Conversas de professor. Não apenas compartilhando-as na rádio, mas garantindo-as nas aulas. E foi num desses bons papos, muitas vezes, por meio de teóricos que pensam a educação e o currículo, que um cenário se apresentou. Aos poucos foi sendo desenhado, tomando corpo e indignação em mim. Como é possível as escolas proibirem seus professores de fazer suas refeições na própria escola? Que lógica é esta que desconsidera, nega corpo, saúde e necessidade de alimento dos professores? Que lógica é esta que despreza a presença do professor como parte e sujeito do processo educativo? Como exigir competência, compromisso e práticas decentes dos professores, se eles se percebem não-sujeitos da rotina de refeição da escola? Em algumas escolas, nem esquentar suas marmitas pode o professor. O que se desvela deste cenário? Afastemos as cortinas! Há nisso uma mensagem. Como um quadro de recados, o que se avista é “o que importa aqui é garantir alimentos para os alunos e só existe verba para eles. Os professores, coadjuvantes, não podem ser contabilizados nesse gasto em alimentação”. Junto a essa mensagem, podemos vislumbrar equívocos que colaboram com a desvalorização do magistério, com o desrespeito pelos professores apregoado em notícias diárias. Se nem em seu locus de trabalho o professor se percebe e se sente dignificado e cuidado, o que dizer ou esperar em termos de outros alimentos, menos palpáveis, intangíveis que preenchem a alma dos que ensinam? Não adianta jingle em televisão clamando pelo valor e importância do professor, se as políticas públicas de gestão educacional não atentarem para o necessário cuidado para com os profissionais que garantem o funcionamento de suas escolas. Dignidade aos professores é o que devemos exigir! Continuando o assunto... pensando em termos de currículo, o que os alunos apreendem e aprendem ao perceberem seus professores alijados do cardápio da escola? Como vêem o professor que não pode se sentar junto com eles, partilhar a comida, repartir o pão? Será que olham o mundo cindido e percebem que há desigualdade até na escola? Lugar de aprender, lugar de abertura de novas janelas, qual a paisagem que é apresentada aos alunos? Lugar de exclusão de professor? Escola feita de alunos com professores como meros coadjuvantes? Que mundo escolar está sendo construído? Há nessa proibição uma violência silenciosa que fere profundamente o que ainda talvez reste ao professor de alguma certeza de seu papel, de sua importância e responsabilidade na formação das novas gerações. O que efetivamente está implicado nesse absurdo? Discursos que não traduzem as práticas de gestão. Escola como um não-lugar de professor. Alimentos para uns. Corpos negados. Mesquinharia e ignorância. Não reconheço a escola que me foi apresentada nessa conversa de professor. Desejaria que fosse mera história, completo engano. Gostaria que não fosse verdade, que me dissessem que é pegadinha, que os professores fazem suas refeições junto aos seus alunos, que o Estado garante esse direito aos seus tão mal-remunerados profissionais da educação. Que me acordem desse pesadelo, por favor!!!!