BOLETIM MÉDICO edição 4 – ano 2 – junho de 2015 Diagnóstico por Imagem Como investigar as síndromes demenciais na população idosa Métodos de imagem ajudam a descartar possíveis causas de demência e fornecem pistas para a presunção diagnóstica dos casos. Frequente nos idosos, a perda de memória é uma queixa que deve suscitar investigação detalhada, já que algumas das causas associadas podem receber intervenção terapêutica. Assim, identificar uma síndrome demencial é o ponto-chave, bem como fazer o diagnóstico diferencial entre as demências, caso essa seja a hipótese central. As mais frequentes incluem a doença de Alzheimer (DA) e as demências com corpos de Lewy, vascular e frontotemporal. Os métodos de imagem são frequentemente utilizados para essa finalidade. Na suspeita de DA, em particular, descartam outras causas de demência, como múltiplas isquemias ou a alteração de mielina no SNC, hematomas subdurais crônicos, hidrocefalia e lesões expansivas. Além disso, sequências volumétricas seriadas de ressonância magnética (RM) convencional conseguem auxiliar o diagnóstico presuntivo dessa demência ao detectar alterações de volume nas mesmas regiões anatômicas das usualmente observadas no envelhecimento cerebral normal, porém de forma maior e mais precoce, com predomínio do acometimento dos lobos temporais – incluindo as estruturas temporais mesiais – e parietais. Nessas situações, o comprometimento da formação hipocampal e do córtex entorrinal é a regra. Sequências adicionais costumam ainda ser úteis na abordagem do Alzheimer, como a espectroscopia de prótons, que permite a análise metabólica tissular in vivo. Em estudos sobre esse recurso, os portadores de DA apresentaram redução do pico de N-acetilaspartato e de suas relações, decorrente de despopulação/disfunção neuronal, associada a aumento do pico de mioinositol e suas relações, por mecanismo de proliferação glial e reparação astrocitária. A despeito de estarem presentes em doenças vasculares, inflamatórias e metabólicas, bem como em outras síndromes degenerativas, tais achados podem contribuir para a presunção diagnóstica de DA, desde que interpretados à luz de uma estreita correlação clínica e dos dados obtidos por meio da RM convencional, da avaliação neuropsicológica e do estudo do liquor. A contribuição dos exames funcionais A Medicina Nuclear dispõe de outras ferramentas capazes de ajudar a detectar os quadros demenciais, como o estudo de perfusão cerebral com Spect, que usa os radiofármacos ECD-99mTc e HMPAO-99mTc, e o exame de PET-CT, que emprega a FDG[18F]. Por se tratar de métodos funcionais, ambos detectam alterações mais precoces e, em geral, mais extensas do que os métodos anatômicos. Assim, além de oferecerem informações diagnósticas e prognósticas complementares à avaliação clínica, são úteis na distinção entre déficit cognitivo leve e quadros demenciais iniciais e no diagnóstico diferencial dos diversos tipos de demência. Em pacientes com Alzheimer, por exemplo, evidencia-se uma redução do fluxo sanguíneo e do metabolismo glicolítico no cíngulo posterior e nas regiões temporoparietais. Vale adicionar que, num futuro próximo, radiofármacos como o composto B de Pittsburgh, que possui afinidade específica por depósitos beta-amiloide, prometem modificar o diagnóstico e o seguimento dos quadros demenciais. Prática clínica O que pode haver por trás da anemia no idoso Causas incluem de deficiências de minerais e vitaminas até doenças agudas e crônicas, mas, em boa parte dos casos, o diagnóstico é um desafio. Embora geralmente leve, a anemia no idoso está, com frequência, relacionada a consequências desfavoráveis, como diminuição da performance, aumento da fragilidade, do número de quedas e de hospitalizações, piora cognitiva e, até mesmo, maior mortalidade. Portanto, a condição requer atenção para investigação da sua causa e a instituição de tratamento adequado. Segundo a OMS, a anemia, nessa população, é definida por valores de hemoglobina (Hb) menores que 13 g/dL, no sexo masculino, e inferiores a 12 g/dL, no feminino, sendo determinada principalmente pelas condições descritas abaixo: Anemia ferropriva Entre as causas identificáveis de anemia, a ferropriva