AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL Nº 102175-89.2012.8.09.0175 (201291021752) COMARCA DE GOIÂNIA 2ª CÂMARA CRIMINAL AGRAVANTE: RUBENS GONÇALVES CALDAS AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO RELATOR: FÁBIO CRISTÓVÃO DE CAMPOS FARIA ( Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau) RELATÓRIO E VOTO A defesa de RUBENS GONÇALVES CALDAS ajuizou agravo em execução, com fundamento no artigo 197 da Lei de Execuções Penais, visando a combater a decisão do Juiz de Direito da 1ª Vara de Execução Penal de Goiânia (fs. 14-16), que negou o direito à progressão do regime prisional fechado para o semiaberto (fs. 29-33). Aduz, em síntese, que RUBENS GONÇALVES CALDAS, encontra-se recolhido no regime fechado na penitenciária Odenir Guimarães, pela prática de duplo homicídio qualificado e, não obstante o preenchimento dos requisitos objetivo e subjetivo elencados no artigo 112 da Lei de Execuções Penais, ao pleitear a progressão de regime prisional, teve o pleito indeferido. Não se conforma com a negativa de progressão para regime menos gravoso, bem como entende que o exame criminológico não se presta AEP 67484 6 1 para o fim colimado, porque foi promovido ao arrepio do 7º da Lei de Execuções Penais. Acrescenta que o exame psicológico, “por ser excepcional” deveria ser interpretado de forma restritiva e com os olhos voltados para a Constituição Federal, porém, conforme se verifica o “pseudo exame” foi realizado por um assistente social, uma psicóloga e uma coordenadora de avaliação e perícia, razão disso, não pode substituir o verdadeiro exame criminológico. Requer seja o agravo conhecido e provido, para que seja anulado o exame criminológico, tendo em vista que não obedeceu aos ditames legais e, de consequência, reformada a decisão combatida, a fim de deferir o direito à progressão para o regime menos gravoso ao reeducando RUBENS GONÇALVES CALDAS. Contrarrazões (fs. 35-37) em que opina pelo “provimento do agravo interposto, com a reforma da decisão agravada e o consequente deferimento de progressão prisional em favor de RUBENS GONÇALVES CALDAS, com sua transferência para o regime semiaberto”. Em juízo de retratação (f. 38) a decisão foi mantida, desprezados os argumentos de apoio à pretensão recursal. Instado, o órgão do Ministério Público de 2º grau, por sua representante, Drª Maria da Conceição Rodrigues dos Santos, opina pelo AEP 67484 6 2 provimento do recurso (fs. 43-50). É o relatório. Passo ao Voto. Recurso próprio e tempestivo. Presentes os demais pressupostos de admissibilidade, dele tomo conhecimento. Como dito em linhas volvidas, trata-se de agravo em execução penal interposto com fundamento no artigo 197 da Lei de Execuções Penais, contra decisão do Juiz de Direito da 1ª Vara de Execução Penal da Comarca de Goiânia, que negou o direito à progressão do regime prisional fechado para o semiaberto, não obstante o preenchimento dos requisitos objetivo e subjetivo imprescindíveis à concessão do benefício ao reeducando RUBENS GONÇALVES CALDAS, com base em exame criminológico realizado no descompasso das disposições do artigo 7º da Lei de Execuções Penais. Pois bem, o fato de o exame pericial ter sido elaborado por um psicólogo e uma coordenadora de avaliação e perícia (f. 24), sem a presença de um psiquiatra, não possui qualquer mácula, porque o ato apresenta-se adequado ao fim que se destina, não houve qualquer prejuízo para o agravante, devendo ser observada a norma contida no artigo 563 do Código de Processo Penal. Nesse sentido o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e desta Corte de Justiça: “A ausência do psiquiatra na Comissão Técnica de Classificação não acarreta, de pronto, nulidade, se não AEP 67484 6 3 detectado prejuízo ao recorrente, aplicando-se, ao caso, o disposto no art. 563 do CPP” (STJ, 6ª Turma, REsp 623032/RS, Rel. Min. Paulo Medina, in DJ de 1º-8-2005, pág. 587). “Se o exame criminológico elaborado por dois psicólogos e uma assistente social apresenta-se adequado à finalidade proposta, inexiste nulidade por falta de participação de um psiquiatra, principalmente quando não demonstrado prejuízo ao reeducando. Inteligência do art. 563 do Código de Processo penal.” (TJGO, 2ª Câmara Criminal, AEP nº 48707648.2011.8.09.0175, Rel. Des. José Lenar