ANÁLISE DAS TENDÊNCIAS NA VELOCIDADE DO VENTO
Luiz Felipe Neris Cardoso 1 2, Maria Gertrudes A. Justi da Silva1, Igor Balteiro Pereira de
Campos1, Wanderson Luiz Silva1
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Universidade Federal do Rio de Janeiro – Departamento de Meteorologia
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[email protected]
RESUMO: Ao se procurar na literatura informações sobre tendências a longo prazo e as
possíveis conseqüências em cenários de mudanças globais, observa-se que as séries de vento
são menos analisadas do que séries de temperatura e precipitação, por exemplo. O presente
trabalho apresenta uma análise das tendências da velocidade do vento utilizando o teste nãoparamétrico de Mann-Kendall, associado ao de Curvatura Sen sobre uma base de dados de
reanálise do NOAA/ESRL PSD, com foco na América do Sul. Os resultados mostram uma
tendência de aumento da velocidade do vento para a maioria das áreas exceto para algumas
regiões continentais que, em geral, apresentaram tendências de decréscimo, isso quando são
significativas.
ABSTRACT: When looking for information in the literature regarding long-term tendencies
and their possible consequences on climate change scenarios, it is observed that the wind
datasets are less analyzed then other series, such as temperature and precipitation. The current
work presents an analysis of the wind speed tendencies using the statistical test of MannKendall associated with the Sen Curvature upon a reanalysis dataset from NOAA/ESRL PSD,
with focus on South America. The results show an increase tendency on the wind speed for
most of the analyzed areas except for some continental areas which, in general, present a
tendency to decrease, if any.
Palavras chave: tendências climáticas, velocidade do vento, Mann-Kendall
1. INTRODUÇÃO
O estudo do comportamento, tanto atual quanto futuro, do vento é de suma importância para
diversas áreas estratégicas para países e empresas. A produção de energia eólica, por exemplo, é
uma área que, por estar inserida no mercado de venda de ações para o futuro, é uma potencial
beneficiária destes trabalhos; para não mencionar áreas como agricultura, dispersão de
poluentes, engenharia civil etc.
Pesquisas na América do Norte (Pryor et al, 2009) que analisam tendências na velocidade do
vento apontam uma diminuição para esta região, seguindo a tendência de outros estudos com o
mesmo objetivo.
Faz-se, portanto, indispensável uma análise similar para a região da América do Sul visando a
análise de informações sobre o vento, as quais são relativamente escassas.
2. OBJETIVO
O presente trabalho tem o objetivo de determinar as possíveis tendências na velocidade do vento
que sejam estatisticamente significativas (α = 5%), principalmente para a região da América do
Sul, na esperança de poder contribuir positivamente na geração de informações relevantes a
serem utilizadas em áreas estratégicas como produção de energia, agricultura, dispersão de
poluição, etc.
3. MATERIAL E METODOLOGIA
3.1. Descrição dos Dados
Utilizou-se uma base de dados provenientes da reanálise do NOAA/ESRL PSD intitulada 20th
Century Reanalysis V2. Apesar de algumas desvantagens no uso de dados de reanálise, algumas
das razões que justificam seu uso são que estas séries são contínuas e homogêneas, além de
possuírem uma resolução espacial horizontal de 2° (lembrando que 1°  111 km), ou seja,
maior do que as demais reanálises do NCEP/NCAR que possuem 2,5° de resolução. Isto
permite resolver perturbações de escalas menores. A partir das médias mensais das
componentes u e v do vento a 10 metros para o período de janeiro de 1961 a dezembro de 2008
(48 anos), foi feito um cálculo da velocidade do vento à superfície..
A área de estudo englobava inicialmente as latitudes de 60S a 15N e longitudes de 90W a 30W.
No entanto, os resultados iniciais motivaram a ampliação da área de estudo para parte dos
trópicos e de todo o hemisfério sul.
3.2. Teste Mann-Kendall e Curvatura Sen
Diversos estudos apontam o teste de Mann-Kendall (Önöz et al, 2003) como um dos mais
indicados para análises de mudanças climáticas em longas séries de dados (Goossens & Berger,
1986). Ele foi aplicado sobre os dados de magnitude do vento previamente gerados.
Uma das diversas vantagens deste teste é que os dados não precisam pertencer previamente a
nenhuma distribuição probabilística particular e seu resultado é menos afetado por valores “fora
de série” ou outliers, uma vez que seu cálculo é baseado no sinal das diferenças e não
diretamente nos valores da variável analisada. Segue um esboço do teste em questão:
(1)
Onde,
(2)
(3)
E a estatística de teste Z é:
(4)
sendo, xj e xk valores da série analisada, g o número de ocorrência de grupos de valores t p iguais
nas séries de dados.
