Apresentação José Ricardo C.M. Ayres Livre Docente em Medicina Preventiva FMUSP É da maior relevância a iniciativa de publicar um texto de divulgação sobre a medicina homeopática, porque ainda é escasso o conhecimento que o grande público tem acerca dos fundamentos dessa prática, das concepções de saúde, doença e cuidado que adota. Esse conhecimento, no entanto, é fundamental para evitar confusões e preconceitos, que muitas vezes levam a confundir homeopatia com práticas místicas, supersticiosas, quando não mesmo com charlatanismo, o que é mais grave. Como conseqüência de qualquer uma dessas posturas, ou mesmo da simples ignorância e desinteresse, pode-se perder oportunidades preciosas de conhecer uma tradição médica de grande sensibilidade para o humano e utilizado por um crescente número de pessoas como resposta às suas necessidades de cuidado. A homeopatia é uma prática baseada em princípios racionais e evidências empíricas, embora de natureza bastante diversa daqueles que instruem a medicina convencional, chamada de alopatia, ou biomedicina. O modo como a homeopatia interpreta os processos saúde/doença, o processo de diagnóstico e a intervenção terapêutica são diversos, embora não necessariamente contrários ao da biomedicina. Apenas olha de outro ângulo, com outras preocupações e outros fundamentos, as mesmas experiências de adoecimento. Lançando mão de uma analogia grosseira, é como se sobre um mesmo cesto de maçãs se debruçassem diferentes olhares, com propósitos diversos. Para um cozinheiro, por exemplo, interessaria ver nas maçãs a madurez, a quantidade, a acidez etc, com vistas a produzir alguma guloseima. Para um artista talvez interessasse o volume, as proporções, o contraste de cores e sombras etc, já antevendo um quadro de natureza morta. A questão é saber o que busca “ver” a medicina homeopática na experiência do adoecimento e o que pretende produzir com essa “visão”. É isso que o livro de Rosenbaum ajuda a entender. O autor chama a homeopatia de uma “medicina do sujeito”. Alguns poderiam argumentar: mas medicina do sujeito não são todas, isto é, a medicina não está sempre voltada para seres humanos? Outros poderiam, no sentido inverso, argüir: pode alguma medicina ser “do sujeito”, não dependerão todas elas de que, de alguma forma, os indivíduos sejam tomados como “objeto” de conhecimento e intervenção? Sim, ambas as contestações têm sua dose de razão. Mas o que Rosenbaum nos mostra é que na homeopatia o sujeito humano não é apenas o destinatário dos benefícios da terapêutica, mas é ativo partícipe da construção do diagnóstico e da estratégia terapêutica. De outro lado, é verdade, sim, que a homeopatia constrói objetos pela e para a intervenção, mas esses objetos não substituem os sujeitos na cena do cuidado, eles apresentam o sujeito ao médico e representam, perante o médico e o próprio paciente, a história de saúde e doença sobre a qual este quer interferir. Essa delicada e complexa relação terapêutica, ninguém melhor para nos apresentar que Paulo Rosenbaum, um dos maiores estudiosos do assunto no país, que reúne em sua bagagem uma sólida e bem sucedida experiência clínica e um incansável e rigoroso estudo das bases conceituais da medicina homeopática. Deixemos então que sua autoridade e generosidade nos conduza por esse fascinante e desconhecido caminho.