Red de Acción en Plaguicidas y sus Alternativas de América Latina Jaime Weber BRASIL LOCALIZAÇÃO DO CAPA Após cinco séculos de dominação social, econômica e ideológica das elites agrárias, assiste-se hoje no mundo rural brasileiro a emergência de um amplo processo social voltado para a construção de alternativas aos padrões ambientalmente predatórios e socialmente excludentes de ocupação e uso do território implementados desde os nossos primórdios coloniais o atual momento histórico dos movimentos sociais no campo revestese de características inéditas que merecem ser sublinhadas. Processos determinantes - década de 1970 • A modernização conservadora da agricultura brasileira – rápidas e profundas transformações no padrão tecnológico – intensificação dos processos de exclusão social e de degradação ambiental – conduzida e patrocinada pelo Estado – orientadas para modernizar o latifúndio – como opção à reforma agrária que se afirmava para amplos setores da sociedade – e dos baixos e decrescentes níveis de produtividade do latifúndio tradicional, – permitiram a continuidade do perfil concentrado de distribuição fundiária no país. Para garantir a implementação e a consolidação da estratégia modernizadora • o Estado brasileiro implementou um conjunto de políticas e programas – – – – novas formas de organização dos mercados dos complexos agroindustriais dos sistemas de crédito, pesquisa e extensão rural e das legislações reguladoras das relações trabalhistas no meio rural. – extrema artificialização dos ecossistemas cultivados – “pacotes tecnológicos”, tidos como de aplicação universal. Revolução Verde também engendrou graves impactos negativos no plano social • inverteu em apenas três décadas a distribuição da população (inicialmente 2/3 rural e 1/3 urbano). • a transferência da pobreza rural para as cidades e a migração para os grandes centros urbanos • o deslocamento para as fronteiras agrícolas (estimulada pelo Estado) • fluxo de migrantes para o Centro-Oeste e para a Amazônia se dá a partir de 1960 (construção de Brasília e a construção da Transamazônica na década de 1970. processos acelerados e em larga escala de desmatamento dos cerrados e da floresta amazônica. • • exerceu grande influência nos modos de vida e nas formas de sociabilidade existentes em comunidades • processos de auto-desqualificação cultural e de perda de identidade social promovidos pelos mitos associados à modernização A emergência das comunidades eclesiais de base • Após 1964 os governos militares reprimiram violentamente as Ligas Camponesas e o movimento sindical • STRs como elos da extensão da previdência social no campo (assistencialista). • o regime militar obrigou os produtores familiares a construírem novos canais de participação cívica e ação política – Igreja Católica e em algumas igrejas de confissão protestante, (com grande capilaridade e escapavam aos controles repressivos do Estado). • A criação da CPT, em 1975: processo de mobilização junto ao campesinato em vários estados da federação. • A “libertação do povo” era a idéia-chave de todo o processo social de construção de soluções locais A implantação das Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) por todo o país na década de 1970 . Segundo estimativas não oficiais, existiam 80 mil CEBs no final da década de 1970 (Betto, 1985). país no • famílias de produtores redescobrem a Igreja não apenas como espaço de expressão e de renovação da fé religiosa, mas também como ambiente para reflexão e análise coletiva sobre a vida material nas comunidades rurais. • por vincular as práticas concretas da vida cotidiana com a leitura crítica do evangelho • fomentam dinâmicas sociais descentralizadas a partir da análise das questões objetivas vivenciadas localmente pelas comunidades e permite que se mobilizem para planejarem ações de enfrentamento dos problemas coletivamente identificados. • O exercício da inteligência criativa de produtores e produtoras familiares abriu o espaço para a experimentação de variadas alternativas sócioorganizativas e técnicas. ( casas de farinha; roças coletivas; bancos de sementes, adubação orgânica, plantas medicinais, os mutirões e outras modalidades de associativismo são alguns exemplos dessas iniciativas) Movimentos e lideranças • Foi em grande parte dentro do movimento das CEBs que emergiram as lideranças que renovaram o movimento sindical de trabalhadores rurais e que criaram, em 1984, o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) • CEBs favoreceram a continuidade da organização popular no campo durante o regime militar e motivaram os principais movimentos sociais que se desenvolveram a partir da década de 1980, com o processo de abertura política. • CEBs: práticas metodológicas – ações a partir das questões colocadas pelo cotidiano das famílias – ligação do geral