto é arte. Traduzido de "Jinsei, Kore Geijutsu"; Compêndio
póstumo. São Paulo: Vida Artística. 2003.
MINAYO, Maria Cecília de Souza; SOUZA, Edinilsa Ramos de. Violência e saúde
como um campo interdisciplinar e de ação coletiva. História, Ciência Saúde –
Manguinhos, Rio de Janeiro, v.4, n.3, p.513-531, 1998.
MINICK, Michael. A sabedoria do Kung-Fu. Rio de Janeiro: Artenova, 1974. p.170.
MIRANDA, Marcelo José Colonna de. As representações do Judô na perspectiva
dos alunos e de seus responsáveis. Trabalho apresentado como requisito parcial
para a conclusão do curso de Licenciatura do curso de Educação Física,
Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2008. p.96.
MOCARZEL, Rafael Carvalho da Silva. Kung-Fu / Wushu. In: FARIA JR., Alfredo
Gomes; VILELA, Eduardo (Orgs.). Atlas histórico e geográfico de esporte e lazer de
Niterói. Niterói: Universidade Federal Fluminense, 2010 (a). p.589-591.
98
______. Tai Chi: O Estilo de Kung-Fu mais famoso em todo Mundo. Associação de
Kung-Fu Shaolin de Niterói. Niterói, 2010 (b). Disponível:
<http://www.kungfurj.com.br/?page_id=42>. Acesso: 27 dez. 2010.
______. Tai Chi Chuan. In: FARIA JR., Alfredo Gomes; VILELA, Eduardo (Orgs.).
Atlas histórico e geográfico de esporte e lazer de Niterói. Niterói: Universidade
Federal Fluminense, 2010 (c). p.636-637
MONAHAN, Michael. The Pratice of Overcoming: Nietzschean Reflections on the
Martial Arts. Journal of Philosophy of Sport, v.34, 2007. p. 39-51.
MURAD, Mauricio. Sociologia e educação física: diálogos, linguagens do corpo,
esportes. Rio de Janeiro: FGV, 2009, p.204.
______. A violência e o futebol: dos estudos clássicos aos dias de hoje. Rio de
Janeiro: FGV, 2007, p.196.
NASCIMENTO, Paulo de; ALMEIDA, Luciano. A tematização das lutas na Educação
Física Escolar: restrições e possibilidades. Movimento, Porto Alegre, v.13, n.3,
2007. p.91-110.
NEGRINE, Airton. Instrumentos de coleta de informações na pesquisa qualitativa. In:
NETO, Vicente Molina. TRIVIÑOS, Augusto N.S. (Orgs.). A pesquisa qualitativa na
Educação Física: alternativas metodológicas. Porto Alegre: Editora da Universidade,
Sulina, 1999. p. 61-93.
NUNES, Tarcílio Divino. A Era Meiji vista a partir da obra Rurouni Kenshin:
modernização, tensões e disputas na construção do novo Japão. In: SEMANA DO
SERVIDOR, 4., E SEMANA ACADÊMICA, 5., 2008, Uberlândia: UNIVERSIDADE
FEDERAL DE UBERLÂNDIA, 2008. p.8.
99
OLIVEIRA, Rafael Orlando de. “Paidéia à chinesa?”: a formação do indivíduo
através da prática do Kung-Fu. 2006. Trabalho apresentado como requisito parcial
para a conclusão do curso de Licenciatura do curso de Educação Física,
Universidade Federal do Paraná, Paraná, 2006.
OLIVEIRA, Ronald Alexandre Mandim de. HISTÓRIA DO JUDÔ, DA CRIAÇÃO À
EsEFEx. Revista de Educação Física, Rio de Janeiro: n.138, 2007. p.46-49.
PELLANDA, Fábio Antônio; PASTRE, Tais Fernandes de Lima; AUGUSTO, Vitor
Nascimento. O Processo de Desportivização do MMA. In: ENCONTRO DA ALESDE,
1., 2008, Curitiba. p.7.
PEREIRA, Cezar Augusto Ferreira; FERON, Patrick Vargas. As artes marciais nas
escolas vistas por diversos ângulos. Efdeportes, Buenos Aires: ano 15, n.143, 2010.
PIMENTA, Thiago Farias da Fonseca. A constituição de sub campo do esporte: o
caso do Taekwondo. 2007. Trabalho apresentado como requisito parcial para a
avaliação do curso de Mestrado em Sociologia, Universidade Federal do Paraná,
Curitiba, 2007.
