UNIJUÍ - UNIVERSIDADE REGIONAL DO NOROESTE DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL
IVO TERNUS
O PODER DE POLICIA E O ABUSO DE AUTORIDADE NO ÂMBITO DA BRIGADA
MILITAR
Ijui (RS)
2013
IVO TERNUS
O PODER DE POLICIA E O ABUSO DE AUTORIDADE NO ÂMBITO DA BRIGADA
MILITAR
Trabalho de Conclusão do Curso de
Graduação em Direito objetivando a
aprovação no componente curricular
Trabalho de Curso - TC.
UNIJUÍ - Universidade Regional do
Noroeste do Estado do Rio Grande do
Sul.
DEJ- Departamento de Estudos Jurídicos.
Orientadora: MSc. Ester Eliana Hauser
Ijui (RS)
2013
2
Dedico este trabalho à minha família, pelo
incentivo, apoio e confiança em mim
depositados durante toda a minha
jornada.
AGRADECIMENTOS
À minha família, que sempre esteve presente e me incentivou com apoio e
confiança nas batalhas da vida e com quem aprendi e dividi que os desafios são as
molas propulsoras para a evolução e o desenvolvimento.
À minha orientadora Ester Eliana Hauser, com quem eu tive o privilégio de
conviver e contar com sua dedicação e disponibilidade, me guiando pelos caminhos
do conhecimento.
Aos meus colegas e amigos, que sempre colaboraram quando solicitados,
com boa vontade e generosidade, enriquecendo o meu aprendizado.
“O começo da sabedoria é encontrado na
dúvida; duvidando começamos a questionar, e
procurando podemos achar a verdade.” Pierre
Abelart
RESUMO
O presente trabalho de conclusão de curso propõe-se a analisar o poder de
polícia e o abuso de autoridade no âmbito da Brigada Militar, avaliando o papel
desempenhado pelos órgãos responsáveis pela segurança pública no Brasil. Busca
analisar o poder de polícia conferido ao policial militar para o exercício das funções
relativas a garantia da ordem pública, com vistas a segurança e a tranquilidade social
em todo território brasileiro, demonstrando que este, enquanto representante estatal,
deve atuar seguindo as normas legais para que os objetivos de sua presença e ação
sejam cumpridos. Também analisa os excessos cometidos que, por não encontrarem
respaldo legal, caracterizam-se como abuso de autoridade, o que possibilita a
responsabilização administrativa, civil e penal do agente público. Para realizar suas
funções, especialmente as relacionadas a segurança pública, o Estado possui um
poder legitimo de atuação, que se bem utilizado assegura a realização das
necessidades do povo e o desenvolvimento do estado democrático de direito. Mas
sempre que ocorre abuso do poder o Estado, por intermédio de seus agentes,
extrapola os limites de controle estabelecidos em lei o que coloca em risco os direitos
de liberdade dos cidadãos e torna o poder de polícia um poder abusivo e ilegítimo.
Palavras-Chave: Segurança Pública. Policial Militar. Poder de Polícia. Abuso
de autoridade. Responsabilização.
ABSTRACT
This work of completion is proposed to analyze the police power and abuse
of authority under the Military Brigade, assessing the role played by the agencies
responsible for public security in Brazil. Analyzes the police power conferred to the
military police for the exercise of functions relating to guarantee public order, with a
view to social security and tranquility throughout the Brazilian territory, demonstrating
that while state representative, must act according to the legal the goals of their
presence and action are met. It also examines the excesses that not finding legal
support, characterized as abuse of authority, which allows the administrative
accountability, civil and criminal public official. To perform its functions, especially
those related to public safety, the state has a legitimate power of action, which is well
used ensures the realization of the needs of the people and development of the
democratic rule of law. But whenever there is abuse of power the state, through its
agents, extends beyond the control limits established in the law that endangers the
rights of freedom of citizens and the police power becomes a power abusive and
illegitimate
Keywords: Public Safety. Military Police. Police Power. Abuse of authority.
Accountability.
