Comunicação, Ciência, Sociedade
Cidoval Morais de Sousa*
Se há um consenso na comunidade científica hoje é quanto a necessidade
de comunicação da Ciência. A socióloga Hebe Vessuri destaca que a Ciência que
não é comunicada não existe. Na mesma linha, A. Lafuente inverte o
paradigma cartesiano: existo porque sou pensado e não porque penso. KnorrCetina pontua com propriedade que a comunicação infiltra a investigação
científica e é responsável pela sua projeção futura. Uma ciência privada, diz
ela, é tão impensada quanto uma linguagem privada.
Outros autores, em diferentes contextos, destacaram o papel da
comunicação ora como instrumento de vulgarização do conhecimento científico,
ora como ferramenta de educação para a ciência ou de alfabetização científica,
e, ora, ainda como uma ação estratégica de apropriação social do conhecimento.
Em outras palavras, como ação de cidadania.
A literatura sobre o assunto, no caso brasileiro, é recente. Os primeiros
trabalhos datam dos anos 70 e exploram, a exaustão, a tensão cientista x
divulgador. Durante mais de 20 anos esse debate se manteve e, com raríssimas
exceções, apresentou fatos novos e/ou alternativas de mudanças. Jornalistas
(divulgadores de Ciência de uma forma geral) e Cientistas, em muitos
trabalhos, foram colocados de lados opostos, protagonizando conflitos, tensões,
numa relação desgastante e pouco produtiva.
Num resumo simplificado das discussões, pode-se dizer que, no baterebate, do lado dos divulgadores o hermetismo do discurso, o tecnicismo, a
vaidade, a inacessibilidade do pesquisador eram pontuados como fatores de
entraves à construção de um discurso qualificado sobre C&T. Do lado dos
pesquisadores, a falta de formação específica do divulgador, a simplificação dos
conteúdos, a falta de contexto eram características que inviabilizavam qualquer
diálogo.
A última década do século XX registra novas preocupações nos debates
da relação Comunicação-Ciência. As tensões cientistas X divulgadores, embora
resistentes, dão lugar a novas questões de fundo como o papel da divulgação
para o desenvolvimento da pesquisa, a relação Ciência-Comunicação-Educação,
a formação do divulgador, a divulgação como indicador a ser considerado nas
definições de políticas públicas de C&T, a divulgação como instrumento de
alfabetização científica, entre outros.
A abertura do leque de preocupações nos referidos estudos coincide com a
criação de programas de pós-graduação (lato sensu) e de linhas de
financiamento (programa Mídia e Ciência da Fapesp) para estimular, não
apenas a formação de divulgadores e de cientistas para a divulgação, mas
investigações pontuais da relação Comunicação-Ciência.
Só na região Sudeste são levadas a cabo três experiências de formação,
todas no Estado de São Paulo: uma em Campinas, na Unicamp, mais
precisamente no Labjor (Laboratório de Jornalismo), que encontra-se na
terceira turma; outra na Universidade de Taubaté, vinculada à Pró-reitoria de
Pesquisa e Pós-graduação, também iniciando a terceira turma; e outra na USP,
no Núcleo José Reis de Divulgação Científica, fechando a primeira turma.
A conjuntura política e econômica e a direção das políticas públicas,
inclusive de C&T, do período, fundadas na cartilha neoliberal, estimulam novas
posturas dos cientistas frente à mídia. Discute-se agora o que a pesquisadora e
jornalista Graça Caldas chama de parceria. Ciência e Mídia são aliadas em
muitas frentes: contra o analfabetismo científico, contra a exclusão social, por
mais qualidade de vida, por uma sociedade sustentável, por mais investimentos
em educação, entre outras.
É certo que na chamada sociedade do conhecimento, os saberes
especializados se multiplicam numa velocidade espantosa, cimentando a
barreira entre os que sabem (e por isso podem) e os que não sabem (e não
podem) e nem têm acesso ao saber. Também é certo que, nesse contexto,
precisamos construir iniciativas de dimensões práticas que promovam um novo
ambiente comunicacional para as Ciências, para a Mídia, e, principalmente,
para o público. Um ambiente democrático, que assegure aos diversos atores um
lugar destacado no processo de construção (e apropriação) da notícia Ciência.
* Jornalista, professor da Unitau e da Univap, doutorando em Geociências pela
Unicamp e Diretor Acadêmico da ABJC.
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