Universidade do Estado do Rio de Janeiro Centro de Tecnologia e Ciências Instituto de Física Armando Dias Tavares Ludiane Silva Lima Síntese e estudo das propriedades luminescentes do SrGa2O4 dopado com íons de Cr3+ Rio de Janeiro 2012 Ludiane Silva Lima Síntese e estudo das propriedades luminescentes do SrGa2O4 dopado com íons de Cr3+ Dissertação apresentada, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-Graduação em Física, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Orientador: Prof. Dr. Raul José da Silva Câmara Mauricio da Fonseca Rio de Janeiro 2012 CATALOGAÇÃO NA FONTE UERJ / REDE SIRIUS / BIBLIOTECA CTC/D L732 Lima, Ludiane Silva. Síntese e estudo das propriedades luminescentes do SrGa2O4 dopado com íons Cr3+ / Ludiane Silva Lima. – 2012. Orientador: Raul José da Silva Câmara Mauricio da Fonseca. Dissertação (Mestrado) – Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Instituto de Física Armando Dias Tavares. 1.Espectroscopia de luminescência -Teses. 2. Fotoluminescência - Teses. I. Fonseca, Raul José da Silva Câmara Maurício da. II. Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Instituto de Física Armando Dias Tavares. III. Título. CDU 535.37 Autorizo, apenas para fins acadêmicos e científicos, a reprodução total ou parcial desta dissertação, desde que citada a fonte. ________________________________________ Assinatura ____________________ Data Ludiane Silva Lima Síntese e estudo das propriedades luminescentes do SrGa2O4 dopado com íons de Cr3+ Dissertação apresentada, como requisito parcial para obtenção do título de Mestre, ao Programa de Pós-Graduação em Física, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. Aprovada em 02 de agosto de 2012. Banca Examinadora: ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Raul José da Silva Câmara Mauricio da Fonseca (Orientador) Instituto de Física Armando Dias Tavares - UERJ ___________________________________________________________________ Profª. Drª. Ada Petronila López Gimenez Instituto de Física Armando Dias Tavares - UERJ ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Antonio Carlos Bento Universidade Estadual de Maringá ___________________________________________________________________ Prof. Dr. Ricardo Borges Barthem Universidade Federal do Rio de Janeiro _________________________________________________________________ Prof. Dr. Norberto Cella Instituto Politécnico do Rio de Janeiro - UERJ Rio de Janeiro 2012 DEDICATÓRIA À minha família! AGRADECIMENTOS É comum considerar uma pessoa de sorte, aquela que ao jogar n dados para o alto obtenha, quando estes caírem no chão, o número seis em todas as faces voltadas para cima, ou a uma pessoa que consiga ganhar um prêmio em dinheiro, em uma ocasião em que a probabilidade de se ganhar é muito pequena. Digo que não fiz nenhum lançamento de dados e nem ganhei nenhum prêmio, mas tenho certeza que consegui algo que vale mais do que qualquer coisa: Amizade. Por isso, agradeço, aos meus amados amigos, que direta e indiretamente contribuíram para este trabalho: Professor Raul da Fonseca, meu orientador, obrigada por ter acreditado em mim. Agradeço pelo imenso aprendizado que me proporcionou, por ter passado seu conhecimento de forma tão paciente e pelo problema, tão interessante, que foi o objeto desse trabalho. A Professora Ada López pelas incontáveis contribuições, por partilhar comigo seu conhecimento. Aos grandes mestres que contribuíram para a minha formação, Ivanor Nunes de Oliveira, Cristina Porto, Luizdarcy de Matos Castro, Jornandes Correia, Valmir de Araújo, Antonio Carlos Bento, Norberto Cella, Ricardo Barthem, Vitor Lemes, Lilian Sosmam. Aos bibliotecários da UERJ: Nádia Lobo, Denise Gayer, Teresa da Silva. A Juçara Dias, Sergio Pereira. Vinicius Mariucci, Ângela Picolloto, Valéria C. A. Moraes. Marcello Antônio da Silva, Raimundo Nonato, Greice Kelly da Costa, Sandra Pedro. Aos meus amigos, Laurimar, Tiago Dourado, Eduardo Lenho, Marcio Pinheiro, Diego Granado, Eduardo Coelho, Gustavo Vicente, Yves Nunes, André Claudino, Romulo Tavares, Pedro Manso, Silvio de Andrade, Daniel Ernani, Paulo Lourenço, Anderson da Silva, Guilherme Maia, Antônio Oliveira, Jessica Tamara Andrade de Paula, Evelin de Sá e aos tantos amigos que conhecer. Deni, mamãe, Aldís, vovó de sil, vovô, Tia Lucília, Tia Neide, Tia Eliene, Tia Odete, Tio Dimar, Tio Sil, Tio Hélio, Isaac, Cinda, Rafa, Paula, Bia, Herbert, papai, vovó de nai, Tia Sirlene, Nai, Tei, Tia Ninha, Jé, Henrique. Agradeço também a Universidade Federal do Rio de Janeiro, ao Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, a Universidade Estadual de Maringá, e ao Instituto Politécnico do Rio de Janeiro. E por fim, mas igualmente importante, quero agradecer ao Programa de Pós- graduação em Física da UERJ e a CAPES pelo apoio financeiro, que proporcionou o desenvolvimento desse trabalho. Por um mundo onde sejamos socialmente iguais, humanamente diferentes e totalmente livres. Rosa Luxemburgo RESUMO LIMA, Ludiane Silva. Síntese e estudo das propriedades luminescentes do SrGa2O4 dopado com íons de Cr3+. 2012. 74f. Dissertação (Mestrado em Física) – Instituto de Física Armando Dias Tavares, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2012. Amostras policristalinas de Sr(Ga1-xCrx)2O4 com x = 0,01 foram estequiometricamente preparadas pela mistura dos materiais em pó SrCO3, Ga2O3 e Cr2O3. A estrutura cristalina da amostra dopada foi analisada pelas medidas de difração de raios-X. O padrão de difração revelou uma única fase relacionada a fase monoclínica do SrGa2O4. Os dados foram ajustados usando o Método de Rietveld para refinamento de estruturas e os parâmetros da rede foram determinados. A luminescência do íon de Cr3+ na rede do SrGa2O4 foi investigada pelas espectroscopias de excitação e emissão a temperatura ambiente, através das quais verificamos que os íons de Cr3+ estão localizados em dois sítios diferentes. Os espectros de emissão apresentam bandas largas associadas à transição eletrônica 4T2(4F) → 4A2(4F) para ambos os sítios. Estes resultados são analisados pela teoria de campo cristalino e o parâmetro de campo cristalino Dq e os parâmetros de Racah B e C são determinados pelas posições das bandas de excitação. A partir destes parâmetros determinamos um campo cristalino forte para ambos os sítios. Além disto, foram realizadas medidas de espectroscopia fotoacústica que confirmaram as transições identificadas e estimadas nos espectros de excitação. Palavras-chave: Fotoluminescência. Espectroscopia fotoacústica. Metais de transição. Óxidos. Campo cristalino. ABSTRACT Polycrystalline samples of Sr(Ga1-xCrx)2O4, with x = 0.01, were stoichiometrically prepared by mixing powder materials SrCO3, Ga2O3 and Cr2O3. The crystalline structure of the doped sample was analyzed by X-ray diffraction measurements. The diffraction patterns showed a single phase, which corresponds to the SrGa2O4 monoclinic phase. The data were fitted by using the Rietveld Method for structural refinements and the lattice parameters were determined. The luminescence of Cr3+ ions in the lattice of SrGa2O4 was investigated by excitation and emission spectroscopies at room temperature and the results show that the emission of Cr3+ ions comes from two different sites. In the emission spectra, we can observe that they present broadbands associated with the electronic transition 4T2(4F) → 4A2(4F) for both sites. These results are analyzed by crystal field theory and the crystal-field parameter Dq and the Racah parameters B and C are determined by the excitation band positions. From these parameters we determined a strong crystal field for both sites. Moreover, photoacoustic spectroscopy measurements were performed and they confirmed the transitions identified and estimated in the excitation spectra. Keywords: Photoluminescence. Photoacoustic spectroscopy. Transition metals. Oxides. Crystal field. LISTA DE ILUSTRAÇÕES Figura 1 - Arranjo do íon ligante (pontos preto) em torno de um íon central (localizado no centro do cubo, mas não exibido na figura): (a) octaédrico, (b) tetraédrico.............21 Figura 2 - Orientação dos orbitais d no espaço e aproximação dos ligantes com carga negativa através dos eixos x, y e z [1].....................................................................................21 Figura 3 - Esquema da divisão dos níveis de energia para um campo cristalino para diferentes simetrias: (a) octaédrico, (b) tetraédrico...................................................................22 Figura 4 - Diagrama de Tanabe-Sugano para a configuração eletrônica d3 (C/B = 4,5 para o ). A linha vertical pontilhada indica o valor de Dq/B para o cruzamento entre os níveis 2E(2G) e 4T2(4F). A linha vertical cheia corresponde ao valor de Dq/B para as transições ópticas observadas no espectro de absorção à esquerda para um íon metal de transição em uma rede hospedeira com esta configuração eletrônica..................................................................................................................23 Figura 5 - Diagrama de coordenada configuracional de um sistema de dois níveis incluindo os níveis de energia vibracional. As setas representam as transições ópticas e sua diferença em energia corresponde ao deslocamento de Stokes, observado entre os espectros de excitação e emissão..............................................................................27 Figura 6 - Esquema dos planos atômicos do cristal com espaçamentos e reflexões de raios-X que dão origem aos picos de Bragg..........................................................................31 Figura 7 - Representação de um difratômetro de pó convencional focalizado com um monocromador de raios-X que utiliza da geometria- Bragg Brentano [9]...............32 Figura 8 - Efeito da heterogeneidade e homogeneidade das partículas sobre a intensidade de raios-X. (a) Amostra heterogênea onde as partículas A e B contribuem de formas diferentes para o espectro, (b) Amostra homogênea onde as partículas A e B contribuem de formas iguais para o espectro...........................................................34 Figura 9 - Amostra de SrGa2O4 dopada com 1% de íons de Cr3+.............................................36 Figura 10 - Estrutura da amostra de SrGa2O4...........................................................................37 Figura 11 - Estrutura da amostra de SrGa2O4, mostrando os dois sítios...................................37 Figura 12 - Difratograma de raios-X da amostra em pó de SrGa2O4: Cr3+, onde (a) foi obtido com passo de 0,02° e tempo de contagem de 1s e (b) foi obtido com passo de 0,01° e tempo de contagem de 30s.....................................................................................39 Figura 13 - Difratograma de raios-X da amostra em pó de SrGa2O4: Cr3+ para o passo de 0,01° e tempo de 30s..........................................................................................................40 Tabela 1 - Parâmetros cristalográficos da estrutura do SrGa2O4 e do SrGa2O4:Cr3+...............43 Figura 14 - Difratograma do padrão do SrGa2O4:Cr3+. Os pontos representam a intensidade observada, a linha sólida representa a intensidade calculada, a linha sólida mais abaixo é a diferença entre as intensidades observada e calculada e as barras pequenas verticais refere-se aos picos de Bragg....................................................44 Figura 15 - Representação esquemática das curvas da energia molecular com seus níveis vibracionais em função da distância internuclear para dois estados eletrônicos com cada estado representando uma transição óptica. O deslocamento de Stokes entre os espectros de excitação e emissão é mostrado na figura.....................................46 Figura 16 - Laboratório de óptica dos sólidos (Instituto de Física da UFRJ)...........................48 Figura 17 - Diagrama dos principais elementos do sistema óptico usado para as medidas de fotoluminescência..................................................................................................50 Figura 18 - Esquema ilustrativo do processo de difusão térmica em uma amostra. Os pontos escuros representam as moléculas da camada de gás em torno da amostra durante o processo de expansão e contração............................................................................53 Figura 19 - Esquema ilustrativo do processo fotoacústico conhecido como efeito termoelástico. As linhas pontilhadas representam a dilatação térmica nãohomogênea sofrida pela amostra..............................................................................54 Figura 20 - Esquema ilustrativo do processo fotoacústico conhecido como expansão térmica. As linhas pontilhadas representam a expansão periódica da amostra...................54 Figura 21 - Foto do Laboratório de Espectroscopia Fotoacústica da Universidade Estadual de Maringá.....................................................................................................................55 Figura 22 - Diagrama dos principais elementos de um sistema experimental empregado em medidas fotoacústicas...............................................................................................56 Figura 23 - Espectro de emissão a temperatura ambiente do SrGa2O4:Cr3+ para um comprimento de onda de excitação fixado em 595 nm............................................58 Figura 24 - Espectro de emissão a temperatura ambiente do SrGa2O4:Cr3+ para um comprimento de onda de excitação fixado em 532 nm. A seta indica a possível posição da linha R da emissão dos íons de Cr3+ no SrGa2O4, que corresponde a transição 2E(2G)→4A2(4F)........................................................................................59 Figura 25 - Espectro de emissão a temperatura ambiente do SrGa2O4:Cr3+ para um comprimento de onda de excitação fixado em 595 nm, filtro R-70 (corta emissões abaixo de 680nm). A seta indica a possível posição da linha R da emissão dos íons de Cr3+ no SrGa2O4...................................................................................................60 Figura 26 - Espectro de excitação a 300 K do SrGa2O4:Cr3+. A linha de emissão foi fixada em 680 nm......................................................................................................................61 Figura 27 - Espectro de excitação a 300 K do SrGa2O4:Cr3+. A linha de emissão foi fixada em 735 nm......................................................................................................................62 Tabela 2 - Transições observadas e parâmetros de campo cristalino e Racah para os íons de Cr3+ nos sítios I e II do SrGa2O4...............................................................................65 Figura 28 - Espectro fotoacústico de absorção da amostra SrGa2O4:Cr3+ à temperatura ambiente. As gaussianas sob a curva experimental representam o ajuste realizado e a curva vermelha é o ajuste total para as seis gaussianas de ajuste..........................68 Tabela 3 – Comparação entre os resultados obtidos pelos espectros de excitação e de fotoacústica...............................................................................................................69 Figura 29 - Sinal fotoacústico da amostra SrGa2O4:Cr3+ à temperatura ambiente...................69 SUMÁRIO