MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO
Assessoria de Gestão Estratégica
A IMPORTÂNCIA DA
ESTRATÉGIA NAS
ORGANIZAÇÕES MODERNAS
Humberto Falcão Martins
Brasília, março de 2010
2
A IMPORTÂNCIA DA ESTRATÉGIA NAS ORGANIZAÇÕES MODERNAS
3
Folha de Rosto para Produto de Cooperação Técnica
Identificação
Consultor(a) / Autor(a): Humberto Falcão Martins
Número do Contrato:110.046
Nome do Projeto: Projeto de Cooperação Técnica Internacional BRA/05/002
Oficial / Coordenador Técnico Responsável:
Data / Local: Brasília,
Classificação
Temas Prioritários do IICA
Agroenergia e
Bicombustíveis
Sanidade Agropecuária
Biotecnologia e
Biosegurança
Tecnologia e Inovação
Comércio e Agronegócio
Agroindústria Rural
Desenvolvimento Rural
Recursos Naturais
Políticas e Comércio
Comunicação e Gestão do
Conhecimento
Agricultura Orgânica
Outros:
Modernização Institucional
X
Palavras-Chave: Organizações modernas; estratégias organizacionais
Resumo
Título do Produto: A importância da Estratégia nas Organizações Modernas
Subtítulo do Produto:
Resumo do Produto:
Qual Objetivo Primário do Produto?
4
R. Sensibilizar pessoas.
Que Problemas o Produto deve Resolver?
R. de percepção sobre a realidade organizacional.
Como se Logrou Resolver os Problemas e Atingir os Objetivos?
R. Mediante um processo de exposição dialogada e argumentação
Quais Resultados mais Relevantes?
R. Participação e engajamento da platéia.
O Que se Deve Fazer com o Produto para Potencializar o seu Uso?
R. Divulgá-lo.
5
SUMÁRIO
1. Introdução ....................................................................................... 03
2. Desenvolvimento
I
.................................................................................
2.2.................
2.3
04
07
” ......................................
13
3. Conclusão
3.1 A importância TITULO DA PALESTRA
Anexo TRANSPARENCIA APRESENTADAS
15
18
6
A IMPORTÂNCIA DA ESTRATÉGIA
NAS ORGANIZAÇÕES MODERNAS
1. INTRODUÇÃO
Peter Senge, autor da “Quinta Disciplina”1, ao tratar de uma delas, o domínio
pessoal, usa uma simples imagem para falar de tensão criativa –versus tensão
destrutiva. O autor sugere imaginarmos duas mãos, uma em cima da outra,
circuladas por um elástico sob tensão, na medida em que as mãos tentam se
distanciar uma da outra. A mão de cima é o projeto de vida. A mão de baixo é a
realidade. A primeira nos inspira em sua direção superior. A segunda nos puxa para
baixo, para o mundo das dificuldades e obstáculos. A moral da estória é que
aqueles que não possuem um projeto de vida são tragados pela realidade e
sucumbem aos seus percalços por meio de uma tensão destrutiva, um stress
aniquilador. O projeto pessoal nos torna mais aptos a agüentar as tensões, tornando
o stress positivo. Infelizmente, a maioria das pessoas não possui um projeto de
vida. Apenas enfrenta a realidade e é consumida por ela. A metáfora também se
aplica às organizações, embora estas sejam arranjos deliberadamente dotados de
propósito – mas que nem sempre está claro, nem sempre sinaliza sua utilidade,
nem sempre permite enfrentar o contexto onde atua e nem sempre proporciona
uma âncora de racionalidade.
Talvez o autor que melhor tenha definido a importância da estratégia seja
Sêneca2: “não há vento favorável para quem não sabe para onde ir”. Organizações
sem rumo ficam ao sabor dos ventos e seu destino mais provável é o rochedo.
Estendendo as alegorias, uma nau sem rumo, cujo destino mais provável é ser
comida pelo mar, diria Camões; ou o drama de Ulisses, condenado a vagar pelos
mares, sujeito a idas e vindas, perigos e desafios, em busca de Ítaca, na Odisséia
de Homero.
1 Senge, P. M. (1998) A Quinta Disciplina: Arte e Prática da Organização de Aprendizagem, (2nd ed.), São Paulo: Editora Best
Seller Círculo do Livro.
