CAPA ARROCO E 1001 OITES O Marrocos é um país exótico e fascinante, cujas expressivas características culturais – um pot-pourri africano, árabe e europeu - estão profundamente enraizadas nas regiões do país, da costa ao Anti-Atlas. A topografia e a vegetação podem mudar drasticamente conforme o lugar, o que permite uma viagem eclética durante a qual vale combinar os mais variados meios de transportes: bicicleta, veículos 4x4, dorso de camelos, e principalmente pé adentro em trilhas nas montanhas, nas vielas dos souks (mercados), no labirinto das medinas e ksours (vilarejos construídos em argila) texto e fotos ANTONELLA KANN TOMBADA PELA UNESCO, A ANTIGA MEDINA DE FEZ É UMA DAS MAIS EXÓTICAS DO MARROCOS Nesta pág. acima, a venda de tapetes num Souk em Essaouira, ao lado, um curtume de tingimento na medina de Fez e o pôr do sol sobre a mesma cidade. Na pág. ao lado, uma cena num dos curtumes de Fez Uma pequena multidão, composta só de homens, estava reunida em frente a uma das 14 portas da medina de Fez. Formando um círculo em volta de algumas caixas cheias de pombos vivos, discutiam em voz alta e gesticulavam. O motivo era a compra e venda destas criaturas que, segundo o guia, são tratadas como animais de estimação. Na realidade, é bem provável que grande parte iria acabar mesmo na panela, já que constituem a matéria-prima de inúmeras receitas típicas da culinária local, como a suculenta DORMIR EM UM ACAMPAMENTO BÉRBERE EM PLENO SAHARA É UMA EXPERIÊNCIA MÁGICA pastilla, espécie de folheado recheado com carne de pombo desfiada. Quase tudo no Marrocos é capaz de surpreender ou causar estranheza. Tombada pelo Patrimônio da Humanidade, a antiga Medina de Fès é uma das mais exóticas do Marrocos. Localizada a cerca de 250 quilômetros ao norte de Casablanca, a principal porta de entrada do país e para onde voam as principais companhias a partir das maiores cidades mundiais, permaneceu como capital até ser desbancada por Rabat sob o protetorado francês, mas conservou na cidadela fortificada toda a sua identidade cultural e relíquias de um importante passado intelectual e religioso. São mais de 200 mil habitantes que vivem atrás destes muros seculares, onde só se anda a pé ou de mula, como se o tempo tivesse parado no século 14. Mais de 50 mil turistas se embrenham diariamente pelas vielas estreitas a fim de explorar os intrigantes labirintos cravejados de souks e de comércio ambulante. O burburinho atordoa, as cores e o brilho das mercadorias ofuscam os olhos, mas são os cheiros fortes que mudam a cada esquina. Alguns até reviram o estômago, como o odor enjoativo de Abaixo, uma avó carrega o neto próximo ao vilarejo de Tik Fist em direção ao souk da cidade. Na pág. ao lado, um acampamento bérbere que acolhe turistas que pernoitam no deserto carne putrefata, que emana dos curtumes onde se tingem as peles dos animais. Um dos segredos para as pessoas mais sensíveis é esfregar folhas frescas de hortelã nas narinas. “Balék, balék, balék!!!” Ao ouvir estes gritos ( que significa “ sai da frente” ), o mais aconselhável é tentar se esquivar rapidamente, porque se trata de algum comerciante tocando seu burro carregado de mercadorias tentando perfurar a multidão. Os personagens da medina, que refletem um dos autênticos modos marroquinos de viver, são velhos e jovens, homens, Um olhar sobre Essaouirá através do buraco na muralha. Na pág. ao lado, na região do pré-deserto uma menina local espreita a chegada de turistas OS BÉRBERES SÃO OS NATIVOS NÃO ÁRABES crianças e mulheres, a maioria delas velada da cabeça aos pés. Desconfiados em relação aos turistas, os locais não gostam de ser fotografados. O bom senso reza que contratar um guia oficial é aconselhável: ao todo são 9700 ruelas sem endereços, números ou qualquer indicação. Curiosamente, juram que todas as cartas chegam ao seu destino! . Marrocos a flor da pele - A apenas uma hora de carro de Fès, aninhada numa idílica região campestre, fica Volubilis, antiga cidadela romana e o sítio arqueológico mais importante do Marrocos. As ruínas desta imponente metrópole, que foi a capital das províncias romanas no norte da África de 45-285 d.C, traduzem a grandeza do poderio romano antes mesmo da implantação do islamismo. O que restou dos vestígios causa impacto devido ao fantástico estado de conservação: Volubilis mantém intactos grande parte de edificações públicas como arcos de triunfo, templos, capitólio, fórum, basílica, termas, fortificações, aqueduto, mercados e pilares de mansões. Devido à sua localização privilegiada numa área de solo fértil, a prosperidade de Volubilis repousou sobre a riqueza agrícola, particularmente na produção de óleo de oliva. Mas a cidade também floresceu com o comércio de milho e animais, principalmente elefantes e leões. Mas