INTRODUÇÃO.............................................................................................................14 1 TEORIA DO CAMPO CRISTALINO........................................................................16 1.1 Interação Estática..........................................................................................................16 1.1.1 Simetria............................................................................................................................20 1.1.2 A configuração d3 – o íon de Cr3+....................................................................................23 1.2 Interação Dinâmica........................................................................................................25 2 CARACTERIZAÇÃO ESTRUTURAL DO COMPOSTO 2.1 Difração de raios-X........................................................................................................30 : 30 2.1.1 Descrição do equipamento...............................................................................................31 : 2.2 Preparação da amostra de .................................................................33 2.3 Tratamento térmico.......................................................................................................35 2.4 Estrutura cristalina do SrGa2O4...................................................................................36 2.5 Resultados obtidos e análise do difratograma.............................................................38 2.5.1 Refinamento.....................................................................................................................40 : 3 CARACTERIZAÇÃO ÓPTICA DO COMPOSTO .........................45 3.1 Espectroscopia Óptica...................................................................................................45 3.1.1 Emissão e excitação da fotoluminescência......................................................................46 3.1.2 Descrição do equipamento...............................................................................................48 3.2 Espectroscopia Fotoacústica.........................................................................................52 3.2.1 Absorção fotoacústica......................................................................................................52 3.2.2 Descrição do equipamento...............................................................................................54 3.3 Resultados obtidos e análise dos espectros..................................................................57 3.3.1 Resultados experimentais: fotoluminescência.................................................................58 3.3.2 Resultados experimentais: fotoacústica...........................................................................67 4 CONCLUSÕES..............................................................................................................71 REFERÊNCIAS............................................................................................................72 14 INTRODUÇÃO O interesse em desenvolver novos compostos que emitem na região do espectro visível e infravermelho próximo é justificado pelos recentes avanços nos laseres de estado sólido sintonizável e nas aplicações envolvendo transmissão de sinal, display, telas de plasmas, dispositivos ópticos etc. Deste modo, materiais dopados com íons metais de transição ou íons terras raras têm sido intensivamente estudados como meios ativos de matrizes óxidas. Em particular, os íons metais de transição têm sido largamente usados em materiais luminescentes. Neste caso, o Cr3+ é o íon com camada incompleta, 3d, mais estudado [30,32] , principalmente devido a forte absorção no visível e quando este é incorporado em uma rede óxida seus espectros ópticos são caracterizados por bandas largas de emissão, permitindo assim a sintonia do comprimento de onda de interesse [13,38]. Outro fato interessante em se estar desenvolvendo pesquisas com esse tipo de material é que embora esse íon tenha sido investigado em diversas redes hospedeiras, para materiais pertencentes à família dos fósforos ainda existem poucos trabalhos na literatura. E no caso do galato de estrôncio dopado com íons trivalente de cromo, é a primeira vez que está sendo estudado. Neste trabalho nós apresentamos e analisamos os resultados do estudo óptico do íon de Cr3+ inserido na rede do SrGa2O4. A emissão dos centros de cromo no galato de estrôncio é investigada por meio das técnicas de fotoluminescência e fotoacústica na temperatura ambiente. As transições pertencentes aos elétrons do íon de Cr3+ quando inserido no SrGa2O4, foram identificadas através das medidas de espectroscopia de emissão e excitação e confirmadas pelas medidas de absorção fotoacústica. Este trabalho está estruturado em três capítulos. No capítulo 1 fazemos uma breve abordagem sobre os tipos de interações que ocorrem quando o íon de Cr3+ interage com a rede cristalina de SrGa2O4. A primeira forma de interação exposta é a interação estática, onde apresentamos a teoria de campo cristalino, e os parâmetros de campo cristalino Dq, e de Racah B e C. Mostramos também o diagrama de Tanabe-Sugano para a configuração eletrônica d3, e a sua importância para a interpretação dos espectros ópticos. O segundo tipo de interação considerada foi à interação dinâmica onde é considerada a atuação dos fônons com a rede, nesse caso leva-se em consideração as coordenadas configuracionais para descrever a dinâmica do sistema. No capítulo 2 é exposto a estrutura cristalina do galato de estrôncio dopado com íons trivalentes de cromo. Para isso, fazemos uma breve abordagem sobre a técnica de difração de 15 raios-X e descrevemos o aparelho empregado para tais medidas. Em seguida apresentamos o método de preparação do composto e a estrutura cristalina do SrGa2O4. O resultado referente ao difratograma é apresentado, e com esse fazemos o refino da estrutura através do Método de Rietveld. No capítulo 3 apresentamos os fundamentos teóricos relacionados às técnicas de espectroscopia da fotoluminescência e de espectroscopia fotoacústica, descrevendo em seguida os equipamentos empregados. Os resultados de fotoluminescência e de fotoacústica são apresentados e as transições ópticas observadas nos espectros são identificadas. Os cálculos dos parâmetros de energia do campo cristalino e da repulsão intereletrônica são mostrados, caracterizando assim o sítio de ocupação e o tipo de ligação entre o íon impureza e os ligantes. Além disso, são apresentados os tempos de vida das emissões do Cr3+ observadas. Por fim apresentamos as conclusões e as etapas futuras a serem desenvolvidas. 16 1 TEORIA DO CAMPO CRISTALINO As características ópticas de um composto inorgânico dependem do tipo de íon (impureza ou dopante) que estamos inserindo na sua rede, bem como da rede na qual está sendo incorporado o íon. Essa interação faz com que a rede do cristal crie um potencial que modifica os estados eletrônicos do dopante, e este potencial é denominado de campo cristalino. Assim, quando excitamos, através de uma fonte eletromagnética, um composto inorgânico que foi dopado por um íon de configuração eletrônica incompleta, observa-se que os níveis eletrônicos do íon livre dopante são desdobrados via campo cristalino, produzindo assim linhas finas e/ou bandas largas nos espectros ópticos. Levando esse fato em consideração, as propriedades ópticas observadas no SrGa2O4:Cr3+, estão relacionadas ao desdobramento dos níveis eletrônicos do íon metal de transição Cr3+, inserido nessa rede cristalina como impureza. Este íon acaba por atuar como um centro opticamente ativo, onde os átomos dessa rede interagem com o íon dopante, através do campo cristalino [1]. Neste capítulo fazemos um breve resumo sobre a teoria de campo cristalino, que é tratada como uma interação estática, e, na sua parte final, sobre a influência da interação dinâmica da rede sobre o espectro óptico. 1.1 Interação Estática Considerando a situação de uma rede rígida, ou seja, nenhuma vibração, percebe-se que no momento da interação dos íons da rede (ligantes) com o íon (dopante), os níveis de energia referentes a este íon dopante quando ele era livre se desdobram. Esse desdobramento é devido à influência de um campo elétrico que é produzido no local do dopante, este campo elétrico estático é comumente chamado Campo Cristalino. Neste caso, quando este material é irradiado por uma fonte luminosa, as transições ópticas ocorrem entre os níveis energéticos desdobrados pela ação do campo cristalino [1]. Esses níveis de energia desdobrados podem ser determinados resolvendo-se a equação de Schroedinger: ѱ= ѱ (1.1) 17 em que H representa a hamiltoniana, que inclui as diferentes interações dos elétrons de valência do íon livre nos centros do cristal , ѱ são as autofunções desses centros e corresponde ao nível de energia do i-ésimo elétron de valência do íon dopante. Para resolver a eq. de Schroedinger utilizamos a teoria do campo cristalino. Essa teoria assume que os elétrons de valência estão relacionados ao íon livre e que os íons do cristal não penetram na região ocupada por estes elétrons de valência. Assim, a hamiltoniana dada pela eq. (1.1) pode ser reescrita como: = + (1.2) é o hamiltoniano do íon livre, considerando uma situação ideal em que este íon está isolado, e é a hamiltoniana do campo cristalino, que representa a interação dos elétrons de valência do íon livre com o campo cristalino eletrostático criado pelos íons do cristal [1]. Para aplicar a teoria da perturbação da mecânica quântica nós escrevemos o termo de íon livre da forma: = + + (1.3) é a hamiltoniana do campo central, termo que reflete o campo elétrico atuando nos elétrons de valência do dopante, dada por, = ∑&'( !" − % $ (1.4) em que ), no somatório, corresponde ao número de elétrons na camada incompleta do íon dopante, * é o momento linear do i-ésimo elétron, + é a massa do elétron com carga ,, - é o número atômico do íon impureza, é a distância entre o i-ésimo elétron e o seu núcleo. é o termo que leva em conta qualquer perturbação devido a interação coulombiana entre os elétrons de valência mais externos, dado por, = ! ∑&'( ∑&1'( ( .% /%0 . . − 1 . corresponde a distância média entre os elétrons i e j. (1.5) 18 23 representa a interação spin-orbita somada sobre estes elétrons, dada por: 23 = ∑&'( ∑&1'( 45 67 . 9 (1.6) 7 e 9 são, respectivamente, os momentos angulares orbital e de spin do i-ésimo elétron, 45 6 é definido como o parâmetro de acoplamento spin-órbita do i-ésimo elétron [1]. Deste modo, utilizando as eqs. (1.4), (1.5) e (1.6), podemos expressar a eq. (1.3) na forma dada por: = ∑&'( :!" − Para o termo % $ + ∑&1'( ! ( .% /%0 . + 45 67 . 9 ; (1.7) visto na eq.(1.2), temos, = ∑&'( ,<5 , > , ? 6 (1.8) sendo ,<5 , > , ? 6 a energia potencial criada pelos íons da rede para a posição 5 , > , ? 6, em coordenadas esféricas, do i-ésimo elétron de valência [1]. Assim sendo, tem-se a seguinte hamiltoniana total representada pela eq. (1.9): = ∑&'( :!" − % $ + ! ∑&1'( ( .% /%0 . + 45 67 . 9 + ,<5 , > , ∅ 6; (1.9) Após definirmos todos os termos que caracterizam o sistema íon-rede percebemos que dependendo da intensidade do termo de campo cristalino, representada pela eq. (1.8), em comparação com os três termos de íons livres, eqs. (1.4), (1.5), (1.6), diferentes interpretações podem ser consideradas para a solução da eq. (1.9) [1]: Campo cristalino fraco: Hcc << Hso, Hee. Neste caso, os níveis de energia do íon livre seriam apenas ligeiramente perturbados (deslocados) pelo campo cristalino. O campo cristalino fraco é característico dos lantanídeos (4fn) e dos actinideos (5fn). Os desdobramentos são da ordem de 50- 400 cm-1. Campo cristalino intermediário (médio): Hso << Hcc < Hee. Campo cristalino mais forte que a interação spin-órbita e menos importante que a interação entre os elétrons de valência 19 do íon livre. Essa aproximação é aplicada aos íons metais de transição da série 3d n em alguns cristais. Desdobramento do campo cristalino da ordem de 10000-20000 cm-1. Campo cristalino forte: Hso < Hee < Hcc. Neste caso, o efeito do campo cristalino é maior que o acoplamento spin- órbita e maior que a interação eletrostática. É característico dos íons do grupo paládio (4dn) e da platina (5dn). Desdobramento do campo cristalino acima de 20000 cm-1[2]. As soluções da hamiltoniana dada pela eq.(1.9) foram calculadas por Tanabe e Sugano [3] para as transições ópticas dentro de uma configuração eletrônica dn específica. Essas soluções são obtidas a partir da diagonalização das matrizes da configuração eletrônica, denominadas matrizes de Tanabe-Sugano, e são a base para a análise dos espectros de fotoluminescência de metais de transição em matrizes isolantes. Do mesmo modo, Tanabe e Sugano elaboraram para cada configuração eletrônica dn diagramas de energia que facilitam enormemente a compreensão das transições ópticas entre os níveis desdobrados. As expressões e os diagramas correspondentes às transições ópticas são expressos em termos de três parâmetros importantes: os parâmetros de Racah, B e C, e o parâmetro de campo cristalino Dq. Estes parâmetros podem ser definidos a partir da hamiltoniana dada pela eq. (1.3), incluindo o parâmetro de spin-órbita ξ e estão associados a cada uma das interações presentes na rede cristalina como descrito por: = + + ↓ B, C + ↓ ξ (1.10) ↓ Dq Os parâmetros B e C, chamados parâmetros de Racah, estão relacionados à hamiltoniana do íon livre e, devido à repulsão coulombiana entre os elétrons, eles representam uma medida da repulsão intereletrônica. Como os parâmetros de Racah B e C estão relacionados ao valor da energia de repulsão intereletrônica para o íon livre, eles fornecem uma medida do tipo de ligação predominante entre o íon dopante e os ligantes. Assim os parâmetros de Racah (B e C) denotam o grau de covalência da ligação entre os íons dopantes e os ligantes do cristal, sendo essa energia de repulsão intereletrônica originária da hamiltoniana Hee [4]. O parâmetro de campo cristalino, Dq, é responsável pelo desdobramento dos termos de energia do íon livre na presença de um campo cristalino. Este parâmetro depende da carga 20 efetiva dos ligantes Q, do valor médio do raio orbital r e da distância íon-ligante R e sua dependência pode ser expressa por: AB ∝ D〈% F 〉 HI (1.11) A partir desta eq., observamos que a intensidade do campo cristalino enfraquece quando o raio orbital diminui. Do mesmo modo, quanto maior à distância íon-ligante (R), menor a intensidade do campo cristalino. Os valores dos parâmetros Dq, B e C são determinados através dos espectros de absorção óptica e também através da utilização das matrizes e diagramas de Tanabe-Sugano da configuração do íon dopante. Na seção 1.1.2 mostraremos as expressões e o diagrama de Tanabe-Sugano para a configuração d3 do íon de Cr3+. O parâmetro de acoplamento spin-órbita ξ considera desdobramentos adicionais dos níveis do íon livre em cristais, causado pela interação entre o momento angular orbital e o spin do íon. Como mencionamos anteriormente, no caso do campo cristalino intermediário e forte esta interação é extremamente fraca quando comparado a Hcc e Hee, e pode ser desconsiderada. Este parâmetro tem um papel importante no caso em que o campo cristalino é fraco, ou seja, para íons terras raras. 