LEI MARIA DA PENHA E O PRINCÍPIO DA ISONOMIA Carlos Takashi Gomes Sato Netto (PIBIC/Fundação Araucária - UENP), Valter Foleto Santin (Orientador), e-mail: [email protected] Universidade Estadual do Norte do Paraná / Centro de Ciências Sociais Aplicadas Palavras-chave: Lei Maria da Penha, isonomia, gênero Resumo: A criação da lei 11.340/2006, mais conhecida como “Lei Maria da Penha” ocasionou muita polêmica, sobretudo no meio jurídico. A presente legislação veio como uma medida de discriminação positiva por parte do Estado, que passou a dar certos benefícios legais ao gênero feminino, na tentativa de conter a violência contra as mulheres. O grande debate surgiu da tese de que essa proteção legal estaria ferindo o princípio da isonomia. Para uns a constitucionalidade desta lei é questionada, pois não trata à todos de forma igualitária. É este ponto que este trabalho se propõe a tratar. Introdução: A agressão contra mulheres, indubitavelmente, é um dos piores crimes que existem. É dito isto, pois ao contrário de outros tipos de crime onde o autor nem sequer conhece a vítima, neste ele é proveniente de uma relação afetiva íntima com ela. Assim como um câncer que corrói parte do organismo, a violência doméstica destrói a célula mater de nossa sociedade: a família. Esse tipo de violência é extremamente democrático, pois não escolhe nível social, etnia, religião. Apesar de ser maior em ambientes de menor nível social, é comum encontrarmos agressores que se apresentam como homens distintos, cuja imagem pública é isenta de qualquer suspeita. A probabilidade das agressões aumenta com o tempo de convivência. Essa evolução gradativa faz com que essas mulheres, cansadas após sofrerem caladas por tantos anos, muitas vezes dividindo sua dor apenas com familiares e amigos, venha buscar ajuda no judiciário. Infelizmente não são todas que tomam essa atitude, ou por ter medo de represália por parte de seu companheiro, ou devido à resignação por amá-lo e não querer o seu mal e nem a desestruturação da família. Foi justamente para amparar essas mulheres, que muitas vezes sofrem caladas, que a Lei Maria da Penha foi elaborada. Esta lei trouxe muitas novidades que beneficiam o gênero feminino. Maria Berenice Dias nos diz que ela é muito mais do que uma lei, é um verdadeiro estatuto que atenta ao caso da violência doméstica. Segundo ela, a falta de consciência de que a violência intrafamiliar merecia um tratamento diferenciado é histórica. Anais do XVIII EAIC – 30 de setembro a 2 de outubro de 2009 Apesar de estar decantando com o tempo, ao ser criada a “Maria da Penha” provocou grande polêmica quanto a sua constitucionalidade. A questão que a corrente contrária a esta lei coloca é se ela não estaria ferindo o princípio da isonomia, ou seja, da igualdade entre os gêneros. Para estes, ao invés de se criar esta lei, deveria serem criadas normas que coibissem não apenas a violência contra a mulher, mas toda as formas de violência doméstica. São partidários desta opinião Antonio Sérgio Vieira ROMA e Valter Foleto SANTIN. A opinião majoritária, no entanto, é favorável à presente lei. Baseando-se na máxima aristotélica: “tratar igualmente os iguais e desigualmente os desiguais”, essa corrente defende as chamadas “ações afirmativas” em benefício das mulheres. Maria Berenice DIAS e Stela Valéria Soares de Farias CAVALCANTI defendem essa tese. Materiais e Métodos Estudo de obras doutrinárias, acompanhamento dos trabalhos do Núcleo de Apoio à Família e à Mulher do Programa Universidade Sem Fronteiras – UENP, observação de simpósios e debates tratando da Violência de gênero. Resultados e Discussão Basicamente as opiniões quanto à esta temática se dividem em duas: os que apoiam a Lei Maria da Penha e os que se opõe à ela, chegando até mesmo a questionar sua constitucionalidade. Como base bibliográfica da primeira corrente foram selecionadas as obras “A Lei Maria da Penha na Justiça”, de Maria Berenice Dias, e “Violência Doméstica”, de Stela Valéria Soares de Farias Cavalcanti. Segundo essas autoras a lei é constitucional. A discriminação positiva adotada pelo Estado nada mais é do que uma forma de ação afirmativa para equilibrar uma desigualdade histórica que vitimou as mulheres ao longo dos tempos. Mesmo com toda a conquista de espaço na sociedade pelo gênero feminino, ainda hoje, muitas vezes, elas ainda são vistas como seres inferiorizados. CAVALCANTI nos fala que, portanto, essa desigualdade formal usada pelo Estado é legítima, pois vem a equiparar uma desigualdade material de nossa sociedade. Ou seja, que a Lei só veio compensar uma desvantagem que as mulheres apresentam em face ao seu gênero oposto. DIAS nos diz na apresentação de seu livro que “a partir de agora a mulher pode denunciar, sem temer que sua palavra não seja levada a sério. Basta aplicar-se a nova lei. E, por mais que se tente minimizar a eficácia e questionar a validade da nova emenda, a Maria da Penha veio para ficar.”