de Melo Bandeira, in DJGO nº 1022, de 13-03-2012). Acrescente-se, ademais que: “Não é nulo o parecer da CTC ou COC porque não integrados por todos os técnicos indicados no art. 7º da Lei de Execução Penal. O fato de estar ausente apenas um chefe de serviço na formação das comissões não é causa hábil a eivar de nulidade os pareceres. Igualmente, a ausência de psiquiatra não implica em ilegitimidade dos laudos, sobretudo porque suprida por psicólogo, além de que não restou evidenciado fosse o apenado pessoa acometida de distúrbio mental. No entanto, mesmo que se o entendam nulos, não contaminam a decisão recorrida, porque o julgador não fica adstrito à peça técnica, que apenas serve para lhe fornecer subsídios.” (TJRS, 2ª Câmara Criminal, Ag nº 70007310261, AEP 67484 6 4 Rel. Antônio Carlos Netto de Mangabeira, julgado em 12-04-2004). (Grifei). Rejeitada a preliminar, passa-se ao exame de mérito. Em proêmio, registra-se que “não obstante o advento da Lei nº 10.792/03, que alterou o artigo 112 da LEP, para dele excluir a referência ao exame criminológico, nada impede que os magistrados determinem a realização de mencionado exame, quando o entenderem necessário, consideradas as eventuais peculiaridades do caso, desde que o façam, contudo, mediante decisão adequadamente motivada, tal como tem sido expressamente reconhecido pelo E. Superior Tribunal de Justiça” (RT 832/676). Nesse compasso, o Superior Tribunal de Justiça editou a Súmula 439, que expõe: “Admite-se o exame criminológico pelas peculiaridades do caso, desde que em decisão motivada”. No mesmo sentido, o enunciado da Súmula Vinculante nº 26, in verbis: “Para efeito de progressão de regime no cumprimento de pena por crime hediondo, ou equiparado, o juízo da execução observará a inconstitucionalidade do art. 2º da Lei nº 8072, de 25 de julho de 1990, sem prejuízo de avaliar se o condenado preenche, ou não, os requisitos objetivos e AEP 67484 6 5 subjetivos do benefício, podendo determinar, para tal fim, de modo fundamentado, a realização de exame criminológico”. (Grifei). Assim sendo, “não obstante o advento da Lei nº 10.792/03, que alterou o artigo 112 da LEP, para dele excluir a referência ao exame criminológico, nada impede que os magistrados determinem a sua realização quando o entender necessário, consideradas as eventuais peculiaridades do caso, desde que o façam, mediante decisão adequadamente motivada.” (TJGO, 2ª Câmara Criminal, AEP nº 423305-96.2011.8.09.0175, de minha relatoria, in DJGO nº 1034, de 29-03-2012) Conforme cediço, cumpre transcrever as lições de Hans Göbbels: “ (...) o bom comportamento de um preso não pode ser determinante imediata para estabelecer-lhe um prognóstico biológico-social 'comprovante' favorável, principalmente porque tal e melhoria se baseia fundamentalmente em informes de funcionários de prisões, fornecidos pouco antes da libertação a que se atêm ao comportamento externo, a fim de facilitar a readaptação sem inconvenientes ao termo da condenação. Mas este comportamento externo só de forma incompleta permite tirar conclusões sobre o caráter e a conduta futura do preso. Na verdade, a adaptação do sentenciado à organização do estabelecimento se deve a AEP 67484 6 6 vários e múltiplos fatores simultâneos e justapostos, e somente a verificação dos motivos predominantes permitirá uma conclusão motivada sobre seu caráter (...)”. Prossegue: “(...) O comportamento mau ou sofrível indica normalmente uma inaptidão para o regime mais suave. Fugas, difícil convivência com os companheiros, falta de respeito para com os funcionários, displicência no trabalho ou no aprendizado, cometimento de faltas disciplinares etc. Correspondem ao demérito que não aconselha a progressão. A aferição do mérito, porém, se refere à conduta global do preso e dela faz parte um acréscimo na confiança depositada no mesmo e a possibilidade de atribuição de maiores responsabilidades para o regime de mais liberdade (...)”