1.1.1 Simetria Na seção anterior vimos que quando o íon livre é inserido na rede de um composto inorgânico seus níveis de energia são desdobrados. Este desdobramento vai depender da simetria da rede do cristal, ou seja, da distribuição espacial dos íons ligantes em torno do íon dopante, deste modo utilizando uma aproximação de primeira ordem, podemos considerar dois tipos de simetria para ocupação do íon dopante: Sítios com simetria octaédrica: Os seis íons ligantes localizam-se em torno do íon central, formando um octaedro, Figura 1(a); Sítios com simetria tetraédrica: Os quatro íons ligantes localizam-se em torno do íon central formando um tetraedro, Figura 1(b); 21 (a) (b) Figura 1: Arranjo do íon ligante (pontos preto) em torno de um íon central (localizado no centro do cubo, mas não exibido na figura): (a) octaédrico, (b) tetraédrico. Estes dois tipos de simetria são de extrema importância para a compreensão do comportamento do íon dopante inserido na rede cristalina, pois a orientação espacial do íon livre, representada pelos cinco orbitais de configuração dn, acaba por ser modificada. Caso o íon livre esteja na ausência do campo cristalino os cinco orbitais devem apresentar a mesma energia. Os cinco orbitais são descritos dz2, dx2- y2, dxy, dyz, e dzx, que correspondem a funções reais derivadas das combinações lineares de harmônicos esféricos [5]. Eles podem ser considerados inscritos em uma simetria cúbica, a princípio sem distorções [6] e estão representados na figura 2. Figura 2: Orientação dos orbitais d no espaço e aproximação dos ligantes com carga negativa através dos eixos x, y e z [1]. Deste modo considerando que o íon de configuração dn esteja localizado em uma rede de simetria octaédrica, como visto anteriormente, os níveis de energia do íon dopante se desdobram, de modo que os três orbitais (dxy, dxz e dyz), devido a similar simetria, ou seja, possuem seus lóbulos apontados para uma direção entre os íons negativamente carregados, irão ser afetados da mesma forma pelo ambiente octaédrico dos íons ligantes. Em outras palavras, estes três orbitais possuem a mesma energia. De forma similar os orbitais (dz2 e dx22 y ) por possuírem lóbulos apontados em direção aos íons negativamente carregados, também 22 serão afetados pela simetria octaédrica dos íons ligantes. Isto significa que o estado de energia dn, cinco vezes degenerado, se divide em dois níveis de energia em um ambiente octaédrico: um triplamente degenerado associado com os orbitais dxy, dxz e dyz (chamado t2g) e outro duplamente degenerado associado com os orbitais dz2 e dx2- y2 (chamado de eg) [1]. Assim para a configuração octaédrica o nível de energia triplamente degenerado (t2g) em termos de energia apresenta-se em um nível inferior ao nível original do íon livre por um fator de 4Dq. Isto se deve ao fato que os lóbulos desses orbitais se acomodam entre os ligantes para essa simetria, gerando uma configuração mais estável. Para o nível duplamente degenerado (eg), o nível energético se apresenta mais alto que o nível original por um fator de 6Dq. Neste caso, os lóbulos desses orbitais estão diretamente direcionados aos íons ligantes. Em um campo cristalino de simetria tetraédrica, a situação se inverte: o nível triplamente degenerado (t2g) é superior ao nível original por 4Dq e o nível duplamente degenerado (eg) é inferior ao original por uma quantidade de 6Dq. A separação entre os níveis de energia desdobrados pelos campos de simetrias octaédrica e tetraédrica é igual a 10Dq, onde Dq é o parâmetro de campo cristalino como mostra a figura 3. eg t2g 6Dq 4Dq 6Dq 4Dq eg t2g (b) (a) Figura 3: Esquema da divisão dos níveis de energia para um campo cristalino para diferentes simetrias: (a) octaédrico, (b) tetraédrico. A intensidade do parâmetro de campo cristalino para as duas simetrias, octaédrica e tetraédrica, estão relacionadas entre si através da seguinte relação: Q AB5JKLMéO PKM6 = − R 5L,L MéO PKM6AB (1.12) Em que se assume que a distância (R), eq. (1.11), entre o íon dopante e os ligantes são praticamente as mesmas para ambas as simetrias. Na eq. (1.12) o sinal de negativo indica a inversão entre os estado t2g e eg em relação a simetria octaédrica. 23 1.1.2 A configuração d3 - o íon de Cr3+ Nesta seção abordaremos o caso específico da configuração eletrônica d3, a mesma do íon trivalente de cromo. O diagrama de Tanabe-Sugano para esta configuração submetida à ação de um campo cristalino de simetria octaédrica é mostrado na figura 4. No eixo vertical temos os termos de energia do íon livre e no eixo horizontal temos a intensidade do campo cristalino. Nesse diagrama mostra o desdobramento dos termos de íon livre conforme a razão Dq/B aumenta, sendo Dq o parâmetro de campo cristalino e B o parâmetro de Racah. Para Dq/B igual a zero temos os níveis de energia de íon livre em unidades E/B, E corresponde a energia de transição. Por sua vez, para valores diferentes de zero temos os níveis de energia desdobrados. 70 2 3 A2 d 4 T1b 2 A1 60 4 T1a 50 2 F 4 T2 40 2 4 T1(4F) E/B Energia T2 30 2 T1 4 T2(4F) 2 G 4 P 2 20 E 10 Absorção 4 4 F 0 0,0 A2 0,5 1,0 1,5 2,0 2,5 3,0 3,5 4,0 Dq/B Figura 4: Diagrama de Tanabe-Sugano para a configuração eletrônica d3 (C/B = 4,5 para o ). A linha vertical pontilhada indica o valor de Dq/B para o cruzamento entre os níveis 2 2 E( G) e 4T2(4F). A linha vertical cheia corresponde ao valor de Dq/B para as transições ópticas observadas no espectro de absorção à esquerda para um íon metal de transição em uma rede hospedeira com esta configuração eletrônica. 24 No caso da configuração d3 o nível de energia fundamental do íon livre 4F se desdobra em três níveis de energia quando submetido à ação do campo cristalino octaédrico, ou seja, os estados, fundamental 4A2 e excitados 4T2 e 4T1. Do mesmo modo, os outros estados excitados do íon livre também se desdobram sobre a ação do campo cristalino. Por exemplo, o primeiro estado excitado do íon livre, 2G, se desdobra em dois outros níveis de energia: 2E e 2T1. Neste diagrama, a linha vertical pontilhada indica o cruzamento entre os estados 4T2(4F) e 2E(2G), nessa posição os estados são iguais em energia, e está localizada próxima a Dq/B = 2,3. Para valores de Dq/B > 2,3 o primeiro estado excitado é o 2E(2G) e o campo cristalino é considerado forte. Por outro lado, para valores de Dq/B < 2,3 o primeiro estado excitado é o 4 T2(4F) e o campo cristalino é considerado fraco. No caso de valores de Dq/B próximos ao cruzamento desses dois níveis, estamos na região que caracteriza o campo cristalino intermediário. Outra característica importante que pode ser considerada no diagrama de TanabeSugano é a dependência dos estados desdobrados em função da intensidade do campo cristalino. Podemos observar claramente no diagrama que os estados 2E(2G) e 2T1(2G) apresentam energias que são quase independentes da intensidade do campo cristalino (inclinação próxima à zero). A inclinação praticamente nula desses níveis de energia corresponde no espectro óptico a bandas estreitas. Na realidade, as emissões desses níveis de energia são transições proibidas por multiplicidade de spin, ou seja, ∆T ≠ 0, e possuem tempos de vida da ordem de milissegundos [5]. Por outro lado, os estados 4T2(4F) e 4T1(4F), possuem uma grande inclinação o que significa que a energia de separação entre esses níveis dependem fortemente do valor do parâmetro Dq. Deste modo, as bandas ópticas correspondendo a uma mesma transição aparecem em posições diferentes nos espectros de excitação e emissão. Esta grande influência do campo cristalino indica que as transições são muito sensíveis ao tipo de rede hospedeira. Estas transições são permitidas por multiplicidade de spin, ∆T = 0, e são caracterizadas por bandas largas e tempos de vida na faixa de dezenas a centenas de microssegundos. Finalmente, devemos mencionar que o diagrama de Tanabe-Sugano é dado para um valor especifico da razão C/B. Este valor depende do íon dopante e muito fracamente da rede hospedeira. No caso do Cr3+ esta razão é aproximadamente 4,5. Como um exemplo de como o diagrama de Tanabe-Sugano é usado para interpretar o espectro, mostramos na figura 4 um espectro de absorção para a configuração d3, junto com alguns níveis de energia relacionados a esse espectro. 25 Tanabe e Sugano também elaboraram as matrizes correspondentes aos níveis de energia para diversas configurações eletrônicas dn em uma simetria octaédrica [3]. Essas matrizes obviamente dependem dos parâmetros Dq, B, e C mencionados anteriormente e, uma vez diagonalizadas, fornecem as expressões para as diversas transições entre os níveis. No caso de uma configuração eletrônica d3, as expressões correspondendo às energias transições são dadas por: E [4A2(4F) →4T2(4F)] = 10Dq (1.13) E [4A2(4F)→4T1(4F)] = 7,5B + 15Dq – 0,5(225B2 + 100Dq2 – 180BDq)1/2 (1.14) E [4A2(4F)→4T1(4P)] = 7,5B + 15Dq + 0,5(225B2 + 100Dq2 – 180BDq)1/2 (1.15) E [4A2(4F)→2E(2G)] = 9B + 3C – (50B2)/(10Dq) (1.16) Logo após terem sido identificadas essas transições, nos espectros de absorção ou excitação da fotoluminescência, relacionam-se essas transições as posições em energia dadas pelos baricentros das bandas. A partir desses valores podemos determinar os parâmetros Dq, B, e C. Em geral, quando as transições proibidas por multiplicidade de spin, por exemplo, a transição 4A2(4F) → 2E(2G), são fracamente observadas nos espectros de excitação (absorção), podemos usar a posição em energia no espectro de emissão, pois ela varia muito pouco em relação ao espectro de excitação (absorção). A largura das transições observadas tanto nos espectros de emissão como nos espectros de excitação (absorção), ou seja, a forma das bandas, e o deslocamento das mesmas transições em relação aos dois espectros só podem ser explicadas pelo ponto de vista dinâmico da rede hospedeira que é apresentado na seção seguinte. 1.2 Interação Dinâmica Na seção anterior, nós consideramos que o centro óptico está incorporado em uma rede estática. Entretanto, em um cristal real, este centro faz parte de uma rede que vibra em torno dele, consequentemente, o ambiente que circunda o íon dopante não é estático, mas sim dinâmico. Assim, para compreender o efeito dinâmico em um espectro óptico, temos que considerar que o íon dopante está acoplado às vibrações da rede. Isto significa que os íons ligantes que rodeiam o íon dopante podem vibrar em volta de algumas posições médias e isto afeta o estado eletrônico do íon dopante. 26 A hamiltoniana estática dada pela eq. (1.2) deve ser alterada de modo a levar em conta o acoplamento íon-rede. Neste caso podemos reescrevê-la como: = onde ѱ= % + + % (1.17) é a hamiltoniana que descreve a rede. Agora a solução da eq. de Schroedinger, ѱ , é muito mais complicada e algumas aproximações devem ser feitas para considerar as diferentes forças de acoplamento. Para um acoplamento fraco entre o dopante e a rede, a intensidade do campo cristalino é baixa 5 ≈ 06 de modo que os movimentos eletrônicos e iônicos são praticamente independente um do outro. Neste caso, as bandas observadas correspondentes às transições eletrônicas são fracas. Para o acoplamento forte, a forma das bandas é fortemente afetada. A banda de emissão, que corresponde a uma única transição na rede estática, é fortemente alargada como um resultado do acoplamento com os fônons da rede hospedeira [1]. Para estudar esse tipo de acoplamento emprega-se o modelo de coordenada configuracional [1]. O modelo de coordenada configuracional baseia-se em duas principais aproximações: A primeira aproximação é chamada de aproximação adiabática que considera que os íons se movem muito lentamente em comparação aos elétrons de valência. Essa aproximação é razoável, pois os núcleos são mais pesados que os elétrons, e deste modo se movem numa escala de tempo menor. Com a aproximação adiabática o movimento nuclear e eletrônico podem ser resolvidos independentemente e assim a energia eletrônica pode ser extraídas como uma função da distância entre o íon dopante e o ligante [1]. Em outras palavras, isso significa que as autofunções podem ser fatoradas da seguinte forma: X = Y5 , Z 6 ∙ \5Z 6 (1.18) onde Y5 , Z 6 são as funções eletrônicas para o caso estático, para a coordenada 5Z 6, e \5Z 6 são as funções de onda vibracional. A segunda aproximação é denominada de modo de pulsação, na qual consideramos que o íon ligante pulsa radialmente “para cima e para baixo” sobre o íon dopante central. Neste caso, precisamos apenas de uma coordenada nuclear, chamada coordenada configuracional Q que corresponde à distância íon-dopante. Logo, a autofunção dada pela eq. (1.18) é simplificada da seguinte forma: X = Y5 , ]6 ∙ \5]6 (1.19) 27 A solução da eq. de Schroedinger para o centro de coordenada dinâmica leva as curvas de energia potencial para o estado fundamental F (inicial) e excitado E (final), como está esquematizado na figura 5, tal diagrama é denominado diagrama de coordenada configuracional. As curvas no diagrama representam a energia potencial de interação interiônica enquanto as linhas horizontais sobre cada curva representam o conjunto de energias vibracionais discretas permitidas (estados de fônon locais). Na figura 5, a transição AB corresponde à absorção de um fóton que leva o sistema do nível fundamental eletrônico-vibracional (m = 0) para um nível vibracional superior (n > 0) do estado eletrônico excitado. Em seguida ocorre um decaimento rápido, por emissão de fônons, do estado vibracional n > 0 para o estado vibracional n = 0 do nível eletrônico excitado e representado pela transição BC no diagrama. A partir desse estado vibracional, n = 0, ocorre um novo decaimento por emissão de fótons para o nível vibracional m > 0 do estado eletrônico fundamental (transição CD). Finalmente, a transição DA corresponde a emissão de multifônons do nível vibracional m > 0 para o nível vibracional m = 0 do estado fundamental (7). Energia Estado Excitado (E) B _ C )=0 ∆] Estado Fundamental (F) D ` +=0 A ] ]^ Q Figura 5: Diagrama de coordenada configuracional de um sistema de dois níveis incluindo os níveis de energia vibracional. As setas representam as transições ópticas e sua diferença em energia corresponde ao deslocamento de Stokes, observado entre os espectros de excitação e emissão. 