2 Lucius Annaeus Seneca, filósofo, escritor e político romano que viveu entre 4 AC e 65 DC.
7
Das muitas possíveis definições de estratégia3, podemos extrair alguns
significados simples. A estratégia é a arte de traçar o rumo e ir. É o mapa, o
caminho, a orientação, a bussola. É uma ponte entre o onde estamos e o onde
queremos chegar. É propósito, resultado e como alcançá-lo.
Porque precisamos dela? Porque investimos (tempo, dinheiro, expectativas)
para formulá-la, implementá-la, monitorá-la de modo sistemático? Este texto
buscará responder a estas perguntas elaborando três argumentos. Primeiro, porque
organizações são arranjos voltados à satisfação de suas partes interessadas e a
estratégia é um sinalizador do valor que a organização gera. Segundo, porque
organizações fazem parte de um mundo dinâmico e sua sobrevivência se sujeita a
fatores externos. Logo, a estratégia é um mapa de navegação. Terceiro, porque
organizações tem um lado “irracional” cuja falta de limites promove sua
desagregação e a estratégica constitui sua âncora racional.
2. ORGANIZAÇÕES SÃO ARRANJOS VOLTADOS À SATISFAÇÃO DE SUAS
PARTES INTERESSADAS
Partes interessadas, ou stakeholders, são pessoas ou outras organizações
que afetam ou são afetadas pelo que uma organização faz. Há quatro categorias de
partes interessadas primárias, essenciais à existência da organização: a)
proprietários ou instituidores, seja o estado, seja um investidor, empresário ou um
iniciador de uma organização não governamental; b) clientes, ou beneficiários
diretor dos produtos que a organização gera (sejam bens, serviços, tangíveis ou
intangíveis), sejam usuários, consumidores etc.; c) colaboradores, ou força de
trabalho direta ou indireta, sejam empregados, servidores, voluntários, parceiros,
terceirizados etc.; e c) fornecedores dos insumos que serão convertidos em
produtos. Se uma destas partes faltar, a organização torna-se inviável.
Também há partes interessadas secundárias, que influenciam e ou são
influenciadas, mas cuja ausência não inviabiliza a organização, tais como governo,
mídia, academia, comunidades etc.
Cada parte interessada é portadora de interesses, demandas e expectativas
legítimas e às vezes contrárias. Proprietários almejam resultado: lucro para o
3 Veja-se, por exemplo, a obra “Safari de Estrategia - um Roteiro Pela Selva do Planejamento Estrategico”, de Henry Mintzberg,
Bruce Ahlstrand, Joseph Lampel (editora Artes Médicas Sul, 1999), que trata da diversidade de enfoques e conceitos relativos ao tema.
8
empresário, resultados de políticas públicas para o Estado e uma causa para o
membro de uma organização não governamental. Clientes almejam bons produtos
e serviços, que satisfaçam suas necessidades. Colaboradores almejam boas
condições de trabalho, remuneração adequada, uma boa carreira, em sentido
amplo. Fornecedores almejam demanda por seus produtos (que são insumos para
a organização), boas condições de pagamento etc. Muito frequentemente, aumentar
o retorno para o proprietário instituidor impõe restrições à qualidade de produtos ou
a remunerações dos colaboradores.
A teoria dos stakeholders sugere que dificilmente uma organização
conseguirá satisfazer plenamente todas as suas partes interessadas primárias, mas
o que não pode ocorrer é deixar nenhuma delas profundamente insatisfeita. Sugere
que a sobrevivência da organização no tempo está relacionada à sua capacidade
de satisfazer as expectativas, interesses e demandas das partes interessadas de
forma não discriminatória. Um exemplo genérico simples deste enunciado está no
conceito de triple bottom line4, ou sustentabilidade tripolar, segundo o qual os
resultados de uma organização medidos em termos sociais, ambientais e
econômicos. Ou seja, não vale garantir bom retorno ao acionista e bons produtos e
serviços e agredir o meio ambiente.
Enfim, segundo esta visão das organizações, a partir do emaranhado de
interesses, expectativas e demandas que a circundam, há muitas formas de
satisfazer as partes interessadas. A questão é de que forma satisfazer atores que
disputam, brigam, de forma adequada ou não a atenção da organização.
Organizações são arranjos voltados à satisfação de suas partes interessadas. Se
estas não se satisfazem, buscam outras formas concorrentes de satisfação.