a prosperidade infelizmente durou pouco. Em 285 d.C, com a retirada dos romanos, Volubilis passa por períodos sombrios e cai nas mãos de inúmeros predadores no decorrer de algumas centenas de anos. A cidade será definitivamente abandonada no século XI, deixando ali soterrados dez séculos de história, até que em 1915 as escavações de um grupo de arqueólogos franceses deixam vir à tona algumas das numerosas ruínas. Hoje, Volubilis pode rivalizar com os mais belos sítios romanos da bacia mediterrânea, como Djemila, Tipasa ou Timgad, na Algéria. Neste Patrimônio Mundial da Unesco, as explorações arqueológicas continuam em andamento. Outrora um entreposto da Legião Estrangeira, Ouarzazate é a porta de entrada para o deserto. Nesta região do Anti-Atlas, há muito que explorar, e o terreno parece ter sido feito sob medida para longas pedaladas. O percurso em estradas pouco movimentadas, praticamente planas, pontilhadas pelos típicos kasbah e ksours, que são fortalezas e Próximo de Zagora uma mulher bérbere conduz seu rebanho de ovelhas até uma pastagem. No detalhe, dois homens em um vilarejo do Alto-Atlas. vilarejos rurais construídos em argila. Ao longo do Vale do Rio Draa, um dos maiores oásis do Marrocos, além das tamareiras, o cenário é repleto de figuras humanas marcantes, que desfilam em trajes característicos. Uma noite no Sahara - É claro que ninguém sai do Brasil para passar uma noite no Sahara, assim sem mais nem menos. Mas, basta um pouco de espírito esportivo para inserir esta aventura em qualquer programação. Dormir num autêntico acampamento bérbere não soa apenas fascinante, mas cria uma expectativa até mesmo no mais calejado viajante. A cidade de Fez: a hora mais feérica do dia é quando o sol se põe Depois de Zagora, onde não se deve perder a oportunidade de perambular pelo souk, um dos mais extravagantes do Marrocos - pois além das quinquilharias é também possível comprar carneiros, camelos e burros - é hora de atravessar M’hamid, o derradeiro oásis antes do deserto. Quando acaba o asfalto, a sensação é nítida: transpomos o portal do Pré-Sahara. Em questão de minutos, não há mais nenhum vestígio de civilização. As Landrovers, uma atrás da outra, serpenteiam entre dunas numa estrada de traçado duvidoso. A poeira embaça o horizonte, onde o sol está se pondo lentamente. O tempo passa devagar, não há sinal de vida, só areia. Para dar veracidade à expedição, os guias distribuem um “kit deserto”, composto do djelabá azul, típica túnica usada pelos nômades (também chamados de “ homens azuis” ) que habitam o Sahara, e um sash, turbante colorido de algodão que, enrolado na cabeça, protege do sol, do frio e das rajadas de areia. Só se chega ao acampamento bérbere montado em dromedários, atravessando lentamente volúveis dunas de areia branca capazes de fazer qualquer cristão perder a referência. Enquanto o corpo sacoleja encima destes quadrúpedes ruminantes, a imaginação associa o cenário com os contos de Mil e uma Noites... ou um set de filmagem. Do alto (da duna e do camelo), tem- A REGIÃO MONTANHOSA DO ANTI-ATLAS GUARDA PAISAGENS MARCANTES Acima, típico personagem de Essaouira. Na pág. ao lado cena tradicional de locais se a primeira visão do acampamento: duas fileiras com oito tendas cada, montadas uma ao lado da outra e viradas frente à frente; no fundo, uma tenda maior, com duas mesas baixas e vários banquinhos, dispostos encima de alguns tapetes coloridos, onde será servido o jantar. O único luxo “urbano” é um banheiro improvisado numa minúscula casinhola, afastado uns cem metros das tendas. As tendas, todas iguais, são feitas de pano, pequenas, mas guardam uma cama de casal, uma mesinha, um lampião e uma chaleira com água e uma bacia para quem precise se lavar sem maiores inconvenientes. Em tempo: banho, nem pensar. No deserto, nada de água. Depois de um jantar com pratos típicos como couscous, tajines (ensopados) e kebabs, os anfitriões berberes acendem uma grande fogueira, porque a temperatura despencou para um dígito. As estrelas cadentes se derramam em cascata no céu e a lua cheia ilumina o acampamento. Tudo muito romântico. O nascer do sol é o ponto culminante. Do alto de uma colina, é um dos espetáculos mais bonitos e cobiçados do Sahara: nascendo no horizonte, projeta os seus fachos de luz nas dunas, dourando- as lentamente. Um momento mágico, Na pág. ao lado, dois ambientes do luxuoso Kashbah Tamadot Resort. Ao lado, o spa do hotel La Sultana e a vista da piscina no L’Heure Bleue Palais sem dúvida. O café da manhã é servido em seguida: bandeja de pães e doces, ou melhor, bagrir, makli e msamene. Oásis no Alto Atlas - Um programa inesquecível pode estar num simples trekking para conhecer algum vilarejo bérbere perdido nas montanhas. Os Bérberes são os nativos não-árabes do