28 Nota-se que as posições de equilíbrio, ] e ] ^ , são diferentes para os estados, fundamental e excitado. A diferença entre estas transições, representada por ∆] = ] ^ − ] , está relacionada ao deslocamento lateral dos estados, fundamental e excitado representado nas parábolas. Essa separação entre ] e ] ^ está associada diretamente a dependência do nível de energia eletrônico excitado com o campo cristalino. Em outras palavras, níveis de energia que dependem fracamente do campo cristalino terão uma separação ∆Q quase nula. Essa diferença ∆] ≈ 0 entre os potenciais, nos leva a observarmos tanto nos espectros de absorção como nos espectros de emissão as mesmas posições em energia para uma mesma transição. Por outro lado, níveis de energia que possuem uma dependência forte com o campo cristalino apresentarão uma separação ∆] importante e para uma mesma transição, observadas nos espectros de emissão e excitação, suas posições em energia serão relativamente afetadas. Deste modo, considerando o potencial cristalino dentro da aproximação do oscilador harmônico, podemos representar a energia do estado fundamental ` em que a = a ` da seguinte forma, ( + 5+ + !6ℏc (1.20) representa a energia do estado fundamental eletrônico e + é o número quântico associado ao estado vibracional na parábola do estado fundamental. Similarmente, podemos escrever a energia do estado excitado _ _ sendo que como ( = + 5) + !6ℏc (1.21) representa a energia do estado excitado eletrônico e ) é o número quântico associado ao estado vibracional na parábola do estado excitado. Das eqs. (1.20) e (1.21) pode ser demonstrado que a diferença em energia de uma mesma transição observada nos espectros de absorção e de emissão será dada por: ∆ 2d e = fg − " = 5+ + )6ℏc (1.22) Eabs e Eem correspondem as energias de absorção e emissão, respectivamente, para uma mesma transição óptica. Esse deslocamento em energia entre o estado fundamental e excitado é denominado de deslocamento de Stokes, indicando que existe uma forte diferença no 29 acoplamento elétron-rede para estes dois estados. O deslocamento de Stokes é uma característica importante identificada nos espectros, uma vez que evita uma forte sobreposição entre as bandas de excitação e emissão. Retornaremos a falar sobre o deslocamento de Stokes no capítulo 3. 30 2 CARACTERIZAÇÃO ESTRUTURAL DO COMPOSTO : O conhecimento da estrutura cristalina dos materiais é imprescindível para compreender e melhorar as suas propriedades físico-químicas. Para isso, existem diversas técnicas que permitem realizar a caracterização estrutural do material e, dentre elas, podemos destacar, principalmente, as seguintes: difração de raios-X, difração de nêutrons e luz sincrotron. Através destas técnicas podemos verificar, por exemplo, a formação adequada do composto, distinguir, se for o caso, as diversas fases presentes no material e a influência de possíveis dopantes sobre a estrutura original da amostra. Neste trabalho, utilizamos a técnica de difração de raios-X para caracterizar estruturalmente a nossa amostra de SrGa2O4:Cr3+. Assim sendo, nas seções seguintes apresentamos brevemente a teoria sobre esta técnica, o equipamento empregado, o método de preparo da amostra e os resultados obtidos, bem como a análise deles. 2.1 Difração de raios-X A difração de raios-X dentre as técnicas citadas acima é a mais comumente usada para a determinação da estrutura cristalina de um material. Os raios-X possuem um comprimento de onda da ordem de alguns angstrons, sendo da mesma ordem do espaçamento entre os átomos em um cristal. A compreensão da difração deste tipo de radiação foi feita pelo físico W.L. Bragg em 1913, que deu uma explicação simples para o feixe de raios-X difratados por cristais. Ele imaginou que os feixes incidentes eram refletidos especularmente por planos atômicos do cristal com cada plano refletindo apenas uma pequena parte da radiação, como um espelho parcialmente transparente, em que os feixes difratados são observados nas direções em que as reflexões nos planos paralelos dos átomos interferem construtivamente [8], como mostra a figura 6. 31 Feixe difratado Feixe incidente θ θ Planos atômicos do cristal θ θ θ θ θ θ d d Figura 6: Esquema dos planos atômicos do cristal com espaçamentos e reflexões de raios-X que dão origem aos picos de Bragg. A condição para que haja um pico na radiação espalhada é dada por: 2O sen > = )l (2.1) A eq. (2.1), responsável pela interferência construtiva, é conhecida como a Lei de Bragg, onde 2O sen > é a diferença de percurso entre os raios refletidos por planos vizinhos, > é o ângulo entre a direção do feixe incidente e o plano de átomos, l o comprimento de onda da radiação incidente, ) é um número inteiro e O corresponde à distância de separação de uma família de planos paralelos consecutivos. Deste modo, os raios do feixe difratado sofrerão interferências construtivas e destrutivas, gerando máximos e mínimos que darão origem ao difratograma para a análise das amostras. 2.1.1 Descrição do equipamento Para a obtenção do difratograma através de um experimento de difração de raios-X simples, dependendo da configuração do equipamento, a amostra é fixa com o detector ou a fonte girando ou, então, a amostra gira e o detector ou a fonte são fixos. O ângulo >é varrido em uma região onde os picos de difração aparecerão somente quando a lei de Bragg for satisfeita. De tal modo os picos de intensidade identificados no difratograma correspondem aos planos de difração de uma rede cristalina e estes são então indexados de acordo com o conjunto de planos que os geram. A partir desta indexação as distâncias interplanares podem 32 ser determinadas e posteriormente empregando técnicas de refinamento diversos parâmetros da estrutura cristalina podem ser obtidos [8]. As medidas de difração de raios-X foram realizadas no Centro de Pesquisas Brasileiras de Física (CBPF) mais especificamente no laboratório multi-usuário de Cristalografia e difração de Raios-X. Nestas medidas, utilizamos o difratômetro Panalytical, modelo X Pert Pro, tendo como fonte de radiação mn5Å6 =1,541874 e mp5Å6= 1,392250 do cobre, a tensão foi de 40 kV e a corrente de 40mA. Este difratômetro de raios-X emprega a Geometria de Bragg-Brentano em que a montagem é representada pela figura 7. Figura 7: Representação de um difratômetro de pó convencional focalizado com um monocromador de raios-X que utiliza a geometria Bragg-Brentano [9]. Na figura 7, So corresponde a direção do feixe incidente, S a direção do feixe difratado e 2θ o ângulo de difração. O movimento do difratômetro é sincronizado, de modo que os focos do feixe incidente e difratado estejam sobre um círculo de focalização (9) sendo que o raio do círculo de focalização varia com θ. Para este ângulo existem duas possibilidades de varredura: θ−θ, em que a fonte de raios-X (1) ou o detector (7) pode se mover ao longo de um círculo (8) (círculo do difratômetro de raio fixo), em cujo centro é a amostra fixada (4), ou pela configuração θ−2θ na qual a amostra é girada e a fonte ou o detector encontram-se estacionários, ou seja, nesta última configuração apenas um deles se move. As fendas de colimação (2), horizontal e vertical, definem a área de iluminação sobre a superfície da 33 amostra. Por sua vez, as fendas Soller (3) eliminam (reduzem) a divergência do feixe em uma direção enquanto as fendas anti-espalhamento (5) evitam que o espalhamento por moléculas de ar seja captado pelo detector. Os monocromadores (6) são cristais orientados com a finalidade de garantir que só haja feixe transmitido quando 2O sen > = )l [10]. Em nosso caso, as medidas associadas à caracterização estrutural da amostra de SrGa2O4:Cr3+ foram realizadas com esse tipo de geometria e uma varredura θ−2θ. 2.2 Preparação da amostra de : O objetivo de qualquer experimento de difração é obter os melhores dados possíveis, de modo que os dados possam ser corretamente interpretados e analisados. Para o sucesso de uma dada experiência de difração invariavelmente depende da escolha correta de preparação [11]. Utilizaremos o método cerâmico convencional de estado sólido que se baseia na mistura de óxidos e carbonatos, além da aplicação de um tratamento térmico que geralmente ocorre em temperaturas elevadas. É um processo simples, pouco contaminável e é o método mais empregado em laboratórios de pesquisa de materiais. Deste modo, quando se utiliza o método de reação de estado sólido, ou seja, método que usa componentes químicos em pó, devem-se macerar os pós de tal forma que a substância formada fique com uma aparência homogênea, o que irá contribuir para um composto sem fases espúrias. Por exemplo, ao passar uma amostra heterogênea pelos raios-X, a parte que foi bem macerada irá contribuir mais para o espectro do que a parte que não foi homogeneizada, devido aos diferentes planos cristalinos que formaram na amostra. Por sua vez em uma amostra cerâmica que foi completamente homogeneizada, os feixes de raios- X iram refletir nos planos da amostra cristalina de formas iguais contribuindo assim de forma igual para o espectro, como mostram as figuras 8 (a) e 8 (b). 34 (a) Amostra heterogênea I A B B A 2θ I (b) Amostra homogênea B A 2θ B A Figura 8: Efeito da heterogeneidade e homogeneidade das partículas sobre a intensidade de raios-X. (a) Amostra heterogênea onde as partículas A e B contribuem de formas diferentes para o espectro, (b) Amostra homogênea onde as partículas A e B contribuem de formas iguais para o espectro. Uma vez que as devidas precauções relacionadas à homogeneidade foram verificadas, a amostra policristalina SrGa2O4 dopada com 1 % de íons de Cr3+ foi preparada pelo método de reação de estado sólido. Neste caso, empregamos o carbonato de estrôncio (SrCO3), pureza de 99,99% o óxido de gálio (Ga2O3) pureza de 99,99% e o óxido de cromo (Cr2O3) de 99,97% de pureza como reagentes. Deste modo, para a obtenção do composto primeiramente escrevemos a eq. estequiométrica, levando em consideração que essa eq. deve ser escrita de acordo com o sítio que se deseja substituir pelo dopante. Em nosso caso queremos que o cromo ocupe o lugar do gálio, por possuírem a mesma valência e raios iônicos próximos (rCr3+ ≈ 0,64 Å e rGa3+ ≈ 0,62Å). Logo, T q + (1-x) rM! q + x !q →T srM5(/t6 t u! qR + q! (2.2) Em que x é a percentagem molar no sítio do dopante. Considerando 1% de Cr3+, obtemos a seguinte expressão, T q + 0,99rM! q +0,01 !q →T srM(,Qv , ! uqR + q! (2.3) 35 Com a eq. (2.3) balanceada, fizemos os cálculos para obter as massas molares de cada reagente, esses cálculos são feitos tomando as massas atômicas dos átomos que formam a matéria. Depois de feito os cálculos das massas moleculares para obter o galato de estrôncio dopado com 1% de óxido de cromo foram medidas as massas em uma balança digital de precisão (0,0001g), onde obtivemos: T q →0,6162g rM! q →0,7745g !q !q →0,0063g A partir das massas dos reagentes misturamos os pós ultrapuros de T q , rM! q e que em seguida foram homogeneizados em gral de ágata com um pistilo por 3hs. Depois da mistura se apresentar como pó finíssimo e cor homogênea, conseguimos 1,2134g do composto estequiométrico para a realização do tratamento térmico que diminuirá porque o CO2 evapora a altas temperaturas. 2.3 Tratamento térmico Para ocorrer uma reação química entre diferentes substâncias inorgânicas em pó, é preciso fornecer certa quantidade de energia, geralmente na forma de calor, que favoreça o encontro e a colisão entre elas. A energia também é necessária para romper ligações químicas existentes entre os átomos de cada substância, favorecendo, assim, a ocorrência de outras ligações químicas e a síntese de uma nova substância a partir das iniciais [12]. Em nosso caso, foram realizados dois tratamentos térmicos em altas temperaturas para a formação do composto SrGa2O4:Cr3+. Antes do primeiro tratamento térmico (pré-síntese), colocou-se a quantidade de pó obtida, no processo de homogeneização, em um cadinho de alumina devidamente esterilizado e levou-a, em seguida, ao forno elétrico modelo Jung com controlador N1100 pressão ambiente e forma de aquecimento resistivo. Para este primeiro tratamento este forno foi programado para elevar a uma temperatura de 970°C mantendo essa constante por 12h. Após a calcinação a 970°C a amostra apresentou 1,1839g, devido à evaporação de CO2, esta por sua vez foi submetida a moagem e com essa quantidade dividiu em 3 pequenas porções de 0,3928g. Para a formação das pastilhas circulares colocou-se a quantidade da 36 amostra de 0,3928g em uma matriz que seria exposto a uma pressão de 2 toneladas, esse procedimento foi feito com cada quantidade. Uma vez que as três pastilhas foram obtidas e colocadas novamente em um cadinho de alumina, iniciamos o segundo tratamento térmico. Neste tratamento, as pastilhas foram colocadas no forno e submetidas a uma temperatura de 1250°C por 24hs [13]. O forno foi então desligado e voltou a temperatura ambiente por inércia.Em seguida essas pastilhas foram novamente moídas de modo a eliminar aglomerados formados durante a calcinação. Os corpos cerâmicos foram conformados em uma matriz de aço inoxidavel formando pastilhas de aproximadamente 8 mm de diametro por 2 mm de espessura como observado na figura 9. Figura 9: Amostra de SrGa2O4 dopada com 1% de íons de Cr3+. 2.4 Estrutura cristalina do SrGa2O4 A estrutura cristalina do galato de estrôncio (SrGa2O4), com seus átomos ou moléculas espacialmente ordenados, é caracterizada por seis anéis de GaO4 tetraédrico que se cristalizam com uma fase estavél monoclínica. Os parâmetros da célula unitária para essa estrutura são caracterizados por a ≠ b ≠ c e α = γ = 90° ≠ β com grupo espacial P121/c1 [14], [15]. A estrutura do SrGa2O4 está relacionada a estrutura tridimita estufada com sequências de camadas tetraédricas. Essa estrutura possui largos íons cátions bivalentes Sr2+ ocupando o centro dos anéis de GaO4 tetraédricos [16] como pode ser visto na figura 10. Neste tipo de estrutura existem grandes canais abertos no conjunto, que fornecem locais adequados para cátions grandes de Sr2+ [17]. A figura 10 mostra estas camadas empilhadas em uma estrutura tridimita estufada com quatro camadas repetidas de tetraedros formando uma estrutura octaédrica. Os átomos de Sr ocupam o centro dos anéis. 37 Anéis de GaO4 Legenda: Estrôncio Oxigênio Sítio A com coordenação octaedro. Sítio B com coordenação octaédrica distorcida, ver Fig.11. Figura 10: Estrutura da amostra de SrGa2O4. A fórmula empírica da estrutura tridimita é AB2O4, onde o sítio A tem coordenação octaédrica, com cátion bivalente A2+, enquanto o sítio B tem coordenação octaédrica distorcida, com cátion trivalente B3+ [18], [19]. A distorção do sítio B pode ser visualizada na figura 11 onde supomos que a rede que apresenta a configuração que está ligada através dos vértices apresenta um campo cristalino mais intenso e a rede que está ligada pelas arestas possui um campo cristalino fraco em relação ao primeiro. Figura 11: Estrutura da amostra de SrGa2O4, mostrando os dois sítios. Percebemos através das figuras 10 e 11 que os galatos possuem uma estrutura aberta com cavidades túneis que são formados ao longo da rede cristalina [20], onde os íons Sr2+ 38 estão localizados em túneis apresentando dessa forma uma irregularidade, de nove vezes com relação a coordenação dos átomos de oxigênio. O que possibilita formar ao longo desses túneis duas diferentes camadas alternadas de poliedros SrO9. Portanto, um número significante de elétrons podem ser transportados em tal material óxido com estrutura túnel. 2.5 Resultados obtidos e análise do difratograma Após a amostra SrGa2O4:Cr3+ ter passado pelo tratamento térmico é necessário identificar se foi formado uma ou mais de uma fases ao longo da estrutura. Essa análise é obtida através de estudos comparativos entre valores das intensidades do difratograma padrão do SrGa2O4, disponível na literatura, tabela de dados JCPDS-ICDD (Joint Committee for Powder Diffraction Studies- International Centre for Diffraction Data), com as linhas de difração obtidas das amostras sintetizadas para estudos. Para descobrir se amostra desejada foi formada ou se formou alguma outra fase espúria utilizou-se a técnica de difração de raios-X. Uma das pastilhas foi pulverizada, manualmente, resultando em um pó fino, evitando efeito de orientação preferencial que prejudica a análise no momento do refinamento da estrutura pelo método de Rietveld, o qual será abordado mais adiante. A primeira análise pelo método de difração de raios-X foi feita no passo de varredura de 0,02 graus em um tempo fixo de contagem de 1 segundo em cada medida (tempo de exposição de passo), com uma varredura de 2θ entre 10° e 70°. Para obtermos um difratograma com maior intensidade nas linhas espectrais e obter um refinamento mais detalhado fizemos uma outra medida de difração de raios-X em que a amostra passou por uma varredura em um tempo de 30 segundos para cada passo de 0,01 graus obtendo assim um maior número de pontos, como pode ser observado na figura 12. 