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ............................................................................................................ 8
1 SEGURANÇA PÚBLICA, PODER DE POLICIA E A ATUAÇÃO DA BRIGADA
MILITAR .................................................................................................................... 11
1.1 Segurança publica e atividade policial na Constituição Brasileira de 1988. 13
1.2 A polícia militar e suas atribuições ................................................................ 17
1.3 Poder de polícia ................................................................................................ 23
1.4 O poder de polícia no âmbito da Brigada Militar ........................................... 25
2 O ABUSO DE AUTORIDADE NO AMBITO DA BRIGADA MILITAR ................. 30
2.1 O abuso de autoridade segundo a lei 4.898/65 ............................................... 30
2.2 A responsabilidade Penal, Civil e administrativa decorrente do abuso de
autoridade ............................................................................................................... 37
2.3 A competência para julgamento do crime de abuso de autoridade – Súmula
172 do STJ ............................................................................................................... 39
2.4 As garantias individuais, os limites do poder de polícia e o abuso de
autoridade no âmbito da Brigada Militar ............................................................... 42
2.5 Violência policial e o papel da polícia Militar no Estado Democrático de
direito ...................................................................................................................... 50
CONCLUSÃO ........................................................................................................... 55
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 59
8
INTRODUÇÃO
A Constituição Federal de 1988 define o Brasil como um Estado
Democrático de Direito e estabelece um rol de direitos civis, políticos, sociais e
coletivos, que são garantias fundamentais do cidadão e da sociedade. Dentre os
direitos fundamentais encontram-se os direitos de liberdade, também conhecidos
como direitos de primeira geração, que visam proteger o homem contra abusos ou
intervenções arbitrárias praticadas pelo Estado através de seus agentes no exercício
do poder.
Apesar dos limites estabelecidos pelo texto da constituição e pela legislação
infraconstitucional não são raras as situações que os direitos de liberdade sofrem
violações, colocando o cidadão em uma situação de fragilidade perante o poder do
Estado, que deve buscar controlar sua ação para consolidar um verdadeiro Estado
Democrático de direito.
Tendo como referência esta realidade, o trabalho apresenta um estudo
acerca do poder de policia estatal, notadamente aquele conferido à polícia militar,
enfocando o agir do agente policial, bem como os limites impostos a sua atuação
que, quando respeitados, asseguram legitimidade a ação, mesmo quando esta é
coercitiva e necessária para a manutenção da ordem e da segurança pública.
O objetivo geral do estudo é analisar o poder de policia e o abuso de
autoridade no âmbito militar e identificar alguns aspectos destacados quanto sua
ocorrência e possibilidades de prevenção para a proteção dos direito e garantias
individuais dos cidadãos. Busca-se também demonstrar qual o papel da Brigada
Militar, enquanto órgão encarregado pela segurança pública, avaliando, a partir da
9
Constituição Brasileira de 1988, quais os principais aspectos da atividade policial
militar, distinguindo as atribuições da polícia militar e dos demais órgãos
encarregados da segurança pública.
Pretende-se, por fim, avaliar as consequências do uso da arbitrariedade
policial, a aplicabilidade da lei de abuso de autoridade e juízo competente, bem
como as sanções cabíveis aos servidores militares diante da prática do crime de
abuso de autoridade, buscando demonstrar a relevância dos órgãos de segurança
pública num estado democrático de direito e a importância destes atuarem de acordo
com a legalidade estabelecida.
Para a realização do trabalho foram efetuadas alem de pesquisas
bibliográficas, pesquisas pelo meio eletrônico, analisando conteúdos que tratam do
poder de policia, a atuação da policia no Brasil e em especifico no Estado do Rio
Grande do Sul, a fim de enriquecer a pesquisa que não esgota o assunto em função
de sua complexidade e sua abrangência. Na vida social contemporânea, baseada
em preceitos básicos de cidadania e que tem centrado no Estado o dever de agir
para garantir uma vida social harmônica, respeitando as garantias individuais, e os
direitos do homem o debate desta temática se mostra sempre relevante.
O primeiro capítulo trás uma abordagem da segurança pública, poder de
policia e a atuação da brigada militar no Estado do Rio Grande do Sul, com base na
ordem constitucional de 1988 e demais normas infraconstitucionais. Buscou-se,
neste capítulo, focar a Segurança pública e atividade policial na Constituição
Brasileira de 1988, a Polícia Militar e suas atribuições, finalizando com um estudo
sobre o poder de policia, especificamente no âmbito da Brigada Militar.
No segundo capítulo é analisado o abuso de autoridade no âmbito da
Brigada Militar, com enfoque na lei 4.898/65, as sanções decorrentes desta prática,
bem como a competência para julgamento do crime de abuso de autoridade
fundamentado pela Súmula 172 do STJ, relacionando as garantias individuais, os
limites do poder de policia e o abuso de autoridade no âmbito da Brigada Militar,
para então finalizar com uma análise do retrato da violência policial existente e o
papel da policia Militar no Estado Democrático de Direito.
