Ano XV, edição especial, agosto, 2010 Não obstante, o direito de propriedade, que sempre foi visto de maneira absoluta e egoísta, passou a ser relativizado. Com as transformações sociais que ocorreram nos séculos XIX e XX em razão da Revolução Industrial e dos pós-guerras, a mentalidade econômica e social que surgiu com o Estado Social influenciou, inevitavelmente, a mentalidade jurídica, alcançando, assim, nova concepção do direito de propriedade. • DOUTRINA reivindicar), alia-se, agora, um elemento dinâmico, que é a sua funcionalidade (função social)14. Em consonância com o exposto, o § 1º do art. 1.228 do Código Civil/2002 é categórico: § 1o O direito de propriedade deve ser exercido em consonância com as suas finalidades econômicas e sociais e de modo que sejam preservados, de conformidade com o estabelecido em lei especial, a flora, a fauna, as belezas naturais, o equilíbrio ecológico e o patrimônio histórico e artístico, bem como evitada a poluição do ar e das águas. A evolução social, dessa maneira, demonstrou que a justificação do interesse individual se torna, muitas vezes, fator de sacrifício de interesses coletivos. É nesse sentido que o alcance do direito de propriedade possui como limitador o exercício de sua função social. Nelson Rosenvald13 esclarece: A refundação da propriedade prende-se a três princípios: o bem comum, a participação e a solidariedade. Quanto ao primeiro, a sociedade surge porque as pessoas descobrem uma vontade geral e um bem que é comum e dispõem-se a construí-lo. A ele se subordinam os bens particulares; a participação resulta na contribuição de todos, a partir daquilo que são e daquilo que têm. A participação transforma o indivíduo em ser humano; por último, a solidariedade, que nasce da percepção de que todos vivemos uns pelos outros, valor sem o qual a sociedade não é humana. Além da previsão de que a propriedade exercerá sua função social (art. 5º, XXIII), essa dimensão axiológica da propriedade resta evidenciada, ainda, na CF/88, no capítulo da Ordem Econômica, quando, no art. 170, III, determina que a ordem econômica tem por fim assegurar a todos existência digna, observado o princípio da função social da propriedade. É importante não esquecer que há muito tempo a Lei de Introdução ao Código Civil já, no art. 5º, determinava que a lei atenderia aos fins sociais e às exigências do bem comum. Portanto, percebe-se que, mesmo sendo cláusula geral (técnica legislativa intencionalmente imprecisa e com grande abertura semântica), possuindo, portanto, uma dimensão subjetiva, o alcance da função social encontrará respaldo na interpretação a ser feita pelo operador do Direito em consonância com a ponderação de valores individuais e sociais justificáveis na CF/ 88. Contudo, é interessante desenvolver o conceito da locução “função social”, até para se ter uma ideia das suas implicações. Nelson Rosenvald15 o faz com propriedade: 12 13 14 Aliado às quatro conhecidas faculdades do direito de propriedade (usar, gozar, dispor e 15 FIORILLO, Celso Antonio Pacheco. Estatuto da Cidade Comentado. 3.ed. rev. atual. ampl. São Paulo: RT, 2008. p. 31-32; ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 3.ed.Rio de Janeiro: Impetus, 2004. p. 29. ROSENVALD, Nelson. Direitos Reais. 3. ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2004 p. 31; Ibid. p. 30. JAM - JURÍDICA • 31