39 passo=0.02; tempo=1s (a) 3+ Intensidade(u.a.) SrGa2O4:Cr 20 40 60 passo=0.01; tempo=30s (b) 3+ SrGa2O4:Cr 20 40 60 2θ (graus) Figura 12: Difratograma de raios-X da amostra em pó de SrGa2O4:Cr3+, onde (a) foi obtido com passo de 0,02° e tempo de contagem de 1s e (b) foi obtido com passo de 0,01° e tempo de contagem de 30s. Depois de ter gerado o difratograma do Sr(Ga1,98Cr0,02)O4, comparamos este com o que possui o banco de dados PDF (Powder Diffraction File) n° 72.0222, o qual está inserido no programa X pert HighScore Plus da PANALYTICAL, que nos fornece uma família de compostos que foram formados a partir dos óxidos primários ( Sr; Ga; O). A partir dessa comparação, obtivemos as distâncias interplanares e os valores referentes à largura total à meia altura dos picos de difração, conseguindo desse modo identificar a formação de uma única fase presente na nossa amostra. Esta técnica é convencionalmente usada para investigar algumas características de amostras, tais como traços de impurezas, presença de fases espúrias e defeitos de estrutura, bem como para investigar a distorção no cristal. Assim o perfil obtido para um pico único de difração depende da distribuição espectral de energia da fonte, do monocromador empregado, da função de transmissão das fendas Soller e das formas das partículas e sua cristalinidade [11, 21, 22]. Deste modo, quando adquirimos um espectro de difração de pó, nossa informação experimental se reduz a um histograma de valores Yi, correspondendo a intensidade da difração para cada posição angular 2θi, que denominamos espectro de difração em pó [21], como pode ser visto na figura 13, para o passo de 0,01° no tempo de 30s. Nesta figura indicamos as posições dos principais planos (h, k, l), através de uma comparação direta com o 40 arquivo difração de pó (PDF), os outros picos também foram identificados o que indica que a (224) (400) (024) (041) (031) 3+ (004) (220) (113) (121) (200) (111) Intensidade(u.a.) 20 SrGa2O4:Cr (032) (202) amostra preparada tem uma única fase presente em toda extensão do espectro de difração. 40 60 2θ (graus) Figura 13: Difratograma de raios-X da amostra em pó de SrGa2O4:Cr3+ para o passo de 0,01° e tempo de 30s. 2.5.1 Refinamento A técnica de difração em materiais do tipo monocristais, ou seja, formados por um único cristal em uma única orientação cristalina e altamente ordenados, nos fornece a informação necessária para poder resolver a sua estrutura. No entanto, muitos materiais com interesse tecnológico não possuem esta característica e são constituídos de diversos cristais (grãos) com diferentes orientações espaciais. Estes materiais são denominados policristalinos. Neste caso, os materiais policristalinos empregam a técnica de difração de raios-X em pó para obter algum tipo de informação sobre suas estruturas, como é o caso da nossa amostra. A priori, o problema da difração em pó com respeito à difração em monocristais e, principalmente nos policristais, é que o espectro obtido omite muita informação difratada, 41 pois ele se encontra fortemente sobreposto, o que traduziria na impossibilidade de poder determinar a estrutura com suficiente resolução. Entre 1964 e 1966 o Dr. Hugo M. Rietveld desenvolveu um método efetivo para conseguir extrair toda a informação sobreposta nos espectros de difração em pó, conhecido como Método de Rietveld [11, 21, 22]. Esse método permite uma determinação estrutural precisa de qualquer material em pó. O método é baseado na construção de um padrão de difração calculado, de acordo com um modelo estrutural ICSD (Inorganic Crystal Structure Database - Base de dados de estruturas cristalinas), pela introdução direta dos dados cristalográficos, e é ajustado ao padrão observado experimentalmente, padrão este que pode ser observado anteriormente através da figura 13 para a nossa amostra. Ajustando os parâmetros, minimiza-se a diferença entre o padrão de pontos experimentais e o padrão de pontos calculados pelo método dos mínimos quadrados. A avaliação do progresso do refinamento e a concordância entre o perfil observado e o calculado são feitas pela estimativa dos resíduos e dos indicadores de qualidade do ajuste. O valor do índice de qualidade de refinamento S, denominado “goodness of fit” (GOF), é calculado pelo quociente dos resíduos como: S = (Rwp /Re) (2.7) sendo seu valor ideal igual a um, embora valores até três sejam aceitáveis. Na eq. (2.7), o resíduo Rwp (padrão ponderado) considera o erro associado a cada valor da intensidade, uma função do número de contagens, enquanto Re (esperado) é o erro esperado derivado do erro estatístico associado às intensidades medidas [22]. Consequentemente, estes resíduos são obtidos a partir das diferenças das intensidades calculadas e observadas, como pode ser verificado através das expressões: Zw = (} ! ∑ w 5y /y 6 x ∑ w z5y 6{ z Z = x∑ ~/• w yz | (} ! | (2.8) (2.9) sendo N é o número total de pontos difratados que foram observados e P é o número de parâmetros ajustados. Rwp é o fator que tem mais significado de todos R’s porque no 42 numerador encontra-se o resíduo Sy que apresenta a minimização no método dos mínimos quadrados e consequentemente está associado à qualidade do refinamento. Este valor de Sy é dado por: T€ = ∑ • 5‚ − ‚ 6! (2.10) onde, • = ( yz , é o peso, Yoi = intensidade observada do i-ésimo passo, Yci = intensidade calculada do i-ésimo passo. A partir do método de Rietveld descrito acima, refinamos os difratogramas obtidos para a nossa amostra de SrGa2O4 dopada com 1% de íons de Cr3+ a fim de que alcançássemos um valor para S próximo a unidade. Em um primeiro momento inserimos no programa denominado FULLPROF (programa de refinamento de estruturas cristalinas, utilizado para realizar os cálculos requeridos pelo Método de Rietveld [23]) os dados teóricos referentes à estrutura do composto SrGa2O4 puro. Estas informações foram obtidas no banco de dados do ICSD através da ficha 15539. Em seguida, também foi adicionado ao programa os dados obtidos experimentalmente e que correspondem ao difratograma da figura 13, referente à amostra de SrGa2O4:Cr3+. Uma vez que os dados teóricos e experimentais foram inseridos no programa, iniciou-se o cálculo dos parâmetros referente à célula da amostra policristalina SrGa2O4:Cr3+. Para a obtenção do difratograma refinado foi necessário adequar os parâmetros estruturais, de tal forma que melhor se ajustassem aos dados teóricos para a amostra não dopada. Esse ajuste foi feito simultaneamente aos dos parâmetros instrumentais, por exemplo, ao deslocamento da amostra com relação ao plano do cristal, a orientação preferencial, o background e o fator de escala. Assim, para que ao final do processo de refinamento conseguíssemos valores que correspondessem aos dados teóricos da célula do cristal obtido através do ICSD, estes dois tipos de parâmetros foram combinados ao longo do processo de refinamento resultando no total de quarenta e três parâmetros refinados. Após o processo de refinamento obtivemos um valor para S de 1,6, o que corresponde a um bom ajuste como mencionado anteriormente. Deste modo, conseguimos determinar quantitativamente a 43 estrutura da amostra de SrGa2O4:Cr3+ a partir das informações fornecidas pelo espectro de difração da mesma, como pode ser observado na Tabela 1. Tabela 1: Parâmetros cristalográficos da estrutura do SrGa2O4 e do SrGa2O4:Cr3+ Refinamento dos dados de difração de pó M5Å6 ƒsÅu K5Å6 α β γ <5Å ) Sistema do cristal: Grupo espacial: (ICSD) 8,390 9,018 10,697 90,0 93,9 90,0 807,66 Monoclínica P121/c1 Rwp = 0,630 : (Calculado) 8,379 8,997 10,683 90,0 93,9 90,0 803,40 Monoclínica P121/c1 Rexp = 0,388 “Goodness-of-fit” = 1,6 A Tabela 1 apresenta os dados calculados referentes aos parâmetros da célula unitária (a, b, c, α, β, γ) do composto SrGa2O4:Cr3+ dopado, mostrando que os valores se assemelham aos parâmetros do composto SrGa2O4 sem dopar, com um desvio na segunda casa decimal. Da mesma forma o valor do volume da célula unitária também é próximo ao valor da referência ICSD, apresentando uma pequena diminuição no SrGa2O4:Cr3+ . Essa diminuição de 0,5% no volume pode estar relacionada ao erro instrumental. A figura 14 mostra o difratograma obtido ao final do refinamento. Neste espectro podemos ver que para o padrão de difração da amostra não se observa reflexões de outras fases ou elementos, como era de se esperar pelos dados expostos através da Tabela 1. Vemos também que através da diferença entre os dois padrões de difração houve uma minimização entre os padrões calculado e observado para a amostra de SrGa2O4:Cr3+, sendo que esta diferença é praticamente insignificante, pois os valores calculados através do método de Rietveld se ajustam de forma satisfatória aos valores teóricos como pode ser observado nesta figura pela superposição dos dois difratogramas. Em resumo, a substituição de 1% do Ga pelo Cr não produz alterações significativas na estrutura cristalina da amostra. 44 Intensidade(u.a.) Calculado Observado Observado - Calculado Posição de Bragg 20 40 60 2θ Figura 14: Difratograma do padrão do SrGa2O4:Cr3+. Os pontos representam a intensidade observada, a linha sólida representa a intensidade calculada, a linha sólida mais abaixo é a diferença entre as intensidades observada e calculada e as barras pequenas verticais refere-se aos picos de Bragg. 45 3 CARACTERIZAÇÃO ÓPTICA DO COMPOSTO : Quando inserimos um íon metal de transição na rede cristalina de um composto, o íon reorganiza seus níveis de energia de modo a se adequar a estrutura da rede cristalina. Por sua vez, os elétrons desses níveis de energia podem ser excitados por uma fonte de luz e o seu comportamento analisado através de medidas ópticas. Deste modo utilizamos neste trabalho diferentes técnicas ópticas com destaque para a fotoluminescência e a fotoacústica com a finalidade de identificarmos os tipos de transições realizadas pelo íon quando excitado por luz e também para medir os tempos de vida dessas transições. Neste capítulo, abordamos brevemente os fundamentos das técnicas de espectroscopia óptica e fotoacústica empregadas para a identificação das transições ópticas e descrevemos o equipamento padrão necessário para a obtenção dos respectivos espectros. Finalmente, apresentamos os resultados que permitem a caracterização óptica do composto SrGa2O4:Cr3+ bem como a análise dos mesmos. 3.1 Espectroscopia Óptica Para a obtenção de um espectro óptico empregamos a espectroscopia óptica, que é um ramo da espectroscopia que se situa na região de comprimento de onda entre 200 nm e 3000 nm, ou seja, do ultravioleta passando pelo visível até alcançar o infravermelho próximo. Esta técnica é uma excelente ferramenta para caracterizar a estrutura eletrônica de centros opticamente ativos através dos espectros de emissão/excitação, bem como fornece informações sobre suas posições reticulares e as respectivas vizinhanças. Em termos gerais a espectroscopia óptica consiste em analisar espectralmente um determinado sistema atômico após ter sido exposto a uma fonte luminosa possibilitando que ele saia do estado fundamental para o estado excitado depois que fótons são absorvidos com uma frequência apropriada, e em seguida decaia para o estado fundamental pela emissão espontânea de fótons. Este processo é denominado de luminescência. Neste trabalho, o nosso centro opticamente ativo refere-se ao íon dopante Cr3+ que produz bandas de emissão e de excitação ou absorção quando inserido na rede do SrGa2O4 que são diferentes dos da rede cristalina pura [24]. Como as amostras desse trabalho não são transparentes, a técnica de absorção óptica não pode ser empregada diretamente e devemos utilizar a técnica de excitação da fotoluminescência. Na seção seguinte 46 faremos uma breve descrição dos mecanismos associados a fotoluminescência (emissão) e a excitação da fotoluminescência. 3.1.1 Emissão e excitação da fotoluminescência A absorção de luz é somente um dos múltiplos mecanismos pelo qual um sistema pode ser excitado, em geral a luminescência é a emissão de luz por um sistema que é excitado por alguma forma de energia, e quando a excitação ocorre com luz chamamos de fotoluminescência [7]. Essa energia adquirida pelo material devido à absorção dos fótons pode ser perdida para o ambiente constituindo-se como radiação térmica. Isso ocorre devido à relaxação vibracional da rede cristalina, consequentemente os comprimentos de onda das bandas de excitação nos espectros ópticos possuem valores inferiores àqueles das mesmas bandas nos espectros de emissão. Esse deslocamento para baixas energias é observado no espectro de fotoluminescência em relação ao espectro de excitação é chamado de deslocamento de Stokes como pode ser observado na figura 15. Emissão Absorção Energia Deslocamento de Stokes Figura 15: Representação esquemática das curvas de potencial com seus níveis vibracionais em função da distância internuclear para dois estados eletrônicos com cada estado representando uma transição óptica. O deslocamento de Stokes entre os espectros de excitação e emissão é mostrado na figura. 47 Na figura 15, vemos duas parábolas representando os estado eletrônicos fundamental e o primeiro estado excitado enquanto os níveis vibracionais são representados por linhas horizontais sobre estas curvas de potencial. Em geral, os elétrons quando excitados (por absorção no visível ou no ultravioleta), não voltam ao nível fundamental diretamente (emitindo radiação com frequência igual à absorvida), mas sim passando por níveis de energias intermediários e emitindo fótons com frequências inferiores. Quando os elétrons de valência da impureza sofrem transições do estado fundamental para o estado eletrônico excitado, a sua distribuição em torno do núcleo é alterada, influenciando a interação da impureza com os ligantes, e tornando a configuração instável. Uma parte da energia absorvida pela impureza será então cedida à rede para que os ligantes ocupem novas posições de equilíbrio. A relaxação do íon ocorrerá sob esta nova configuração, e o estado fundamental será alcançado somente após uma recomposição dos íons da rede em direção à configuração original. Consequentemente, a impureza cede energia à rede, tornando a energia associada à emissão inferior à da absorção [24]. A intensidade da interação do íon com a rede tem um papel fundamental nos espectros de emissão e excitação observados. Em geral, quando a interação do íon com a rede é fraca o espectro de emissão apresenta linhas estreitas e intensas e, se a interação íon-rede é forte, as linhas se alargam formando bandas com intensidades mais fracas. As transições entre os níveis vibrônicos que ocorrem nos materiais dopados, resultantes das interações do íon na rede hospedeira com a radiação eletromagnética, alteram a distribuição da população pelos diferentes níveis de energia. Seguem-se processos de decaimento radioativos e não-radiativos, designados por processos de relaxação, cuja dinâmica contribui para determinar o tempo do íon dopante no estado excitado, influenciando a forma do espectro. De fato, quanto menor for o tempo de vida de um estado excitado, maior será o domínio de frequências associadas a processos não-radiativos (fônons). Logo, o tempo de vida de um íon excitado pela absorção de radiação está relacionado aos mecanismos que proporcionam o decaimento do mesmo do estado excitado para um estado de menor energia e influencia o perfil da banda espectral [26]. 