Seminário Internacional sobre Resolução no Sistema Financeiro Brasileiro Discurso de Encerramento - Diretor Sidnei Corrêa Marques Boa noite (tarde). Estamos agora nos aproximando do término dessa jornada e, antes de mais qualquer coisa, gostaria de agradecer a presença e o apoio de tantas pessoas a esse evento. Agradeço: a participação do Presidente Alexandre Tombini e do Senador Lindbergh Farias, por suas palavras de muito encorajadoras ontem aqui na abertura deste seminário; a presença de meus colegas de Diretoria Colegiada; a presença dos ex-diretores que nos prestigiam com as suas presenças, Paulo Cavalheiro, Alvir Hoffmann, Claudio Mauch e Gustavo. a contribuição dos palestrantes e dos moderadores; a participação dos colegas do Banco Central, tanto os presentes no auditório quanto aqueles que nos acompanham pela TV Bacen; Agradeço também: aos representantes das entidades reguladas e do FGC; aos visitantes internacionais; E aos liquidantes; Nesses dois dias de seminário, tivemos a oportunidade de debater um tema atual e relevante para este Banco Central e para o nosso Pais, e considero que atingimos plenamente os objetivos propostos. Foram dois dias de excelentes apresentações e de muitas discussões. Com este seminário, reabrimos para discussão um assunto que vem sendo intensamente estudado pela comunidade internacional de resolução e pelo Banco Central nos últimos anos. Ao mesmo tempo, apresentamos alguns dos principais pontos do anteprojeto para a modernização do arcabouço de resolução de instituições que constituem o Sistema Financeiro Nacional, fruto do trabalho de muitos e de profunda reflexão a partir das lições aprendidas nas últimas quatro décadas e, especialmente, desde o início da crise financeira internacional. O conjunto das apresentações, o apoio recebido e a riqueza dos debates reforçam nossa percepção sobre o acerto e a tempestividade de levarmos esse projeto a bom termo. Temos uma oportunidade rara à frente. Enquanto outras jurisdições foram levadas a rever seus arcabouços de resolução no calor da crise, nós estamos diante da possibilidade de fazê-lo no momento ideal, quando o sistema financeiro apresenta-se muito sólido. Não nos furtaremos a aproveitar esta oportunidade com determinação e afinco, pois agir de outra forma seria contrário à missão deste Banco Central. Nessa direção, e por ser um assunto tão complexo, nunca podemos esquecer que as ações de resolução, sejam quais forem, são parte do arcabouço de supervisão lato sensu, cujo objetivo primordial é manter a estabilidade do sistema financeiro e, por conseguinte, o regular funcionamento da economia real. Como bem disse o Presidente Tombini, aqui ontem neste evento, a saída de instituições é fato tão esperado na vida do sistema financeiro quanto a entrada de novas empresas. Ambos os movimentos devem ser realizados de forma muito diligente pelo regulador. Tal como somos exigentes na entrada de novas instituições, somos absolutamente criteriosos em sua saída, de modo a promovê-la da forma mais organizada possível para evitar efeitos deletérios à vida da nação. O anteprojeto que estamos finalizando é amplo em seus objetivos, no escopo e nas suas ferramentas. Sua principal finalidade é permitir que sejam mantidos os serviços críticos do sistema financeiro. Não se trata de “salvar” instituições, mas de manter a prestação de serviços essenciais aos mais variados estratos da população. Para atingir esse fim, o anteprojeto prevê a aplicação dos regimes especiais a todos os participantes que desempenhem funções críticas, incluindo as empresas fornecedoras de infraestrutura para o funcionamento do sistema financeiro, que foram tão bem descritas pelo Diretor Otávio Yasbek. Trata-se de uma lei de resolução não limitada a bancos, mas que abrange todo o sistema financeiro, portanto. A lei a ser proposta deverá inovar ao trazer em seus artigos iniciais uma lista de diretrizes para nortear a atuação dos atores envolvidos com a resolução de entidades reguladas nas mais variadas formas pelas quais as crises idiosincráticas ou sistêmicas se apresentam. Por conta das marcantes diferenças entre as entidades reguladas, a nova lei propõe ferramentas apropriadas para a resolução de instituições de todos os portes e níveis de complexidade. Para aquelas sistemicamente importantes, existem instrumentos adequados para evitar que problemas em sua viabilidade elevem o risco de contágio e de crises sistêmicas. É importante ressaltar que a definição de instituição sistemicamente importante é, por natureza, mutante no tempo. Em determinado momento, mesmo uma instituição de pequeno ou de médio porte pode ser sistêmica. Como bem destacou o Diretor Feltrim, também aqui ontem, o início da fase mais aguda da recente crise financeira se deu a partir da resolução de uma instituição de médio porte, o Banco Lehman Brothers. De fato, a história nos mostra que várias crises sistêmicas tiveram início com a quebra de bancos pequenos em sequência, rapidamente seguida de desconfiança que arrastou consigo parte significativa do sistema. Os principais pontos do anteprojeto para a condução da resolução dessas empresas já foram abordados pelos palestrantes ao longo dos dois dias. Muitos dos quais já encontraram eco em matérias divulgadas nos veículos de imprensa. Quero aqui comentar especialmente sobre o bail-in. Conforme destacado no último painel, bail-in é apenas mais uma ferramenta à disposição da autoridade de resolução. Seu uso não é obrigatório e estará sempre restrito a instituições de importância sistêmica. Em verdade, a solução dos casos concretos quase sempre passará por uma combinação de ferramentas para que se atinja o objetivo desejado, incluindo bail-in, a transferência de ativos e passivos, o uso de banco-ponte, a separação entre a parte boa e a parte ruim da instituição, a reorganização sob qualquer forma, entre outras, a maioria já prevista em nosso atual arcabouço legal. Conforme muito bem apresentado pelos