CRESCIMENTO E DESENVOLVIMENTO: O BIOLÓGICO EM INTERAÇÃO COM O PSICOLÓGICO E O SOCIAL (autor desconhecido) Que idade você tem Peter Pan? Não sei. Só sei que sou bastante criança. Fugi de casa no mesmo dia em que nasci. No mesmo dia em que nasceu? Que idéia. E por que meu caro? Porque ouvi uma conversa entre meu pai e minha mãe sobre o que eu havia de ser quando crescesse. Ora, eu não queria crescer. Não queria, nem quero nunca virar homem grande, de bigodeira na cara feito taturana. Muito melhor ficar sempre menino, não acha? Por isso fugi e fui viver com as fadas (Monteiro Lobato, Peter Pan). Peter Pan sabia que crescer significava tornar-se adulto, implicava ter que mudar sua aparência física e assumir novos papéis. Por isso, Peter Pan queria continuar menino. Essa era a sua maneira de não enfrentar as mudanças que necessariamente viriam com o crescimento. Ora, quando se fala em crescimento, em geral as pessoas estão se referindo ao aspecto quantitativo da evolução humana. Mas ele não é só isso: a mão da criança, por exemplo, diferencia-se da do adulto não só pelo tamanho, mas também pela destreza, agilidade, maior precisão e controle dos seus movimentos. As razões que provocam o crescimento e ocasionam tantas modificações não são de todo conhecidas. Até hoje, por exemplo, não há consenso entre os biólogos a respeito de por que as células crescem e se organizam. No entanto, como toda matéria viva tem necessidade de manter um equilíbrio entre meio interno e meio externo, o crescimento pode ser entendido como uma das conseqüências das trocas entre organismo e meio. A alimentação, a luz, a temperatura e a composição química do meio contribuem para a dinâmica de crescimento. De igual maneira, também os hormônios são importantes para o equilíbrio dos diferentes órgãos e tecidos. Os processos de crescimento vegetal, animal e humano apresentam muitas características semelhantes. Todavia, o crescimento humano é essencialmente diferente do crescimento dos demais seres vivos, pois o homem vive em sociedade. Ao longo do convívio social, ele transforma tanto as maneiras através das quais mantém seu equilíbrio face ao meio, como a finalidade mesma do equilíbrio. O crescimento humano não é, desta maneira, mera manifestação do biológico, mas também expressão das condições existentes no mundo social, em especial, dos avanços técnicos e das conquistas culturais. Progressos da medicina, do saneamento, da educação, da agricultura, etc., levam não só a novas modalidades de sobrevivência como também a transformações radicais no próprio meio em que se vive. O contraditório é que a sociedade não apenas contribui para melhorar as condições de vida do homem: ela também atua no sentido de piorá-las. Vacinas, antibióticos, a divulgação de hábitos de higiene, a racionalização da agricultura, o desenvolvimento dos transportes são, entre muitos outros, benefícios à disposição do homem. Em contrapartida, há os efeitos da poluição do ar, das águas e do meio-ambiente em geral, que aumentam a incidência de doenças e provocam mesmo o aparecimento de outras. Dessa forma, o crescimento humano ocorre dentro de um espaço em contínua transformação pela ação social. Nele, o psíquico e o biológico estão em constante interação, de modo que o primeiro impulsiona o segundo em direção a constantes e sucessivas modificações. Na criança, as possibilidades de crescimento existem como capacidades biopsicológicas potenciais. Dessa maneira, a realização efetiva dessas capacidades depende das condições sócio-culturais disponíveis. É diferente se a mesma criança for colocada para viver num ambiente com boa alimentação e condições sanitárias adequadas, onde existem oportunidades para viver situações de trabalho e de prática de esportes, ou em outro ambiente onde estas características não se encontram presentes. É importante salientar que um menino ou menina desnutrida, por sofrer uma diminuição sensível em seu tônus muscular, apresenta características tais como apatia, menor capacidade de concentração e de atenção, etc. Como conseqüência, o padrão de interação estabelecido com ele/ela é menos estimulante do que aquele que se mantém com uma criança robusta, alerta e atenta, Espera-se menos da criança desnutrida e, dada a essa diferente expectativa, altera-se drasticamente a natureza do contato interpessoal: ele fica empobrecido, menos estimulante, mais condescendente. Com isto, as trocas cognitivas e afetivas que a criança desnutrida poderia ter com o seu ambiente empobrecem-se, perdem o vigor. Por isso é possível considerar que o crescimento e o desenvolvimento são processos praticamente inseparáveis, ainda que distintos. A curva do crescimento nem sempre coincide com a do desenvolvimento. A primeira tende a atingir seu ponto mais alto quando a maturação biológica é alcançada. A curva do desenvolvimento, por outro lado, é contínua, acompanhando o homem durante toda a sua vida. O processo de crescimento culmina com o aparecimento de um tipo adulto previsto geneticamente. Já o processo de desenvolvimento propicia a construção do padrão de individualidade que caracteriza cada sociedade. Ambos os processos produzem, no indivíduo, mudanças físicas, mentais, emocionais e sociais. Compreender o crescimento e o desenvolvimento humano exige, assim, que se pense no homem, e em si mesmo, não apenas do ponto de vista biológico, mas, principalmente, como alguém que é historicamente determinado.