é a mais comum. A história clínica e o exame físico sugerem o diagnóstico, porém há necessidade de investigação laboratorial para sua confirmação. O hemograma, que, nesse contexto, detecta não somente os níveis diminuídos de hemoglobina, mas também hipocromia e microcitose, além do achado de anisocitose, sugestivo da doença, é importante na exclusão de outras etiologias. Apesar de estar associada à deficiência nutricional em alguns casos, a anemia ferropriva no idoso é mais frequentemente ocasionada por sangramentos, o que torna fundamental a investigação de prováveis fontes perdedoras de sangue, com destaque para o trato gastrointestinal. Reprodução de um quadro de anemia. Anemia da inflamação Anemia inexplicada A maior parte dos estudos mostra que, em cerca de um terço dos idosos com anemia, a causa não pode ser encontrada. Alguns fatores ou doenças devem ser excluídos nessa situação, como toxicidade, uso de álcool, neoplasias e síndrome mielodisplásica (veja boxe na página ao lado), mas, apesar de extensa investigação hematológica, a condição permanece como diagnóstico de anemia em parcela considerável dos casos. Presume-se que condições inflamatórias crônicas, alteração na percepção da hipóxia ou na resposta a essa condição, síndrome mielodisplásica inicial ou não diagnosticada, alterações hormonais ou defeitos na célula-tronco hematopoética expliquem o quadro em alguns pacientes. Forma mais frequente de anemia nos pacientes hospitalizados, a anemia da inflamação ocorre em indivíduos com doenças agudas ou crônicas e resulta da ação combinada de citocinas inflamatórias, capazes de atuar sobre diferentes vias da eritropoese. Como principal característica, tem o bloqueio na reutilização do ferro, o que se evidencia laboratorialmente pela diminuição do ferro sérico combinada à ferritina aumentada. Anemia por deficiência de vitamina B12 ou folato Embora seja uma causa rara de anemia no idoso, convém se lembrar dessa possibilidade, que pode ser confirmada por meio do roteiro de investigação a seguir. Possível deficiência de vitamina B12 B12<150 pmol/L Deficiência de B12 B12 entre 150 e 220 pmol/L Ácido metilmalônico e homocisteína normais Ácido metilmalônico e homocisteína elevados Deficiência de B12 excluída Deficiência de B12 confirmada B12>220 pmol/L Deficiência de B12 improvável Anemias ferropriva X da inflamação: semelhanças e diferenças no diagnóstico laboratorial Marcador Anemia ferropriva Anemia da inflamação Associação das duas entidades Ferro sérico Diminuído Diminuído Diminuído Transferrina Aumentada Diminuída a normal Diminuída Saturação de transferrina Diminuída Normal ou diminuída Diminuída Ferritina Diminuída Normal a aumentada Diminuída a normal Receptor solúvel de Aumentado transferrina Normal Normal a aumentado Relação receptor de transferrina/log ferritina Baixo (<1) Alto (>2) Aumentadas Aumentadas Alto (>2) Citocinas (ex.: IL-6) Normais Causas mais frequentes de anemia de doença crônica Prevalência estimada Doença Infecções agudas ou crônicas (virais, bacterianas, parasitárias e fúngicas) 18-95% Neoplasias (tumores sólidos e hematológicos) 30-77% Doenças autoimunes (artrite reumatoide, lúpus, vasculites, sarcoidose e doença inflamatória intestinal) 8-71% Rejeição crônica de enxerto após transplante de órgão sólido 8-70% Insuficiência renal crônica 23-50% Prevalência das principais causas de anemia no idoso 8% 20% Anemia inexplicada 4% Deficiência de ferro Deficiência de vitamina B12 ou folato 14% 34% Anemia da inflamação Secundária à doença renal Associação de doença renal com anemia da inflamação 20% Fonte: Estudo Nhanes III Subdiagnóstico ronda a síndrome mielodisplásica As síndromes mielodisplásicas constituem um conjunto de doenças caracterizadas por proliferação clonal das células da medula óssea, acompanhada, em geral, de pancitopenia, em virtude de defeitos de maturação. Sua prevalência vem aumentando em decorrência da maior expectativa de vida da população mundial, assim como do alto índice de cura no tratamento de tumores sólidos, que favorece o aparecimento das SMD secundárias à quimioterapia e/ou à radioterapia. Ademais, têm sido mais reconhecidas por suas particularidades, na medida