48 3.1.2 Descrição do equipamento Para investigar em detalhes os níveis energéticos de um centro opticamente ativo é necessário recorrer a vários tipos de experiências espectroscópicas efetuadas em diferentes regiões do comprimento de onda da radiação incidente no material. Os espectros de emissão e excitação da fotoluminescência, apresentados neste trabalho, foram obtidos em temperatura e pressão atmosférica ambiente. Essas medidas foram realizadas no Laboratório de Óptica dos Sólidos da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e os equipamentos empregados são mostrados na figura 16. Figura 16: Laboratório de óptica dos sólidos (Instituto de Física da UFRJ). 49 Um diagrama do sistema óptico é apresentado na figura 17. Nesse esquema, a amostra (1) é colocada numa célula ou suporte, adequados às condições da experiência. A fonte de luz usada para excitar a amostra foi uma lâmpada halógena de tungstênio 50 W (2) que emite continuamente na região de comprimento de onda de 300 nm a 800 nm. O feixe luminoso é modulado em amplitude por um modulador eletromecânico (3), também denominado “chopper”, da Princeton Applied Reseach, modelo 191. A frequência de modulação deste mecanismo é transmitida como sinal de referência para o amplificador síncrono “lock-in” (4), modelo EGG 5209. A luz é então focalizada por meio de uma lente (L1) na fenda de entrada do primeiro monocromador (5), o qual serve para selecionar o comprimento de onda da radiação de excitação na amostra. Por isso, este monocromador também é denominado monocromador de excitação. Ele possui uma configuração óptica do tipo Czerny-Turner onde ela é composta essencialmente de dois espelhos esféricos, uma rede de difração e as fendas de entrada e saída do sistema. Em nosso caso, o monocromador empregado é da Acton Research Corporation, modelo AM505F. O feixe luminoso que sai do monocromador de excitação, através da fenda de saída, é focalizado pela lente (L2) sobre a amostra (1), a qual emite uma luz espalhado que é focalizado pela lente (L3) em direção à fenda de entrada do segundo monocromador (6). Este monocromador tem a função de varrer a emissão luminosa da amostra, consequentemente ele é denominado monocromador de emissão ou espectrômetro. Este segundo monocromador possui a mesma configuração óptica do primeiro e em nossas medidas trabalhamos com o equipamento fabricado pela MacPherson, modelo 2061. A luz emitida pela amostra é detectada por uma fotomultiplicadora (7) da marca RCA tipo C31034-128 acoplado na fenda de saída do espectrômetro e enviado para o amplificador síncrono “lock-in”. O “lock-in” compara o sinal de referência do “chopper” com o sinal da fotomultiplicadora e se as frequências dos dois sinais forem as mesmas este sinal é amplificado e enviado para um microcomputador (8) onde é processado. A partir deste aparato experimental, os seguintes tipos de medidas foram realizadas: 50 (8) (6) (4) Filtro (7) L3 L2 (5) (1) (2) (3) L1 Figura 17: Diagrama dos principais elementos do sistema óptico usado para as medidas de fotoluminescência. (i) Espectroscopia de emissão luminescente ou fotoluminescência Para obter o espectro de emissão luminescente, o primeiro monocromador (monocromador de excitação) é fixado em um determinado comprimento de onda com a finalidade de selecionar o comprimento de onda da radiação incidente sobre a amostra. Este valor fixado corresponde a uma região do espectro em que a absorção pela amostra é possível. Por sua vez, a intensidade da luz emitida pela amostra é medida ao fazer a varredura em comprimento de onda com o monocromador de emissão. Cada comprimento de onda que incide sobre a fenda do monocromador entra em uma posição horizontal diferente e só o comprimento de onda na posição da fenda pode passar através desta. Variando a largura das fendas de entrada de 2mm e de saída modifica-se a resolução espectral do sistema e a intensidade da luz detectada. A varredura em comprimento de onda é feita ao girar a rede de difração para diferentes ângulos, sendo que a rede de difração opera com sua eficiência máxima no ângulo ou comprimento de onda de brilho ou “blaze”, λblaze [38]. Em nosso caso, o monocromador de excitação utiliza uma rede de difração holográfica sem “blaze” enquanto 51 que o monocromador de emissão possui um λblaze em 500 nm. Na entrada do segundo monocromador colocamos filtros ópticos com resolução de aproximadamente 1nm cuja função principal no experimento é evitar que a luz de excitação se sobreponha à emissão da amostra. Os filtros utilizados foram da marca Corning, dos tipos CS2-64 (corta emissões abaixo de 610nm) e R-70 (corta emissões abaixo de 680nm). (ii) Espectroscopia de excitação da fotoluminescência Nas medidas de excitação fixa-se no espectrômetro (monocromador de emissão) o comprimento de onda correspondente à emissão luminescente da amostra e realiza-se a varredura do espectro com o monocromador de excitação. Os resultados são corrigidos de acordo com as respostas experimentais obtidas e por variações nas intensidades da lâmpada, ou seja, se fez uma normalização com o espectro de emissão da lâmpada. Os filtros utilizados foram da marca Corning, dos tipos CS2-64 e R-70. Deste modo, um espectro de excitação é obtido medindo-se a intensidade de luminescência em um comprimento de onda fixo, enquanto o comprimento de onda de excitação é variado. Em outras palavras, o espectro de excitação da fotoluminescência corresponde a resposta de uma dada emissão luminescente em função da energia de excitação que incide na amostra. (iii) Medidas de tempo de vida – método do deslocamento de fase. Para medir o tempo de vida associado às transições eletrônicas dos centros opticamente ativos do material luminescente, depois de excitados por uma fonte luminosa, usamos o método de deslocamento de fase. Neste método o monocromador de emissão é fixado no comprimento de onda que corresponde ao baricentro da banda de luminescência (comprimento de onda que fornece um sinal intenso). Identifica-se no amplificador síncrono “lock-in” a fase ∅ relacionada ao sinal maximizado pela excitação. Em seguida, muda-se a posição da rede de difração do espectrômetro até que a luz de excitação espalhada pela amostra seja detectada pela fotomultiplicadora e variamos a fase no amplificador “lock-in” até que o sinal seja novamente maximizado, nesse caso retirou-se o filtro. Esta fase ∅ corresponde a um tempo de decaimento zero (luz direta). Com estes dados experimentais e com a frequência de modulação da amplitude da luz ν, que é idêntica para a medida de ∅ e de ∅ , pode-se obter o tempo de vida … ou tempo de decaimento do estado luminescente, dado por [24]: 52 …= †‡ˆ|∅/∅Š | !‹Œ (3.1) 3.2 Espectroscopia Fotoacústica A espectroscopia fotoacústica é uma técnica que fornece um meio de obter espectros de absorção nas regiões do ultravioleta, visível e infravermelho de amostras sólidas, semisólidas ou líquidos turvos. Esses espectros nos possibilitam uma investigação detalhada das bandas de energia de um determinado material e permitem a identificação das transições ópticas envolvidas, além de nos fornecer certos parâmetros ópticos, tais como o coeficiente de absorção óptica, a eficiência quântica de transição não radiativa, etc. [35]. A aquisição de espectros para os tipos de amostras citadas, a partir de métodos convencionais, é geralmente difícil, no mínimo, devido ao espalhamento e à reflexão da luz. A técnica fotoacústica foi escolhida por ser rápida, sensível e não destrutiva, ou seja, não necessita de contato físico durante a aquisição de dados. O sinal fotoacústico obtido na espectroscopia fotoacústica é o resultado da conversão da energia eletromagnética de amplitude modulada em energia térmica modulada, através do decaimento não-radiativo no material absorvedor. No processo de decaimento não-radiativo ocorre a liberação de calor que parte dos pontos dentro do material em que a luz foi absorvida. A propagação de calor faz surgir uma flutuação térmica superficial no material, esta flutuação é monitorada por um detector. As técnicas referentes a fenômenos envolvendo geração de calor causada pela absorção de uma radiação modulada ou pulsada como, por exemplo, calorimetria, emissão infravermelha, espectroscopia fotoacústica, lente térmica, deflexão superficial etc. são denominadas Ciências Fototérmicas. 3.2.1 Absorção fotoacústica O sinal obtido através da absorção fotoacústica pode ser gerado através de três mecanismos em uma amostra sólida: o de difusão térmica, o da expansão térmica e o da flexão termoelástica. Com medidas de amplitude do sinal fotoacústico em função da frequência de modulação da onda podemos identificar qual dos processos é predominante para a sua geração. Ao incidir luz modulada sobre uma amostra sólida, alguns destes 53 processos podem ocorrer simultaneamente. Porém, dependendo de suas propriedades térmicas e ópticas, um desses mecanismos predominará sobre os demais. O mecanismo de expansão térmica geralmente predomina na geração do sinal em amostras cerâmicas na forma de pó dopadas com metais de transição [35]. Difusão térmica A amostra ao receber um feixe de luz modulada, o absorve e, em seguida, o converte em energia térmica. A energia se difunde pela amostra até a superfície em contato com o gás presente na célula. Este calor se transfere para o gás e apenas uma fina camada de gás localizado nas vizinhanças da amostra irá responder termicamente às variações de temperatura da amostra, sofrendo uma expansão e comprimindo o restante do gás na célula. A fina camada de gás atuará como um pistão acústico, sofrendo um processo cíclico de expansão e contração, gerando assim o sinal fotoacústico. Quando este processo é o predominante na amostra, a intensidade do sinal é proporcional a Y /(,•, onde f é a frequência de modulação da radiação incidente [27, 36]. A figura 18 ilustra este mecanismo. Figura 18: Esquema ilustrativo do processo de difusão térmica em uma amostra. Os pontos escuros representam as moléculas da camada de gás em torno da amostra durante o processo de expansão e contração. Efeito termoelástico Neste processo a geração de calor não é uniforme, pois surge um gradiente de temperatura dentro da amostra, perpendicular á face de maior dimensão. A diferença de temperatura ocasiona uma dilatação térmica não-homogênea nos diversos planos da amostra, criando uma vibração na direção perpendicular ao plano da amostra, resultando no sinal fotoacústico, como mostra a figura 19. Quando o efeito termoelástico é o mecanismo de geração do sinal dominante na amostra, a dependência do sinal com a frequência de modulação exibe uma dependência proporcional a Y /(,• para baixas frequências (abaixo de 100 Hz) e Y /(, para altas frequências [36]. 54 Figura 19: Esquema ilustrativo do processo fotoacústico conhecido como efeito termoelástico. As linhas pontilhadas representam a dilatação térmica não-homogênea sofrida pela amostra. Expansão térmica Neste mecanismo, a radiação é absorvida pela amostra que a converte internamente em energia térmica, ocasionando um processo de expansão. Ao se expandir periodicamente, a amostra submete o gás no interior da célula a uma variação de pressão que é captado pelo microfone e gera o sinal fotoacústico [36], como representado pela figura 20. O sinal neste caso é proporcional à temperatura média da amostra. Quando este processo é o predominante na amostra, a intensidade do sinal é proporcional a Y /(, . Figura 20: Esquema ilustrativo do processo fotoacústico conhecido como expansão térmica. As linhas pontilhadas representam a expansão periódica da amostra. 3.2.2 Descrição do equipamento O efeito fotoacústico é observado com a condição que a radiação seja absorvida pela amostra sólida, deste modo à potência do som resultante está diretamente relacionada à grandeza associada ao processo de absorção. Em nosso caso, as medidas fotoacústicas da amostra SrGa2O4 dopada com íons de Cr3+ foram realizadas em dois laboratórios distintos. Inicialmente, usamos o sistema experimental disponível no Laboratório de Caracterização Óptica e Térmica (LCOT) do Instituto Politécnico (IPRJ) do Campus regional da UERJ em Nova Friburgo. Os espectros obtidos nessas medidas situavam-se entre o intervalo de comprimento de onda de 400 nm e 900 nm. Como também estávamos interessados em observar bandas de absorção fotoacústica em comprimentos de onda inferiores a 400 nm, realizamos outras medidas fotoacústicas em um laboratório diferente, visto que no LCOT 55 estávamos limitados ao intervalo de comprimento de onda mencionado. As medidas posteriores foram feitas no Laboratório de Espectroscopia Fotoacústica, na Universidade Estadual de Maringá (UEM) que permite obter espectros na região de comprimento de onda situada entre 200 nm e 920 nm. Em ambos os casos os espectros foram obtidos na temperatura e pressão atmosférica, ambientes. Uma foto do equipamento empregado nas medidas fotoacústicas realizadas no Laboratório de Espectroscopia Fotoacústica da UEM é apresentada na figura 21 e uma descrição do sistema experimental para essas medidas é mostrada na figura 22. Figura 21: Foto do Laboratório de Espectroscopia Fotoacústica da Universidade Estadual de Maringá. Esse efeito fotoacústico é observado quando um gás em uma célula fotoacústica fechada contendo a amostra (1) é irradiado com um feixe de luz modulado. No laboratório da UEM utiliza-se como fonte luminosa uma lâmpada policromática (2) de arco de alta pressão de xenônio da Oriel com potência de 1000 W, modelo 68820. Essa luz é focalizada pela lente (L1) na fenda de entrada do monocromador (3) da Oriel, modelo 77325, que separa a luz branca em suas diversas componentes, obtendo-se luz monocromática. O filtro (4) localizado na saída do monocromador é da marca Oriel e ele fornece a curva de resposta em frequência. 