com o particular, do macro com o micro, do genérico com o específico permitia que as dinâmicas sociais locais não se desvinculassem das dimensões mais amplas relacionadas à luta – favorecia que as questões enfrentadas localmente fossem aos poucos integradas à agenda de lutas e mobilizações dos movimentos sociais em escalas mais amplas. – favorecia a plena participação dos membros das comunidades nos processos de transformação de suas próprias realidades, valendo-se da criatividade da vida comunitária como força social transformadora. A construção do “movimento agroecológico” a partir do início da década de 1980 foi possível graças à interação das comunidades rurais e organizações de base estimuladas pelas CEBs com instituições comprometidas com a viabilidade social e econômica da agricultura familiar portadoras de uma proposta de agricultura alternativa (notadamente ONGs) A agricultura alternativa em construção – década de 1980 • Década de 1980 :construção sistemática de uma agricultura alternativa ao modelo da Revolução Verde • conjuntura era favorável: enfraquecimento da ditadura militar; retomada dos processos organizativos do movimento popular, e do debate sobre as alternativas para o desenvolvimento democrático da sociedade • ponto de vista crítico de algumas organizações profissionais: a dos engenheiros agrônomos: 1977- 10 Congresso Paulista de Agronomia; em 1979, XI CBA - FAEAB (postura crítica à modernização da agricultura); em 1981: FAEAB e FEAB realizam em Curitiba o 10 EBAA • A emergência de associações de agricultores orgânicos em alguns estados(produtores neo-rurais de classe média e profissionais das ciências agrárias). Exploração de um nicho de mercado composto por consumidores de alta renda. Continuação • Início anos 80: identificação de iniciativas isoladas de grupos de pesquisadores (fixação biológica de nitrogênio ; controle biológico da lagarta da soja – Embrapa. • As organizações de assessoria aos movimentos sociais no campo, criadas em sua grande maioria no início da década de 1980, surgem de dentro dos movimentos pastorais (tendo à frente a CPT) • a reorganização dos Mov. Pop. no campo deveria vincular: a luta pelo acesso à terra, e a permanência na terra • Em 1983, após um período de identificação de experiências bem sucedidas de assessoria técnica a organizações locais de produtores familiares em diversos estados do país, é inaugurado o Projeto Tecnologias Alternativas, vinculado institucionalmente à FASE (PTA/FASE). • Seminário em Campinas foram lançadas as bases da Rede de Intercâmbio em Tecnologias Alternativas (Rede PTA) que, já em 1988, estava presente em 10 estados da federação nas regiões Sul, Sudeste e Nordeste. Continuação • Rede PTA introduziu no debate que se travava sobre a agricultura alternativa, o tema “dos agricultores como agentes de transformação social” e a preocupação com “a valorização do conhecimento popular”. • A Rede PTA: um fecundo processo de interação voltado ao aprendizado mútuo sobre aspectos metodológicos, conceituais e técnicos do trabalho com agricultura alternativa; • A Rede tinha em comum a atuação vinculada a processos sociais locais, procurando difundir técnicas e métodos apropriados às situações específicas. • O “choque epistemológico” se dá no encontro entre o método racional, analítico e linear de produção e disseminação de conhecimentos dos técnicos com o método intuitivo, integrador e não-linear dos agricultores. Continuação • Um dos papéis das equipes seria o de identificar e sistematizar essas práticas para posteriormente difundi-las por meio de cursos, seminários, impressos e outros meios de extensão rural. Em três anos mais de mil técnicas alternativas foram identificadas. • A perspectiva de “transferência de tecnologias” permanecia presente nos fundamentos metodológicos das equipes de assessoria. A baixa eficiência das metodologias difusionistas ajustadas à agricultura alternativa não tardou a ser percebida e problematizada • Centros de Tecnologias Alternativas (CTAs): Testar e sistematizar sistemas produtivos inovadores que integrassem um conjunto de tecnologias alternativas, e a realização de experimentos deveriam reproduzir as condições médias das propriedades familiares nas regiões de atuação das equipes e entidades. • A formação técnica era outra função desempenhada pelos CTAs, para agricultores que já se destacavam como “inovadores”. Esses “agentes de promoção tecnológica” aos poucos se diferenciavam ( discursos e os códigos). Organizações que se descolam das realidades locais • A existência de uma rede nacional criou um ambiente fermentador de idéias que favoreceu que os enfoques metodológicos adotados fossem aos poucos sendo criticados e modificados • A abertura política - anos 80, as lideranças egressas das CEBs, sobretudo através da CPT, exerceram papel destacado