ENTREVISTA
FAROL VERDE PARA A GESTÃO ESCOLAR
Cristina Ministerio é jornalista (Belo
Horizonte – MG) .
AMAE Educando – Afinal, o
que é gerenciar?
Maria Helena Godoy – Ge-
14
AMAE educando - 376 . Novembro . 2010
AE – Então, no caso de gerenciamento escolar, a questão pedagógica tem um peso muito grande?
MHG – Ela tem um peso maior.
Até porque a escola existe para ensinar,
seu processo fundamental é o ensinoaprendizagem. Trabalhamos com
uma cadeia de valor que coloca como
principal a entrada do aluno na escola,
passando por todo esse processo,
até conseguir o seu certificado. O
processo administrativo é o de apoio,
existe para apoiar o processo ensinoaprendizagem. Nós mostramos isso
muito claramente para os diretores
das escolas que atendemos porque,
em geral, eles estão perdidos entre os
fins e os meios.
AE – Que perfil têm esses diretores?
Cristina Ministerio
Maria Helena Pádua Coelho
de Godoy estudou Psicologia mas,
por considerar a educação uma área
prioritária para o desenvolvimento
do país, graduou-se em Pedagogia,
especializando-se em Gestão Moderna Aplicada à Educação, tema a que
tem se dedicado por 15 anos. “Durante todo este tempo, eu aprendi
muito, mas posso dizer que também
ensinei muito”, afirma a educadora.
Seus conhecimentos permitiram que
ela publicasse quatro livros técnicos
sobre o assunto e outros quatro em
coautoria. Ouvindo o que os alunos
pensam sobre educação, ela recolheu
material para sete textos infantis, dois
deles com foco nos princípios de gestão aplicados ao contexto escolar das
crianças. Mineira, de Diamantina,
Maria Helena já atuou em mais de três
mil escolas, muitas delas, públicas e
carentes, auxiliando-as a melhorar
seus resultados, sem que isso tenha
custos para as instituições parceiras.
Atuando na Fundação de Desenvolvimento Gerencial (FDG) e pelo Instituto de Desenvolvimento Gerencial
(INDG), ela já aplicou a metodologia
denominada “Gestão Integrada na Escola” (publicada em parceria com a
consultora Izabela Lanna Murici), no
Ceará, Pernambuco, Sergipe e Bahia,
além de um grande número de escolas
em seu estado natal, Minas Gerais.
renciar, para nós, é atingir metas
e a meta está sempre ligada
à atividade-fim da escola, à sua missão,
então, a preocupação maior de
um gestor na
escola deve
ser produzir
os melhores
resultados
no processo
ensino-aprendizagem. Hoje,
nós temos uma
meta definida pelo
MEC que é o Ideb.
Eu diria que a principal
preocupação de um gestor
é obter o melhor Ideb possível,
acima até da meta definida pelo MEC.
Professora Maria Helena Godoy:
vasta experiência em gestão
escolar a serviço das escolas
MHG – Eles são idealistas,
querem fazer a diferença, querem uma
escola de excelência, mas, com o afã
de produzir mais e melhor, se perdem
entre fins e meios. Eles se preocupam
com o Ideb da sua escola e com a alta
taxa de evasão, mas colocam no mesmo patamar o estado do laboratório,
a presença dos pais na escola e as
aulas pouco atrativas. É preciso que
eles se organizem neste cenário, que
fique claro o que é fim e o que é meio,
porque gerenciar é organizar os meios
para atingir os fins.
AE – Então, que qualidades
você considera indispensáveis a um
bom gestor?
MHG – Para se obter resultados na escola, precisamos de lideran-
ça + gestão integrada + conhecimento
técnico, portanto, a principal qualidade que um gestor precisa ter é ser
líder. Inclusive, este é um critério importante para a escolha de uma escola
parceira da FDG: ter uma liderança,
porque ela vai abraçar o processo e
dar a contrapartida. Líder é aquela
pessoa que consegue congregar as outras pessoas da comunidade em torno
de uma meta e liderá-las nessa caminhada, motivando-as e reconhecendo
seu empenho, levando-as a produzir
resultados.
AE – Os gestores estão se
adaptando aos novos paradigmas
exigidos pela modernidade?