______. Racionalizando o machucar: processo civilizador e as artes marciais. In:
SIMPÓSIO INTERNACIONAL PROCESSO CIVILIZADOR: CIVILIZAÇÃO E
COMTEMPORANEIDADE, 12., 2009, Recife. Anais eletrônicos... Recife: 2009.
Disponível em: < http://www.uel.br/grupoestudo/processoscivilizadores/portugues/sitesanais/anais12/artigos/pdfs/comunicaco
es/C_Pimenta.pdf >. Acesso em: 10 Maio 2010.
RÁDIO VATICANO. Disponível em:
<www.oecumene.radiovaticana.org/bra/Articolo.asp?c=412660>. Acesso em: 08 Set.
2010.
REID, Heather L.; EVANGELIOU, Christos C.. Ancient Hellenic ideals and the
modern Olympic Games. In: REN, Hai; DACOSTA, Lamartine; MIRAGAYA, Ana;
JING, Niu. (Org.) Olympic Studies Reader. Beijing: Beijing Sport University Press,
2008. p.205-216.
100
REVISTA VEJA. São Paulo: Abril, 44 ed., 4 Nov. 2009. p.108-117. ISSN 0100-7122.
REVISTA NATIONAL GEOGRAPHIC. Disponível em:
<http://viajeaqui.abril.com.br/national-geographic/edicao-127/edicao-127-kung-futemplo-shaolin-mudancas-artes-marciais-599401.shtml?page=0>. Acesso em: 19
Out. 2010.
ROCHA, J. C. S.; AGUIAR, A. M.; ROCKENBACH, S.. KUNG FU: o uso da arte
marcial chinesa como método de criação e expressão corporal. In: V Encontro
Regional de Esporte Educacional (ERESPE): Projeto Social como divisor de Águas:
Os valores transmitidos pelo PEE na Formação Humana, 2008, Curitiba. V Encontro
Regional de Esporte Educacional (ERESPE): Projeto Social como divisor de Águas:
Os valores transmitidos pelo PEE na Formação Humana. Curitiba, 2008. p. 39-45.
SANTOS, Antônio Roberto Rocha. Espírito esportivo – Fair Play e a prática de
esportes. Revista Mackenzie de Educação Física e Esporte. Ano 4, n. 4, 2005.
SANTOS, Delson Peixoto dos. A arte marcial auxiliando o desenvolvimento escolar:
aprendizado para a escola e para a vida!. Webatigos. 2008. Seção Esportes e
Recreação. Disponível em: <http://www.webartigos.com/articles/6152/1/A-ArteMarcial-Auxiliando-O-Desenvolvimento-Escolar-Aprendizado-Para-A-Escola-E-ParaAvida/pagina1.html>. Acesso em: 01 Maio 2010.
SANTOS, Jose Vicente Tavares dos. Microfísica da violência, uma questão social
mundial. Ciência e Cultura (Online), São Paulo, vol.54, n.1, p.22-24, JunSet. 2002. Disponível em: <http://cienciaecultura.bvs.br/scielo.php?pid=S000967252002000100017&script=sci_arttext>. Acesso em: 3 Abr. 2010.
SANTOS, Roberto Ferreira dos. A violência no futebol português: uma
interpretação sociológica a partir da concepção teórica de processo
civilizacional. 1996. Trabalho apresentado como requisito parcial para a avaliação
do curso de Doutorado do curso Ciência do Desporto e Educação Física,
Universidade do Porto, Porto, 1996.
101
SANTOS, Paulo Alexandre dos. Uma forma de adquirir consciência corporal
através da arte marcial chinesa conhecida por Kung-Fu. 2006. Trabalho
apresentado como requisito parcial para a avaliação da disciplina Atividades
Rítmicas do curso de Educação Física, Universidade Federal do Paraná, Curitiba,
2006.
SHAHAR, Meir. Evidências da Prática Marcial em Shaolin durante o Período Ming.
Revista de Estudos da Religião – REVER. Tradução de Rodrigo Wolff Apolloni.
São Paulo, n.4, ano 3, 2003, p.93-144. Disponível em:
<http://www.pucsp.br/rever/rv4_2003/i_shahar.htm>. Acesso em: 17 nov. 2010.
______. The Shaolin Monastery – History, Religion, and the Chinese Martial Arts.
Revista de Estudos da Religião – REVER. Tradução de Rodrigo Wolff Apolloni.