ao fomentar a renovação das organizações populares e a constituição de novos condutos de expressão da sociedade civil no campo. • CEBs deixaram de ser os principais canais de expressão das lutas populares. De energias transformadoras para estruturas de representação distanciadas das famílias e comunidades que representam • Os movimentos e organizações populares no campo se desvincularam dos processos sociais locais, transformando-se em movimentos de massa ou em organizações institucionalizadas orientadas a partir dos grandes temas polarizadores do debate político no plano nacional • As instituições formais de representação se organizam a partir de estruturas que abrem pouco espaço às inovações geradas em suas bases; consolidando lideranças hegemônicas que tendem a se perpetuar no poder. Interrompe o fecundo processo iniciado com as CEBs voltado para a construção de projetos populares a partir das bases. • Implicações para o desenvolvimento do trabalho das ONGs; limitação para estabelecer parcerias com interlocutores institucionalizados no nível local em torno a temas relacionados à produção. Continuação • MSTR: capilarização em todo o país, e legitimidade como articulador das lutas camponesas no plano nacional (luta pela reforma agrária; expansão dos direitos trabalhistas e previdenciários, crédito etc... • Os STRs mantiveram-se alheios ao debate sobre modelo de desenvolvimento rural e não atuaram no sentido de promover experiências alternativas de âmbito local • Percepção limitada de assessorias das lideranças dos movimentos sociais no que diz respeito à importância estratégica do debate sobre modelo de desenvolvimento tecnológico na agricultura ( volta ao passado; viés tecnicista e pouco politizado; opção pela elitização; garantir o acesso à modernização por meio de políticas públicas orientadas para a democratização da Revolução Verde) • Força ideológica que os mitos da modernização desempenharam mesmo nas mentes comprometidas com transformações estruturais em nossa sociedade; • Vários STRs ajudaram a fomentar um verdadeiro “caldeirão de experimentação” que serviu como substrato ao processo de amadurecimento das abordagens metodológicas e conceituais orientadas para a construção da agricultura alternativa Das tecnologias alternativas à Agroecologia - década de 1990 • • • • • • • ONGs vinculadas à Rede PTA permitiram o estabelecimento de eficientes fluxos de idéias do Nordeste ao Sul do país. Variados temas técnicos e metodológicos foram objeto de reflexão e estudo coletivo pelas entidades da Rede. esforço significativo de incorporar novas referências teóricas do mundo acadêmico e de experiências internacionais. Criou-se assim um fecundo processo de aprendizado coletivo fundamentado na vinculação entre a teoria e a prática da agricultura alternativa Final dos anos 80: vínculos estabelecidos com o CLADES (Consórcio Latino-Americano de Agroecologia e Desenvolvimento Sustentável), o conceito de agroecologia foi introduzido nesse processo dialético de aprendizagem, abrindo novos horizontes para o desenvolvimento de abordagens metodológicas mais consistentes A combinação dessas inovações no plano conceitual trouxe profundas implicações no que diz respeito às abordagens metodológicas adotadas por ONGs. Essa evolução se processa como tema de um debate cujo objeto ainda não está perfeitamente delineado “cultura” presente no termo “agricultura”: o cultivo da criatividade humana em busca de inovações orientadas para a convivência com contextos ecológicos e sócio-econômicos sempre em mutação - “aprender fazendo” Continuação • Redes locais de inovação agroecológica são constituídas a partir da conformação de grupos de agricultores-experimentadores, favorecendo que um número crescente de famílias se aproprie dos conhecimentos e passem a experimentá-los em suas próprias condições. • Cria-se um ambiente social no qual os processos de invenção e adaptação interagem com as aplicações diretas das inovações nos sistemas produtivo • Essa concepção metodológica permite que se estabeleçam relações de convivência com as comunidades e famílias rurais, superando aos poucos noção de “assistência técnica” • Os processos de formação técnica passam a privilegiar também a teoria das inovações experimentadas • Experiências empíricas conduzidas localmente, num processo de permanente realimentação entre a prática e a teoria agroecológica; • Os conhecimentos científicos são assimilados pelos agricultores quando eles os introduzem nas coerências lógicas que estruturam seus conhecimentos prévios Continuação • pouco a pouco, as instituições de assessoria assumem o papel de dinamizadoras das redes locais de inovação agroecológica • gestão local do conhecimento agroecológico fundado na interdependência entre os processos de experimentação prática, comunicação horizontal