Nº
/2015 - ASJTC/SAJ/PGR
Ação Cível Originária 1523/SC
Relator:
Ministro Teori Zavaski
Autores:
Autopista Litoral Sul S/A e outro(a/s)
Agência Nacional de Transportes Terrestres - ANTT
Réu:
Estado de Santa Catarina
Interessada: União
AÇÃO CÍVEL ORIGINÁRIA. EMPRESAS CONCESSIONÁRIAS
DE SERVIÇO PÚBLICO. COBRANÇA DE PEDÁGIOS. RODOVIAS FEDERAIS BR-101, BR-116 BR-376. LEI ESTADUAL QUE
ISENTA DO PAGAMENTO DE PEDÁGIO OS VEÍCULOS EMPLACADOS NO MUNICÍPIO ONDE ESTÃO INSTALADAS
PRAÇAS DE PEDÁGIOS. CONFLITO FEDERATIVO. COMPETÊNCIA ORIGINÁRIA DO STF. INCONSTITUCIONALIDADE
DO ATO NORMATIVO ESTADUAL. PARECER PELA PROCEDÊNCIA DO PEDIDO.
1. É competente o Supremo Tribunal Federal para julgar ação
em que se evidencia a contraposição direta de interesses entre
União e Estado-membro, por configurar hipótese de conflito
federativo, nos termos do art. 102, I, “f”, da Constituição Federal.
2. É inconstitucional lei do Estado de Santa Catarina que isenta
do pagamento de pedágio os veículos emplacados em município onde estejam instaladas praças de pedágio, em rodovias federais.
3. Parecer pelo provimento do pedido.
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Trata-se de ação cível originária proposta por Autopista Litoral Sul S/A e Autopista Planalto Sul S/A em desfavor do Estado
de Santa Catarina, pleiteando provimento judicial para não se
submeterem aos efeitos da Lei Estadual 14.824/09, que isentou
do pagamento de pedágio os veículos emplacados no município
onde estão instaladas praças de pedágio.
As autoras informam que são concessionárias da malha rodoviária federal nos lotes correspondentes a trechos da BR-101,
BR-116 e BR-376, de acordo com contrato celebrado com a
Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT).
Salientam que, em razão das obras de melhorias realizadas
nos trechos concedidos, elas foram autorizadas pela ANTT a cobrar pedágio em algumas cidades, mas que, passados alguns meses, vieram a ser surpreendidas com a Lei 14.824/2009, do
Estado de Santa Catarina, que isentou do pagamento de pedágio
todos os moradores das cidades nais quais seja instalada uma
praça de pedágio.
Destacam que as rodovias em questão são federais, razão
pela qual o Estado de Santa Catarina não poderia conceder referida isenção.
Noticiam que alguns municípios e estados já editaram lei de
semelhante conteúdo, mas referidos atos restaram declarados in-
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constitucionais pelos Tribunais de Justiça locais e pelo Supremo
Tribunal Federal.
A ANTT requereu o seu ingresso no feito na qualidade de litisconsorte ativo, salientando que é “a entidade responsável pela
atuação na exploração da infraestrutura rodoviária federal, fazendo-o através de delegação à iniciativa privada” (fl. 702, vol.
3).
Argumentou que “a isenção de pedágio pretendida pela Lei
Estadual nº 14.824/09 refletirá diretamente no cumprimento do
contrato de concessão firmado pelas partes (demandantes e
ANTT)” (fl. 703, vol. 3).
As empresas concessionárias requereram urgência na apreciação do pedido de liminar, ao argumento de que o Ministério
Público Federal e o Ministério Público do Estado de Santa Catarina “passaram a questionar as autoras acerca do cumprimento da
referida lei estadual, noticiando ainda a instauração de diversos
procedimentos preparatórios visando a penalizá-las pelo eventual
descumprimento da lei” (fl. 715, vol. 3).
A União requereu a sua intervenção no feito na qualidade de
assistente simples, justificando que “possui interesse jurídico
face à interferência municipal ou estadual na política tarifária dos
contratos de concessão de rodovias federais.
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Em prévio exame dos autos, o Juízo Federal de primeiro
grau declinou de sua competência e determinou a remessa dos
autos ao Supremo Tribunal Federal, ao argumento de que “as
concessionárias propõem a ação para a declaração da inconstitucionalidade da Lei Estadual que repercute no contrato de concessão; se, considerando ser a autarquia especial concedente
integrante da administração indireta da União, e, como no caso,
também autora em litisconsórcio ativo, por iniciativa própria e
por evidente repercussão em sua esfera de atribuições legais, estabelecido o conflito federativo, que supera de muito a mera tese
de recomposição do equilíbrio econômico e financeiro do contrato, tudo impõe a remessa do feito à Corte competente”.