. Conclui: “(...) O condenado deve ser avaliado, aliás, em função do regime para o qual pretende progredir, terá que ser examinado tendo em vista as regalias de que irá gozar no regime progressivo seguinte. Não deve ser concedida a progressão quando se verificar que o apenado não apresenta condições para se ajustar ao novo regime.” (Los aocialies, esencia y concepto de asocialidad. Trad. De ª Linhares Maza. Madri: Morata, AEP 67484 6 7 1952, p.200-1, apud Júlio Fabbrini Mirabete- Execução Penal, 9. ed., São Paulo: Atlas, p.346). Nessa ordem: “Não basta o bom comportamento carcerário para preencher o requisito subjetivo indispensável à progressão. Bom comportamento não se confunde com aptidão ou adaptação do condenado e muito menos serve como índice fiel de sua readaptação social (…). comportamento dissimulado, pouco grau de responsabilidade, personalidade insegura ou imatura, com dificuldade de introjetar leis e normas, desinteresse em trabalhar ou frequentar escola, etc., são circunstâncias indicativas de que o condenado não merece a progressão.” (In Execução Penal, de Júlio Fabbrini Mirabete, Ed. Atlas, 2007, págs. 424425). Nesse toar, o juiz da Vara das Execuções Penais, ainda que estivesse satisfeito requisito objetivo necessário à progressão do regime prisional (cumprimento de 1/6 da pena privativa de liberdade aplicada), em decisão devidamente fundamentada, determinou que fosse RUBENS GONÇALVES CALDAS submetido a exame criminológico. Promovida a perícia para constatar se o reeducando está apto para passar para um regime menos gravoso, foi apurado o seguinte: “No AEP 67484 6 decorrer dos meses compareceu às sessões, 8 apresentando-se por vezes com pensamentos confusos ou um tanto desorganizados, aparentando alguns momentos estar em estado psicótico ou sob efeito de substâncias químicas. Refere, porém, que atualmente não faz uso de drogas ilícitas. A respeito de sua vida pregressa, não apresenta percepção significativa de dificuldades pessoais. Faz avaliação crítica dos erros cometidos, assume ter praticado alguns delitos pelos quais foi condenado, responsabilizando sobretudo o fato de ser um sujeito passional, e a defesa de sua honra, não se referindo de forma crítica e nem manifestando arrependimento por outros tipos de delitos que praticava em sua vida pregressa. Refere poder contar com ajuda de irmãos e tios, caso receba progressão penal, porém não tem contato cotidiano com tais familiares.” (f. 24). (Negritei) Ao negar o benefício da progressão de regime, o Juiz, com base no exame criminológico, acentuou “que o reeducando ainda não está apto para retornar ao convívio em sociedade, por ainda apresentar imaturidade em seu comportamento interpessoal e dificuldades na assimilação das normas e regras sociais (...)” Vale ressaltar que o exame criminológico foi realizado por uma psicóloga, uma assistente social e pela coordenadora da Central de Avaliação e Perícia, que fizeram uma análise ampla e coerente sobre o comportamento do periciando. AEP 67484 6 9 Destarte, ao correlacionar os ensinamentos supramencionados, com a gravidade dos crimes em que condenado RUBENS GONÇALVES CALDAS e, principalmente, com o resultado do exame pericial, conclui-se pela impossibilidade de ser-lhe concedido o direito à progressão de regime prisional, ante o não preenchimento do requisito subjetivo necessário à benesse, sendo de rigor, nas circunstâncias, a manutenção da decisão agravada. A propósito: “Agravo em execução penal. 1- A despeito de a nova redação do artigo 112 da Lei de Execuções Penais ter deixado de exigir a submissão do condenado ao exame criminológico para a progressão de regime, nada impede que o juízo da execução determine a realização de perícia técnica, quando necessário, e assim formar seu convencimento, desde que o faça de forma fundamentada e excepcional, como no caso sub judice. 2- Constatadas por meio do exame criminológico as dificuldades de adaptação do reeducando ao convívio em sociedade, conclui-se que este não preenche os requisitos subjetivos exigidos para a concessão do benefício pleiteado. AGRAVO CONHECIDO E IMPROVIDO.” (TJGO, 2ª Câmara Criminal, AEP nº 391438-85.2011.8.09.0175, Rel. Des. Ney Teles de Paula, in DJGO nº 1032, de 27-03-2012). “EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME DE AEP 67484 6 10 CUMPRIMENTO DE PENA. IMPOSSIBILIDADE. NÃO PREENCHIMENTO NECESSIDADE NULIDADE DO DE REQUISITO TRATAMENTO DO SUBJETIVO. PSICOLÓGICO. EXAMECRIMINOLÓGICO. INOCORRÊNCIA. Embora a nova redação do artigo 112 da LEP não mais preveja a possibilidade de elaboração de examecriminológico, nada veda ao magistrado