e formação teórica (simbiose entre Ciência e Cultura ) Novos arranjos institucionais para a promoção do desenvolvimento • A abordagem do desenvolvimento local vem favorecendo a criação de uma nova concepção política voltada para a mobilização das forças sociais ativas • o “local” é o lugar por excelência fecundo para a conformação de arranjos institucionais favorecedores da efetiva participação dos atores sociais no planejamento e na gestão das dinâmicas de desenvolvimento rural Enfrentando o mito do desenvolvimento participativo • os diagnósticos participativos passaram a ser incorporados a partir do início da década de 1990 nas estratégias de trabalho de diversas entidades vinculadas à Rede PTA. • DRPAs: papel destacado na elaboração dos programas participativos voltados para o desenvolvimento local. • DRPA foi sendo ajustado pouco a pouco a partir de sua experimentação por diferentes ONGs do Nordeste, do Sudeste e do Sul do país • DRPAs forneceram instrumentos para favorecer o envolvimento comunitário nos processos de desenvolvimento local. (comunicação inter-pessoal e percepções dos agricultores sobre suas realidades; crescente interação de pesquisadores de universidades e centros de pesquisa ) Continuação • . A atração pelas técnicas de participação (diagramas e outros meios de expressão visual na condução de entrevistas semiestruturadas) gerou enorme interesse por essas metodologias. • O apego à razão instrumental terminou por gerar diferentes formas de separação lógica entre os procedimentos adotados nos diagnósticos e os próprios objetos diagnosticados. As técnicas de participação abordam a complexidade dos agroecossistemas a partir de um enfoque analítico e segmentador. • Se empregadas de forma desvinculada da teoria agroecológica, as informações levantadas dificilmente podem ser integradas em um todo coerente a partir de uma perspectiva sistêmica. • Muitas organizações não conseguiram escapar do positivismo lógico que informa os métodos convencionais de geração e difusão de tecnologias embora tenham sido acometidas pela “febre das metodologias participativas” da década de 1990. Continuação • Rede PTA foi pioneira na introdução dessas técnicas de participação no Brasil, • Muitas organizações e técnicos a ela vinculados foram solicitados para coordenarem cursos de capacitação metodológica voltados para instituições oficiais de pesquisa e extensão rural • Apesar do forte interesse demonstrado por essas instituições, as alterações de seus procedimentos institucionais foram epidérmicas, não chegando sequer a questionar as formas de estruturação dos seus programas, e para efetivamente atuarem a partir de uma perspectiva de desenvolvimento local participativo • A incorporação de abordagens participativas fica circunscrita às técnicas de animação de dinâmicas de grupo; não modifica as relações de poder, historicamente estabelecidas. • As ONGs foram capazes de incorporar progressivamente inovações em suas práticas e formas de organização, o que permitiu que a própria concepção de desenvolvimento participativo fosse sendo aos poucos aprimorada. • Os processos de interação em rede jogaram um papel decisivo nessa evolução, ao permitir que princípios comuns de atuação fossem analisados a partir de diferenciados contextos socioambientais Continuação • A Rede Sementes, originada na Rede PTA é exemplo de um fecundo espaço de intercâmbio para tratar de uma questão central no desenvolvimento da Agroecologia; iniciou com o milho e foi se expandindo para outras regiões e outras espécies cultivadas • Permitiu relações sistemáticas com instituições oficiais de pesquisa agrícola. Esse exercício prático de confrontação de idéias favoreceu o amadurecimento do trabalho das entidades nos planos técnico, metodológico, conceitual e político • Os intercâmbios sobre as referências técnicas e metodológicas do trabalho na área do manejo das sementes prepararam as entidades e seus parceiros locais para assumirem uma expressão pública organizada nos debates relacionados à biodiversidade. • Permitiram o amadurecimento de uma concepção de trabalho que associa a conservação da biodiversidade com os processos de desenvolvimento local, contrapondo-se ao enfoque unilateral das estratégias preservacionistas que desconsidera a presença humana nos ecossistemas. • Variados temas puderam ser refletidos: o enfoque no produto ou o enfoque no sistema; o universalismo ou o contextualismo das técnicas; a identificação das melhores variedades ou a valorização da variabilidade genética do conjunto das variedades; o método científico ou o método empírico de objetivação; critérios acadêmicos ou populares de avaliação das variedades, etc. Continuação • As redes locais de desenvolvimento agroecológico vêm se fazendo presentes em vários espaços de influência sobre políticas públicas