56 Depois do feixe luminoso ter passado pelo filtro ele é modulado em amplitude por um modulador eletromecânico “chopper” (5) Stanford SR 540. Em seguida, essa luz modulada reflete em um espelho plano (6) e passa pelas lentes (L2) e (L3), que colimam o feixe modulado até a célula fotoacústica onde se encontra a amostra (1) em forma de pó. Esta célula é lacrada com uma lâmina de quartzo, transparente a radiação incidente, contendo, além da amostra, ar atmosférico ou outro gás não-absorvedor. Deste modo, o sinal fotoacústico é gerado no interior da célula e é detectado por um microfone sensível (7) caso a frequência de modulação esteja no intervalo de frequência acústica. Esses pulsos de pressão são enviados para o detector sincrônico “lock-in” (8), EG&G, modelo 5110, que compara a frequência do sinal do microfone com a frequência de modulação do sinal de referência fornecido pelo “chopper”. Se ambos os sinais possuírem a mesma frequência, o sinal fotoacústico é amplificado e retificado, sendo enviado para um microcomputador (9) onde é analisado e processado. A radiação refletida ou espalhada pela amostra não tem efeito no microfone e, portanto, não interfere. Esta última propriedade é talvez a característica mais importante do método [28]. (9) (5) (6) (4) (3) L2 (2) L3 L1 (1) (7) (8) Figura 22: Diagrama dos principais elementos de um sistema experimental empregado em medidas fotoacústicas. Com a montagem descrita acima, os espectros de absorção fotoacústica são obtidos ao variarmos o comprimento de onda da luz modulada que atinge a amostra e anotando para cada um destes comprimentos de onda a amplitude e a fase do sinal gerado. O espectro obtido necessita ser normalizado em relação ao espectro da lâmpada, devido às variações espectrais 57 de sua intensidade luminosa. Para isso, usamos como amostra de referência pó de carvão vegetal, que é um excelente absorvedor de luz e permite reproduzir o espectro de emissão da lâmpada. Finalmente, como mencionado no inicio desta seção, a espectroscopia fotoacústica é uma técnica não-destrutiva muito útil para a obtenção dos espectros de absorção óptica de sólidos, semi-sólidos, líquidos e gases, e é eficiente para o estudo de amostras opticamente opacas e espalhadoras de luz. 3.3 Resultados obtidos e análise dos espectros A análise das transições eletrônicas realizadas pelos elétrons de um íon em um dado material, quando se incide sobre ele um feixe de luz, pode ser realizada por duas técnicas que se complementam: a espectroscopia óptica e a espectroscopia fotoacústica. Esse dois métodos, mesmo se fundamentando no processo de absorção de fótons, acabam por contribuir de modos particulares à interpretação dos espectros. O primeiro se baseia em um processo radiativo onde, ao se variar o comprimento de onda relativo a energia de excitação, podemos separar as bandas de emissão que supostamente estejam superpostas no espectro de emissão. Isto indica que esta técnica tem uma grande sensibilidade com relação a energia de excitação, permitindo a identificação de emissões luminescentes oriundas de diferentes sítios ou fases da amostra dopada, ou seja o espectro de excitação da fotoluminescência da amostra mostrará as bandas correspondendo as diferentes emissões oriundas dela. O segundo método, a espectroscopia fotoacústica, leva em consideração processos não-radiativos, em outras palavras está associado a conversão da radiação eletromagnética em energia térmica e ele nos fornece um espectro de absorção completo. Este espectro só leva em conta a radiação absorvida pela amostra, o que pode ser considerado um ponto positivo, visto que a espectroscopia fotoacústica desconsidera perdas com relação ao espalhamento da radiação sobre a amostra. Consequentemente, utilizando as duas técnicas obtemos um quadro de espectros que nos possibilita uma interpretação completa das transições ópticas sofridas pelos elétrons da amostra SrGa2O4:Cr3+ quando a mesma foi posta em contato com uma fonte luminosa. Nas próximas sub-seções mostramos os resultados referentes as medidas por espectroscopias óptica e fotoacústica, bem como a análise realizada a partir deles fazendo conexão com os resultados da parte estrutural mostrados no capítulo anterior. 58 3.3.1 Resultados experimentais: fotoluminescência O espectro de emissão luminescente a temperatura ambiente do SrGa2O4 contendo 1% de íons de Cr3+ é mostrado na figura 23. Este espectro foi obtido com um comprimento de onda de excitação igual a 595 nm e ele apresenta duas bandas largas de emissão, que aparentemente encontram-se superpostos, no intervalo de 650nm a 900nm, com máximos de intensidade localizados em 680 nm e 735 nm. Estas bandas são típicas de transições eletrônicas permitidas por multiplicidade de spin e as identificaremos mais abaixo, após tentarmos separá-las. Observamos também, um alargamento não-homogêneo situado na região de baixas energias, o que indica uma possível sobreposição de duas ou mais transições. Acreditamos que, nesse caso, possam existir dois ou mais sítios diferentes e que existam duas bandas sobrepostas no espectro obtido correspondendo a esses sítios. Além disso, o formato da banda de emissão como um todo, com o alargamento não-homogêneo, é outro indicador da presença de uma ou mais bandas sobrepostas [29]. Intensidade (u.a.) T= 300 K λex= 595 nm 650 700 750 800 850 900 Comprimento de Onda (nm) Figura 23: Espectro de emissão a temperatura ambiente do SrGa2O4:Cr3+ para um comprimento de onda de excitação fixado em 595 nm. Para investigar mais detalhadamente as duas bandas largas que são observadas no espectro de emissão da figura 23 separamos os espectros superpostos alterando a energia de 59 excitação. A separação dessas duas bandas foi feita de duas maneiras distintas: para a banda situada em 680 nm fixamos o comprimento de onda de excitação em 532 nm, eliminando dessa forma a emissão de 735 nm. Este resultado é apresentado na Figura 24. Por sua vez, para a banda situada em 735nm não foi possível separar as duas bandas, apenas alterando o comprimento de onda, devido a forte influência da banda centrada em 680 nm. Deste modo, além de centrar a excitação em 595 nm, empregamos um filtro óptico (filtro R-70) que corta emissões abaixo de 680nm. Na verdade, a banda de mais alta energia não foi totalmente zerada, indicando que existe realmente uma sobreposição bastante forte das emissões do Cr3+ nos diferentes sítios, como é mostrado na figura 25. Intensidade(u.a.) T=300nm λexc=532nm Linha R 650 700 750 800 850 900 Comprimento de onda(nm) Figura 24: Espectro de emissão a temperatura ambiente do SrGa2O4:Cr3+ para um comprimento de onda de excitação fixado em 532 nm. A seta indica a possível posição da linha R da emissão dos íons de Cr3+ no SrGa2O4, que corresponde a transição 2 2 E( G)→4A2(4F). Em geral, transições eletrônicas, de íons metais de transição, permitidas por multiplicidade de spin são caracterizadas por bandas largas nos espectros de emissão e excitação, por causa do forte acoplamento entre as transições eletrônicas (fótons) e vibracionais (fônons) [24]. Deste modo, as bandas largas com baricentros em 680 nm e 735 60 nm nas figuras 24 e 25, respectivamente, são atribuídas à transição permitida por spin 4T2(4F) → 4A2(4F) do íon de Cr3+ na rede do galato de estrôncio. Esta identificação está de acordo com as transições radiativas dos íons na configuração eletrônica d3, caso do cromo trivalente, quando os níveis de energia do íon livre são desdobrados pela influência do campo cristalino da rede (ver figura 4). O fato de ambas as bandas serem identificadas com a mesma transição eletrônica indica que o íon Cr3+ ocupa sítios diferentes na rede do SrGa2O4. Esta afirmativa é também baseada na caracterização estrutural realizada para essa amostra dopada, onde se verificou que o composto formou-se sem fases espúrias e, consequentemente as emissões não podem ser oriundas de duas fases distintas. Além disso, as posições em energia dessas duas transições, 4T2(4F) → 4A2(4F), indicam que os sítios ocupados pelo Cr3+ possuem simetria octaédrica. Caso a simetria fosse tetraédrica esta banda estaria em energias inferiores a 10000 cm-1[37], ou seja, comprimentos de onda superiores a 1 μm. Outro detalhe apresentado nas figuras 24 e 25 é a posição das linhas R que correspondem as transições eletrônicas proibidas por multiplicidade de spin 2 E(2G) → 4A2(4F) dos íons de cromo trivalente em ambos os sítios. A identificação dessas linhas será explicada mais abaixo após os resultados referentes aos espectros de excitação. Intensidade (u.a.) T=300 K λexc= 595 nm Linha R 650 700 750 800 850 900 Comprimento de Onda (nm) Figura 25: Espectro de emissão a temperatura ambiente do SrGa2O4:Cr3+ para um comprimento de onda de excitação fixado em 595 nm, filtro R-70 (corta emissões abaixo de 680nm). A seta indica a possível posição da linha R da emissão dos íons de Cr3+ no SrGa2O4. 61 Identificada a região em que esses dois sítios emitem fizemos as medidas de excitação para o sitio de 680 nm e 735 nm. Na figura 26 apresentamos o espectro de excitação à temperatura ambiente para a emissão em 680 nm que estamos denominando como a emissão do “sítio I”. Nesta figura, os dados experimentais são representados pela curva cheia enquanto o ajuste gaussiano está representado pela curva pontilhada. Neste espectro observamos três bandas de excitação designadas como bandas 1, 2 e 3. A primeira banda (banda 1) localizada em 530 nm foi identificada como correspondendo à transição eletrônica do nível 4A2(4F) para o 4T2(4F) enquanto que a banda 3, centrada em 385 nm, foi associada a transição eletrônica do nível 4A2(4F) para o 4T1(4F). A banda 2, em 440 nm, está relacionada ao sítio com emissão centrada em 735 nm. Essa banda aparece no espectro de excitação devido a forte superposição das duas emissões localizadas em 680 nm e 735 nm. As posições em comprimento de onda mencionadas foram obtidas a partir do ajuste gaussiano realizado (processo de deconvolução de picos) para determinar o baricentro das bandas de excitação. Pode-se observar que o ajuste é extremamente satisfatório, pois a curva experimental e a curva ajustada praticamente se superpõem. Sítio I Experimental Ajuste Teórico Banda 3 Intensidade (u.a.) Τ = 300Κ λem = 680 nm Banda 2 350 400 450 Banda 1 500 550 Comprimento de Onda (nm) Figura 26: Espectro de excitação a 300 K do SrGa2O4:Cr3+. A linha de emissão foi fixada em 680 nm. 62 Na figura 27 mostramos o espectro de excitação para a emissão centrada em 735 nm a qual denominamos a emissão associada ao “sítio II”. Do mesmo modo, observamos que o espectro de excitação possui três bandas. A banda 4 está centrada em 605 nm e corresponde a transição eletrônica 4A2(4F) → 4T2(4F), enquanto que a banda 2, com baricentro em 440 nm, é associada a transição eletrônica do nível 4A2(4F) → 4T1(4F). Por sua vez, a banda 3, centrada em 385 nm, corresponde a um resquício da emissão do sítio I, e ela aparece devido à superposição das bandas de 680 nm e 735 nm. Percebemos também através desse espectro, que essa banda centrada em 385 nm diminuiu na intensidade integrada (área sob a curva) e a banda em 530 nm desapareceu, o que constata mais uma vez que a amostra possui dois sítios emissores. Banda 3 Sítio II Experimental Ajuste Teórico Intensidade (u.a.) Τ = 300Κ λem = 735 nm Banda 4 Banda 2 350 400 450 500 550 600 650 Comprimento de Onda (nm) Figura 27: Espectro de excitação a 300 K do SrGa2O4:Cr3+. A linha de emissão foi fixada em 735 nm. Uma vez que foram identificadas as transições eletrônicas, calculamos os parâmetros de campo cristalino, Dq, e os parâmetros de Racah, B e C, a partir das posições em energia das transições nos espectros de excitação. Para isso usamos as expressões fornecidas pelas matrizes de Tanabe-Sugano para a configuração d3, mostradas no capítulo 1. 63 Os parâmetros de campo cristalino Dq para os dois sítios ocupados pelos íons de Cr3+ no SrGa2O4 foram calculados a partir da posição em energia das transições 4A2(4F) → 4T2(4F) nos espectros de excitação, Fig.26 e Fig.27 e empregando a expressão 1.13. Assim os parâmetros de campo cristalino obtidos para os sítios I e II dos íons de Cr3+ foram 1890 cm-1 e 1653 cm-1, respectivamente. Por sua vez, os parâmetros de Racah foram determinados a partir da posição em energia das bandas de excitação referentes às transições 4A2(4F) → 4T1(4F), usando a expressão 1.14. Neste caso, os valores de B para os sítios I e II foram 729 cm-1 e 670 cm-1, respectivamente. A determinação desses dois parâmetros para cada sítio permite calcular a razão Dq/B, a qual fornece a região no diagrama de Tanabe-Sugano correspondente ao grau de intensidade do campo cristalino da rede sobre os íons de Cr3+. Para o sítio I obtemos uma razão Dq/B igual a 2,59 enquanto que no sitio II esta razão Dq/B é igual a 2,47. Isto mostra que ambos os sítios estão na região de campo cristalino forte, pois Dq/B é > 2,3. Neste caso, o nível excitado mais baixo é 2E(2G) para os íons de Cr3+. No caso contrário, Dq/B < 2,3, o nível mais baixo é o 4T2(4F) e corresponde a região de campo cristalino fraco. Valores de Dq/B próximos a 2,3 (de 2,2 a 2,4), são interpretados como um campo cristalino intermediário e se encontra muito próximo do cruzamento dos níveis 4T2(4F) e 2E(2G). Os valores Dq/B obtidos para ambos os sítios de Cr3+ no SrGa2O4 estão de acordo com as características apresentadas por estes íons de cromo trivalente em outras redes óxidas [30, 31, 32, 33, 34]. Esses dois parâmetros, Dq e B, foram obtidos diretamente do espectro de excitação e das matrizes de Tanabe-Sugano, em contrapartida o parâmetro de Racah C foi determinado levando em conta a fraca dependência do campo cristalino com o nível 2E(2G), fato que torna sua posição em energia praticamente constante, como mostrado no diagrama de TanabeSugano (ver figura 4). Neste diagrama, a posição em energia associada a transição 4A2(4F) → 2 E(2G) pode ser determinada a partir da interseção entre o nível 2E(2G) e as retas verticais correspondentes as razões Dq/B obtidas para ambos os sítios. Assim sendo, as transições 4 A2(4F) → 2E(2G) foram estimadas em 15151 cm-1 (λ = 660 nm) e em 14085 cm-1 (λ = 710 nm) para os sítios I e II, respectivamente. A fraca variação da posição da linha 2E(2G) no diagrama de Tanabe-Sugano permite verificar no espectro de emissão do SrGa2O4:Cr3+ a presença destas transições, pois a localização delas nos espectros de emissão e excitação praticamente não varia, ou seja, essa linha pode ser encontrada na mesma faixa de comprimento de onda, a menos de alguns nanômetros. As duas setas mostradas nas figuras 24 e 25 são então identificadas como as possíveis transições eletrônicas 2E(2G) → 4A2(4F) dos íons de Cr3+ nos dois sítios da rede do galato de estrôncio e, tradicionalmente denominadas 64 linhas R. Por sua vez, nos espectros de excitação, a transição 4A2(4F) → 2E(2G) não é observada por que essa transição é proibida por spin e também devido a forte interferência das interações vibracionais da rede na temperatura ambiente e da proximidade das fortes emissões de ambos os sítios. Medidas em baixas temperaturas talvez permitissem a observação desta transição nos espectros de emissão e excitação com maiores detalhes. Assim sendo, usando a posição em energia das transições eletrônicas 4A2(4F) → 2E(2G) estimadas e observadas fracamente nos espectros de emissão e a expressão 1.16 da matriz de Tanabe-Sugano correspondente a esta transição, determinamos os parâmetros de Racah C para ambos os sítios. Os valores obtidos para o parâmetro de Racah C foram 3245 cm-1 e 3043 cm-1, respectivamente, para os sítios I e II. Estes valores fornecem uma razão C/B igual a 4,45 para o sítio I e igual a 4,54 para o sítio II. Podemos observar que os parâmetros B e C para os sítios I e II são reduzidos por fatores de 0,79 e 0,73, respectivamente quando comparados com aqueles valores do íon livre de Cr3+ (B = 918 cm-1 e C = 4133 cm-1). Esta redução reflete o efeito de covalência nesse material gerado pela ligação Cr3+ - O. Estes valores são consistentes porque a razão C/B = 4,5 do íon livre é mantida na rede cristalina. Por fim, as transições eletrônicas permitidas por multiplicidade de spin 4A2(4F) → 4 T1(4P) para ambos os sítios podem ser estimadas a partir dos valores de