Empresas perdem donos para investimentos com maior retorno e clientes para
concorrentes capazes de oferecer melhores produtos e serviços. ONGs perdem
membros e beneficiários para outras ONGs capazes de traduzir melhor suas causas
e formas de atuação. Organizações públicas são extintas, fundidas, cindidas etc. e
ou perdem beneficiários para o mercado (veja-se, por exemplo, o processo de
exclusão da classe média dos sistemas públicos de educação e saúde, que contam
com um mercado em expansão) ou para o não-estado (as zonas capturadas pelos
4 Veja-se a obra seminal de Andrew W. Savitz, The Triple Bottom Lineby Andy SavitzHow Today's Best-Run Companies are
Achieving Economic, Social, and Environmental Success — And How You Can Too” (Jossey Bass, 2006).
9
poderes paralelos, onde o crime supre funções de estado, tendo em conta sua
absoluta ausência).
Segundo esta visão, todas as organizações estão inseridas em um ambiente
institucional competitivo e nele sobrevivem na medida em que são consideradas
úteis, aceitas, legítimas. A questão aqui é legitimidade. Legitimidade é aquilo que é
socialmente aceito, que faz sentido, que agrega valor. Que não se confunde com a
legalidade, que é aquilo que está na lei – e não assegura a legitimidade.
Organizações que não geram valor não sobrevivem, mesmo tendo existência legal.
Uma firma que perde legitimidade, porque oferece produtos inadequados ou gera
efeitos danosos (ambiental, moral etc.), quebra. Uma ONG que não representa e
atua bem em defesa de sua causa, se desfaz. Mas organizações públicas, tendo
em conta o caráter da legalidade (existem enquanto vigem suas leis constituintes),
podem atravessar um longo período de agonia se perdem legitimidade – refletida na
progressiva perda de funções, quadros, orçamento, deterioração da imagem. Há
organizações publicas que se tornam organizações zumbi, mortas-vivas, apenas um
centro de custos. Cedo ou tarde, geralmente no calor de escândalos ou em
momentos de grandes reorganizações, típicas em momentos de crise ou inicio de
governo, sucumbem.
Logo, uma função da estratégia é deixar claro para que e para quem servem
as organizações. Estratégias são, portanto, um instrumento de posicionamento que
permite revelar que produto/serviço se entrega a quem, declarando seu valor
público, no caso das organizações públicas.
3. ORGANIZAÇÕES FAZEM PARTE DE UM MUNDO DINÂMICO
Organizações são parte da sociedade contemporânea e sujeitam-se aos
seus ditames em vasta extensão. Se a realidade social fosse estática, uma
definição inicial a respeito do propósito, resultados e formas de alcançá-lo bastaria.
Não se alteraria ao longo do tempo. E provavelmente nem precisaria ser de amplo
conhecimento de todos, na medida em que poderia ser desdobrado em áreas,
processos e tarefas dotados de alta estabilidade e cuja execução (mesmo que
realizada às cegas), conduziria inequivocamente aos resultados previstos.
Organizações inseridas em contextos de baixa complexidade, caracterizados
pela previsibilidade e estabilidade de demandas (baixa variabilidade nas
necessidades dos beneficiários e, por conseguinte, nos produtos/serviços) e ofertas
10
tecnológicas (baixo grau de inovação do produto e do processo), alinham-se, por
sua vez, com arquiteturas organizacionais mais burocrático-mecanicistas. Há duas
variáveis-chaves que devem ser consideradas: porte e incerteza da tarefa.
Organizações de grande porte estão mais sujeitas à burocratização. Por outro lado,
ambientes estáveis proporcionam baixa incerteza da tarefa, que, nesse caso,
impõe, em nome da eficiência (a relação ótima entre recursos e produtos), um
desenho organizacional mais rígido e programável.
Com efeito, os modelos de gestão mecanicistas possuem as seguintes
características5: a) a estratégia é mais estável e reativa; b) o conjunto de produtos
(bens ou serviços) é mais padronizado, menos ou pouco diferenciado; c) os
processos de trabalho são mais rotinizados, programáveis, regulamentados e
autônomos (circunscritos dentro da organização); d) as estruturas são mais rígidas,
verticalizadas e reproduzem uma “separação entre mãos e cérebros” (uns pensam,
outros executam; quem pensa não executa; quem executa, não pensa),
demarcando
de
forma
muito
contundente
instâncias
de
decisão
e
planejamento/formulação (uma cúpula pensante) e instâncias de execução (uma
base operacional); e) os quadros funcionais são mais fixos (mais empregados do
quadro que colaboradores eventuais), as competências são pré-definíveis e a
capacitação é orientada por conhecimentos disponíveis “no mercado”; f) a cultura
organizacional tende a destacar valores tais como disciplina, obediência e
impessoalidade; g) a liderança emana mais da autoridade do cargo formal; h) a
comunicação é mais formal e tende a seguir a hierarquia; e i) os sistemas de
informação são centralizados e herméticos (caixa preta). Uma arquitetura com estas
características proporciona maior eficiência em ambientes estáveis.