MHG – O que eu percebo, em
todos os estados onde trabalho, é que
a gestão está sendo muito demandada pela educação. As pessoas se interessam pela gestão, porque percebem
que aquilo vai auxiliar o seu trabalho do dia a dia. Quando iniciamos o
nosso trabalho, há 15 anos, havia um
certo estranhamento. Costumo dizer
que nós fomos precursores das metas
na educação. As pessoas se perguntavam: “Metas na educação? Não é possível, a educação é um outro universo.” Hoje, a aceitação tem sido muito
grande. Os diretores falam em metas
com muita naturalidade e o que eles
querem é encontrar o caminho para
atingi-las. Eu costumo brincar que a
metodologia que usamos – a Gestão
Integrada na Escola – é científica, produz resultados, fala a língua da escola,
mas nós não sabemos fazer milagre.
AE – Os gestores não veem a
escola como uma empresa?
MHG – Não, mas é preciso
que, como administradores, eles a
vejam, porque, em última estância
eles são responsáveis pelos resultados. Meu trabalho tem sido traduzir
os conhecimentos gerenciais para a
linguagem da escola. Percebi, logo no
início, que a escola precisava disso,
mas que esse conhecimento chegava
lá com uma roupagem empresarial e
que isso causava estranheza. As pessoas, às vezes, se assustavam com a
tecnologia e, sem se aprofundar, já diziam que não tinham gostado. Então,
me debrucei sobre esses conhecimentos de gestão e os adaptei à linguagem
da escola.
AE – Em que se baseia a metodologia Gestão Integrada na Escola?
MHG – A nossa metodologia,
que hoje já está publicada, baseiase em três aspectos. Primeiro: ela
é orientada pelo PDCA, que é um
método científico de solução de
problemas; segundo: ela tem um
caráter sistêmico, porque integra os
aspectos estratégicos, pedagógicos e
gerenciais e terceiro: ela é balizada
pelo Índice de Formação de Cidadania
e Responsabilidade Social (IFC/
RS), publicado em parceria com a
consultora Neuza Chaves e criado
a partir do que observamos pelo
Brasil afora. Nós descobrimos que,
independentemente da localização
geográfica da escola, as causas do
insucesso, eram as mesmas, não
variavam. Fomos, então, criando um
banco de dados, após realizar inúmeras
sessões de brainstorming (técnica
para geração de ideias). Fazíamos um
diagnóstico da escola, estabelecíamos
uma meta de melhoria em conjunto
com a direção e a comunidade e
íamos procurar as causas. Criamos,
a partir daí, um indicador, no qual a
escola pode se ver. Entendemos que
a questão da educação é urgente,
então, por que aplicarmos sessões de
brainstorming em cada escola, se já
sabíamos que existiam causas que se
repetiam sistematicamente?
AE – Para os diretores, fica
clara a necessidade de valorizar o
papel do professor para que as metas sejam alcançadas?
MHG – Sem dúvida, inclusive
porque os professores precisam ser
reconhecidos em todos os sentidos.
O gestor precisa, também, avaliar a
competência do professor, auxiliálo no que for necessário para que
ele exerça sua missão de ensinar da
melhor forma possível, elogiá-lo e
mostrar à comunidade os resultados
obtidos.
AE – Que tipo de escola procura o auxílio da FDG?
MHG – As escolas que nos
procuram, em geral, não têm a noção
exata da nossa contribuição. Sabem
que nós contribuímos em tudo e nos
procuram porque uma colega diretora
disse: “Nossa escola mudou”. Logo
que nós começamos a trabalhar, mostrando os problemas e as causas, eles
percebem que o problema está no resultado da escola.
AE – O que causa maior impacto nos resultados de uma escola?
MHG – O que mais impacta
são as causas relacionadas ao ensinoaprendizagem: a frequência do
professor e de alunos, as aulas pouco
atrativas, os alunos que não fazem as
tarefas de casa, o cumprimento do
currículo, a falta da participação dos
pais na escola, entre outras.
AE – O que você tem percebido, nas escolas, após a intervenção
da FDG?
MHG – Percebo que, de fato,
seus resultados melhoram. 99,9% das
escolas atingem suas metas, aumentam o índice de aprovação dos alunos
AMAE educando - 376 . Novembro . 2010
15
e reduzem a evasão, portanto não se
trata apenas de atingir as metas, também visamos a qualidade. Temos escolas que superaram a meta nacional
para 2021, que é o Ideb 6. Elas atingiram mais que 7. Apesar de o pedagógico ter um peso maior, pela nossa
metodologia, a escola também muda
seu aspecto físico, deixa de ser uma
escola desorganizada, pichada, com
carteiras quebradas, sem lixeiras nas
salas de aula. Há um cuidado com
todo o ambiente da escola. O mesmo
acontece nos serviços de apoio e nas
atividades fim, com foco nos resultados. Nós ajudamos a escola a padronizar todas as atividades críticas, como,
por exemplo, processos referentes à
organização e utilização da biblioteca e, na secretaria, processos de organização de arquivos, efetivação de
matrícula e entrega de históricos escolares.
