Conversor Directo com Interruptor Ressonante e Funcionamento a Frequência Constante Luís M. Torreira Fidalgo 1 e J. M. F. Dores Costa 2 INESC, Rua Alves Redol, 9, 1000 Lisboa, Portugal Resumo Apresenta-se um novo conversor comutado de corrente contínua, derivado do conversor directo (forward), que pode ser usado com frequência de comutação elevada sem redução do rendimento. O novo conversor tem dois interruptores activos que permitem o funcionamento com frequência de comutação constante. O interruptor principal comuta com tensão nula e e o segundo com corrente nula. Tem ainda a vantagem de não necessitar um circuito adicional para desmagnetizar o transformador. I. INTRODUÇÃO Nos conversores de potência comutados, o aumento da frequência de comutação tem vantagens porque permite aumentar a relação potência/volume. Todavia, porque as perdas de comutação nos interruptores (transistores e díodos) são proporcionais à frequência, o aumento da frequência faz baixar o rendimento. Uma forma de se ultrapassar este inconveniente consiste em associar bobinas e condensadores aos interruptores dos conversores convencionais de tal forma que as correntes e/ou tensões tenham troços sinusoidais, o que permite que a comutação se efectue nos instantes em que a corrente é nula (ZCS - Zero Current Switching) ou em que a tensão é nula (ZVS - Zero Voltage Switching) [1, 2]. É este o caso, por exemplo, dos conversores quase-ressonantes (QR) [3], dos conversores multi-ressonantes (MR) [4] e dos conversores quase-square-wave (QSW) [5]. Os componentes reactivos associados aos interruptores permitem, também, absorver os elementos parasitas que degradam o funcionamento dos conversores quando a frequência de comutação é elevada. Os conversores QR e MR apresentam sobreintensidades ou sobretensões nos interruptores, que são desvantajosas, porque obrigam ao sobredimensionamento dos componentes e fazem aumentar as perdas de condução. Os conversores QSW-ZVS têm a vantagem de manterem a tensão nos transistores com valor máximo igual ao que ocorre nos conversores comutados convencionais; no entanto, a corrente na bobina tem elevado tremor e estes conversors só são interessantes para aplicações de pequena potência. Os conversores com interruptores ressonantes, na sua versão básica, são controlados por variação da frequência de comutação, porque a necessidade de manter ZCS ou ZVS é incompatível com o funcionamento a frequência constante. Isto dificulta o projecto dos conversores e obriga ao 1 2 sobredimensionamento dos filtros, motivo pelo qual é desejável modificar os circuitos daqueles conversores para que possam funcionar com frequência de comutação constante [5, 6]. Neste artigo, apresentamos uma nova topologia de conversor directo que se distingue da convencional por utilizar um interruptor ressonante no primário e um interruptor unidireccional em corrente, no secundário; esta combinação de interruptores permite a comutação com frequência constante e pode considerar-se uma aplicação do interruptor múltiplo que foi proposto em [5] para os conversores QSW-ZVS sem isolamento galvânico. Descrevese o funcionamento e apresentam-se os resultados experimentais de um protótipo deste novo conversor. II. CONVERSOR DIRECTO Na Fig. 1(a) representa-se um conversor directo convencional, cujo transformador tem um terceiro enrolamento que, conjuntamente com D3, se destina a desmagnetizar o núcleo. Num período de comutação, T, o conversor apresenta as três fases assinaladas nos diagramas temporais da Fig. 1(b). Admite-se que todos os componentes são ideais; desprezam-se os tempos de comutação dos interruptores, o tremor das tensões de entrada e de saída e a dispersão magnética. A corrente de magnetização do núcleo do transformador é iµ. Inicialmente, o interruptor S está aberto, os díodos D1 e D3 estão cortados e D2 conduz. No instante t0 o interruptor S é fechado; D1 entra em condução e D2 passa ao corte; nesta situação é v2=VI/N>VO (N=n1/n2), i1 cresce linearmente e verifica-se a transferência de energia da fonte de entrada para a bobina LF. No instante t1, S é aberto e o díodo de roda livre, D2, entra em condução transferindo a energia de LF para a carga. Com um transformador real, tem de se prever um circuito de desmagnetização do núcleo cuja função é devolver à fonte de tensão VI a energia armazenada no núcleo durante a fase 1, caso contrário