EDÉZIO TEIXEIRA DE CARVALHO MSC Engenheiro Geólogo - CREA 8.157/D TÁTICAS PARA “VENDER” A TRANSPOSIÇÃO1 Geocentelha 111 Espero que semelhanças entre a transposição do São Francisco e o TRT-SP fiquem na insuficiência, pelo menos quanto ao divulgado até o dia 28/08/00, de definições de projeto. Considero derivações fluviais grande equívoco, mesmo as citadas como casos de êxito. A do Colorado para a Califórnia só pode ser considerada êxito por quem não vê imoralidade em impedir que uma gota d’água chegue à foz em território mexicano. Essa imoralidade cresce de significado quando se percebe a indisposição em controlar enchentes e inundações, na própria Califórnia. Embora não concorde com eles, admito argumentos de que a água a transferir é uma insignificância e melhor dá-la de beber a quem tem sede que entregá-la ao mar. Tenho simpatia pelo argumento da “sinergia” hídrica, quantitativa e qualitativa. O que são? O projeto de “garantia de fornecimento de água”, que só funcionará quando preciso, permitiria uso mais eficiente dos reservatórios nordestinos, esgotando-os mais mesmo na perspectiva de seca. Trabalhando com reservatórios mais baixos, seria reduzida a perda por evaporação, o que equivale a dizer que tudo se passa como se a quantidade transposta fosse maior. A sinergia qualitativa vincula-se à redução da salinidade média das águas dos açudes, proporcionada pela redução da perda por evaporação. Daí em diante nada mais ajuda a aderir ao projeto. Antes, contudo, de apresentar argumentação complementar ao já exposto neste espaço, não concordo com as táticas de “venda” do projeto (o último ex-ministro que disse ter tentado “vender” o Brasil, eu levei a sério, porque acho que ele vendeu mesmo, sem aspas). Dessas táticas fazem parte argumentos do tipo: “Os mineiros, em nada afetados pela transposição, se ficam contra ela, ficam com a obrigação moral de resolver o problema dos atingidos pelas secas mais agudas. As pesquisas mostram que a grande maioria dos brasileiros aprova a transposição. O prejuízo de uma única seca monta em bilhões de reais (ou dólares). Não podemos ficar de braços cruzados só porque, no passado, obras ditas faraônicas não deram certo. No nordeste chove mais para cima (evaporação) que para baixo (precipitação)”. São manipulações do emocional, chantagens, que não deveriam ajudar a “vender” nada, mas que no Brasil funcionam. Os mineiros, além de serem afetados, pelo menos por pagarem impostos federais, podem achar que a solução não é boa, sem deixarem de ser favoráveis à solução do problema da seca. Quanto à questão das obras faraônicas, o roteiro de sua aprovação não foi tão diverso do atualmente seguido. Sobre chover mais para cima que para baixo, estão sempre se esquecendo de dizer que as taxas de evaporação referem-se aos espelhos d’água e as de precipitação ao território inteiro. Voltando aos argumentos, a água é pouca e estará dirigida para faixas estreitas de terreno, tendendo a gerar o ciclo da realimentação positiva, que gera carências superiores às atuais. Nessa quantidade outros meios de armazenamento de águas pluviais, complementares aos reservatórios de superfície, não estão esgotados, e podem gerar condições para o atendimento dos períodos de carência, em bases geográficas difusas, sem provocar a “corrida da água”. Há outras restrições à transposição, mas é preciso haver projeto até para discutir aspectos técnicos e custos. Sobre custos, se obra de tal porte será de funcionamento intermitente, que fará o pessoal de operação na ociosidade? Quanto custará a água efetivamente transferida? A informação técnica é pouca, mas alguma coisa escapa dela. Por exemplo, se o aqüífero Apodi teve depleção de + 40m a – 200m, ele está com volume ou capacidade de armazenamento sub-utilizada correspondente a esses 240m de depleção. O fato de tal capacidade não estar sendo usada reflete a falta de responsabilidade da civilização atual no trato com a terra. Está aí capacidade de armazenamento de água que a civilização deixa de usar, mostrando que não é água que vai faltar, mas lugar para ela na terra, pois não há dificuldade técnica em fazer recarga forçada, bastando para tanto localizar as áreas de recarga e injetar nelas as águas de chuva dos anos chuvosos por meios disponíveis há muito tempo. Edézio Teixeira de Carvalho. Geólogo, autor do livro Geologia urbana para todos – uma visão de Belo Horizonte. 1 Estado de Minas – Opinião, p. 7; 30/08/00 Rua Dom Lúcio Antunes, 424/603 - Bairro Coração Eucarístico CEP: 30.535-630. Belo Horizonte - MG. Tel./Fax: (31) 375-6127; 0414. e-mail [email protected]