"ASPECTOS DE HISTORIA E FILOSOFIA EM LINGUISTICA'"
Maria Victoria R~bori Ruben (DL-USP/POs-gradua940)
o
assunto desta
comunica930
diz
respeito ao
filosOfico e
metodolOgico ern que transcorre
pesquisa que
venho
desenvolvendo
ao
marco
uma parte
nlvel
do
da
doutorado.
Esclare90 que, dado 0 espa90 reduzido, 0 tratarei de maneira
muito geral
carAter
. Assim, quero ressaltar como algumas visOes
histOri co
complementadas
em
a
tor no
partir
extra-linguisticos
vinculados
pensamento como com as
histOrica
de
da
leitura
tanto
com
podern
de
as
da
qual
se
fatos
partiu
ainda difusa,
de
natureza
ser
dados
correntes
e,
de
do
~poca
implica, de urn lado, uma
incorpora9Ao na metodologia,
lingulstica
linguistica
necessidades de determinada
lugar. Essa complementa930
na visAo
da
de
mudan9a
outro,
da histOria
peculiar
caracterlstica e a pertinencia ao dominio de uma
e
a
da
cuJa
pragmAtica
filosOfica.
1. 0 nlvel geral do problema.
Na literatura especializada em histOria da
todos concordam em que
hA uma rela9Ao
lingulstica
entre a histOria
da
lingulstica e a histOria das ideias (ou histOria da ciencia)
de modo
geral. Entretanto,
essa rela930
graus de mimetismo metodolOgico.
Christmann, 1987) por
adquire
Para Schmitter,
exemplo, esse mimetismo
(entre histOria da linguistica
diversos
1982
(apud
metodolOgico
e hi~tOria da ciencia)
serA
total, jA para Auroux, Koerner e Malkiel - erndiversos graus
a
histOria
da
linguistica
possui
caracteristicas
particulares que nem sempre seriam extenslveis
a
histOria da
ciencia de modo geral.
Assim, a
rela930 entre as histOrias divide e
confunde
1256
coisas
reconhecimento de que ~ necessArio vencer
que ~ colocado pela
dos dados,
para
delimita~&o e
que a
efetivamente uma ~rea
hist6ria
0
em: fatos exclusivamente
linguisticos
0
chamado
da 1inguistica.
~ necessidade
se
torne
Ou seja,
geral os fatos se
nos
dividem
(que dizem respeito
a
como de
- por exemplo, na visAo de Koerner
"clima de opinUlo"
extra-linguistico
sistemAtico
internos) e fatos considerados
car~ter extra-linguistico
(1978)
tratamento
dentro da linguistica.
de modo
do
grande desafio
da linguistica
estudos historiogr~ficos
teorias linguisticas,
0
decorre
III
considerado um
fato
que deve ser levado em conta pela histbria
Assim, os especialistas
de delimita~o
sac un4nimes
e tratamento
quanto
sistem6tico
de
dados como esses. Entretanto, dividem-se na hora de
assumir
uma metodologia:
mllltodos
alguns
optam pela
aplica~&o
de
provenientes da hist6ria da ci~ncia e, outros, acreditam que
~ necess~rio estar a par
mas
que
tratamento
0
desses m~todos e suas
deve
ser
resultado
descobertas
de
pesquisa
emplrica.
Numa
maneira as
formula~&o mais
duas
hist6rias,
determinar como e quais
determinada teoria
podemos
do
debate
observar
"amadurecidas"
0
as razOes que
e
explicativa
respectiva
(como
as
mesma
levam a aceitar
de
grande
Atrav~s
entre
uma
outros.
divis6ria de
demar9Ao
em
dela
ciencias
fisica - e cilllncias "adolescentes"
(Bolinger, 1975:554) - como as
classifica~&o
a
da
transforma
contempor4neo.
entender
- como a
se
em detrimento
contida a linha
cientifico
que atinge
problema
ou paradigma
Nesta formula~&o est~
parte
geral e
humanas -, assim como a
em:
ci~ncias
ci~ncias
naturais)
de
e
sua
natureza
ci~ncias
de
1257
natureza
compreensiva
(como
preconceituosa discriminaQ80
natureza "compreensiva"
e
as
humanas)
das
e.
