ID: 35860791 06-06-2011 Tiragem: 20126 Pág: 26 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 26,70 x 31,02 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 1 de 2 Maioria dos cursos de Direito e Arquitectura não cumpre a lei Direito, Arquitectura, Turismo, Artes e Design são as áreas onde se registam mais irregularidades na regra do número de doutorados entre o corpo docente. Mais de metade dos cursos superiores não cumprem regra que exige que 50% dos professores sejam doutorados na área que leccionam. Ana Petronilho [email protected] “Se neste momento aplicássemos a lei, tal como está, fechava mais de metade do ensino superior”, assegura Alberto Amaral, responsável pela primeira avaliação e acreditação dos cursos superiores portugueses em cinco anos. O presidente da Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES) explica ao Diário Económico que grande parte das escolas universitárias não está a cumprir o estipulado no Decreto-Lei de 2006, segundo o qual 50% do corpo docente de cada curso em funcionamento terá de ser doutorado na área que lecciona. Em causa estão sobretudo as escolas de “Direito, Arquitectura, Turismo, Artes e Design”, acrescenta Alberto Amaral. Segundo os dados enviados pelas instituições para a A3ES até Abril de 2010, em Direito, a percentagem de cursos que não cumprem a lei ronda os 54%, sendo que a nível nacional a média de doutorados nesta área é de 48,6%. No caso de Arquitectura a percentagem de cursos em incumprimento é menor: cerca de 30% dos cursos desta área não têm no seu corpo docente metade de doutorados, sendo que a nível nacional existem 49% de professores doutorados em Arquitectura. Para o presidente da A3ES, existe esta irregularidade porque “em algumas áreas científicas não existem doutorados que permitam satisfazer esta condição” o que faz com que “em muitas instituições seja difícil cumprir a condição quando se impõe que os doutorados o sejam na área de curso”. Em alguns casos, este é um dos motivos da não acreditação dos cursos. Processo que ainda está a decorrer e que a A3ES afirma estar a “aplicar com cuidado os critérios aos cursos já em funcionamento, cuja exigência irá aumentando com o tempo nas áreas mais deficitá- rias”, através de visitas de comissões de avaliação às instituições para que se certifiquem de que “o pessoal docente em formação vai assegurar o cumprimento das condições legais em tempo credível e razoável”. O ex-ministro da Educação, Roberto Carneiro, diz não perceber a existência desta irregularidade nos cursos de Direito mas na área das Artes e da Arquitectura, que considera como sendo “débil”, sublinha que “é natural porque não há uma tradição de doutoramentos”. A lei aplica-se a todas as instituições de ensino superior mas Para o ex-ministro da Educação Marçal Grilo a A3ES tem feito “um excelente trabalho que é absolutamente indispensável ao País”. O ex-ministro da Educação Roberto Carneiro diz não perceber a existência desta irrgularidade na área de Direito mas diz que “é natural nas áreas das Artes e da Arquitectura”. é nas “universidades que se verifica mais esta irregularidade”, diz Alberto Amaral. No caso dos institutos politécnicos a lei é mais leve e é apenas exigido que “15% dos docentes sejam doutores na área que leccionam e 35% especialistas, sendo esta uma qualificação criada para a carreira docente do politécnico”, diz o presidente da A3ES. Alberto Amaral considera “necessário” corrigir estas irregularidades. Em sua opinião, estes incumprimentos da lei resultam “de uma política de pouco rigor na avaliação da qualidade que se manteve por mais de 30 anos”. O que têm feito as universidades? Apesar destas irregularidades, Alberto Amaral não deixa de sublinhar que “as universidades têm procurado resolver o problema formando o seu pessoal docente”. Para além disso, o presidente da A3ES não deixa de salientar “que a situação é hoje muito melhor do que há dez anos” e aponta mesmo alguns exemplos que considera como sendo “excelentes”, entre os quais a Faculdade de Ciências do Porto com 98,8% de doutorados, a Escola de Psicologia da Universidade do Minho com 100% de doutorados ou o Instituto Superior Técnico, da Universidade Técnica de Lisboa, com 90,6%. O processo de avaliação e acreditação dos cursos de ensino superior arrancou há cerca de dois anos e meio e já ditou o encerramento de 1.221 cursos universitários, entre licenciaturas, mestrados e doutoramentos. Um trabalho que o ex-ministro da Educação Marçal Grilo considera como sendo, até ao momento, “um trabalho excelente e absolutamente indispensável ao País”. Opinião partilhada por Roberto