Projetos de extensão que trabalham com movimentos sociais – Katia Marro (UFF – Campus de Rio das Ostras) Esta reflexão é produto de uma pesquisa intitulada “Serviço Social em movimento: experiências universitárias de trabalho e articulação com movimentos e organizações das classes subalternas na contemporaneidade“, realizada no período de 2009-2010 como parte das atividades docentes realizadas no PURO-UFF, tendo contado com a participação da aluna de iniciação científica Natalia da Silva Pessoa. Destacamos a seguir um breve resumo da proposta e dos resultados do referido trabalho. a) Principais objetivos e hipóteses de trabalho • Mapear algumas experiências de estágio e extensão de universidades públicas ou de referência do país; • Conhecer as perspectivas e frentes de trabalho desenvolvidas nessas experiências; • Problematizar a relação com as estratégias de redimensionamento crítico do Serviço Social, considerando: 1) o vínculo político e profissional com os movimentos sociais é condição fundamental no processo de ruptura com o conservadorismo e reversão da relação tradicional de controle e apaziguamento das massas trabalhadoras; 2) é também a possibilidade de abertura de novos horizontes para o exercício profissional. b) Sobre a natureza dos projetos de extensão • Quais movimentos prevalecem? Movimentos urbanos; movimentos do campo (em especial o MST); movimentos populares (consumo e reprodução social); movimento quilombola; movimento indígena; movimento de mulheres; movimento LGBT. • Quais temáticas são abordadas? Luta contra o latifúndio e a concentração fundiária; contra o uso de agrotóxicos e a depredação da natureza; contra a especulação imobiliária e o déficit habitacional; contra o racismo, a homofobia, o machismo e a discriminação; contra o desemprego e o empobrecimento; contra a privatização e o clientelismo nas políticas públicas; contra a repressão e criminalização dos movimentos; pelo acesso ao conhecimento socialmente produzido. • A coordenação: a grande maioria dos coordenadores possui algum tipo de experiência de militância partidária, sindical, em diversos movimentos. • Que instituições se destacam? 1) uma primeira geração de projetos que se iniciam no contexto da década de ’80, vinculados aos processos de reorganização de classe e de mobilização popular pós-ditadura (onde se destacam a PUC-SP; UFMA; UFPA, com os chamados “projetos pilotos universitários” de extensão e estágio); 2) uma segunda geração de projetos relacionados com os conflitos de classe e opressão proprios das transformações do capitalismo contemporâneo (onde podemos mencionar, a UFVJM; UFF - Niterói, Campos e Rio das Ostras -; UFRJ; UERJ; UFJF; UFPB; UFS; UFES; UFSC; UNESP-FRANCA). c) Vínculo institucional • Institucionalização de convênios ou parcerias entre universidade e movimentos (se destaca o MST-ENFF) • Os recursos permanentes se reduzem a recursos humanos da instituição e bolsas para estudantes (sobrecarga do trabalho docente) • Certa abertura para concorrer a editais específicos (MEC; MINC) Do ponto de vista dos ganhos e avanços institucionais, que este tipo de trabalhos representam podemos mencionar: 1) a diversidade e amplitude dos sujeitos e instituições envolvidas; 2) a formação de alunos (graduação e pós) e docentes; 3) a articulação inter-institucional e trabalho interdisciplinar; 4) o enriquecimento da função social da universidade; 5) práticas coletivas de trabalho na contramão de tendências produtivistas. d) Perspectivas de trabalho desenvolvidas pela profissão no trabalho com movimentos sociais • Apoio à mobilização, articulação de diversos sujeitos em luta e auto-organização popular ; • Assessoria política e técnica aos movimentos e organizações populares; • Formação teórico-política e cidadã para o fortalecimento da organização popular e constituição de sujeitos coletivos; • Desenvolvimento de estudos sócio-econômicos (inclusive em articulação interdisciplinar com outras profissões) com o objetivo de potenciar os processos de auto-organização dos grupos subalternos em torno das suas condições de vida e de trabalho, assim como nutrir suas reivindicações para a implementação de possíveis intervenções do poder público; • Qualificação e politização dos debates (através de palestras, oficinas, dinâmicas de educação popular, assembleias comunitárias, fóruns) acerca dos modos privilegiados de enfrentamento das manifestações da “questão social”, envolvendo técnicos, profissionais, gestores e dando visibilidade aos sujeitos subalternos que no seu enfrentamento acionam traços de luta e resistência; • Qualificação da participação política na elaboração, implementação e controle da política pública; • Orientações, encaminhamentos e atendimentos que busquem potencializar a apropriação por parte desses grupos dos serviços e instituições públicas que constituem direitos sociais de cidadania. e) Sobre o significado destas experiências de extensão Dentre os principais motivos que fundamentam a importância deste tipo de experiências, podemos mencionar: 1) Dar resposta às reivindicações desses sujeitos e potencializar sua organização; 2) democratizar o acesso à universidade; 3) materializar compromissos do nosso projeto profissional; 4) oferecer experiências de formação diferenciadas para os alunos; 5) pautar novas agendas de ensino, pesquisa e extensão articuladas às necessidades dos grupos subalternos; 6) certa expectativa de que seja aprofundada (de forma fecunda) a direção dada pela tradição marxista. Ao indagarmos sobre as possibilidades concretas de provocar um Redimensionamento teórico, ético e político da formação profissional, os integrantes destes projetos destacam os seguintes ganhos: Amplitude para enfrentar diversas expressões da questão social; Maior politização; Sensibilidade para compreender e dar visibilidade às lutas sociais; Maior compreensão das tensões entre os movimentos e as políticas públicas; Abertura para o trabalho interdisciplinar; Novos conhecimentos e temáticas que enriquecem o perfil profissional f) Dificuldades e desafios Dificuldades: 1) escassez de produções sobre a temática e 2) de experiências de trabalho da profissão junto aos movimentos sociais (a grande maioria vinculada à Universidade); 3) sobrecarga do trabalho docente e ausência de recursos ou apoio institucional para realizar trabalhos desta natureza. Desafios: 1) abertura de campos de estágio articulados aos processos de organização dos movimentos sociais para oferecer essa experiência para futuros AS; 2) maior articulação entre ensino, pesquisa e extensão tensionando as exigências produtivistas; 3) articulação das experiências universitárias com o conjunto de instituições de política social/pública (e outros âmbitos privilegiados da intervenção); 4) multiplicar a divulgação das experiências em revistas e periódicos, seminários internos da universidade, eventos interdisciplinares e nos próprios meios de comunicação populares; 5) ampliar nosso conhecimento em algumas áreas fundamentais (questão agrária, habitacional, agroecologia, dentre outros) que aparecem como uma necessidade do trabalho junto aos movimentos sociais.