10
Com este estudo buscaremos destacar, a essencialidade da Segurança
Pública para o desenvolvimento da sociedade, e se esta deve ser efetivada a partir
de métodos que viabilizem, simultaneamente, a realização do controle social estatal,
de modo a garantir uma sociedade pacífica e organizada. E, as garantias e direitos
individuais do cidadão, estão sendo respeitados e assegurados especialmente pelos
agentes estatais, sem que coloque em risco a ideia de dignidade humana.
11
1 SEGURANÇA PÚBLICA, PODER DE POLÍCIA E A ATUAÇÃO DA BRIGADA
MILITAR
Nos primórdios da civilização o homem abandonou a vida isolada, formando
os primeiros grupos comunitários. Nesta forma de organização primitiva, os mais
fortes integrantes eram destacados para manter a defesa dos grupos sociais, que
eram regulados por regras que foram evoluindo gradativamente.
Ao evoluir do tempo o homem encontrou por meio do Estado a melhor forma
de se organizar socialmente. Sendo que este termo (Estado) originou-se inicialmente
com o famoso opúsculo de Nicolau Maquiavel, O Príncipe (Maquiavel 1996). Assim,
o Estado passa a ser concebido como uma sociedade política e juridicamente
organizada para atender o bem comum do seu povo.
Para manter a sociedade organizada, garantindo o acesso a direitos
fundamentais a todos, o Estado assumiu competências que são fundamentais para o
alcance das expectativas propostas. E nesta organização, compete ao Estado
garantir a proteção dos direitos individuais e assegurar ao seu povo o pleno
exercício da cidadania.
Buscando assegurar tais direitos o Estado, por meio da instituição de forças
de
segurança,
comportamentos
deve
empreender
criminosos,
ações
inibindo,
de
prevenção
neutralizando
e
práticas
repressão
antissociais
aos
e
assegurando a proteção coletiva e dos bens na sua totalidade. Também, estas
forças possuem a responsabilidade de oferecer estímulo ativo para que o povo
possa conviver harmonicamente e desenvolver sua vida dentro dos preceitos
sociais.
No Brasil, entre as forças que integram a segurança pública, estão as
Polícias militares, que são forças auxiliares das forças armadas, as quais têm por
função primordial o policiamento ostensivo e a preservação da ordem pública no
âmbito dos Estados e do Distrito Federal. As polícias militares são subordinadas
diretamente aos governadores dos Estados Federativos do Brasil, e por esse motivo
12
são denominados de Polícias Militares Estaduais que será a instituição alvo deste
trabalho, com ênfase a Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul.
A Constituição Brasileira de 1988, buscando assegurar as garantias
individuais, estabelece no titulo V, que trata da Defesa do Estado e das Instituições
Democráticas, em seu capitulo III, que trata da segurança pública, um conjunto de
diretrizes aos agentes do Estado que devem garantir a segurança dos indivíduos.
Sendo órgão da estrutura governamental a polícia tem por funções, a
prevenção da criminalidade e também auxiliar o poder judiciário para que os
infratores da lei sejam devidamente processados. Neste sentido a polícia atua no
âmbito administrativo, quando objetiva assegurar as limitações impostas a bens
jurídicos individuais, ação realizada por agentes de fiscalização, e em atividades de
segurança, quando realiza funções de polícia ostensiva e policia judiciária.
No Estado de Direito a administração pública precisa ter meios próprios para
atingir seus objetivos, previstos em Lei e na Constituição, os quais são vistos como
verdadeiros poderes ou prerrogativas especiais de Direito Público. Sendo que, um
desses poderes é o do poder de polícia, por meio do qual o Estado age na órbita do
interesse privado, visando satisfazer o interesse público e restringindo, assim,
direitos individuais.
Incumbidos da realização da polícia ostensiva e atuando preventivamente na
preservação da ordem pública, os órgãos policiais, em especial as polícias militares,
gozam do poder de polícia inerente a administração pública, uma vez que sua
atividade se realiza em prol do interesse público, e se caracteriza pela
discricionariedade, auto-executoriedade e pela coercibilidade.
Assim como os demais estados federados do Brasil, o Estado do Rio Grande
do Sul possui sua polícia Militar Estadual denominada Brigada Militar que atua com a
missão primordial de preservar a ordem pública, a incolumidade das pessoas e do
patrimônio, sendo que sua história confunde-se com a própria história do Estado,
que é marcada com participações históricas de revoluções no cenário nacional.