São Paulo, Jun., ano 8, 2008, p.146-150. Disponível em:
<http://www.pucsp.br/rever/rv4_2003/i_shahar.htm>. Acesso em: 17 nov. 2010.
SOUZA JR., Orlando Marreiro de. Estratégias de enfrentamento utilizadas por
praticantes de Artes Marciais. 2007. Trabalho apresentado como requisito parcial
para a avaliação do curso de Mestrado do curso Psicologia da Saúde, Universidade
Metodista de São Paulo, São Bernardo do Campo, 2007.
STAREPRAVO, Fernando Augusto; MEZZADRI, Fernando Marinho. Esporte,
Relações Sociais e Violências. Motriz, Rio Claro, v.9, n.1, p.59-63, jan./abr. 2003.
TAIGEN, Getúlio. Textos Budistas: Bodhidarma. Rio de Janeiro: San Zen Dojo –
Centro Zen Budista, [ca. 2000]. p.4.
TANG, Hao. Foreword by Tang Hao. In: TONG, Zhongyi. The Method of Chinese
Wrestling. Tradução Tim Cartmell. Berkeley: Blue Snake Books, 2005. p.5-9.
102
TANIDA, Kaor. Você ainda pode e deve ser feliz! 2.ed. Raízes de Lins: Microlins
Brasil, 2006. P.304.
THOMAS, Jerry R.; NELSON, Jack K.; SILVERMAN, Stephen J.. Métodos de
pesquisa em atividade física. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2007. p.396.
TONG, Zhongyi. The Method of Chinese Wrestling. Tradução Tim Cartmell.
Berkeley: Blue Snake Books, 2005. p.229.
TUBINO, Manoel José Gomes; MOREIRA, Sérgio Bastos. Metodologia Científica
do Treinamento Desportivo. 13. ed., Rio de Janeiro: Shape, 2003. p.462.
______; TUBINO, Fábio Mazeron; GARRIDO, Fernando Antonio C. Dicionário
Enciclopédico Tubino do Esporte. Rio de Janeiro: SENAC, 2007, p.157.
TURELLI, Fabiana Cristina. Corpo, domínio de si, educação: sobre a pedagogia
das lutas corporais. 2008. Trabalho apresentado como requisito parcial para a
avaliação do curso de Mestrado em Educação, Universidade Federal de Santa
Catarina, Florianópolis, 2008.p.127.
UNITED NATION EDUCATIONAL, SCIENTIFIC AND CULTURAL ORGANIZATION
– UNESCO. Disponível: <http://www.unesco.org/pt/brasilia/about-the-unescobrasilia-office/>. Acesso: 31 Dez. 2010.
UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA. Manual para elaboração de trabalhos
acadêmicos. Niterói: 2006. p.68.
103
VERTONGHEN, Jikkemien. The social-psychological outcomes of martial arts
practise among youth: A review. Journal of Sports Science and Medicine. n.9,
2010. p.528-537.
VIEIRA, M. P.. Arte, artista e processo civilizador: uma leitura da formação das
tradições estéticas no Ocidente, em Norbert Elias. In: V Simpósio em Filosofia e
Ciência, 2003, Marília. V Simpósio em Filosofia e Ciência: anais eletrônicos.
Marília: Unesp Marília Publicações, 2003. v. 5.
VIEIRA, Sergio Luiz de Souza. In: DACOSTA, Lamartine Pereira (Org.). Atlas do
esporte no Brasil – atlas do esporte, educação física e atividades físicas de
saúde e lazer no Brasil. Rio de Janeiro: Shape, 2006. p.924.
WENG, Daniel. Fundamentals of Shuai Chiao. San Francisco: 1984.
Mimeografado. p.82.
______. Ch’ang Style T’ai-Chi-Ch’uan – Modified Short Form. 3 ed. San
Francisco: 2000. p.176.
104
ANEXO 1 – PRECEITOS DO KUNG-FU (UNIÃO GARRA DE ÁGUIA DO BRASIL)
105
ANEXO 2 – PROGRAMA PEDAGÓGICO (ASSOCIAÇÃO DE KUNG-FU SHAOLIN
DE NITERÓI – AKSN)
PROGRAMA PEDAGÓGICO DA AKSN
Este programa pedagógico não só serve de referência para as pessoas que
querem conhecer a filosofia e metodologia da equipe A.K.S.N., mas também, tornase uma sólida referência para os alunos e profissionais que nela atuam.