Mesmo que se admitam momentos de relativa estabilidade, a tendência que
se observa nas sociedades contemporâneas, com raríssimas exceções, é uma
crescente
instabilidade
que
submete
organizações
privadas,
publicas
e
comunitárias e as faz lidar com ambientes cada vez mais complexos e desenvolver
modelos de gestão cada vez mais orgânicos.
Contextos de alta complexidade são caracterizados pela incerteza,
ambiguidade, pluralidade e instabilidade das demandas (alta variabilidade nas
necessidades dos beneficiários e, por conseguinte, nos produtos/serviços) e ofertas
5 Em relação a estas características e as apresentadas no parágrafo seguinte, veja Motta, Paulo Roberto M., “Gestão Contemporânea – a
ciência e a arte de ser dirigente” (Record, 1991) e Morgan, Gareth, “Imagens da Organização” (Atlas, 1996).
11
tecnológicas (alta inovação do produto e do processo), alinham-se, por sua vez,
com modelos de gestão de feição mais orgânica. Ambientes instáveis ou turbulentos
proporcionam alta incerteza da tarefa, que, nesse caso, impõe, em nome da
efetividade (o impacto necessário, a partir dos produtos necessários), um desenho
organizacional mais flexível e capaz de se reprogramar para atender rapidamente
às variações do contexto.
Com efeito, os modelos de gestão orgânicos possuem as seguintes
características: a) a estratégia mutante, emergente e proativa, voltada, inclusive,
para criação do futuro em bases autopoiéticas (na qual a organização pauta-se por
um ambiente que reflete mais a própria organização); b) o conjunto de produtos
(bens ou serviços) é mais diversificado, mais ou muito diferenciado, podendo, no
limite, ser totalmente customizado; c) os processos de trabalho são estruturados,
mas menos rotinizados, menos programáveis e menos regulamentados e, sujeitos a
constantes inovações e integrações laterais com organizações parceiras; d) as
estruturas são mais flexíveis, horizontalizadas (menos níveis hierárquicos e
eliminação de “intermediários” na média gerência) e buscam uma integração entre
mãos e cérebros (a cúpula predominantemente pensante se envolve em questões
operacionais e a base operacional pensa estrategicamente e ganha maior
autonomia/empowerment); e) os quadros +funcionais são mais variáveis (menos
empregados do quadro e mais colaboradores eventuais e parceiros), algumas
competências
são
pré-definíveis,
mas
há
competências
emergentes
e
conhecimentos gerados exclusivamente dentro da organização; f) a cultura
organizacional tende a destacar valores tais como iniciativa, ousadia e
sensibilidade; g) a liderança emana da capacidade de resolver problemas e lidar
com pessoas e situações difíceis sob pressão; h) a comunicação é mais informal e
multidirecional; e i) os sistemas informacionais são descentralizados e acessíveis a
todos. Esta arquitetura proporciona melhor capacidade de resposta em ambientes
instáveis.
Modelos mecanicistas ou orgânicos não são bons nem maus a priori, sua
adequação é sempre contingente, embora todas as organizações tenham traços de
ambos, formando, para usar a expressão de Hock6, um conjunto caórdico (com
elementos da ordem e controle mecanicistas e da anarquia caótica orgânica).
6 Hock, Dee. (1999). Birth of the Chaortic Age. Berrett-Koehler Publishers.
12
Contextos instáveis impõem condições externas severas, cada vez menos
controláveis. Fatores econômicos, sociais, tecnológicos, políticos, culturais etc.
provocam constante rearranjo de condições, impõem ameaças e oportunidades
inusitadas, mediante baixa previsibilidade. Há, neste bojo, fatores denominados
“ecológicos” (a partir de correlações entre a taxa de mortalidade organizacional e
fatores demográficos tais como perfil etário e porte; fatores populacionais, tais como
densidade do nicho de atuação; fatores de ruptura tecnológica; e fatores legais
relacionados à regulação) que as organizações definitivamente não controlam...
ficando a mercê do contexto.