relacionadas à biodiversidade ( lei de patentes, a lei de sementes, os direitos dos agricultores, a Campanha por um Brasil Livre de Transgênicos etc. • Outras redes temáticas jogaram papéis semelhantes na construção coletiva voltadas para a promoção da Agroecologia ( sistemas agroflorestais, comercialização de alimentos ecológicos, criação animal, manejo dos recursos hídricos, manejo dos solos, etc.) • Rede PTA : Vantagem de ser uma articulação eficiente no que diz respeito à construção coletiva de referências inovadoras orientadas para a promoção da agricultura familiar ecológica; e a desvantagem de ser uma rede fechada e dependente da postura ativa de suas entidadesmembro para que a interatividade positiva entre redes locais/regionais se mantivesse. • O balanço entre vantagens e desvantagens foi se modificando com o tempo, o que justificou o estabelecimento de novas formas de articulação do campo agroecológico no país. • A Rede PTA e enfraqueceu devido à maior ênfase atribuída pelas entidades à construção das redes locais (estratégica de operar a partir de programas de desenvolvimento local) • As redes locais se caracterizam por serem articulações abertas que congregam instituições formais e informais de diferentes naturezas e indivíduos de diferentes inserções sociais: Esse vínculo com atores que se inserem de forma diversificada na sociedade permitiu que os referenciais da Agroecologia se capilarizem nos territórios nos quais as dinâmicas de inovação foram desenvolvidas, assentando as redes multi-institucionais locais em bases sociais sólidas. • Essa “volta para o local” trouxe vantagens evidentes no que diz respeito à produção de resultados concretos do emprego dos princípios agroecológicos na conversão produtiva dos agroecossitemas e ao fortalecimento das capacidades políticas dos atores locais envolvidos com a promoção de padrões sustentáveis de desenvolvimento rural A Articulação Nacional de Agroecologia – década de 2000 • Essa “volta para o local” limitou a capacidade de construção de articulações mais amplas que extrapolam a abrangência local . Essas articulações, fundamentais para a construção de uma expressão organizada do campo agroecológico no nível nacional, ainda dependiam dos processos de mediação realizados pelas próprias entidades da Rede PTA. • O Encontro Nacional de Pesquisa em Agroecologia, promovido pela AS-PTA e pela Embrapa-Agrobiologia, em 1999, exemplifica o grau limitado de articulação existente entre os atores envolvidos em diferentes dinâmicas sociais de inovação agroecológica no país. Foi um momento inédito para a interação e o interconhecimento de pesquisadores envolvidos com a pesquisa agroecológica vinculada a processos de desenvolvimento local. • Se os pesquisadores de instituições oficiais se deparavam com obstáculos para se articularem autonomamente no nível nacional para o avanço da pesquisa em Agroecologia, o que dizer dos agricultores familiares envolvidos em dinâmicas locais de inovação agroecológica? • Assim como as instituições de pesquisa, as organizações de representação nacional dos agricultores familiares, notadamente as vinculadas ao movimento sindical, não se propunham a promover um processo de reflexão a partir das experiências locais conduzidas pelos STRs a elas filiadas. Continuação • A ausência da Rede PTA nas regiões Norte e Centro-Oeste agravava o problema. Os ricos processos de mobilização social existentes nessas regiões tardaram a ser incorporados como referências sócio-políticas na Rede PTA, nem encontraram nela um canal aberto e ativo de articulação, presentes nas outras três regiões do país • Os movimentos sociais pautam-se por princípios de ação e objetivos semelhantes, o que justifica a importância estratégica da vinculação dessas dinâmicas sociais em um só “movimento nacional” • Apesar da diversidade dos atores sociais coletivos e dos contextos socioambientais nos quais as redes locais se organizam, existem unidades que identificam o conjunto dos processos sociais envolvidos com a transição agroecológica no país, entre elas os desafios a serem enfrentados coletivamente (Almeida, 2002). • avaliação externa realizada entre 1997 e 1999, a Rede PTA teve uma excelente oportunidade de rever o sentido de sua existência e o seu papel no processo de promoção da Agroecologia Continuação • A Rede se descobre distribuída em várias redes locais/regionais que têm suas próprias formas de expressão e suas agendas de mobilização específicas, mas representava um risco de fragmentação do “movimento nacional”. • Surge a necessidade do estabelecimento de um processo de articulação nacional capaz de tirar partido da diversidade existente ao nível local/regional e favorecer uma expressão unitária do “campo agroecológico” no plano nacional; explicitada também em dois outros eventos: ENA, 2002 e O