determinar, justificadamente, a sua realização. Precedentes das Cortes Superiores. Ademais, se o laudo pericial é elaborado por uma equipe técnica adequada à finalidade proposta, inexiste falar em nulidade por falta de participação de um psiquiatra. Assim, em sendo o exameconclusivo no sentido de necessitar o reeducando de acompanhamento psicossocial e educacional, entende-se que ele não preenche o requisito de ordem subjetiva, faltando-lhe aptidão para o convívio social. AGRAVO EM EXECUÇÃO CONHECIDO E DESPROVIDO.” (TJGO, 2ª Câmara Criminal, AEP nº 89581-43.2012.8.09.0175, Rel. Des. Leandro Crispim, in DJGO nº 1099, de 10-07-2012). “AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. PROGRESSÃO DE REGIME. EXAME CRIMINOLÓGICO. FUNDAMENTAÇÃO HÁBIL. REQUISITO SUBJETIVO. ÓBICE. ADAPTAÇÃO SOCIAL DESFIGURADA. INDEFERIMENTO MANTIDO. IO cumprimento de 1/6 da pena no regime anterior e o bom comportamento carcerário não constituem óbice à determinação fundamentada de submissão do reeducando a AEP 67484 6 11 exame criminológico, a fim de se aferir o requisito subjetivo. II- As avaliações psicossociais, abrangidas pelo termo 'exame criminológico', podem servir de apoio para a convicção do julgador que, em face dos indicadores negativos de reinserção social do condenado, negou-lhe, com acerto, o direito de progredir de regime, não havendo que se cogitar de nulidade eis que não demonstrado prejuízo ao reeducando. Recurso improvido. ” (TJGO, 2ª Câmara Criminal, AEP nº 12974380.2012.8.09.0175, Rel. Juiz Jairo Ferreira Júnior, in DJGO nº 1098, de 09-07-2012). Em razão do exposto, desacolho o parecer da representante ministerial de cúpula, conheço do agravo e nego-lhe provimento, mantendo-se incólume a decisão agravada. É como voto. Goiânia, 07 de agosto de 2012. FÁBIO CRISTÓVÃO DE CAMPOS FARIA Relator AEP 67484 6 12 AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL Nº 102175-89.2012.8.09.0175 (201291021752) COMARCA DE GOIÂNIA 2ª CÂMARA CRIMINAL AGRAVANTE: RUBENS GONÇALVES CALDAS AGRAVADO: MINISTÉRIO PÚBLICO RELATOR: FÁBIO CRISTÓVÃO DE CAMPOS FARIA ( Juiz de Direito Substituto em Segundo Grau) E M E N T A : AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. EXAME CRIMINOLÓGICO. AUSÊNCIA DE MÉDICO PSIQUIATRA. REQUISITO PROGRESSÃO SUBJETIVO. NÃO DE REGIME. PREENCHIDO. IMPOSSIBILIDADE DE CONCESSÃO DO BENEFÍCIO. 1- O fato de o exame pericial ter sido elaborado por um psicólogo e uma coordenadora de avaliação e perícia, sem a presença de um psiquiatra, não possui qualquer mácula, porque o ato apresenta-se adequado ao fim que se destina, não houve qualquer prejuízo para o agravante, devendo ser observada a norma contida no artigo 563 do Código de Processo Penal. 2- Não obstante o advento da Lei nº 10.792/2003, que alterou o artigo 112 da LEP, para dele excluir a referência ao exame criminológico, nada impede que os magistrados determinem a sua realização quando necessário, consideradas as eventuais peculiaridades do caso, desde que o façam, mediante decisão adequadamente motivada. 3- Não há falar em progressão de regime prisional AEP 67484 6 1 quando o reeducando não satisfaz o requisito subjetivo do artigo 112 da Lei de Execuções Penais, uma vez que o laudo psicológico demonstra que periciado ainda não se encontra apto para o convívio em sociedade AGRAVO CONHECIDO E DESPROVIDO. ACÓRDÃO Vistos, relatados e discutidos os presentes autos de AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL Nº 102175-89.2012.8.09.0175 (201291021752), da Comarca de Goiânia, figurando como agravante RUBENS GONÇALVES CALDAS e agravado MINISTÉRIO PÚBLICO. ACORDAM os integrantes da Segunda Câmara Criminal do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado de Goiás, por unanimidade de votos, desacolher o parecer ministerial, conhecer do agravo e o desprover, nos termos do voto da relator. Custas de lei. V O T A R A M , além do Relator, os Desembargadores Leandro Crispim e José Lenar de Melo Bandeira, que completou a Turma Julgadora, em virtude das férias do Desembargador Luiz Cláudio Veiga Braga. A sessão foi presidida pela Desembargadora Nelma Branco Ferreira Perilo. AEP 67484 6 2 Esteve presente à sessão a Procuradora de Justiça Maurício José Nardine. Goiânia, 07 de agosto de 2012. FÁBIO CRISTÓVÃO DE CAMPOS FARIA Relator AEP 67484 6 3