Se isto torna os ambientes de negócios hiperdinâmicos em escala global,
suscetíveis a crises, efeitos sistêmicos e outros problemas globais (clima,
segurança etc.), os ambientes de política pública não escapam. Sujeitam-se cada
vez mais a incertezas a respeito de problemas e soluções, pluralidade de
interesses, pressões por participação, expansão da interlocução, aumento da
transparência e responsabilização.
Ambientes
complexos
trazem
problemas
complexos,
caracterizados
por
imprevisibilidade, instabilidade, multidimensionalidade (ou múltiplas variáveis e
determinantes com padrões circulares de causa e efeito), totalidade (impondo
compreensões de transversalidades, conexões, integrações) e, uma vez mais,
pluralidade (múltiplos atores, interesses, pressões).
Problemas complexos clamam por soluções complexas: multi-institucionais,
sem fronteiras políticas, em rede, intensiva de coordenação e integração entre
partes interessadas que se posicionam e reposicionam constantemente e jogam:
formam coalizões, apóiam, atacam.
Nesse mar de complexidade, desorientação é um risco constante. Os cantos
da sereia também são, na medida em que distraem e encantam, impedindo uma
percepção aguçada da realidade circundante. A questão aqui é entender o ambiente
para navegar melhor nele. Estratégias podem também ser ancoras em mares
revoltos e nebulosos, impedindo redirecionamentos bruscos e indesejáveis.
Logo, uma função da estratégia é servir de mapa de navegação, de recurso
sistemático para enfrentamento da complexidade e norteamento do processo de
alinhamento organizacional – servindo de referência para a transformação do
modelo de gestão como um todo, em relação à qual estruturas, processos,
tecnologias, recursos, competências etc. deverão se alinhar.
13
Em perspectiva macro, o grande desafio é a construção de um novo padrão
de estado e de administração pública, nos quais a estratégia, o valor público,
possuem um destaque central.
O estado pós-moderno contemporâneo herda os ideais do estado moderno,
mas lida com condições contextuais complexas que impõem desafios e
perspectivas inusitados. Há três fatores determinantes que exigirão redobrada
atenção estratégica.
O primeiro fator determinante é a crise da reforma do Estado. A adesão ao
padrão predominante de ajuste fiscal e choque de eficiência pode ter gerado
relevantes efeitos positivos em termos macroeconômicos, mas gerou custos de
oportunidade – principal- mente em se tratando de contextos submetidos a
condições de alta pobreza e desigualdade, nas quais o critério da eficácia se
sobrepõe ao da eficiência. Em segundo lugar, muitos dos efeitos benéficos
observados na economia mundial decorreram mais da reestruturação produtiva, da
nova economia e das bolhas de consumo e produção que dos efeitos fiscais das
medidas implementadas. Em todo caso, aumentou o desafio de geração de bemestar e desenvolvimento.
O segundo fator é a emergência de problemas globais relacionados ao clima,
à segurança, à saúde e à volatilidade dos mercados, que requerem intervenções e
integrações que vão muito além dos padrões usuais de gestão de políticas públicas
confinadas a Estados- nação e mesmo aos Estados.
O terceiro fator é o alastramento da democracia e dos valores democráticos
pelo mundo afora, senão em qualidade, na forma de governo, o que representa um
clamor quase sem fronteiras (tendo em conta a penetração da mídia e da internet)
por maior transparência, participação e responsabilização.
Com efeito, o mundo contemporâneo impõe arranjos de governança não
apenas estatais para lidar com problemas complexos. Esses arranjos requerem um
modelo de governança social, em vez de tipicamente de gestão pública, pondo em
operação um tipo de estado-rede, com caráter consensual, relacional e contratual,
caracterizado pela coprodução ou cogestão de políticas públicas por arranjos multiinstitucionais entre Estado, iniciativa privada e terceiro setor. Destaca-se a
necessidade de equilíbrio institucional entre os poderes dessas esferas, visto que
cada uma delas possui limitações e vantagens comparativas. Assim, por exemplo, o
14
Estado promove equidade, mas é menos eficiente, ao passo que o mercado
apresenta grande eficiência, mas é insensível em equidade. O terceiro setor é
virtuoso porque é o domínio do valor, da causa, mas sua natureza não é a regra de
direito.