Um método não-paramétrico proposto conjuntamente por Theil (1950) e Sen (1968) foi
usado para estimar a magnitude de tendência, a curvatura Sen. Este método assume que
a tendência é linear, e que ela é a mediana de todas as inclinações encontradas entre
todos os pares possíveis de pontos da série de dados. O estimador desta inclinação é
dado pela equação abaixo, que é uma estatística igualmente robusta e resistente como
estimativa da tendência linear da série de dados.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
Na América do Sul (Figura1), observa-se aumento da velocidade do vento sobre os
oceanos e uma diminuição no quadrilátero que vai de 50°W até 65°W e de 15°S a 60°S,
aproximadamente, contemplando os estados do Rio Grande do Sul, Paraná e Mato
Grosso, bem como parte do Paraguai e da Argentina.
É possível inferir que há uma tendência de intensificação dos ventos alísios, de uma
maneira geral, o que também pode estar associada ao comportamento da borda
equatorial dos anticiclones subtropicais, principalmente do Pacífico.
Com a ampliação da área analisada (Figura 2), fica evidente que um aumento da
velocidade do vento está sendo detectado na região tropical como um todo e na e na
região subtropical do Hemisfério Sul e que há pelo menos três regiões nas latitudes
médias (geralmente sobre os oceanos), entre 35°S e 55°S, onde se observa núcleos de
diminuição da velocidade do vento logo abaixo de núcleos de aumento situados na
região tropical.
Pode-se sugerir uma possível relação, entre as três áreas tropicais com fortes tendências
positivas (da esquerda para a direita: Pacífico, África e Indonésia) e as áreas
extratropicais (entre 35°S e 55°S) com, comparativamente, fortes tendências negativas,
tendo em vista que estão posicionadas razoavelmente em longitudes correspondentes.
Ainda com relação aos oceanos, há também uma predominância de locais com
tendências significativas ao longo dos oceanos, o que não ocorre para os continentes.
Figura 1 - Tendência da velocidade do vento para a área inicial de estudo. A figura da direita mostra as
regiões onde a tendência estatística foi significativa ao nível de 0,05. A escala à direita denota o valor
associado à tendência em m/s. As áreas com tendência de aumento da velocidade do vento estão
assinaladas com cores que variam entre o amarelo e o vermelho; aquelas com tendência de diminuição
são representadas pelas cores que variam do azul claro ao azul escuro e as regiões sem tendência
estatisticamente significativa são representadas pela cor branca.
Figura 2 - Tendência da velocidade do vento sobre área de estudo ampliada para ao redor do globo
abrangendo a região tropical e o Hemisfério Sul. Na figura inferior, estão destacadas as regiões onde o
teste estatístico foi significante, com α = 0,05.
5. CONCLUSÕES
As principais conclusões a serem extraídas deste trabalho foram:
1. A tendência de aumento da velocidade do vento é predominante ao longo da área de
estudos, sobretudo na faixa tropical, aproximadamente na região de convergência dos
ventos alísios. Uma possível explicação para isto seria uma intensificação da borda
equatorial dos sistemas de alta pressão subtropicais.
2. É inegável que o continente sul-americano apresenta uma tendência de diminuição da
velocidade do vento na faixa central e a sudoeste. As razões para as tendências encontradas
ainda não são claras, podendo ser uma motivação para os futuros passos deste trabalho.
3. Verifica-se a necessidade, inclusive sugerida por outros autores (Klink, 2001 e 2002), de se
utilizar uma variedade de base de dados para análises de vento de modo a reforçar os
resultados, bem como de se utilizar dados de maior resolução para refinar a análise e
atribuir as causas das tendências, o que fica como sugestão de seguintes passos.
De uma maneira geral, sabe-se que a velocidade do vento é afetada por fenômenos de grande e
pequena escala (Klink, 2001 e 2002), o que aponta, respectivamente, para fatores como
trajetória e frequência de ciclones e anticiclones, urbanização, mudança no uso do solo e
topografia.
6. AGRADECIMENTOS: Deve-se reconhecer a contribuição da FAPERJ que financiou a
bolsa de iniciação científica do primeiro autor deste trabalho, bem como a utilidade das
instalações e equipamentos do GEPAC/UFRJ1.
7. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
Compo G.P. et al. The Twentieth Century Reanalysis Project. Q J ROY METEOR SOC.
Revised on 30 October 2010.
Goossens, C. and Berger, A. 1986. Annual and seasonal climatic variations over the northern
hemisphere and Europe during the last century. ANN GEOPHYS, Berlin, v.4, n.B4, 385-400.
Klink, K. 2001 and 2002. Trends and Interannual Variability of Wind Speed Distributions in
Minnesota. NOTES CORRESP.
Önöz, B.; Bayazit, M. C. 2003. The power of statistical test for trend detection. TURK J ENV
SCI, 27, 247-251.ENG.
Pryor, S. C. et al. Wind speed trends over the contiguous United States, J GEOPHYS RES, 114,
D14105, 2009.
Pryor, S. C. and Ledolter J. (2010), Addendum to “Wind speed trends over the contiguous
United States,” J GEOPHYS RES, 115, D10103, doi:10.1029/2009JD013281.
Sen, P. K. Estimates of the regression coefficient based on Kendall’s tau. J AM STAT ASSOC,
v. 63, p. 1379-1389, 1968.
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Grupo de Estudos, Previsões e Análises Climáticas do Departamento de Meteoologia da UFRJ
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