em que os avanços no conhecimento permitem a identificação de subtipos mais bem definidos. Apesar disso, muitos casos ainda permanecem sem diagnóstico e somente são detectados quando os pacientes, até então com manifestações frustras, pioram e passam a precisar de atenção pormenorizada. O reconhecimento da doença também fica mais desafiador em algumas situações clínicas limítrofes, já que diversas condições podem apresentar características e sintomas semelhantes, tornando o diagnóstico diferencial extenso e, por vezes, complexo. Como se não bastasse, muitas pessoas sucumbem às complicações advindas da neutropenia, da anemia ou da trombocitopenia e, apenas nesse momento crítico, têm a investigação da doença feita. Embora a síndrome mielodisplásica seja amplamente distinguida pelos hematologistas, grande parte do atendimento primário cabe a generalistas, que, diante de citopenia ou monocitose inexplicável e persistente, devem suspeitar dessa hipótese e encaminhar os pacientes para um diagnóstico rápido e preciso, que geralmente implica, além do hemograma e do mielograma, a realização de biópsia de medula óssea, cariótipo, imunofenotipagem, hibridação in situ por fluorescência e testes moleculares para pesquisa de mutações. Portanto, o conhecimento das características da SMD pelos profissionais que efetuam a atenção primária é imperioso. Atualidades Para diagnosticar, tratar e acompanhar a osteoporose Densitometria óssea e marcadores do metabolismo ósseo contribuem decisivamente para o manejo desses pacientes. Doença osteometabólica clínica mais comum, a osteoporose atinge cerca de 10 milhões de pessoas atualmente no Brasil e ocasiona aumento da fragilidade e do risco de fraturas no idoso, que estão associadas a uma alta morbimortalidade. O método de referência para a quantificação da osteopenia, para o diagnóstico da osteoporose e para o acompanhamento de pessoas em uso de terapêutica específica é a medida da densidade mineral óssea (DMO) pela densitometria óssea, que ainda avalia o risco de ocorrência de fraturas, dada a correlação existente entre maior incidência destas e menor DMO. Os parâmetros utilizados para interpretação dos resultados desse exame compreendem o T-escore e o Z-escore, que representam o número de desvios-padrão em relação à média dos adultos jovens e à média para a idade do paciente, respectivamente. Para a população de risco, ou seja, mulheres na pós-menopausa ou com idade ≥40 anos e para homens >50 anos, deve ser utilizado o T-escore. Critérios diagnósticos de osteoporose na população mais suscetível Classificação T-escore Normal OsteopeniaOsteoporose ≥-1 De -1,1 a -2,4 ≤-2,5 O papel dos marcadores do metabolismo ósseo A densitometria óssea apresenta boa correlação com o risco de fraturas, mas demora a registrar mudanças na DMO após o tratamento e pode não flagrar a má aderência dos pacientes à terapêutica. Sem contar que a ausência de aumento na DMO nem sempre significa falta de resposta à medicação. Além disso, nem a densitometria nem os fatores clássicos de risco para a osteoporose estimam diretamente o grau de remodelação óssea, que, quando acentuado, está ligado a formas mais graves da doença e a uma maior possibilidade de fraturas. Esse papel cabe mesmo aos marcadores bioquímicos do metabolismo ósseo, que avaliam a natureza dinâmica da formação e da reabsorção óssea, possibilitando a monitoração da eficácia da terapêutica tão logo ela seja instituída – em torno de dois a três meses. BOLETIM MÉDICO edição 4 – ano 2 – abril de 2015 Diagnóstico por Imagem Como investigar as síndromes demenciais na população idosa Métodos de imagem ajudam a descartar possíveis causas de demência e fornecem pistas para a presunção diagnóstica dos casos Frequente nos idosos, a perda de memória é uma queixa que deve suscitar investigação detalhada, já que algumas das causas associadas podem receber intervenção terapêutica. Assim, identificar uma síndrome demencial é o ponto-chave, bem como fazer o diagnóstico diferencial entre as demências, caso essa seja a hipótese central. As mais frequentes incluem a doença de Alzheimer (DA) e as demências com corpos de Lewy, vascular e frontotemporal. Os métodos de imagem