Outra questão essencial é a superação das reformas de primeira geração e a
implementação de reformas de segunda e terceira gerações. As reformas de
primeira geração (anos 1980 e 1990) tinham uma orientação essencialmente
econômica e fiscal, sem uma preocupação central com a geração de resultados. As
reformas de segunda geração, por outro lado, que emergiram no limiar do século
XXI, direcionaram-se no sentido da promoção do desenvolvimento e do
fortalecimento institucional. Recentemente, a crise de 2008 marcou o advento de
uma nova geração de mudanças baseada na reafir- mação do papel do Estado,
voltado a apoiar o mercado, promovendo-se: um reordenamento de funções e
rerregulação, como forma de reestruturar seu modelo de atuação e ineficiências; a
mitigação dos efeitos sociais negativos; a busca pela construção do futuro em
novas bases tecnológicas; e a conservação dos recursos naturais.
O advento de uma nova administração para o desenvolvimento é outra
característica da gestão pública contemporânea. A velha administração para o
desenvolvimento se baseava em uma idéia nacionalista, xenófoba e autóctone de
desenvolvimento. Dicotomizava desenvolvimento econômico e desenvolvimento
social e seguia um modelo de planejamento tecnocrático e centralizado, a partir de
um forte órgão central de planejamento.
A nova administração para o desenvolvimento baseia-se em um conceito de
desenvolvimento aberto, num contexto marcado pela globalização, integração e
interdependência. Busca tratar de forma integrada a dimensão do desenvolvimento
econômico, do desenvolvimento social e da sustentabilidade ambiental. Também
atribui papel central ao Estado, mas numa linha de estado-rede, um elemento
consertador, ativador e direcionador das capacidades do mercado e da sociedade
civil. Essa realidade requer o desenvolvimento de modelos integrados de gestão
para resultados – conjuntos coerentes e sistemáticos de práticas que buscam
melhorar o desempenho de governos, mercados, sociedade civil organizada,
organizações e pessoas, de forma integrada, para a solução de problemas coletivos
complexos.
15
Uma visão panorâmica desse processo de transição de um padrão de estado
patrimonial pré-moderno para um padrão de estado contemporâneo pós-moderno
demonstra tratar-se de um processo contínuo e inacabado, porém com
direcionadores claros no sentido de construir um estado democrático de direito (que
garanta direitos civis, políticos, sociais, republicanos) que se constitua, ao lado de
atores sociais relevantes, em um ativo promotor do desenvolvimen- to em benefício
dos cidadãos.
Em muitos países, o atual momento histórico pode ser descrito como uma
encruzilhada. O desafio de modernizar a gestão pública é transformar e consolidar,
na democracia, uma burocracia que, no conteúdo, ainda apresenta traços
patrimonialistas e, na forma, linhas ortodoxas. E fazê-lo incorporando tecnologias
emergentes de forma devida e na direção de se fortalecer as instituições estatais,
para
que
possam
desenvolvimento.
consolidar
Fazê-lo
de
um
forma
estado
devida
democrático
significa
capaz
soluções
de
gerar
(modelos,
instrumentos etc.) adequadas aos problemas, que são baseados em diagnósticos
que indiquem sua devida extensão e permitam uma priorização. Fazê-lo de forma
devida também significa processos adequados de transformação, mobilizando os
atores-chave de dentro e de fora da burocracia para comprometê-los com a
mudança. Fazê-lo na direção de um Estado capaz de gerar desenvolvimento, com e
a partir do mercado e do terceiro setor, exige capacidade estratégica.
4. ORGANIZAÇÕES TEM UM LADO “IRRACIONAL”
Tal como as pessoas, e na medida em que são por elas constituídas,
organizações possuem um lado “irracional” – ou pelo menos pertencentes ao
domínio de outras racionalidades alem da racionalidade funcional ou instrumental
típica dos sistemas administrativos. O reverso da medalha de racionalidade que
resplandece das estratégias, estruturas, processos, recursos etc. organizações são
uma dualidade dialética, um yin-yang. Ao mundo racional aparente e visível, tal
como num topo de iceberg, subjaz um universo profundo e misterioso, impenetrável
por vezes, formado por valores, crenças, preferências pessoais, idiosincrasias,
interesses individuais (altruístas e comezinhos), jogos de poder, mais ou menos
difusos e articulados, sentimentos, medos, sonhos. Organizações são sistemas
psíquicos, sistemas políticos e possuem sombra.