Abaixo, observamos primeiramente os “objetivos gerais” que trazem os
conhecimentos ministrados nas aulas de maneira generalizada. Logo após, o
programa pontua os “objetivos específicos”, que demonstram de maneira mais
discriminada e esmiuçada ideais mais profundos. Por fim, o programa traz o perfil do
aluno (e cidadão) que objetivamos ajudar a formar.
OBJETIVOS GERAIS:
•
•
•
•
•
Instruir o educando sobre as técnicas e conceitos tradicionais do Kung-Fu;
Fornecer conhecimento básico sobre a MTC (Medicina Tradicional Chinesa) e
o Qigong (Chi-Kung);
Embasamento sobre a filosofia e história oriental;
Educar sobre a biologia humana;
Atribuir ética e respeito como diversos outros valores morais para colocá-los
em prática no dia-a-dia.
OBJETIVOS ESPECÍFICOS:
•
Fazer com que o educando possa diferenciar estilos de padrão Interno e
Externo, Norte e Sul, Tradicional ou Não-Tradicional;
•
Apresentar as diversas contribuições para a boa saúde e qualidade de vida
através da prática do Qigong (Chi-Kung) e de outras técnicas da MTC;
•
Explicar as diferentes filosofias orientais que influenciaram as artes marciais
através da história;
•
Aperfeiçoar diversas valências físicas durante treinamentos práticos, como:
coordenação motora, equilíbrio, percepções diversas, lateralidade,
resistência, força, expressão corporal etc.;
•
Introduzir o praticante a diferentes métodos de ensino, de maneira que o
mesmo possa se auto-avaliar, refletindo os melhores meios de superar suas
dificuldades de aprendizado geral como aluno e/ou professor;
106
•
Adquirir conhecimentos básicos sobre anatomia e fisiologia humana para
melhor compreensão do por que do treinamento a ser desenvolvido;
•
Capacidade de avaliação e julgamento técnico de atletas como árbitro do
Kung-Fu sob uma vertente esportiva;
•
Fomentar o amadurecimento da postura ética, crítica, pedagógica e sóciocultural do praticante de maneira que sua cultura geral progrida e acrescente
de maneira positiva à sociedade como um todo;
•
Discutir conceitos éticos e pedagógicos no esporte e nas artes marciais;
•
Desenvolver o ímpeto competitivo de forma sadia, ética e motivadora;
•
Incentivar o espírito cívico e patriótico na sociedade.
PERFIL DO EDUCANDO FORMADO:
•
Profissional autônomo capaz de desenvolver o aprimoramento físico e técnico
do Kung-Fu tanto em si quanto em terceiros;
•
Indivíduo com opinião crítica capaz de novas reflexões e contribuições sobre
a arte, assim, podendo aperfeiçoá-la e aprimorá-la cada vez mais;
•
Árbitro com conhecimentos técnicos, teóricos e práticos sobre a arte e suas
variantes na condição de esporte;
•
Escolado sobre a cultura, filosofia e história oriental, com diversos
conhecimentos, vivências e práticas sobre os mesmos dentro do dia-a-dia;
•
Instruído para que em casos acidentais (dentro e/ou fora dos locais de
treinos), o mesmo saiba como agir e ajudar o próximo necessitado, fazendo
uso dos conhecimentos básicos de “primeiros socorros”;
• Membro de uma geração da sociedade que valoriza o uso das diversas
técnicas, benefícios e virtudes da prática do Qigong (Chi-Kung) e dos diversos
recursos fornecidos pela MTC;
•
Cidadão com a consciência genuína, tanto cívica quanto patriótica,
amadurecida e propagada;
•
Estudante de artes marciais capaz de se defender em casos inusitados de
desventuras diversas.
107
ANEXO 3 – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)
Título do projeto: Artes Marciais & Jovens: violência ou valores educacionais? Um
estudo de caso de um estilo de Kung-Fu.