Oltimas em
ainda,
fun~ao da
"adolescente". sao
a
sua
inOmeros
os
esforQos que as ci~ncias humanas t~m feito neste s~culo para
eliminar essa
visao. Entretanto,
visao discriminatOria
0 importante
~ que
essa
coloca a linguistica no dilema de
ter
que decidir que parte do seu ample escopo a representar4
concerto da ciencias. 0 reconhecimento
tabela, a
entender a
luta interna
no
deste fato ajuda. por
das diversas
4reas
da
linguistica.
o
historiador da linguistica que desconhece esse
maior da
discussao acad~mica,
diversas vozes da ciencia e
filosofia, contribui
se entrincheiram
as
argumentam no terreno comum
da
com um
em que
plano
tipo
de hist6ria
ingenua
nossa disciplina e. 0 que e mais grave, n80 entende 0
papal
fundamental da hist6ria enquanto pr6tica mais ampla, em
a reconstruQ80
do passado lanQa luz sobre
um compromisso
individual
de
natureza
0
da
que
presente e
pragm4tica.
cria
Neste
ponto, a reflexao histOrica passa a ser uma pr4tica, ela
se
transforma no caminho que queremos traQar. lsto n80 tem nada
a ver com 0
que se entende por
tendenciosa, como
ficar4 claro
"whig history" ou
majs adiante.
hist6ria
Voltemos
ao
histOria
da
ini~io destes argumentos.
2. Os indicios.
o
curso de
linguistica tem
certos dados
algumas
mudado toda
argumenta~es
vez que
em
s80 trazidos
(tradicionalmente extra-linguisticos)
~
que
tona
se
tornam essenciais para entender algumas das raz~es que leva.
a
aceitar
um
paradigma
exemplos sao ilustrativos.
em
detrimento
de
outros.
Oois
1258
o
primeiro
exemplo ~ fornecido no trabalho de
de 1969. Nesse trabalho program&tico,
Malkiel
Malkiel estabelece sua
vis~o particular sobre os problemas da pesquisa em histOria
da linguistica e
os requisitos que
historiador da linguistica que
seria e
equilibrada.
fatores extra-linguisticos
A modo
de exemplo
pretende fazer uma
autor
0
s30 necess~rios para
aponta
a
quase residual,
histOria
importAncia
para a confec~o
dessa
j& que
a
raz40
que,
entre
outras,
dos
histOria.
aparece no
texto como um exemplo acess6rio, Malkiel lan9a uma
sobre
poderia
0
seu
hipOtese
ter
tornado
Saussure um autor .paradigm&tico para a linguistica.
Malkiel
Saussure's
diz textualmente:
posthumous
deserves assessment
accomplishments,
Cours
on the
its
"By
the same token,
(1916)
invites
strength of
instantaneous
while
and
richly
its splendors
impact,
and
especially
outside Central Europe, cannot be properly measured
without
some allowance for the feelings of that time: the acceptance
of the leadership of a French-Swiss genius connoted for many
Westeners
then
opposed
rationalized escape
to
from the
Germany
a
world of
strongly
desired,
Brugmann,
Leskien,
Osthoff and Paul." (op.cit.pp. 55) .
Os
"feelings of
argumento de car~ter
mudar
0
centro
that time"
de Malkiel
politico que surge
de gravidade dos
sugerem
um
da necessidade
de
estudos linguisticos
ate aquele momento, se encontrava
na academia alem3 ou,
outras palavras,
havia
muitos interessados
hegemonia
sobre
os
alem3
argumento, colocado
reflex40 e n40
estudos
por Ma1kiel
a
aprofundado, sugere
qualidades justamente atribuidas
que,
da
em
quebrar
linguagem.
modo de
que, alem
em
hip6tese
de todas
a Saussure, a sua
a
Esse
para
as
passagem
para a hist6ria
e
0
produto de uma
feliz coincid~ncia
de
fatores.