Seminário sobre Reforma Agrária e Meio Ambiente, promovido pelo Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Meio Ambiente e Desenvolvimento e pelo Fórum Nacional pela Reforma Agrária • as condições para a criação de uma articulação de âmbito nacional estavam maduras. Entre elas, cabe destacar: – Os movimentos sociais no campo (MST, MPA, Fetraf-Sul e segmentos importantes da Contag) manifestavam uma crítica ao modelo tecnológico da Revolução Verde. (incorporação do debate sobre os transgênicos ).. Ao contrário do período de rápida disseminação dos agrotóxicos na agricultura brasileira, os transgênicos foram recebidos com forte reação Continuação – Algumas iniciativas inovadoras de governos municipais, estaduais e federal se orientavam para favorecer a expansão da Agroecologia. Mesmo que fragmentadas e isoladas, indicavam a existência de movimentos de ruptura com o paradigma científico-tecnológico no interior das instituições oficiais. – Um novo ambiente ideológico; o crescimento dos mercados de alimentos orgânicos no Brasil; – a imagem negativa da agricultura familiar vinha aos poucos sendo desconstruída, e sendo concebida por seus valores positivos: geradora de empregos; qualidade e diversidade alimentar; diversidade biológica e cultural; economias rurais rentáveis e estáveis; conservadora das paisagens, etc... (aprovação popular aos movimentos sociais no campo e suas lutas pela reforma agrária). – Realização do ENA: Havia um contexto pré-eleitoral (para os poderes executivos e legislativos estaduais e nacional) no qual os debates sobre os papéis da agricultura familiar e da reforma agrária e sobre o modelo tecnológico na agricultura (polarizado pela questão dos transgênicos) mereciam grande atenção da sociedade brasileira Continuação • Foi convocado um seminário preparatório do ENA que envolveu 50 pessoas de entidades e redes nacionais, regionais e locais, instituições oficiais e lideranças de movimentos sociais, todas com capacidade de mobilização de representantes de outras redes e organizações envolvidas com a promoção da agroecologia e da produção familiar nas diferentes regiões do Brasil. Além de definir o método de preparação e realização do encontro nacional, o grupo reunido assumiu-se formalmente como convocador do ENA A Comissão organizadora do ENA é compostas pelas seguintes entidades, redes e movimentos:ANMTR – Articulação Nacional de Mulheres Trabalhadoras Rurais; ASA Brasil – Articulação do Semi-Árido Brasileiro; AS-PTA – Assessoria e Serviços a Projetos em Agricultura Alternativa; CTA-ZM – Centro de Tecnologias Alternativas da Zona da Mata; Centro Ecológico Ipê; Centro de Desenvolvimento Agroecológico Sabiá; CPT – Comissão Pastoral da Terra; CNS – Conselho Nacional dos Seringueiros; CONTAG – Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura e Comissão Nacional de Trabalhadoras Rurais da CONTAG; Fase – Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional; FEAB – Federação dos Estudantes de Agronomia do Brasil; Fetraf-Sul – Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar da Região Sul; Gera – Grupo de Estudos sobre Reforma Agrária / Universidade Federal do Mato Grosso; GTA – Grupo de Trabalho Amazônico; GTNA – Grupo de Trabalho Agroecológico na Amazônia; MPA – Movimento dos Pequenos Agricultores; MST – Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra; Rede Cerrado; Rede Ecovida de Agroecologia; Sasop – Serviço de Assessoria a Organizações Populares Rurais; Unefab – União Nacional das Escolas Famílias Agrícolas do Brasil. Continuação • o processo preparatório se deu de forma descentralizada, favorecendo o encontro entre redes locais e sub-regionais e o fortalecimento de alianças entre elas. • Os eventos locais e regionais associados ao processo preparatório do ENA foram concebidos com o objetivo de dar visibilidade às experiências concretas de promoção da Agroecologia. Foi possível produzir sínteses sobre os principais avanços alcançados e grandes desafios para a generalização dos processos de transição agroecológica nas diferentes regiões e estados. • Realizado em julho de 2002, no Rio de Janeiro. A condução metodológica do evento (colocar as experiências concretas no centro dos debates) permitiu que a elaboração de diagnósticos e propostas nos grupos de trabalho temáticos e nas plenárias (por região e nacionais) se fizesse de forma estreitamente vinculada aos processos reais vivenciados pelos atores envolvidos com dinâmicas de transição agroecológica em todo o país. Continuação • O ENA permitiu que lideranças dos diferentes movimentos populares pudessem interagir entre si com relativa autonomia em relação às aderências político-ideológicas que informam suas formas específicas de luta. (sem ocultar as diferenças existentes, mas permitir que elas pudessem conviver num espaço democrático de