o núcleo do transformador satura. A fase 2 termina quando iµ=0 e a sua duração é t2- t1=DTn3/n1. Nesta fase, a tensão no interruptor S é máxima vS = VI (1 + n3 n1 ) (1) Com n3=n1, como é usual, o factor de ciclo, D, não pode ser superior a 0,5 e S deve ser capaz de bloquear uma tensão Trabalho realizado enquanto aluno finalista do IST e estagiário do INESC. Professor Adjunto da Escola Náutica Infante D. Henrique (Paço d’Arcos) e investigador do INESC. igual a 2VI. Na fase 3 prossegue a fase de roda livre até que se inicie um novo período de comutação com o fecho de S. A componente contínua da tensão na carga, VO, é o valor médio da tensão em D2: VO = DVI n2 n1 (2) D 1 L 1 L 3 L 2 v L F v 2 D 2 D2 C o R o vo V I S Para a descrição do funcionamento despreza-se o tremor de iLF e fazem-se as mesmas hipóteses simplificativas consideradas para o conversor da Fig. 1. Num período de comutação, o novo conversor directo com interruptor ressonante apresenta as quatro fases da Fig. 2(b). Os diagramas temporais relevantes são apresentados na Fig. 3. Considera-se que o conversor se encontra na fase 1 (t0 a t1), com S1 e S2 fechados: vD2=v1/N, iLF cresce linearmente e verifica-se a transferência de energia da fonte de entrada para a bobina LF. (a) D D 4 3 L (a) v V D L 2 1 v 1 S 1 L 2 D 2 F V D2 2 C O R O V O I S D 1 C 3 v 1 C1 (b) L i1 v LF i2 1 V O L v 2 2 I Fase 1 t < t < t 0 1 v i (b) v C1 1 C I Fig. 1: Conversor directo; (a) esquema; (b) diagramas temporais. As principais limitações desta topologia são a necessidade de um circuito de desmagnetização e os valores elevados da tensão e da corrente no transistor nos instantes de comutação. i L 2 F 1 L 1 2 v V O 2 Fase 2 t < t < t 1 2 v v C1 C I III. CONVERSOR DIRECTO COM INTERRUPTOR RESSONANTE Na Fig. 2(a), representa-se o conversor que se obtém do conversor directo, colocando um condensador em paralelo com o interruptor S de modo a obter-se um interruptor ressonante; C1 pode entrar em ressonância com a bobina de magnetização do transformador, Lµ, (Lµ=L1, se se desprezar a dispersão), permitindo que S1 comute com tensão nula. No secundário, coloca-se um interruptor unidireccional (em corrente), constituído pela associação do interruptor activo S2 com o díodo D1; este interruptor permite que se regule a tensão de saída sem alterar a frequência de comutação. A presença de D1 é essencial para garantir a descarga completa de C1 e, portanto, a comutação de S1 com tensão nula. L L 1 i L 2 L 2 v 2 1 F i O V O Fase 3 t < t < t 2 3 i v I 1 L 1 L 2 i v L 2 2 F V O Fase 4 t < t < t 3 4 Fig. 2: Conversor directo com interruptor ressonante; (a) esquema; (b) fases num período. A fase 2 (t1 a t2), inicia-se quando o interruptor S1 é aberto; S2 continua fechado e o díodo D3 não conduz. Sendo IX a corrente de magnetização em t1, admite-se que C1 se carrega de modo aproximadamente linear com o valor máximo da corrente do primário I1= I X + IO N . No instante t2, quando vC1=vI, S2 é aberto e tem início a fase 3. Na fase 3 (t2 a t3), D2 conduz e existe ressonância entre C1 e Lµ : iµ = ( I X + IO N ) cos( ω1( t − t2 )) (3.a) vC1 = VI + Z1 ( I X + IO N )sen ( ω1( t − t2 )) (3.b) com ω1 = 1 (3.c) Lµ C1 e Z1 = Lµ / C1 com π < ω1T3 < 3π 2 . Sendo D o factor de ciclo de S1, a razão entre as tensões de saída e de entrada é, aproximadamente, VO D − d = VI N (6) Com d=0, a razão entre as tensões é máxima e é igual à do conversor directo da Fig. 1. Para que S1comute com ZVS, D depende da frequência de comutação, Fs, e de ω1. Desprezando a duração da fase 2 relativamente à das outras fases, o intervalo de tempo em que S1 está aberto é aproximadamente igual a T3. Considerando T3=(1-D)Ts, de (5) obtém-se F D = 1 − s ( arcsen( −V I I1Z1 ) + π ) ω1 (7) As equações (6) e (7) permitem dimensionar o conversor da Fig. 3(a). Deve-se também ter em conta os valores máximos de i1 e de vC1, que se obtêm de (3.a) e (3.b), porque influenciam as perdas de condução. Na fase 3 a corrente no primário toma valores negativos e, para que a descarga de C1 seja completa, deve-se impedir que circule corrente no secundário através do díodo parasita, D4, do transistor MOS; esta é a função do díodo D1. IV. RESULTADOS EXPERIMENTAIS Fig. 3: Diagrams temporais do conversor da Fig. 2(a). Durante a fase 3, iµ torna-se negativa, motivo pelo qual não é necessário um circuito de desmagnetização adicional. Quando vC1 se anula, em