Marrocos. Ao longo dos séculos, eles se misturaram à população árabe dominante, adotaram a língua e muitos escolheram a região montanhosa do Alto Atlas. É também nessa região onde o visitante se depara com uma das mais prazerosas surpresas da viagem, o luxuoso Kashbah Tamadot Resort. Com instalações dignas dos melhores hotéis do mundo, o Kashbah mescla o clima tipicamente marroquino com influências ocidentais. Uma visita e região só é completa se uma noite no hotel entrar em sua programação. O Mar do Marrocos - Ao se despedir das montanhas e de uma temperatura amena, chega-se numa encantadora cidade portuária caiada de branco. Essaouira, localizada a apenas 173 quilômetros de Agadir, é a cidade mais romântica do litoral marroquino. O ano inteiro desfruta de um micro clima e, curiosamente, o vento que assola a região o ano inteiro afugenta muita gente, o que a deixa livre do assédio do turismo de massa. Por outro lado, tornou-se a capital mundial dos amantes da vela, atraindo legiões de windsurfistas e praticantes do kitesurf. A cidade, que esteve sob a influência dos portugueses e ingleses, respectivamente nos séculos 18 e 20, já foi um marco do comércio exterior e hoje abriga uma importante colônia de artesões. Perambular pelas ruas estreitas dentro da cidadela de Essaouira, e se embrenhar pelos souks é um programa prazeroso visto o número de lojinhas vendendo atraentes objetos de madeira talhada e tapetes irresistíveis. Na mesma cidade, o incrível hotel L’Heure Bleue Palais, chancelado pelo Relais & Chateaux, torna-se um ótimo motivo para pernoitar nesse idílico lugar. Não falta charme e luxo ao hotel cujas acomodações têm decoração com temas africanos e cuja gastronomia é a mais festejada da região, tudo sob o comando do chef Sylvian Scotti. Uma ótima pedida para relaxar em pleno Marrocos dentro dos muros de Essaouira. Marrakesh e seus prazeres Retorno à civilização, ao burburinho das grandes metrópoles. Marrakech, conhecida como por ser uma cidade prazerosa, a cidade dos sultões e a preferida dos designers de moda como Yves Saint Laurent, Armani e Versace. Tem seu grande mercado ao ar livre na praça Jemaa-el-Fna, que palco de saltimbancos, acrobatas, músicos, mágicos, contadores de histórias, “arrancadores” de dentes; além daqueles encantadores de serpentes e domadores de macacos, ladeados por dançarinos travestidos de mulher e ainda insólitos espetáculos como o dos engolidores de escorpiões vivos. Um verdadeiro circo mesclado com um mercado de ambulantes vendendo frutas, peixe frito e outros quitutes sem denominação específica. Para quem prefere a urbanidade ao ritmo vagaroso dos vilarejos, a capital do sul do Marrocos também reserva muitas surpresas. Uma delas é o novíssimo La Sultana, boutique hotel cinco estrelas instalado no meio da Medina. Autêntico e luxuoso se torna uma oportunidade rara de sentir-se um sultão em meio à caótica cidade. Talvez para guardar na memória algum sabor do exotismo marroquino, vale um jantar no famoso restaurante Dar Yacout, considerado como uma instituição em Marrakech. O ambiente rivaliza com o que há de mais autêntico, e a decoração do terraço leva a assinatura do conhecido designer americano Bill Willis. Lá do alto, desfruta-se não apenas da vista, mas de um sofisticado cardápio. Entre as inúmeras receitas tradicionais, não podia faltar a tal típica pastilla de pombo. Ah, lembrando daqueles pombos na porta da medina de Fès. O destino deles já estava mesmo traçado... GUIA TOP Como ir: a TAP tem vôos diretos a partir de Lisboa para Casablanca. A melhor opção saindo do Brasil é voar via capital portuguesa até a principal porta de entrada do Marrocos. Passagens a partir de US$1234 por pessoa em classe econômica e US$3.600 em classe executiva. Reservas: 0300 210 6060 ou www.flytap.com ONDE FICAR: ESSAOUIRA L´ Heure Bleue Palais: Antigo palácio convertido num Relais & Chateaux tem 35 suítes luxuosas. Diária de 308 a 539 euros. Tel. 212 24 783434 www.heure-bleue.com MARRAKECH La Sultana: cinco estrelas ao lado de três campos de golfe. Diária a partir de 260 euros. Tel. 212 24388008 www.lasultanamarrakech.com ASNI Kasbah Tamadot Resort: tem spa e restaurante gastronômico. Diária de 290 a 1525 euros. Tel. 212 24 368200 www.kasbashtamalot.com FÈS Riad Maison Bleu : autêntica residência moura no centro de Fés. Diária 172 a 254 euros com café da manhã. Tel.212 35 741873 www.maisonbleue.com Acima, a parte interna do sofisticado hotel L’Heure Bleue Palais, em Marrakesh Quem leva: Butterfield & Robinson tem expedições de 9 noites para o Marrocos. Preço p/ pessoa, com acomodações em hotéis cinco estrelas, guia, traslados, refeições completas : U$ 8,795. Reservas: 11 3071 4590 ou www.butterfield.com Moeda: o dirham é a moeda local. 11 dirhams equivalem a 1 euro