construção de referências e identidades comuns. • Como o processo de mobilização dos agricultores-experimentadores para a participação no ENA se fez a partir das redes locais/regionais, as lideranças políticas dos agricultores tiveram a oportunidade de visualizar a rica diversidade da experimentação promovida por suas próprias “bases”. • Dois encaminhamentos interdependentes principais foram tirados no ENA: a criação da Articulação Nacional de Agroecologia (ANA) e o fortalecimento das redes regionais e estaduais já existentes. – A idéia é que a ANA esteja ancorada em redes dinâmicas constituídas por organizações e processos sociais atuantes em diferentes escalas geográficas e áreas temáticas. A construção de uma articulação coesa horizontalmente (entre redes locais) e verticalmente (entre o micro e o macro) será uma condição para a sustentabilidade política de um processo nacional fundado no princípio da “unidade na diversidade” Continuação • Faz-se necessário estimular a emergência e/ou a consolidação de canais eficientes de mobilização e expressão das forças sociais envolvidas com a transição agroecológia dispersas pelo país afora. • O que se pode perceber no curto período pós-ENA é o fortalecimento dessas “redes intermediárias” em todas as regiões e em vários estados. Multiplicam-se os eventos de intercâmbio e mobilização entre redes locais tais como as feiras de sementes, as “feiras de saberes e sabores”, os intercâmbios entre grupos de agricultores-experimentadores e os eventos para troca de experiências no plano metodológico. • A intensificação dessas dinâmicas interativas possibilita o revigoramento das próprias redes locais e o fortalecimento das redes mediadoras, entre as quais: Rede Ecovida de Agroecologia, a ASA Brasil e as ASAs estaduais, a Articulação Mineira de Agroecologia, a Jornada Paranaense de Agroecologia, a Rede Cerrados, a Rede Maranhense de Agroecologia, Pólos Sindicais, as Feiras nacionais e regionais de Sementes etc... Rede ECOVIDA de Agroecologia • • • • Região Sul do Brasil 24 Núcleos regionais 2.400 Famílias – 270 Grupos/Associações 30 ONGs + 32 Outras Organizações (Cooperativa de Consumidores, Peq. Agroindústrias, ...) • 133 Feiras Ecológicas Continuação • A ANA também vem favorecendo a atividade de grupos de trabalho constituídos por representantes de organizações que integram essas redes. Esses GTs vêm organizando uma atuação articulada nos debates relacionados a distintos temas de políticas públicas, – Em 2003 a ANA exerceu influência decisiva na elaboração da nova legislação que regula os processos de certificação da qualidade orgânica dos alimentos, na implementação de políticas de crédito orientadas à conversão agroecológica, e nos debates sobre a reestruturação das políticas de assistência técnica e extensão rural (ATER). Desafios para o “movimento agroecológico” Desafios para que possa pavimentar os caminhos do “movimento agroecológico” e favorecer que ele se dissemine e se consolide no país • Apoiar o processo de construção de uma identidade comum a esses numerosos movimentos e organizações; trata-se de uma condição fundamental para a cimentação e a expressão nacional de um “movimento” de tamanha complexidade e diversidade. (engloba as múltiplas identidades auto-atribuídas pelos atores sociais coletivos envolvidos com a promoção da Agroecologia nos níveis local e regional) • O fator que permite a síntese dessas identidades é a defesa compartilhada de um projeto de transformação do mundo rural brasileiro cujos princípios comuns são assumidos pelos atores sociais que vêm se mobilizando desde suas realidades locais. Alguns desafios estão colocados para que esse projeto se irradie e se consolide: • A necessidade de incorporação progressiva de diferentes setores da sociedade ao processo de construção de uma consciência social crítica e ativa com relação aos efeitos do modelo hegemônico de desenvolvimento rural. – Reformas estruturais no campo brasileiro e mudanças na concepção que orienta o desenvolvimento rural devem ser assumidas pelo conjunto da sociedade – A construção de alianças entre os diferentes movimentos sociais apresenta-se como condição essencial para o adensamento da capacidade política da sociedade para formular e defender um projeto nacional de desenvolvimento – A desconstrução dos mitos associados à modernização agrícola é uma dimensão estratégica para que essas alianças se efetivem, permitindo que a luta pela justiça social seja informada por uma cultura ecológica que penetre, motive e mobilize as organizações da sociedade. – Sendo os mais diretamente afetados pelos efeitos perversos do modelo, os produtores familiares, a partir de suas comunidades, deverão ser também os protagonistas de sua transformação Continuação • A necessidade de reorientação das políticas públicas e de reformulação do