As autoras vieram aos autos informar que ajuizaram ação
cautelar perante o Supremo Tribunal Federal, na qual o Min. Gilmar Mendes reconheceu a competência da Suprema Corte para
julgamento do presente feito e deferiu tutela liminar no sentido
de obstar ao Estado de Santa Catarina a adoção de quaisquer penalidades administrativas em virtude da cobrança de pedágio (fls.
825/873).
Recebidos os presentes autos no Supremo Tribunal Federal,
vieram com vistas à Procuradoria-Geral da República.
Inicialmente, cumpre analisar a competência do Supremo
Tribunal Federal para o presente feito.
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E, neste ponto, verifica-se, que, de fato, a presente causa encerra controvérsia que faz instaurar a jurisdição do Supremo Tribunal Federal, porquanto presente verdadeira hipótese de conflito
federativo.
Há, no caso dos autos, a contraposição direta de interesses
entre a União e o Estado de Santa Catarina. Este, porque busca
subtrair-se à política tarifária de exploração das rodovias federais. Aquela, porque alega ter tido a sua competência legislativa
invadida pelo ente estadual, com grave interferência no equilíbrio
econômico-financeiro do contrato de concessão estabelecido com
as empresas autoras.
Fixadas essas premissas, passa-se ao exame do mérito da
causa.
A questão debatida na presente ação refere-se à irresignação
das empresas autoras, na qualidade de concessionárias de trechos
da malha rodoviária federal, em relação à Lei nº 14.824/2009, do
Estado de Santa Catarina, que isentou do pagamento do pedágio
os veículos emplacados nos Municípios onde haja praças de pedágio das rodovias federais. Pretendem as autoras obter provimento que afaste a possibilidade de imposição de qualquer
sanção administrativa pelo descumprimento da norma estadual,
no que se refere à efetiva cobrança do pedágio.
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Ao examinar casos semelhantes, o Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento do sentido da impossibilidade de um
Estado-membro interferir na relação jurídico-contratual estabelecida entre a União e as empresas concessionárias de serviço público:
Ação Direta de Inconstitucionalidade contra a expressão
“energia elétrica” contida no caput do art. 1º da Lei nº
11.260/2002 do Estado de São Paul, que proíbe o corte de
energia elétrica, água e gás canalizado por falta de pagamento, sem prévia comunicação ao usuário. 2. Este Supremo Tribunal Federal possui firme entendimento no
sentido da impossibilidade de interferência do Estado-membro nas relação jurídicos-contratuais entre Poder
concedente federal e as empresas concessionárias, especificamente no que tange a alterações das condições estipuladas em contrato de concessão de serviços públicos, sob
regime federal, mediante a edição de leis estaduais. Precedentes. 3. violação aos arts. 21, XII, b, 22, IV, e 175, caput
e parágrafo único, incisos I, II e III da Constituição Federal.
Inconstitucionalidade. 4. Ação Direta de Inconstitucionalidade julgada procedente. (ADI 3729/SP, Dje 9/11/2007)
No caso em apreço, o Estado de Santa Catarina, ao editar a
Lei 14.824/2009, incidiu em inequívoca invasão da esfera legislativa exclusiva da União para dispor sobre transporte rodoviário
interestadual – art. 21, XII, “e”, da Constituição Federal. Descuidou-se, também, do fato de se tratar de rodovia federal, explorada pela União por meio das concessionárias autoras, que
obtiveram autorização legal tanto da União quanto da ANTT para
cobrar o pedágio, como forma de remuneração das obras de me-
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lhoria efetivadas, nos termos pactuados nos contratos de concessão.
Ora, não há dúvida de que o Estado de Santa Catarina não
tem competência para imiscuir-se nos assuntos relacionados à
exploração das rodovias federais, não podendo interferir nos contratos de concessão firmados entre a União e as empresas autoras,
de forma que a legislação estadual sob comento padece de grave
e insanável vício de inconstitucionalidade.
Ante o exposto, o parecer é, reconhecida a competência do
Supremo Tribunal Federal para o julgamento da causa, pela procedência do pedido.
Brasília (DF),
de agosto de 2015.
Rodrigo Janot Monteiro de Barros
Procurador-Geral da República
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