16
Por muito tempo as organizações foram vistas como o templo da
racionalidade, mas pela ótica da psicossociologia, elas são alimentadas pela
emoção, pela fantasia, pelos fantasmas que cada ser humano abriga em si. Só
recentemente as organizações “passaram a ser vistas como tributárias de uma
pluralidade de campos de conhecimento humano, como um sistema a uma só vez
cultural, simbólico e imaginário [e local em que] as primeiras vivências,
especialmente a ansiedade, são revividas, sendo a estrutura organizacional [..] uma
arena de emoções, que tanto definem a estrutura organizacional, como são por ela
definidas” 7.
Este lado irracional se manifesta no individual e no coletivo. Existe um
inconsciente organizacional. Existem organizações boas e más, organizações
saudáveis, organizações doentes (organizações paranóicas, esquizofrênicas etc.).
Os elementos irracionais são poderosos, definem escolhas, moldam preferências e
impõem condições internas mais ou menos instáveis. Estes elementos não se
sujeitam aos comandos e controles usuais, impostos pelas regras, estruturas,
processos, tarefas. Muitas organizações são paralisadas e capturadas por conflitos
internos, perdem legitimidade perante suas partes interessadas e se desorientam.
A ação humana é orientada por “teorias práticas” sobre a realidade, que
articulam valores, crenças, atitudes, opiniões e que são impregnadas pelos
sentimentos. Elas constituem totalizações - sempre transitórias, fluídas, parciais que “fazem sentido” para as pessoas. São construídas coletivamente, nas relações
sociais, através da comunicação, num processo dinâmico e interativo. Os gerentes,
como pessoas, compartilham “teorias práticas” sobre a organização, o serviço
público, a sociedade, as relações de trabalho, etc. Elas orientam seu
comportamento e têm implicações diretas sobre o cotidiano da organização, o
desempenho profissional, as relações interpessoais e de trabalho. Mas, em que
medida o nível de complexidade e articulação dessas “teorias” é compatível com a
realidade? Há informações e/ou conexões importantes ausentes? Uma função da
estratégia é estabelecer estas conexões.
A preponderância do lado oculto, das “irracionalidades”, da sombra
organizacional, promove o caos, a desorientação, o vale tudo, a fragmentação e,
enfim, a desorganização. O fim da organização.
7 MOTTA, F. C. P. Os pressupostos básico de Schein e a fronteira entre a psicanálise e a cultura organizacional. In: FREITAS,
M. E. e MOTTA, F. C. P. (Org.). Vida Psíquica e Organização. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora FGV, 2002. p. 75-102.
17
Logo, uma função da estratégia é servir de ancora de racionalidade,
convergir interesses, integrar conflitos, visões, preferências. Promover consciência
estratégica para evitar o afloramento do inconsciente. Nesse sentido, a estratégia é
um mecanismo de controle, um estado de alerta. Estratégias também servem como
faróis que iluminam e geram convergência.
5. CONCLUSÃO: A IMPORTÂNCIA DA ESTRATÉGIA NAS ORGANIZAÇÕES
PÚBLICAS
Os argumentos desenvolvidos anteriormente sugerem que as organizações
são, por questões externas ou internas, arranjos complexos pautados pela
imprevisibilidade, ambigüidade e pluralidade. Esta constatação põe à prova várias
visões excessivamente tributárias da crença em mecanismos clássicos de controle
e de alinhamento. Pessoas, processos, estruturas, recursos etc. não são
espontânea e automaticamente dotados de orientação estratégica de forma
convergente. A definição de marcos legais, âmbitos de atuação, atributos,
competências, requisitos processuais e outros mecanismos de definição do trabalho
humano nas organizações não dão conta de fornecer, por si só, uma visão
integrada de propósito, resultados e formas de alcance de forma dinâmica – tendo
os contextos interno e externo.
A sobrevivência das organizações depende cada vez mais de sua
capacidade de formular, expressar, comunicar, difundir, inserir sua estratégia nas
mentes e corações, de dentro e de fora. E de aprender com sua implementação e
se ajustar continuamente. Não há autoconsciência estratégica, a compreensão tem
que ser construída, comunicada, aprendida.
No setor privado, o papel da liderança do topo é mais determinante, porque o
topo é mais fixo e a base é mais rotativa. No setor público, o papel da liderança da
base é mais determinante, porque o topo é mais rotativo (mesmo que, às vezes,
integrantes do topo venham da base) e a base é fixa. Logo, os lideres da base não
possuem apenas responsabilidades táticas e operacionais; devem se posicionar
como gestores da estratégia, devem participar e se apropriar do processo de gestão
da estratégia e desenvolver consciência estratégica, sem prejuízo de suas
responsabilidades táticas e operacionais.