t3, S1 é fechado e inicia-se a fase 4 (t3 a t4) durante a qual v2=vI/N. Esta é uma fase de espera em que o atraso, dTs, entre o fecho de S1 e o fecho de S2 permite regular o valor médio da tensão de saída, mantendo a frequência de comutação constante. Após o fecho de S2, o conversor encontra-se na fase 1 considerada inicialmente e tem início um novo período de comutação. O interruptor S1 tem ZVS, o que é uma vantagem em relação ao conversor directo convencional porque as perdas são reduzidas quando se eleva a frequência. O interruptor S2 tem ZCS, e o mesmo acontece com D1, porque i2 se anula antes de S2 abrir. Para que S1 comute com tensão nula ( vC1 = 0 ), de (3) conclui-se que se deve verificar a seguinte relação, Z1 ( I X + IO N ) ≥ VI (4) A duração da fase ressonante, T3=t3-t2, é T3 = −V arcsen I ω1 I1Z1 1 (5) Para confirmar a análise teórica do novo conversor, montou-se e testou-se o protótipo da Fig. 4 no qual os transistores MOS (IRF 540) realizam os interruptores S1 e S2. As tensões nominais são VI=15 V e VO=5 V e a frequência de comutação é Fs=260 kHz. O núcleo do transformador é uma ferrite do tipo RM com Al=250 nH/esp2: L1=16 µH (n1=8 espiras) e L2=32 µH, (n2=12 espiras); LF =250 mH. Para se atenuarem as oscilações “parasitas” quando o díodo de roda livre passa ao corte, colocou-se em paralelo com D2 um circuito amortecedor (snubber) constituído por uma resistência de 330 Ω em serie com um condensador de 100 nF. O protótipo inclui o circuito de controlo que gera a onda rectangular com frequência e factor de ciclo constantes que comanda M1 (foi determinada para as condições nominais) e uma tensão em dente de serra com a mesma frequência. O controlo do atraso da entrada em condução de M2 é feito por PWM (Pulse Width Modulation) e resulta da comparação da tensão em dente de serra com uma tensão de controlo à saída do amplificador detector de erro. Os diagramas temporais experimentais são apresentados na Fig. 5 e verifica-se uma boa concordância com as curvas teóricas. A curva do rendimento do andar de potência, em função da carga, encontra-se na Fig. 6. Verifica-se uma queda no rendimento do andar de potência quando a potência se aproxima do valor máximo admitido no projecto (20 W); isto deve-se principalmente às perdas nos díodos D1 e D2 que não têm as características mais indicadas para o funcionamento a plena carga. VI D1 L1 L2 n1 C3 D. Maksimovic', S. Cúk, "Constant-Frequency Control of Quasi-Resonant Converters", IEEE Trans. on Power Electronics, vol. 6, January 1991, pp. 141-150. LF M2 n2 [6] D2 C 4 C 5 v O C2 M1 C1 C2, C5 - 100 nF; C3- 2200 µF; C4 - 1000 µF; D1- 3 díodos 1N 5819 em paralelo; D2 - 1N 5819 Fig. 4: Conversor experimental. V. CONCLUSÕES Apresentou-se um novo conversor directo com interruptor ressonante que tem a vantagem de poder funcionar com alta frequência sem quebra de rendimento. Para além disto, o conversor funciona com frequência constante e não é necessário circuito de desmagnetização do núcleo do transformador. O funcionamento do conversor experimental comprovou a análise teórica e o rendimento do andar de potência pode-se considerar satisfatório, uma vez que se trata de um protótipo não optimizado. Ficou assim demonstrado que o interruptor múltiplo que foi inicialmente desenvolvido para conversores QSW-ZVS sem isolamento galvânico, pode ser utilizado num conversor directo com transformador. REFERÊNCIAS Fig. 5: Diagramas temporais experimentais. 80 Rendimento (%) [1] G. Hua and F. C. Lee, “Soft-Switching PWM Technics and their Applications”, Proc. EPE Conf., September 1993, pp. 87-92. [2] G. Hua and F. C. Lee, “Soft-Switching Technics in PWM Converters”, IEEE Transactions on Industrial Electronics, vol. 42, December 1995, pp 595-603. [3] K. H. Liu, R. Oruganti, F. C. Lee, "Quasi-Resonant Converters - Topologies and Characteristics", IEEE Trans. on Power Electronics, vol. 2, January 1987, pp. 62-71. [4] W. A. Tabisz, F. C. Lee, "Zero-Voltage-Switching Multiresonant Technique - a Novel Approach to Improve Performance of High-Frequency QuasiResonant Converters", IEEE Trans. on Power Electronics, vol. 4, October 1989, pp. 450-458. [5] J. M. F. D. Costa, M. M. Silva,“Constant-Frequency Control of Quasi-Square-Wave Converters”, Proc. HFPC’90, pp. 359-368. 75 70 65 60 55 50 3 4 5 6 7 8 10 12 16 Potência na saída (W) Fig. 6: Variação do rendimento com a carga. 20 22