Dq, B, C usando a expressão 1.15. Os valores encontrados para a posição em energia dessa transição são iguais a 41440 cm-1 (λ = 241 nm) e a 36460 cm-1(λ = 274 nm) para os sítios I e II, respectivamente. As bandas correspondentes a essas duas transições não podem ser observadas no espectro de excitação porque se encontram além da capacidade instrumental do sistema de medidas. A tabela 2 resume os valores encontrados para as transições ópticas observadas e estimadas, bem como os valores determinados para os parâmetros de campo cristalino Dq e de Racah B e C. A partir dos dados expostos na tabela 2 conseguimos identificar a interação do campo cristalino atuante nos íons de cromo trivalente devido a rede cristalina do galato de estrôncio, tanto para o sítio I quanto para o sítio II, como sendo forte. Neste caso, podemos supor que o surgimento de dois sítios para a ocupação dos íons de Cr3+ em uma mesma matriz está relacionada a existência de dois sítios diferentes de Ga3+ distorcidos presentes na rede do SrGa2O4, pois os difratogramas mostraram a presença de uma única fase na amostra. Na verdade, vimos no capítulo 2 que a estrutura do galato de estrôncio apresenta um sítio de Ga3+ ligado a outro sítio de Ga3+ por arestas e outros dois ligados por vértices. O sítio I apresenta um Dq maior do que aquele calculado para o sítio II, indicando que os íons de Cr3+ estão mais 65 comprimidos neste sítio do que no sítio II e, consequentemente, esta simetria mais baixa explica porque a transição 2E(2G) → 4A2(4F) encontra-se em energias maiores, neste caso. Acreditamos que este sítio I ocupado pelos íons de Cr3+ corresponde ao conjunto de sítios de Ga3+ ligados por arestas, pois estes sítios apresentam uma simetria mais distorcida em relação à simetria octaédrica. Logo, os íons de Cr3+ identificados como pertencentes ao sítio II são aqueles que substituem os íons de Ga3+ nos sítios conectados por vértices, pois estes possuem uma simetria menos distorcida em relação a octaédrica. Tabela 2: Transições observadas e parâmetros de campo cristalino e Racah para os íons de Cr3+ nos sítios I e II do SrGa2O4. Sítio I Transições 4 A2(4F) → 4T2(4F) 4 A2(4F) → 4T1(4F) 4 A2(4F) → 4T1(4P)a 2 E(2G) → 4A2(4F)b Parâmetros Dq (cm-1) B (cm-1) C (cm-1) Dq/B C/B a b Sítio II -1 (nm) 529 380 241 660 (cm ) 18903 26315 41440 15151 (nm) 605 430 274 710 (cm-1) 16530 23255 36480 14085 ─ ─ ─ ─ ─ 1890 729 3245 2,59 4,45 ─ ─ ─ ─ ─ 1653 670 3043 2,47 4,54 Posição calculada a partir das matrizes de Tanabe-Sugano. Posição da linha R correspondente à transição 2E(2G) → 4A2(4F). Os resultados referentes a Dq/B corroboram a análise acima, pois o sítio I possui um valor de Dq/B maior do que aquele encontrado para o sítio II. Isto indica que as transições ópticas correspondendo ao sítio I encontram-se em energias maiores, o que é observado nos espectros. O fato de que para os dois sítios encontramos valores diferentes de B e C, nos leva a supor que essa diferença está relacionada ao tipo de ligação predominante entre os íons dopante do Cr3+ e os íons dos ligantes do SrGa2O4. Sabemos que quanto menor for o valor de B na presença do campo cristalino em comparação ao valor de B do íon livre, mais covalente o caráter da ligação dopante-ligante [24]. As distorções possibilitam uma modificação na repulsão coulombiana entre os elétrons, fazendo com que cada íon de cromo ao entrar em um sítio distorcido apresente valor de B diferente. Assim quando comparamos os valores de B para os dois sítios, nós percebemos que este valor é mais reduzido para o sítio II do que para o 66 sítio I, indicando que os sítios ligados pelos vértices possuem um efeito de covalência mais importante do que nos sítios ligados pelas arestas. Outra observação importante está relacionada aos deslocamentos de Stokes associado as transições entre os níveis 4T2(4F) e 4A2(4F) e observado a partir dos espectros de emissão e excitação. Verificamos que o deslocamento de Stokes, ∆EStokes, é igual a 4200 cm-1 no caso do sítio I e de aproximadamente 2900 cm-1 para o sítio II. Ambos os deslocamentos de Stokes são grandes e mostram uma forte diferença no acoplamento eletron – rede para ambos os sítios. Os valores encontrados para o deslocamento de Stokes corroboram a análise feita acima a partir dos parâmetros de campo cristalino e de Racah. O maior deslocamento de Stokes para o sítio I indica que neste caso existe um campo cristalino mais intenso sobre esse sítio do que para o sítio II. Finalmente, os tempos de vida para as emissões centradas em 680 nm e 735 nm foram, respectivamente, 280 μs e 270 μs. Esses tempos são da ordem de grandeza prevista para as transições 4T2(4F) → 4A2(4F) permitidas por multiplicidade de spin. Em geral, tempos de vidas menores estão associados a sítios mais distorcidos e vice-versa. Em uma primeira análise o resultado referentes aos tempos de vida contradiz a identificação feita acima para os sítios I e II ocupados pelos íons de Cr3+ no SrGa2O4. Entretanto os valores medidos são muito próximos e o método empregado para determinar esses tempos de vida, método de deslocamento de fase, em nosso caso este erro foi calculado e é de aproximadamente 30μs. Além disso, as duas bandas apresentam uma superposição parcial entre elas e a medida realizada tem a interferência de uma na outra. Logo, apesar desses resultados serem característicos para bandas de emissão do Cr3+ permitidas por multiplicidade de spin, não podemos afirmar apenas a partir deles qual sítio da rede está associado a cada emissão. Deste modo, a análise feita a partir dos parâmetros de campo cristalino e Racah e das posições em energia das transições ópticas são mais importantes para a associação dos sítios de emissão do Cr3+ com os sítios da rede do galato de estrôncio. Uma análise usando os tempos de vida deveria ser realizada para medidas de fotoluminescência em baixas temperaturas, principalmente para as transições 2E(2G) → 4A2(4F) proibidas por multiplicidade de spin de ambos os sítios. Essa transição é o primeiro nível excitado no diagrama de Tanabe-Sugano para nossa amostra e apresenta, em geral, tempos de vida da ordem de milissegundos e não se encontram superpostas em nosso sistema dopado, pois a diferença em energia entre elas é relativamente grande (aproximadamente 1000 cm-1). 67 3.3.2 Resultados experimentais: fotoacústica O espectro de absorção fotoacústica medido para a amostra de galato de estrôncio dopado com 1% de íons trivalentes de cromo é mostrado na figura 28. Este espectro foi obtido no intervalo de comprimento de onda situado entre 195 nm e 925 nm com uma frequência de modulação de 20 Hz. Observa-se nesse espectro que as bandas são largas, indicando a ocorrência de uma superposição das transições relacionadas a absorção fotoacústica na amostra. Nesse espectro encontramos as bandas vistas na figura 26 e 27 superpostas, além de incluir transições para altas energias situadas na região de comprimento de onda entre 200 nm e 400 nm. Com a finalidade de separar as bandas que supostamente encontram-se superpostas fizemos a deconvolução do espectro através do ajuste por curvas gaussianas, o que proporcionou a visualização de seis bandas, deixando explícita a notável superposição das transições de absorção. As bandas gaussianas que melhor se ajustaram a curva experimental encontram-se centradas em 233 nm, 264 nm, 363 nm, 433 nm, 623 nm e 809 nm. Este ajuste correspondeu a uma concordância de 99,5% com a curva experimental. Como o espectro de absorção fotoacústica tem a possibilidade de abranger todas as bandas vistas no espectro de excitação, além das bandas localizadas em baixas energias, podemos associar essas bandas às transições observadas e previstas a partir dos espectros de excitação. Deste modo, observando a figura 28 podemos associar as bandas com baricentros em 233 nm e 264 nm as bandas previstas a partir da determinação dos parâmetros Dq e B para os sítios I e II e localizadas em 241 nm e 274 nm, respectivamente. Estas bandas de excitação foram associadas à transição 4A2(4F) → 4T1(4P) dos íons de Cr3+ na rede do galato de estrôncio para ambos os sítios. O aparecimento das transições 4A2(4F) → 4T1(4P) no espectro de absorção fotoacústica faz com que este apresente de modo claro o formato característico de transições dos íons de Cr3+ e mostra que os parâmetros encontrados anteriormente ajustam com boa precisão os espectros ópticos. As outras gaussianas ajustadas no espectro fotoacústico também foram comparadas com outras bandas observadas nos espectros de excitação para ambos os sítios. Por exemplo, as bandas localizadas em 363 nm e 433 nm, vistas na figura 28, foram associadas às bandas de excitação com os baricentros em 380 nm e 430 nm e identificadas como sendo as transições 4A2(4F) → 4T1(4F) para os sítios I e II, respectivamente. Para a banda de absorção localizada em 623 nm na figura 28, comparamos 68 com a banda localizada em 605 nm com a transição de 4A2(4F) → 4T2(4F) dos íons de Cr3+ localizados no sítio II (ver figura 27). Intensidade (u.a) Experimental curva ajustada 233nm curva ajustada 264nm curva ajustada 363nm curva ajustada 433nm curva ajustada 623nm curva ajustada 809nm Ajuste teorico 200 300 400 500 600 700 800 900 Comprimento de Onda (nm) Figura 28: Espectro fotoacústico de absorção da amostra SrGa2O4:Cr3+ à temperatura ambiente. As gaussianas sob a curva experimental representam o ajuste realizado e a curva vermelha é o ajuste total para as seis gaussianas de ajuste. Devido a forte superposição das bandas de absorção fotoacústica não foi possível observar a mesma transição 4A2(4F) → 4T2(4F) para o sitio I. O aparecimento da banda, localizada em 811 nm, pode ser hipoteticamente atribuído a uma transição de absorção de íons de cromo com outra valência em sítios tetraédricos do SrGa2O4. Em resumo, as transições identificadas para os espectros de excitação estão associadas também ao espectro de absorção fotoacústico, respectivamente, para os sítios I e II. A comparação entre os resultados obtidos nos espectros de excitação e fotoacústico pode ser visualizada na tabela 3. 69 Tabela 3: Comparação entre os resultados obtidos pelos espectros de excitação e de fotoacústica. Transições Eletrônicas 4 A2(4F) → 4T1(4P) 4 A2(4F) → 4T1(4F) 4 A2(4F) → 4T2(4F) Sítio I Fotoacústica Excitação (nm) (nm) 233 241 363 385 530 Sítio II Fotoacústica Excitação (nm) (nm) 264 274 433 440 623 605 Do mesmo modo foram realizadas medidas do sinal fotoacústico em função da frequência de modulação da luz de excitação na amostra com a finalidade de definir qual mecanismo predomina na geração do sinal fotoacústico (difusão térmica, efeito termoelástico ou expansão térmica). O procedimento experimental consistiu em fixar o monocromador para os comprimentos de onda de 275 nm, 350 nm e 680 nm que correspondem as bandas de absorção de razoável resolução no espectro de absorção fotoacústica. Em seguida variou-se a frequência de modulação para as três bandas mencionadas no intervalo de 4 Hz a 100 Hz, mantendo fixa a fase que maximiza o sinal. Na figura 29 temos o gráfico do sinal fotoacústico em função da frequência de modulação da radiação incidente. 0,6 275nm 350nm 680nm Intensidade (mV) 0,4 Inclinação: -1.23 (275nm) -1.25 (350nm) -1.30 (680nm) 0,2 0,1 0,08 0,06 0,04 20 40 60 80 100 Frequência (Hz) Figura 29: Sinal fotoacústico da amostra SrGa2O4:Cr3+ à temperatura ambiente. 70 A partir da figura 29 podemos calcular a dependência da intensidade do sinal fotoacústico com a frequência de modulação para as três bandas de absorção. Os resultados obtidos mostraram que essa dependência é aproximadamente proporcional a f-1,26. Pela literatura sabemos que valores próximos à f-1,0 indicam que o espectro fotoacústico é gerado principalmente pelo processo de expansão térmica da amostra e que a amplitude do sinal é proporcional à temperatura média da amostra. Assim sendo, os resultados confirmam que o mecanismo predominante é o de expansão térmica, pois a dependência do sinal fotoacústico com a frequência de modulação é próxima de f-1,0. 71 4 CONCLUSÕES Os dados obtidos relativo à caracterização estrutural da amostra SrGa2O4 dopado com 1% de íons de Cr3+, pela técnica de difração de raios-X, nos permitiu concluir que esta possui somente uma única fase. Com a utilização do difratograma fizemos os cálculos pelo Método de Refinamento de Rietveld que nos forneceu os parâmetros da célula cristalina, confirmado a unicidade da fase da amostra de SrGa2O4:Cr3+. Com as medidas de espectroscopia de fotoluminescência percebemos que a rede do galato de estrôncio exibe duas regiões cristalográficas diferentes para os íons trivalentes de Ga3+. Um dos sítios nós chamamos de sítio I, caracterizado por unidades de GaO3 ligados pelos vértices, onde para essa região os íons de Cr3+ possuem uma emissão com baricentro em torno de 680 nm correspondendo a transição 4T2(4F) → 4A2(4F). O sítio II possui arranjos de GaO3 que são ligados pelas faces, e o espectro de emissão apresenta uma transição com baricentro localizada em 735 nm e também associada a transição 4T2(4F) → 4A2(4F). A partir dos espectros de excitação identificamos os parâmetros de campo cristalino Dq e os parâmetros de Racah B e C para ambos os sítios. A razão Dq/B nos possibilitou identificar que para os sítios I e II o campo cristalino atuando sobre os íons de Cr3+ é forte. Este fato implica que o primeiro nível de energia excitado para ambos os sítios é o 2E(2G). Entretanto, esta linha é fracamente observada na temperatura ambiente devido ao forte acoplamento elétron - fônon da rede. Esses resultados mostraram que a teoria do campo cristalino pode ser aplicada para explicar as transições ópticas observadas no espectro de emissão deste material dopado e que os parâmetros espectroscópicos obtidos são típicos dos íons de Cr3+ em coordenação octaédrica. Com as medidas de absorção fotoacústica verificamos que os mecanismos de geração do sinal predominante neste composto é a expansão térmica e que as estimativas feitas a partir dos espectros de excitação para a transição 4A2(4F) → 4T1(4P) estão de acordo com os dados experimentais. Para as etapas futuras desse trabalho está prevista a realização de medidas de fotoluminescência a baixas temperaturas para confirmar a localização das linhas-R a partir das transições 2E(2G) → 4A2(4F), permitindo, sobretudo a visualização das linhas pares de Cr3+ através das linhas R. Além disso, medidas de fotoluminescência em função da concentração de íons trivalentes de cromo na rede do SrGa2O4 devem ser feitas com a finalidade de avaliar a influência dela sobre a emissão luminescente. 72 REFERÊNCIAS 1 SOLÉ, J.G.; BAUSÁ, L.E.; JAQUE, D. An Introduction to the Optical Spectroscopy of Inorganic Solids. Madrid: John Wiley & Sons, 2005, 306 p. 2 PEDRO, Sandra da Silva. Propriedades ópticas do Fe3+ tetraédrico em matriz cerâmica. 2007. 58 f. Dissertação (Mestrado em Física) – Instituto de Física Armando Dias Tavares, Universidade do Estado do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2007. 3 TANABE, Yukito; SUGANO, Satoru. On the Absorption Spectra of Complex Ions. I. Journal of the Physical Society of Japan, Tokyo, v. 9, n. 5, p. 753-766, June, 1954. 4 SILVEIRA JUNIOR, Raimundo Nonato. Propriedades fotoluminescentes da fase Sr3Al2O6 dopada com íons de Cr3+. 2008. 57 f. 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