. Do outro lado temos como base os argumentos de ROMA e SANTIN, presentes em seus artigos. O primeiro, em seu trabalho intitulado: “Lei Maria da Penha: Ação Afirmativa ou Discriminação Negativa?”, traz sua opinião: “Ninguém em sua normalidade psíquica é a favor do uso de qualquer tipo de violência, mas o emprego de sanções de maneira discriminada para favorecer de forma politiqueira uma parcela da sociedade viola o princípio Anais do XVIII EAIC – 30 de setembro a 2 de outubro de 2009 constitucional da isonomia.”. Já SANTIN, por sua vez, em seu artigo “Igualdade Constitucional na Violência Doméstica” conclui que: 1) O benefício legal exclusivo de um gênero da espécie humana, a mulher, e o maior rigor legal ao homem, pessoa do sexo masculino, constante da Lei 11.340, ferem os princípios constitucionais da igualdade, da isonomia entre pessoas de sexos diferentes e de cônjuges, devendo ser alterada a nomenclatura legal para termo adequado comum de dois gêneros; 2) A possibilidade de transposição de eventuais vícios constitucionais, é através da interpretação do termo “mulher”, constante da Lei 11.340/2006, como “cônjuge” ou “convivente” ou “coabitante” ou “familiar”, ou para tratar de “mulher ou homem”, de forma que a mulher e o homem sejam protegidos e reprimidos igualmente pelo sistema legal, por eventual violência doméstica em desfavor do outro, pois a violência doméstica pode ser sofrida por cada um dos membros da família, não apenas a mulher. Conclusões Após analisarmos a problemática, chega-se a seguinte conclusão: apesar de ainda haverem discordâncias a respeito da constitucionalidade da Maria da Penha, esta tende a se solidificar no sistema jurídico brasileiro. Assim como as cotas fornecidas por universidades públicas, e outras formas de ações afirmativas, esses benefícios dado às mulheres são necessários enquanto persistir essa diferença entre os dois gêneros. Apesar da mulher estar conquistando o seu espaço na sociedade, ainda é fato que na grande maioria dos lares brasileiros elas muitas vezes dependem de seu parceiro afetivo-financeiro-emocionalmente. Sendo assim, para que elas se sintam protegidas para denunciar esse crime que tem se intensificado aos olhos da justiça, diariamente, essa medida protetiva do Estado foi importantíssima. Daqui alguns anos veremos a questão com a vantagem de poder olhar com uma certa perspectiva, e aí sim poderemos balancear se ela trouxe benefícios notáveis à nossa sociedade. Porém, a questão quanto à sua constitucionalidade se apresenta de forma clara: enquanto houver desigualdades formais é necessário que o Estado adote algumas medidas para que haja um equilíbrio, ou seja, justiça. Agradecimentos Antes de mais nada aos meus pais, que são os maiores responsáveis por minha vida, e consequentemente por este trabalho. À Fundação Araucária, que através de sua bolsa vem fomentando o desenvolvimento científicotecnológico em todo o território paranaense. Ao meu orientador Valter Foleto Santin, que mesmo com sua rotina atribulada, conseguiu transmitir um pouco de seu conhecimento empregado neste projeto. E por fim, à Anais do XVIII EAIC – 30 de setembro a 2 de outubro de 2009 Universidade Estadual do Norte do Paraná, da qual eu tenho orgulho de ver e participar de seus primeiros passos. Referências Barbosa, Andresa Wanderley de Gusmão; Cavalcanti, Stela Valéria Soares de Farias. A constitucionalidade da Lei Maria da Penha . Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1497, 7 ago. 2007. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=10249>. Acesso em: 06 fev. 2009. Brega Filho, Vladimir; Alves, Fernando de Brito. O direito das mulheres: uma abordagem crítica. In: Conpedi, 2008, p. 2160-2176. Disponível em: http://conpedi.org/manaus/arquivos/anais/salvador/vladimir_brega_filho.pdf. Acesso em: 21 fev. 2009. Cavalcanti, Stela Valéria Soares de Farias. Violência Doméstica: análise da Lei “Maria da Penha”, n. 11.340/2006. Salvador: Podivm, 2007 Dados da Fundação Perseu Abramo, 2001. Disponível em:http://www2.fpa.org.br/portal/modules/news/article.php?storyid=227. Acesso em: 23 fev. 2008. Dias, Maria Berenice. A Lei Maria da Penha da Justiça. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007 Eluf, Luiza Nagib. A Lei Maria da Penha. On-line. Disponível em http://pfdc.pgr.mpf.gov.br/clipping/abril/a-lei-maria-da-penha-1/. Acesso em: 5 fev. 2009. Roma, Antônio Sérgio Vieira. Lei Maria da Penha: Ação Afirmativa ou Discriminação Negativa?. On-line. Disponível em http://www.adepolma.com.br/default.asp?id=3&ACT=5&content=146&mnu=3 . Acesso em: 6 fev. 2009. Santin, Valter Foleto. Igualdade constitucional na violência doméstica. Online. Disponível em: http://www.apmp.com.br/juridico/santin/. Acesso em: 06 fev. 2009. Anais do XVIII EAIC – 30 de setembro a 2 de outubro de 2009