são frequentemente utilizados para essa finalidade. Na suspeita de DA, em particular, descartam outras causas de demência, como múltiplas isquemias ou a alteração de mielina no SNC, hematomas subdurais crônicos, hidrocefalia e lesões expansivas. Além disso, sequências volumétricas seriadas de ressonância magnética (RM) convencional conseguem auxiliar o diagnóstico presuntivo dessa demência, ao detectar alterações de volume nas mesmas regiões anatômicas das usualmente observadas no envelhecimento cerebral normal, porém de forma maior e mais precoce, com predomínio do acometimento dos lobos temporais – incluindo as estruturas temporais mesiais – e parietais. Nessas situações, o comprometimento da formação hipocampal e do córtex entorrinal é a regra. Sequências adicionais podem ainda ser úteis na abordagem do Alzheimer, como a espectroscopia de prótons, que permite a análise metabólica tissular in vivo. Em estudos sobre esse recurso, os portadores de DA apresentaram redução do pico de N-acetilaspartato e de suas relações, decorrente de despopulação/ disfunção neuronal, associada a aumento do pico de mioinositol e suas relações, por mecanismo de proliferação glial e reparação astrocitária. A despeito de estarem presentes em doenças vasculares, inflamatórias e metabólicas, bem como em outras síndromes degenerativas, tais achados podem contribuir para a presunção diagnóstica de DA, desde que interpretados à luz de uma estreita correlação clínica e dos dados obtidos por meio da RM convencional, da avaliação neuropsicológica e do estudo do liquor. A contribuição dos exames funcionais A Medicina Nuclear dispõe de outras ferramentas que podem ajudar a detectar os quadros demenciais, como o estudo de perfusão cerebral com Spect, que usa os radiofármacos ECD-99mTc e HMPAO-99mTc, e o exame de PET-CT, que emprega a FDG[18F]. Por se tratar de métodos funcionais, ambos detectam alterações mais precoces e, em geral, mais extensas do que os métodos anatômicos. Assim, além de oferecerem informações diagnósticas e prognósticas complementares à avaliação clínica, são úteis na distinção entre déficit cognitivo leve e quadros demenciais iniciais e no diagnóstico diferencial dos diversos tipos de demências. Em pacientes com Alzheimer, por exemplo, evidencia-se uma redução do fluxo sanguíneo e do metabolismo glicolítico no cíngulo posterior e nas regiões temporoparietais. Vale adicionar que, num futuro próximo, radiofármacos como o composto B de Pittsburgh, que possui afinidade específica por depósitos beta-amiloide, prometem modificar o diagnóstico e o seguimento dos quadros demenciais. Compare os testes de formação e reabsorção óssea Marcador Tipo Descrição P1NP Formação • Apresenta concentrações elevadas em pessoas com o turnover ósseo aumentado, como na doença de Paget, na osteoporose pós-menopausa e em metástases ósseas • Tende a cair com o uso de inibidores do turnover ósseo e a subir com o de drogas que aumentam a osteogênese Fosfatase alcalina óssea Formação • Aplicável a todas as condições em que se quer avaliar a atividade osteoblástica, como na osteoporose e na investigação do efeito da terapêutica Osteocalcina Formação • Indicada no monitoramento de terapias para o controle do processo de remodelação óssea • Níveis elevados condizem com maior atividade osteoblástica e vice-versa • A interpretação deve considerar vários fatores, desde a metodologia empregada até as condições de coleta, já que esse peptídeo é suscetível à proteólise CTx Reabsorção • Recomendado para o monitoramento da eficácia da terapia antirreabsortiva em casos de osteoporose ou de outras doenças osteometabólicas • Concentrações aumentadas são observadas em pessoas com reabsorção óssea elevada, que precisam receber agentes antirreabsortivos ósseos Publicação trimestral da Clínica Felippe Mattoso • Responsável técnico: Dr. Wilson Shcolnik (CRM-RJ 52-34610-4) • Editora científica: Dra. Fernanda Aimée Nobre • Editora executiva: Solange Arruda • Produção gráfica: Solange Mattenhauer Candido • Impressão: Promopress • Assessoria médica: [email protected] • Contribuíram com esta edição: Dra. Anna Patricia de Freitas Riello, Dra. Renata Gomes Nunes e Dr. Sérgio Altino.