4 DIÁRIO CATARINENSE, QUARTA-FEIRA, 25 DE MAIO DE 2011 Reportagem Especial PROFESSORES PARADOS Guerra de informações JÚLIA ANTUNES LORENÇO [email protected] ENTREVISTA Marco Tebaldi Secretário de Estado da Educação FOTOS FELIPE CARNEIRO, BD, 23/05/2011 A greve do magistério da rede estadual completa uma semana hoje. Ontem, em assembleias regionais, os professores optaram por continuar a paralisação, mesmo com a medida provisória (MP) – assinada na última segunda-feira pelo governador em exercício, Eduardo Pinho Moreira – que estabelece novo piso salarial. A proposta foi rejeitada pelo Sindicato dos Trabalhadores em Educação (Sinte) porque, para os educadores, desconsidera a progressão na carreira. Apesar de o governo afirmar que só reabrirá as negociações quando a greve terminar, o Sinte vai pedir, hoje, um novo encontro com representantes do Estado e solicitou ajuda dos deputados estaduais. A expectativa deles é que amanhã haja uma reunião. Sem receber o pedido, Pinho Moreira não se manifestou. Por enquanto, vale a posição anunciada na segunda-feira. O secretário de Educação, Marco Tebaldi, falou que sempre estará disposto a conversar, mas só vai retomar as negociações com a volta das aulas. O DC entrevistou o secretário e a coordenadora estadual do Sinte, Alvete Bedin, para que os dois dessem a versão deles sobre o momento. O resultado é uma guerra de informações e versões entre sindicato e governo. Eu sei, você sabe e os outros sabem que o governo não tem condições de pagar. Nossa folha do magistério é de R$ 109 milhões. De onde arrumaremos mais R$ 100 milhões por mês? “O piso está dado e agora eles têm que voltar às aulas” Diário Catarinense – Com essa medida provisória,SC cumpre a lei do piso? Marco Tebaldi – Lógico. Hoje o Estado está legal. DC – Ao cumprir a lei do piso,o governo deixa de lado a progressão da cargos e salários do professor? Tebaldi – Como não respeitou a progressão? Não era o piso que o sindicato queria? O sindicato não pressionou e fez greve por que queria o piso? O que eu dizia no início? Vamos aguardar um pouco, para sair as regras e para fazer algo melhor, mas não tivemos tempo, porque o sindicato pressionou.A carreira vai ser uma outra discussão.Agora o Estado está cumprindo a lei do piso. DC – O governador Raimundo Colombo elegeu-se falando em meritocracia. Como um professor vai buscar aperfeiçoamento se a tabela salarial não acompanha a progressão? Não é contraditória a fala? Tebaldi – Até ontem eles não falaram que queriam o piso? A decisão pode ser mudada,mas não para amanhã.Não posso dar um prazo para que que a gente tenha condições de atender a todos. DC – O governo está disposto a discutir a carreira? Tebaldi – O governo está disposto a discutir e, inclusive, melhorar a carreira. Mas tem que ser com mais calma, não pode ser de um dia para outro. Então, voltem às aulas e com tempo iremos construir isso juntos.Nós queremos melhorar. DC – Por que não é possível pagar o piso acompanhando a progressão? Tebaldi – Eu sei, você sabe e os outros sabem que o governo não tem condições de pagar isso.A nossa folha do magistério é de R$ 109 milhões, de onde arrumaremos mais R$ 100 milhões por mês? Ultrapassa a Lei de Responsabilidade Fiscal, ultrapassa o orçamento. Não temos dinheiro, não adianta. Em momento algum quisemos enganar. Estamos falando a verdade. Queremos melhorar e encontrar a solução em conjunto. Iremos buscar mais recursos. Estou em Brasília, quero ver se com os demais secretários estaduais de Educação encontramos uma forma de dialogar com o ministro da Educação, para ver de que maneira eles podem ajudar a gente. O procurador-geral da República disse aos ministros do Supremo (Tribunal Federal) que o governo federal iria auxiliar aqueles estados com dificuldades para cumprir o piso. Se o procurador falou isso, por que o governo federal não pode nos ajudar? DC – A publicação do acórdão pode mudar ainda alguma coisa do que foi proposto? O quê? Tebaldi – Temos uma medida provisória, que pode ser mudada. Cumprimos o piso, estamos dentro da lei, estamos ampa- rados,saindo o acórdão podemos melhorar essa questão da carreira. DC – A greve foi precipitada? Por quê? Tebaldi – Porque ainda tem muita coisa para ser conversada. Tem o acórdão, ele vai dar condições de fazer outras coisas, que não foram feitas agora, porque temos uma insegurança jurídica. Pode mudar a questão de incorporação da regência e do Prêmio Educar ao salário. Se isso vier claro no acórdão,já melhora bastante. Por que o sindicato não esperou um pouquinho para sair esse acórdão? Na minha opinião, eles não têm por que reclamar. O piso está dado e agora eles têm que voltar às aulas para restabelecer um diálogo, com um pouco mais de calma, para nós encontrarmos uma saída. DC – O Sinte garante que a greve continua.O que o Estado pretende fazer? Tebaldi – O que nós podíamos fazer nós fizemos. Quanto mais eles ficarem em greve, pior vai ser para todo mundo. Para o governo, tem-se um desgaste, não podemos negar isso. Para o sindicato, ele vai entrar num túnel sem fim, ou eles ficam para sempre em greve ou daqui a pouco eles voltam. Se for para voltar daqui a um mês ou hoje, que voltem hoje. Daí não tem prejuízo para o aluno, que deixa de ser prejudicado. Eu respeito a greve, mas essa devia ser a última instância deles. Podem falar o que quiserem, mas estamos legais perante o piso e perante a carreira. 5 DIÁRIO CATARINENSE, QUARTA-FEIRA, 25 DE MAIO DE 2011 e versões marca greve ENTREVISTA Interior volta a ser cenário de protestos Alvete Bedin Coordenadora estadual do Sinte Essa medida achata e acaba com o plano de carreira do magistério público catarinense, conquistado na década de 1980, através de uma das maiores greves do nosso Estado. “Não tenho dúvidas de que o governo pode pagar” Diário Catarinense – Com essa medida provisória, Santa Catarina cumpriu a lei nacional do piso? Por que não foi aceita pela categoria? Alvete Bedin – Com a medida provisória, o Estado simplesmente aplica o piso de maneira linear na carreira e retira todos os artigos das leis que garantiam a progressão. Ele revoga as leis complementares, leis promulgadas em 1995 e 1992, tirando todos os direitos de progredir. Essa medida achata e acaba com o plano de carreira do magistério público catarinense, conquistado na década de 1980, através de uma das maiores greves do nosso Estado.Por isso rejeitamos. DC – Ao cumprir a lei do piso, o governo deixa, então, de lado a progressão de cargos e salários do professor? Alvete – Essa MP achata a tabela e tira todos os nossos direitos de progredir e o nosso estímulo de formação. DC – O governador Raimundo Colombo elegeu-se falando em meritocracia. Como um professor vai buscar aperfeiçoamento se a tabela salarial não acompanha a progressão? Não é contraditória a fala? Alvete – É para lá de contraditório. A meritocracia, da forma como o governo já vinha querendo implantar, era punitiva, porque a partir do momento que você avalia o professor, com pais e alunos, ela funcionava de uma maneira de punir e não de estimular o professor a progredir. Imagina agora, acabando com o plano de carreira? Não concordamos em hipótese nenhuma com a meritocracia que o governo vem propondo. pode chegar a 49% pela Lei de Responsabilidade Fiscal. Tem várias saídas: dinheiro do Fundeb, da folha e o crescimento da arrecadação. Não tenho dúvidas de que o governo pode pagar. DC – O Sinte está aberto a novas negociações com o governo? Alvete – Quem se fechou foi o governo. Ele fechou portas.A posição dele foi determinante, quando disse que eles estavam apresentando uma proposta e não abririam nenhuma negociação. Foi simplesmente a apresentação de uma proposta, eles não estavam conversando conosco. Falaram que só voltariam a negociar quando voltássemos às aulas.Ficamos duas horas (na última segunda-feira) tentando convencer o governo de que pegaríamos a proposta deles, e até quinta-feira apresentaríamos