representantes de reguladores estrangeiros que hoje nos brindaram com excelentes apresentações, essa nova ferramenta – bail-in – já é realidade em muitas jurisdições e em breve o será nos demais países do G-20. Adotá-la não deixará o Brasil em posição competitiva desfavorável em relação às grandes nações que são seus pares. De outra forma, não recepcioná-la nos privará de um recurso que pode vir a ser crítico no momento mais agudo de uma futura crise. Quanto ao uso de recursos públicos, quero abordar essa questão por duas vertentes. A primeira trata da permissão de utilizá-lo. Como ficou claro a partir das discussões havidas nesses dias e da experiência acumulada em resolução, é preciso que os governos possam contar com essa opção para a solução de situações sistêmicas muito específicas e geralmente agudas. A própria Lei de Responsabilidade Fiscal, um dos pilares macroeconômicos que fundamentaram a construção da atual estabilidade financeira do Brasil, já previa que uma lei específica deveria disciplinar seu uso para esse fim. O anteprojeto que finalizaremos em breve, se aprovado, virá a ser essa lei específica. A segunda vertente é deixar claro que seu uso será sempre em situação de gravidade extrema e no interesse público – sempre a exceção; nunca a regra, portanto. A motivação para isso é cristalina: preservar o interesse público, configurado pela estabilidade financeira, os recursos dos contribuintes e limitar a solução do problema ao sistema que o deve conter. Essa abordagem tem dois objetivos principais: mitigar a disseminação do problema à economia real e reduzir o moral hazard, visto que os controladores e os administradores de instituições sujeitas a esses regimes jamais contarão com o salvamento de seu patrimônio pelo Estado. É para reduzir o moral hazard que pensamos prever o bail-in. Esse mecanismo e o uso de recursos públicos, longe de serem instrumentos incompatíveis, são ferramentas complementares e sinérgicas, cada qual sendo usada em situações específicas e bem delimitadas. No caso de liquidação de instituições não sistemicamente importantes, o projeto traz vários aprimoramentos para que esse regime possa atingir melhor seu objetivo: liquidar ativos para pagar passivos. A promoção da saída organizada do sistema nesse caso deve ser refletida na celeridade na consecução desse objetivo. Por exemplo, esse novo arcabouço permitirá alienar as carteiras de crédito das massas liquidandas com mais rapidez e menor risco. Em vez de levar tais créditos até o seu recebimento final, o liquidante poderá cedê-los rapidamente de modo a agilizar a satisfação aos credores no que for possível. Hoje, essa alienação esbarra na avaliação dos créditos para alienação e na percepção de risco nos liquidantes quanto à exposição legal de suas ações. Para contornar essas dificuldades, o projeto prevê a possibilidade de formação de um conselho de credores que, sob clara inspiração na lei de falências, compartilhará tal decisão com o liquidante. Outra inspiração da lei de falências está na proteção aos compradores dos ativos da instituição em relação a ações contra a massa liquidanda, uma barreira por vezes quase intransponível para a negociação desses ativos. Outra inovação já prevista é o estabelecimento do juízo universal, cujo benefício e a funcionalidade foram bem apresentados ontem pelo Dr. Eronides e por outros palestrantes. Por fim, cabe ressaltar a manutenção da estrutura de responsabilização na íntegra, incluindo a indisponibilidade e o arresto de bens, o inquérito administrativo conduzido pelo Banco Central e a participação do Ministério Público nas ações de responsabilização. Ferramentas fundamentais para o alinhamento de incentivos, reduzindo moral hazard. Para não me alongar em demasia, concluo que, em suma, esse anteprojeto será um instrumento que possibilitará alinhar nosso arcabouço de resolução às melhores práticas e à realidade atual dos sistemas financeiros, aumento sobremaneira a eficácia e a eficiência desses regimes. O anteprojeto já avançou muito no Banco Central e esse seminário permitirá concluí-lo com a serenidade e a maturidade necessárias. Concluiremos em muito breve as tratativas com nossos pares no Governo, notadamente a CVM, a Susep e o Ministério da Fazenda. Por certo que ainda envolveremos as entidades e os profissionais que vivenciam esse tema no Brasil, incluindo representantes das entidades reguladas sujeitas aos preceitos da futura lei. Essa discussão tenderá a ser rápida para aproveitar o momento oportuno, em linha com o apoio externado pelo Senador Lindbergh Farias em seu pronunciamento. Para encerrar, quero agradecer também a todos e a cada um dos membros das equipes que produziram esse anteprojeto em suas várias fases, em especial Maria Goreth e Marcelo Pires. Quero também agradecer à equipe que organizou esse bem sucedido evento, especialmente à Lilian Senna. Agradeço aos moderadores e aos palestrantes nacionais e internacionais por compartilharem conosco o conhecimento acumulado ao longo de tantos anos. Obrigado aos participantes nacionais e internacionais, especialmente os representantes de países de língua portuguesa e da ASBA, os colegas do Banco Central e os representantes das entidades reguladas e de suas associações, bem como os membros do FGC, nas pessoas dos Srs. Celso Antunes, júlio Araújo e Alexandre Abreu. Gostaria de expressa o meu sincero agradecimento aos representantes dos veículos de imprensa que acompanharam o seminário para prestar o relevante serviço de informação à população. Eventos como esse estreitam e fortalecem os laços da comunidade nacional e internacional de resolução no âmbito do sistema financeiro. Em um mundo tão interconectado, esse relacionamento será cada vez mais fundamental para mitigar os efeitos de futuras crises financeiras. Desejo aos participantes de outras cidades e países um feliz retorno às origens. Com essas palavras, declaro encerrado o seminário, esperando revê-los em outras oportunidades.