13
1.1 Segurança pública e atividade policial na Constituição Brasileira de 1988
A partir da consolidação dos Estados de Direito modernos a convivência
entre as pessoas passou a ser regulada essencialmente pela lei. Logo, este Estado
que se organiza através da ordem jurídica, e com a participação popular, passa a
dar respaldo legal aos cidadãos, que além de serem sujeitos de direitos, tem a seu
dispor mecanismos jurídicos para se defender contra eventuais abusos da
organização estatal. Cria-se, assim, o Estado democrático.
Neste sentido é a explicação de José Lauri Bueno de Jesus (2004, p. 37)
sobre o estado moderno:
As leis surgem no corpo político para assegurar as liberdades
públicas e a autoridade do governo, ao mesmo tempo em que
protegem os membros da comunidade, restabelecendo, pelo viés do
Direito a liberdade natural dos Homens. Ainda, pela lei, é assegurado
ao estado o exercício dos poderes que lhe foram conferidos
respeitando a vontade geral. A lei ao mesmo tempo em que obriga o
cidadão, vincula o estado, por ser uma declaração da vontade geral,
não somente enquanto sua obrigatoriedade deriva do pacto social,
mas sim, sobre o todo, pois os homens, mediante o pacto, se dão
leis para não se darem amo. Assim, passamos às concepções de
estado absolutista, e liberal no estado moderno.
Com a união do Estado de Direito e do Estado Democrático cria-se o Estado
Democrático de Direito que tem como principal princípio norteador, o principio da
legalidade. Ou seja, o Estado Democrático de Direito surge de duas idéias, o Estado
limitado pelo direito e o poder do estado legitimado pelo povo. E nestes estados os
poderes estão limitados pela lei e devem estar a serviço da defesa dos direitos
fundamentais, como nos ensina José Joaquim Gomes Canotilho (1998, p. 227)
quando discorre que:
[...] a vertente do estado de direito não pode ser vista senão a luz do
principio democrático, também a vertente do Estado Democrático
não pode ser entendida senão na perspectiva de Estado de Direito.
Tal como só existe um Estado de direito Democrático, também só
existe um Estado Democrático de Direito, isto é sujeito as regras
jurídicas.
14
Com o Estado Democrático de Direito, avança-se em relação ao Estado
liberal, onde a ordem econômica e social não possui mais a capacidade de produzir
justiça livremente. Neste sentido, o Estado Democrático de Direito possui em sua
essência, conforme Lenio Luiz Streck (2003, p. 93):
[...] um conteúdo transformador da realidade, não se restringindo
como o Estado Social de Direito, a uma adaptação melhorada das
condições sociais de existência. Assim o seu conteúdo ultrapassa o
aspecto material de concretização de uma vida digna ao homem e
passa a agir simbolicamente como fomentor da participação pública,
quando a Democracia qualifica o Estado, o que irradia os valores da
democracia sobre todos os seus elementos constitutivos e, pois,
sobre a ordem jurídica.
No Estado Democrático de Direito, ocorre à junção do controle do arbítrio do
Estado, através da lei e a participação social com direitos fundamentais, em que o
Estado e o seu povo se inserem numa relação de igualdade material garantidos pelo
direito. Ou seja, é a eliminação da rigidez formal, prevalece a supremacia da vontade
do povo, e a preservação da liberdade e da igualdade. E é neste sentido que
Norberto Bobbio (1992, p. 100) descreve a evolução do Estado contemporâneo.
Primeiro liberal, no qual os indivíduos que reivindicam o poder
soberano são apenas uma parte da sociedade; Depois democrático,
no qual são potencialmente todos a fazer tal reivindicação; E
finalmente, social no qual os indivíduos, todos transformados em
soberanos sem distinções de classe, reivindicam – alem dos direitos
de liberdade – também os direitos sociais, que são igualmente
direitos do individuo [...]
Assim, o Estado Democrático de Direito, adotado pela constituição de 1988,
traz as características que são fundamentais para uma sociedade democrática: A
soberania popular, exercida através dos representantes políticos; pela sociedade
politicamente organizada, com base na Constituição escrita que estabelece um
contrato social para a coletividade; pelo respeito ao principio da separação dos
poderes, com limitação dos poderes governamentais; pelo reconhecimento dos
direitos fundamentais da pessoa humana, que são inalienáveis; pela igualdade de
todos perante a lei; pela pluralidade partidária e pela imperatividade da lei, em que a
legalidade se sobrepõe a vontade governamental. (STRECK E MORAIS, 2003).