18
Resistir à rotina, desenvolver a consciência estratégica e se engajar na
gestão estratégica não é trivial, mas é um esforço que pode ser trilhado e
aprendido. Como observa Paulo Motta:
“Para a maioria das pessoas, o cotidiano administrativo tende a ser pouco voltado para o futuro e
quase nada proativo: na prática diária, as pessoas detectam problemas e reagem de maneira
adaptativa e intuitiva com base em referências diversas produzidas pela sua própria experiência.
Apesar de rupturas bruscas não ocorrerem com freqüência, há um processo cotidiano e incremental
de mudanças afetando objetivos e metas já programadas e com repercussão nas diversas unidades.
A existência de problemas leva as pessoas a pensar em alternativas e a ensaiar mentalmente os
caminhos que julgam adequados, aprimorando uma maneira particular de ver a organização. No
entanto, os funcionários se diferenciam por serem mais ou menos empreendedores que outros.
Alguns não só agem segundo essa visão particular mas tentam levá-la para todos os seus colegas,
procurando coletivizar a sua idéia, através da busca de apoio e agregação das pessoas. Como as
pressões de curto prazo conspiram contra o pensamento de longo alcance e como a complexidade
organizacional muda as visões compartilhadas e fere a coerência dos planos, há a necessidade
periódica de reativar reflexões e consensos sobre o futuro próximo. Reflexão estratégica significa
investir algum tempo em conhecer melhor o caminho e o futuro: é um processo de liberar o potencial
criativo e de concretização existente dentro da empresa. Pensar coletivamente a razão de ser e os
objetivos de longo alcance torna o cotidiano mais eficiente e esperançoso.”8
O alargamento da visão organizacional, a conquista da visão estratégica, o
pensamento estratégico são, sem dúvida, a maior contribuição em termos de
competências e habilidades gerenciais para todos, os níveis hierárquicos (gerentes
efetivos e potenciais) em organizações que operam em contextos crescentemente
complexos (e, por conseguinte, necessitam conceber algum tipo de ajustamento
estrutural e do modelo de gestão).
Novamente, Peter Senge, em “A Quinta Disciplina”, enfatiza que o sucesso
de uma organização está diretamente relacionado à sua capacidade de aprender:
“as melhores organizações do futuro serão aquelas que descobrirão como despertar
o empenho e a capacidade de aprender das pessoas em todos os níveis da
organização.” Isso, significa muito mais do que obter informação. Em palestra para
o programa Leardership and Mastery, compilada por Ray e Rinzler (1993), Senge
afirma: “aprender tem muito pouco a ver com informar-se. Em essência, aprender
consiste em melhorar a capacidade. Aprender é criar e construir a possibilidade
para fazermos aquilo que antes não podíamos. O aprendizado está intimamente
8 Paulo Roberto M. Motta, “Reflexão e Emoção Estratégicas; construindo firmeza na decisão empresarial”, Parceria em Qualidade,
(6), 28, 1998; Desempenho em Equipes de Saúde, FGV-PAHO, 2001; e INA, 2000.
19
relacionado com a ação, o que não acontece com a absorção de informação. Uma
das razões pelas quais o aprendizado tradicional é tão aborrecido é esta: a
absorção de informações é aborrecidíssima, passiva demais. Já o verdadeiro
aprendizado está sempre no corpo, liga-se a ação.”
Assim, é fundamental explicitar com bastante objetividade os resultados
pretendidos com a mudança e as conseqüências positivas e negativas, visando a
ampliar o espaço de adesão. Normalmente associa-se risco à mudança, mas,
muitas vezes o risco maior está em não mudar !
Concluindo, promover a institucionalização desse processo de mudança na
direção da gestão estratégica significa lidar com dois elementos-chave, que
funcionam como sujeito e objeto da mudança: quem presta o serviço (os servidores
públicos) e quem se beneficia dele (o cidadão). A mudança será efetiva se existir
comprometimento dos servidores com os resultados que criam valor público na
percepção dos cidadãos.
ANEXO
( Apresentação da Palestra em 54 slides )
,
Download

A IMPORTÂNCIA DA ESTRATÉGIA NAS ORGANIZAÇÕES