papel do Estado para que as dinâmicas sociais de inovação agroecológica ultrapassem o atual estágio de experiências isoladas, fragmentadas e socialmente pouco visíveis e possam expandir suas escalas social e geográfica. – As redes locais/regionais envolvidas com a promoção da Agroecologia que vêm se constituindo nas diferentes regiões são reveladoras da emergência de uma nova concepção sobre o domínio do público, que deixa de ser concebido como o campo exclusivo e definidor da ação do Estado, para envolver também o espaço em que se exprimem e se exercitam os interesses e projetos gerados no seio da sociedade civil – A mudança na qualidade das relações entre Estado e sociedade mostra-se, nesse sentido, como condição inarredável para que as dinâmicas promotoras da Agroecologia se irradiem e se fortaleçam em todo o país Essa mudança de qualidade significa, em última instância, que o Estado atue como instrumento estimulador da organização da sociedade, para que ela possa agir na formulação e na implementação de um projeto próprio de desenvolvimento, sem que isso corresponda ao esvaziamento do papel estatal. – Essas novas relações devem se constituir mediante o estabelecimento de parcerias do Estado com organizações da sociedade civil que estimulem o florescimento e a multiplicação das iniciativas autônomas destas últimas. Essas parceiras deverão ser alimentadoras de uma nova cultura política na qual Estado e sociedade mantêm entre si relações de cooperação e de controle mútuo. Continuação • A necessidade de rompimento com o paradigma científico-tecnológico que organiza os sistemas oficiais de produção e disseminação de conhecimentos na agricultura. Esse rompimento não se dará de forma abrupta como resultado de novas orientações políticas implementadas “de cima para baixo”. Ele deverá se processar progressivamente a partir da gradual incorporação dos enfoques teórico-metodológicos da Agroecologia nas instituições oficiais de ensino, pesquisa e extensão. • A intensificação das parcerias com as organizações da sociedade em dinâmicas sociais locais de desenvolvimento rural é uma para irradiar idéias e propostas que balizem a reorganização das instituições envolvidas com a geração e a disseminação de conhecimentos para o desenvolvimento rural; e favorecer o processo de revisão crítica das abordagens metodológicas adotadas por essas instituições • Incorporação do enfoque de gênero no trabalho: favorecer o equilíbrio do poder decisório, tanto no âmbito do núcleo familiar quanto no da esfera pública. Além de ser um imperativo ético, a construção de equidade entre gêneros nas comunidades rurais joga um papel vital na promoção da sustentabilidade socioambiental Associação Brasileira de Agroecologia • A embrionária Sociedade Brasileira de Agroecologia, cuja criação vem sendo objeto de debate por número significativo de pesquisadores de várias regiões do país, poderá jogar um duplo papel nesse processo: 1) favorecer a produção de sínteses dos acúmulos de conhecimento gerados a partir do exercício concreto das metodologias participativas de pesquisa e extensão, abrindo caminho para que a abordagem agroecológica seja internalizada nas práticas das instituições oficiais; 2) criar um espaço de articulação dos pesquisadores e extensionistas comprometidos com a promoção da Agroecologia, tornando mais coesa a ação política desse já considerável segmento social por dentro das próprias instituições oficiais. ARTICULAÇÃO NACIONAL EM AGROECOLOGIA - ANA • Caberá à ANA um papel determinante na integração do esforço coletivo das redes e dos movimentos sociais que as integram para o enfrentamento desses desafios – – fazer convergir as capacidades transformadoras, sem que as condições de autonomia que vêm permitindo que elas surjam de forma descentralizada sejam subtraídas Sua existência se justifica pela necessidade da interação sinérgica entre essas redes para que, juntas, elas possam construir crescentes capacidades de influência nos rumos do desenvolvimento rural no país. • O caráter sutil e difuso do “movimento agroecológico” se explica pela forma descentralizada e distante dos centros de poder como ele vem sendo construído no curso das últimas duas décadas. • Sua trajetória ainda o deixa relativamente imperceptível para o conjunto da sociedade, mas permite que ele se desenvolva assentado em bases sociais sólidas. • A ANA poderá representar um salto qualitativo de grande importância em sua evolução. Tudo dependerá de sua capacidade de fazer convergir a força transformadora dos rincões na construção de identidades compartilhadas capazes de cimentar sua expressão social e política no nível nacional. ” Não importa quantos recursos ou poder você tenha, você não poderá comprar felicidade, afeto e nem tranqüilidade. Sem isto, sua vida é miserável" . (Dalai Lama) Gracias