AE – O que as escolas que
não conseguiram ser aprovadas no
processo seletivo, feito anualmente
pela FDG, podem fazer no sentido
de melhorar sua gestão?
MHG – Conheço escolas que
não são parceiras da FDG, mas que
utilizam o CD-ROM que acompanha
o livro Índice de formação de cidadania e responsabilidade social para
aplicação na escola, da editora INDG
Tecnologia e Serviços Limitada, e
que está disponível no comércio. Seu
uso é muito fácil. A escola pode colocar os seus dados, verificar seu status, o que ela tem obtido no processo
ensino-aprendizagem e enxergar seus
problemas. Nós trabalhamos com “faróis”. A escola tem farol verde, nos
fatores em que está bem, e vermelho
ou amarelo, nos que precisa melhorar.
Ela obtém mais rapidez no diagnóstico e mais agilidade no planejamento
das ações que vão levá-la a resultados
16
AMAE educando - 376 . Novembro . 2010
positivos.
AE – A escola pública, hoje,
pode ser vista como concorrente da
escola particular. De um modo geral, ela tem buscado melhorar a sua
gestão, considerando este fato?
MHG – Eu diria que sim. Tenho encontrado diretores muito comprometidos, que dedicam a sua vida
ao que estão fazendo, trabalhando, às
vezes, em três horários. Escolas que já
foram nossas parceiras, com as quais
trabalhamos por uns anos, atraem alunos da rede particular, em função dos
seus resultados.
AE – O que a gestão pode fazer para que a escola saia da mesmice e encante o aluno?
MHG – De um modo geral,
o diretor precisa ser muito presente,
mas, como não pode estar em todos os
lugares ao mesmo tempo, precisa também saber delegar. A sistemática do
nosso método completa esta questão,
quando, por exemplo, detecta as aulas
pouco atrativas. O plano de ação, que
envolve os itens: o quê, como, quando, onde, por que fazer e quem é o
responsável, vai apontar como tornar
essas aulas mais atrativas. No plano,
as ações são delegadas e a ação de tornar mais atraentes as aulas compete ao
supervisor. O diretor acompanha se a
ação saiu do papel, se as aulas melhoraram. Também registramos as práticas de sucesso, para que possam ser
socializadas nas reuniões de módulo.
O diretor participa de todas as nossas
reuniões para que ele acompanhe todo
o processo: apresentação do diagnóstico, a elaboração e implementação do
plano, a tomada de ações corretivas,
caso necessário e o registro e difusão
das práticas de sucesso.
AE – E quando as ações en-
volvem custos extras?
MHG – Nossa orientação é
no sentido de que essas ações, de um
modo geral, não envolvam custos,
mas, às vezes, a própria comunidade
sugere ações que os envolvem, mas
ela mesma usa a criatividade para superar a falta de recursos. Quando há
vontade política, tenho visto acontecer coisas muito bonitas.
AE – Então, a criatividade seria a solução para os desafios financeiros que as escolas enfrentam?
MHG – No nosso método, a
criatividade produz resultados incríveis, porque a pessoa pode até ser
muito criativa, mas, se ela não sabe o
que é fim e o que é meio, não se organiza, fica perdida, passa o ano planejando vários instrumentos de gestão e as ações não saem do papel. A
criatividade tem de ter o respaldo do
método PDCA. Entretando, há situações em que a escola depende, sim, do
aporte de recursos públicos,
AE – Para o planejamento do
próximo ano, o que as escolas não
devem esquecer, no que diz respeito
à gestão?
MHG – Todo planejamento
requer foco. Que, no final do ano, a
escola veja seus resultados e estabeleça onde ela quer chegar em 2011.
A partir dessa meta, que ela verifique
onde vai atuar. Ela deve se perguntar,
por exemplo: “Eu atingi a minha meta
do Ideb?” Em caso negativo, ela pode
reunir a comunidade e procurar identificar o que está impactando esses
resultados. Ela mesma pode aplicar
o indicador gerencial (IFC/RS), que
vais mostrar o caminho a ser trilhado
para o alcance dos resultados almejados. Realizar uma sessão de brainstorming pode ser uma alternativa.
Download

A experiente gestora escolar Maria Helena