Carneiro que acrescenta que o desempenho da A3ES “pode trazer mais confiança e credibilidade ao sistema de ensino superior”. ■ Universidades oferecem cursos sem investigação Para além do incumprimento em relação aos docentes doutorados na área que leccionam, o presidente da A3ES salienta ainda um outro problema das universidades. Segundo Alberto Amaral, a componente de investigação dos cursos “não é cumprida em bastantes casos”. Segundo a lei, todos os cursos universitários devem estar ligados a uma ciência de investigação, com o desenvolvimento de investigação e publicações científicas. No caso das áreas de consultoria, contabilidade ou secretariado, entre outros, são cursos que Alberto Amaral considera como sendo “claramente de natureza vocacional, adequados aos politécnicos e que começam a ser oferecidos pelas universidades”, explica. Uma irregularidade que ocorre no ISLA, diz o presidente da A3ES. Contactado pelo Diário Económico, o ISLA diz não ter “informação disponível”. Regras da Pelo menos 50% dos docentes devem ser doutorados na área que leccionam. Segundo o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), no corpo docente de cada instituição de ensino superior deve existir, pelo menos, um professor doutorado por cada 30 alunos. Para além disso, 50% dos docentes devem ser doutorados na área que leccionam. 1CORPO DOCENTE DO ENSINO UNIVERSITÁRIO ID: 35860791 06-06-2011 Tiragem: 20126 Pág: 27 País: Portugal Cores: Cor Period.: Diária Área: 26,70 x 30,85 cm² Âmbito: Economia, Negócios e. Corte: 2 de 2 Paulo Figueiredo ANÁLISE DOUTORADOS Quando e como vai a A3ES fazer cumprir a lei? ANTÓNIO VICENTE Presidente da Direcção do SNESup carreira docente universitária Segundo o Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), cada universidade tem que dispor, no conjunto dos seus professores ou de investigadores que desenvolvam actividade docente ou de investigação, no mínimo, um doutor, de qualquer área de estudo, por cada 30 estudantes. 2 REGIME DE TEMPO O RJIES estipula, ainda, que pelo menos metade dos docentes doutores devem estar em regime de tempo integral. A lei prevê condições específicas para cada grau de curso superior, ou seja, licenciaturas, mestrados e doutoramentos. 3 ATRIBUIÇÃO DE GRAU DE LICENCIADO Segundo o Decreto-Lei 107/2008, para as instituições de ensino superior poderem abrir licenciaturas têm que dispor de um corpo docente próprio, qualificado na área em causa, cuja maioria seja constituída por titulares de grau de doutor. 4 ATRIBUIÇÃO DE GRAU DE MESTRE Para abrir mestrados, as universidades têm que ter um cor- po docente na maioria com o grau de doutor e que desenvolvam actividade reconhecida de formação e investigação, de alto nível. 5 ATRIBUIÇÃO DE GRAU DE DOUTOR Para os doutoramentos, as instituições também têm de ter um corpo docente na maioria com o grau de doutor, que realizem investigação e que tenham experiência acumulada de investigação sujeita a avaliação numa produção científica e académica relevantes nessa área. ■ A.P. Portugal conheceu nos últimos anos uma evolução muito significativa de doutorados. Só em 2009, doutoraram-se em Portugal 1399 pessoas, o equivalente a mais 150 doutorados que em toda a década de 1980. Nos últimos 30 anos realizaram-se cerca de 16 mil doutoramentos em Portugal. Paradoxalmente, se aplicado nas universidades o artº 57 da Lei 74/2006 (que define os requisitos para a acreditação dos ciclos de estudo, e que estipula que “o corpo docente que assegura o seu funcionamento seja constituído, na sua maioria, por titulares do grau de doutor”), vários cursos do Ensino Superior universitário não poderiam funcionar. A questão está em saber quando e como vai a A3ES fazer cumprir a lei. Se, por um lado, é expectável que a agência de acreditação vá estreitando o seu crivo, confinando-o à lei, no sentido de garantir uma qualidade mais elevada, por outro lado não é verosímil, no curto prazo, uma política cega de aplicação desse requisito. Tal significaria, por exemplo, o encerramento de cursos de universidades mais periféricas, ao ponto de ser posta em causa a própria existência dessas instituições, ou ainda o encerramento de cursos prestigiados e estruturantes (direito, arquitectura, etc.) em universidades menos periféricas. Resta saber se este não vai ser um critério de aplicação selectiva num eventual cenário de redefinição e de redimensionamento da rede de oferta de cursos de Ensino Superior e de constrangimentos orçamentais. ■ Tal significaria o encerramento de cursos de universidades mais periféricas, ao ponto de ser posta em causa a própria existência dessas instituições.