Parece legitimo
se perguntar
desses fatores, j~ que
extra-lingulsticos
acerca da
tradicionalmente
pela
nossa
pertin~ncia
sao encarados
hist6ria
e
seu
como
lugar
na
metodologia ~ ainda um mist~rio.
o
segundo exemplo
trata das crlticas ao
declarado por Chomsky.
Do grande caudal
sentido, as de Aarsleff
(1970)
explica muito
mais
ideol6gica) da sua
pelos
fatos
em
e
de crlticas
"Linguagem
e
Chomsky nessas obras. Desta
de
Pensamento",
sustentay40
epistemo16gicos
se
(te6rica
teoria gerativo-transformacional
e
a
por Chomsky, atrav~
fun9ao da
hist6ricos
nesse
t~m 0 poder de mostrar que
hist6ria da linguistica construida
"Lingulstica Cartesiana"
racionalismo
do
que
aludidos
maneira, a hist6ria
e
por
construlda
por Chomsky ~ semelhante ao que os historiadores e fil68ofos
costumam chamar de "Whig history" - uma hist6ria tendenciosa
em que se
apresentam os
perlodos anteriores
refor9ar determinada posiy4o do presente
de maneira
a
(Koerner, 1978).
Sa no primeiro exemplo Malkiel nos oferece uma hip6tese
da influ~ncia
dos
"sentimentos
ascens&o de Saussure; 0
os "sentimentos do
ele
momento"
e nao no
construiu
lingulstica, uma hist6ria
no
caso
segundo exemplo tambem mostra
momento" atuam de
hist6rla num sentido
Chomsky,
do
hist6ria
em fun940 da
como
maneira a conduzir
outro. Ou seja,
uma
da
a
no caso
de
partid3ria
da
sustentay40 de
sua
teoria, eram estes os "sentimentos do momento" de Chomsky.
Mas, os "sentimentos do momento" de que Malkiel nos fala
equivalentes 4s motiva90es politico-ideol6gicas
qualquer acontecimento
hist6rico.
inerentes
.aa
a
1260
A necessidade de
incorporar esses fatores atravea
tratamento sistem~tico
permanece nebuloso.
~
Em
explicita por~m,
nossa
opini~o,
seu
tratamento
problema
0
de
assim
colocado conduz a uma vis~o parcial: a divis30 entre fatores
linguisticos e extra-linguisticos
fatos epistamicos
Granger -
se bem
geral, parece
hist6ria da
(internos) e
sentido
linguistica. A
teoria linguistica
observamos os
pe9as de um
fatos datados
indiscutivel
perder
se
- anAloga A divislo
num
quando
linguisticos
momento em
de
estudo
no inicio
fazer
que
uma
histbrico,
distinta)
a divis30
0 plano
de
muito
de
como
tradicional
e extra-linguisticos.
possivel procurar reconstituir
acadamica que apontAvamos
trata
de natureza
mesmo quadro, superando
entre fatores
se
partir do
s~o
(externos)
nivel descritivo
torna objeto
dad os (que
entre
e
Assim
maior da
discuss30
deste trabalho;
plano
que reflete a luta dos diversos interesses e que n30 podemos
classificar
como
exclusivamente
"datado"
(hist6rico)
ou
podemos
distinguir
algumas
politico-ideo16gicas
configura9Ao
das
-
que
causas
levaram
motiva90es
para
uma
determinada
dos fatos hist6ricos da lingulstica.
Desta forma, no ambito da filosofia a linguistica passa
a ser representada
como 0 resultado
de uma pr~tica
social
particular e, nesse sentido, nos serve para refletir sobre
presente e para atuar sobre
0 futuro. Algo diferente
0
Berta
fazer da hist6ria da linguistica um modele meta-lingulstico.