Responsável pelo Projeto: Prof. Rafael Carvalho da Silva Mocarzel
Eu,_____________________________________________________________,
abaixo assinado, declaro ter pleno conhecimento do que se segue: 1) Fui
informado(a), de forma clara e objetiva, que a pesquisa intitulada “Artes Marciais &
Jovens: violência ou valores educacionais? Um estudo de caso de um estilo de
Kung-Fu” irá analisar as influências do Kung-Fu na formação educacional de seus
praticantes; 2) Sei que nesta pesquisa serão realizadas as utilizações de um
questionário fechado e também a efetuação de uma entrevista semi-estruturada; 3)
Estou ciente que não é obrigatória a minha participação nesta pesquisa, caso me
sinta constrangido(a) antes e durante a realização da mesma e que fui informado(a)
que isto não implicará em prejuízos para meu estado dentro da associação; 4)
Poderei saber através desta pesquisa as implicações que colaboram ou não na
propagação da violência de jovens praticantes de Kung-Fu; 5) Sei que os materiais
utilizados para coleta de dados serão armazenados por 5 anos seguindo à
recomendação da Resolução CNS 196/96 e depois rasgados e descartados; 6) Sei
que o pesquisador manterá em caráter confidencial todas as respostas que
comprometam a minha privacidade; 7) Receberei informações atualizadas durante o
estudo, ainda que isto possa afetar a minha vontade em continuar dele participando;
8) Estas informações poderão ser obtidas através dos números de telefone
(21)2620-5504 / (21)8816-5504 com o pesquisador Rafael Carvalho da Silva
Mocarzel; 9) Foi-me esclarecido que o resultado da pesquisa somente será
divulgado com o objetivo científico, mantendo-se a minha identidade em sigilo; 10)
Quaisquer outras informações adicionais que julgar importantes para compreensão
do desenvolvimento da pesquisa e de minha participação poderão ser obtidas no
Comitê de Ética e Pesquisa.
Declaro, ainda, que recebi cópia do presente Termo de Consentimento.
Niterói, ________ de _____________ de 20____.
_______________________________________________________
(Rafael Carvalho da Silva Mocarzel; CPF 106.228.467-44)
______________________________________________________
(Nome do Sujeito da Pesquisa/Representante Legal e CPF)
108
APÊNDICE 1 – MODELO DE QUESTIONÁRIO
UNIVERSIDADE SALGADO DE OLIVEIRA
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO STRICTU SENSO
MESTRADO EM CIÊNCIAS DA ATIVIDADE FÍSICA
QUESTIONÁRIO PARA IDENTIFICAR MOTIVOS DE INGRESSO E
PERMANÊNCIA DOS ALUNOS DA AKSN
NADA
POUCO
MUITO
IMPORTANTE
IMPORTANTE IMPORTANTE
IMPORTANTE
MOTIVOS DE INGRESSO
1
MÍDIA – ídolos, filmes, seriados, desenhos animados, revistas
em quadrinhos etc.
2
PROMOÇÃO DA SAÚDE – praticar exercícios, liberar a
tensão do dia-a-dia, qualidade de vida
3
ESTÉTICA – definição muscular, diminuição do percentual de
gordura etc.
4
FILOSOFIA – ensinamentos filosóficos e culturais de origens
milenares.
5
AUTODEFESA – manter sua segurança e integridade física,
elevar autoconfiança e auto-estima
6
PARTICULARIDADES DO KUNG-FU
técnicas baseadas nos animais etc.
7
ESPORTE – lazer competitivo, esportivização, vontade de se
destacar num esporte
8
LAZER – prática esportiva realizada no tempo livre de
trabalhos com objetivo lúdico e de satisfação pessoal
9
OUTROS – descreva abaixo qual outro motivo:
(_______________________________________________)
–
armas,
saltos,
NADA
POUCO
MUITO
IMPORTANTE
IMPORTANTE IMPORTANTE
IMPORTANTE
MOTIVOS DE PERMANÊNCIA
1
MÍDIA – ídolos, filmes, seriados, desenhos animados, revistas
em quadrinhos etc.
2
PROMOÇÃO DA SAÚDE – praticar exercícios, liberar a
tensão do dia-a-dia, qualidade de vida
3
ESTÉTICA – definição muscular, diminuição do percentual de
gordura etc.
4
FILOSOFIA – ensinamentos filosóficos e culturais de origens
milenares.
5
AUTODEFESA – manter sua segurança e integridade física,
elevar autoconfiança e auto-estima
6
PARTICULARIDADES DO KUNG-FU
técnicas baseadas nos animais etc.
7
ESPORTE – lazer competitivo, esportivização, vontade de se
destacar num esporte
8
LAZER – prática esportiva realizada no tempo livre de
trabalhos com objetivo lúdico e de satisfação pessoal
9
OUTROS – descreva abaixo qual outro motivo:
(_______________________________________________)
–
armas,
saltos,
Download

violência ou valores educacionais?