uma proposta nossa a eles. Quem nega negociação,agora,é o governo. DC – Com a medida provisória, o sindicato ainda vai buscar algum recurso? Alvete – Hoje (ontem) fomos à Assembleia Legislativa pedindo aos deputados que não votem nessa medida provisória. Temos certeza que a Assembleia vai ficar do nosso lado. Nós queremos que os professores sejam beneficiados, mas queremos que isso seja garantido na tabela para todos. DC – O Estado alega que não tem dinheiro para acompanhar a progressão na carreira.O que o Sinte propõe? Alvete – Uma proposta é desvincular o repasse do dinheiro do Fundeb (Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica) da Assembleia Legislativa, esse dinheiro de desvinculação representa cerca de R$ 36 milhões. A outra é a questão do crescimento da arrecadação, que aumentou. Tem mais uma, que é a folha de pagamento do governo ao Executivo, que está em 42% e A terça-feira foi de assembleias regionais do Sinte e protestos por todo o Estado. Insatisfeitos com a proposta do governo, cerca de 300 professores da região serrana se reuniram novamente no auditório da Escola de Educação Básica Vidal Ramos Junior, em Lages, para discutir a proposta e encaminhar novos manifestos. Em Chapecó, os professores fizeram uma assembleia na Catedral Santo Antônio e decidiram continuar em greve. Hoje, às 14h, eles protestam em frente à Secretaria de Desenvolvimento Regional e saem em passeata até a prefeitura. Joaçaba terá uma reunião entre os professores e o secretário de Desenvolvimento Regional, Jair Lorensetti,para pressionar por uma solução. No Sul do Estado, os professores fizeram assembleias regionais em Tubarão e Criciúma.Em Tubarão,cerca de mil educadores de 15 cidades da regional mantiveram a greve e vão agora em busca da adesão de professores de cidades menores que ainda não pararam de trabalhar. Já em Criciúma, 800 professores, reunidos na Escola Sebastião Toledo dos Santos, conhecida como Colegião, também rejeitaram a proposta do Estado e marcaram um bandeiraço para quinta-feira, na Avenida Centenário,no Centro da cidade. No Vale do Itajaí, Blumenau teve uma passeata de 500 professores na Rua XV de Novembro. Em Balneário Camboriú, 800 educadores de 11 municípios da região fizeram uma assembleia seguida de passeata pela Avenida Atlântica, onde queimaram a tabela salarial do governo. As divergências ● priu a lei do piso nacional do magistério, ao pagar R$ 1.187 para todos os 35 mil professores, 53% da rede estadual, que ainda não recebiam o valor no salário-base. Ele continua pagando o Prêmio Educar (R$ 200) e a regência de classe (40% ou 25% sobre o salário). Isto vale para a folha de maio. Novas negociações apenas quando a greve terminar. O governo ainda espera a publicação do acórdão do STF para analisar o que fazer. DC – A greve foi precipitada? Por quê? Alvete – Em hipótese alguma.O governo teve todo tempo, todas as formas e oportunidades para apresentar uma proposta. Em fevereiro, começamos essa discussão. Em abril, o STF (Supremo Tribunal Federal) julgou a lei constitucional. A greve surgiu quando não havia mais nenhuma chance de negociação. ● DC – A medida provisória vai beneficiar 53% dos professores. Com isso, o movimento ficou dividido? Alvete – Não, o movimento continua forte, o resultado são as assembleias regionais (feitas ontem), que continuam com a mesma força. A categoria já compreendeu que o que foi apresentado não é o que os professores merecem na carreira. Para o Estado – O governo acredita que cum- Para os professores – A proposta não agradou porque, para eles, não respeita a progressão na carreira, o que desestimularia a busca pela qualificação. O reajuste do professor com ensino médio, que passou de um salário-base de R$ 609 para R$ 1.187, não foi repassado a quem tem pósgraduação, por exemplo, porque este já ganhava uma salário-base acima do piso. A diferença salarial inicial entre eles cai de R$ 883 para R$ 305. Em percentuais, reduz de 145% para 25,6%.