Poram,
um
objetivo
como
este
nos
levaria
de
imediato
novamente para 0 n~cleo da discuss30 em hist6ria da ciencia,
o que, em nosso entender,
ponto.
nos faria voltar sempre ao
mesmo
1261
Um ~ltimo
exemplo nosso, sugere como esse plano
maior
da discuss§o academica atua afetando 0 direcionamento
de uma
pesquisa. No contexto da linguistica
d~cada
de
sociolingu!stica
resposta
0
'70,
trabalho
quantitativa
pr~tica
frente
marcadamente racistas,
indice de fracas so
americana durante a
inicial
Labov
na
pode ser interpretado como uma
a
como
teorias
as
que
do
conhecimento
justificavam
escolar nos bairros
cidades americanas, atrav~s
de
0
negros das
de teorias
alto
grandes
sustentando que
pessoas de ra9a negra eram menos inteligentes - a
as
conhecida
"hip6tese do deficit" de Basil Berstein formulada durante s8a
d~cada
de
(Dittmar,
'60
linguagem empregada e
americana) era em
muito respons~vel
Coincid~ncia
esta parece
ter
dessa sociolinguistica:
uma
humanisticos
sentido
de an~lise
situa930 da
tinham
sido
(a lingua
inten9&0
contribui930
0
como
escolar
assumida,
genuinamente
social que a
adquiriu em
realidade
em
social
lingulstica
busca de
em que
escamoteados
a
padrAo
pelo fracas so
hist6rica ou
sido a
enquant6 instrumento
mostrou
ensinada na escola
nos guetos.
resposta a
Labov
1976).
os
prol
uma
valores
de
uma
justificativa te6rica retr6grada em cujo bojo se encontra
progresso social como
ra9a historicamente
0 progresso ou
as conquistas de
0
uma
privilegiada.
3. Conclus§o.
Uma vis&o
pragmatica da
orienta, que acrescenta
politico-ideo16gicas
na medida
em que
linguistas do
0 estudo
como parte do
incorpora
pr~tica linguistica,
hist6ria
nos
passado e
suas
das possiveis
que
frente a
nos
motiva~es
seu objeto de
uma concep930
coloca
como a
pesquisa,
intencional
da
frente
os
teorias eliminando
com
a
carga
1262
mitica com que chegaram at~
n6s. Nesse sentido, esta
nos torna semelhantes a esses homens do passado
- enquanto pesquisadores
visAo
linguistico
procurando dar respostas para a
realidade em que estamos inseridos - e ao mesmo tempo, for9a
um questionamento
quanto ao
projeto de ci~ncia
que queremos construir. Esta orienta9Ao
como parte
da hist6ria
intencionalidade
como
da
um
linguistica
pretende nos colocar
nossa disciplina,
dos fatores
que
admitindo
a
determinaram
e
determinam a hist6ria que queremos contar.
NOTAS:
(1) Este trabalho 6 uma versAo 'revista' da comunica~o
feita
durante a 44a. Reuni.o Anual da SBPC - USP, SP, 07/92.
PALAVRAS-CHAVES:
Sem~ntica
- Hist6ria - Filosofia.
BIBLIOGRAFIA:
AARSLEFF, H. (1982) From Locke to Saussure University of Minnesota Press - Minneapolis.
AUROUX, S. (1990) Histoire des idees linguistigues.
Vol.1
Pierre Mardaga - Paris. (Introdu9ao)
BOLINGER, D. (1975) Aspects of Language - 2a.ed.- Harcourt
Brace Jovanovich,
Inc. - NY/Chicago/San
Fco.
CHRISTMANN, H.H. (1987) "Quelques remarques sur l'histoire
de
la
linguistique",
in:
Historiographia
Linguistica XIV:3 - John Benjamins B.V.(235-241).
DITTMAR, N. (1976) A critical survey of sociolingui,tic,
-
St.Martin's Press - New York.
KOERNER, E.F.K. (1978) Toward a historiography
linguistics,
MALKIEL, Y.(1983(1969)
linguistics",
of
John Benjamins Pub.Co. - Amsterdam.
"History and histories of
in:
From
particular
to
general
linguistics, John Benjamins Pub.Co. - Amsterdam.
Download

"ASPECTOS DE HISTORIA E FILOSOFIA EM LINGUISTICA