15
Dentre os direitos fundamentais consagrados no texto da Constituição,
encontra-se a segurança pública. Tal direito está previsto no artigo 144, que diz:
A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de
todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes
órgãos: I - polícia federal; II - polícia rodoviária federal; III - polícia
ferroviária federal; IV - polícias civis; e V - polícias militares e corpos
de bombeiros militares.
No caput do artigo 5º, desta mesma constituição encontra-se positivados os
direitos individuais e coletivos. Nele se elenca a segurança como direito fundamental
a todos os brasileiros e aos estrangeiros residentes no solo brasileiro, sem distinção
de qualquer natureza. Mas para que se possa melhor entender este direito, se faz
necessário compreender o termo “segurança” no seu sentido exato. Conforme
Amauri Meirelles e Lucio Emilio Espírito Santo (2003, p. 32):
Em relação à segurança entendemos que, em seu sentido amplo, é
também um ambiente, um estado, uma situação em que
objetivamente as ameaças estão controladas. É uma situação ideal,
porque o ser humano não dispõe ainda de meios eficazes para o
controle total das ameaças. [...] insegurança, que podemos definir
como inexistência, insuficiência, deficiência ou ineficiência de
proteção nacional ou de proteção social, o que pode ensejar um
estado permanente de tensão, medo, descrença, revolta, desgaste
emocional, ansiedade, em que vive o homem moderno, diante das
ameaças que o rondam permanentemente. A insegurança em seu
sentido amplo, é um clima, um ambiente, em estado, uma situação,
em que ameaças permanecem sob precário controle e há a
percepção da precariedade desse controle [...]
Maria Victoria Mesquita Benevides (1996, p. 75) discorre sobre o direito à
segurança observando que:
[...] Ora, o direito a segurança pressupõe, evidentemente, o risco da
insegurança – risco esse não apenas patrimonial, como infelizmente
tem sido tão valorizado, mais do que, até mesmo, o direito à vida,
mas o risco da insegurança no plano da integridade física. E se o
direito à segurança é um direito essencial a todo ser humano, faz
parte do conjunto de direitos fundamentais da pessoa humana, faz
parte dos Direitos Humanos.
Como já visto, a segurança é essencial a todo ser humano e a Carta
Constitucional brasileira, em seu artigo 144, especifica a segurança pública como
16
atribuição (dever) do ente estatal, reportando-se a uma responsabilidade de todas as
pessoas, poderes e instituições, sejam elas públicas ou privadas. Também
determina que a segurança pública deve ser exercida para preservação da ordem e
da incolumidade das pessoas e do patrimônio, não excluindo a idéia de garantia dos
direitos fundamentais elencados no artigo 5º, caput da CF. E é neste sentido que o
conceito de segurança publica é descrito por José Afonso da Silva (2002, p. 754):
A segurança pública consiste numa situação de preservação ou
restabelecimento dessa convivência social que permite que todos
gozem de seus direitos e exerçam suas atividades sem perturbação
de outrem, salvo nos limites de gozo e reivindicação de seus próprios
direitos e defesa de seus legítimos interesses. Na sua dinâmica, é
uma atividade de vigilância, prevenção e repressão de condutas
delituosas.
Conclui-se, portanto, que a segurança pública realiza-se mediante um
conjunto de ações e processos administrativos, jurídicos e judiciais, em que cada
poder tem funções que interagem, complementam e dão continuidade ao esforço
dos demais, para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e
do patrimônio, o que depende da harmonia entre os poderes, das ligações entre os
instrumentos de coação, da justiça e da cidadania e do comprometimento dos
agentes públicos, objetivando a paz social.
Para uma melhor compreensão da segurança pública e da ordem pública,
José Lauri Bueno de Jesus (2004, p. 65) observa que:
[...] a segurança pública e a ordem pública são necessidades dos ser
humano e cabe ao estado propiciar a segurança almejada pela
sociedade, atuando, juridicamente, na sua vertente normativa
estabelecendo as leis que a disciplinarão; na sua vertente
jurisdicional, aplicando a lei aos casos concretos; e na sua vertente
administrativa, aplicando a lei de forma discricionária e executória,
para preservar a ordem e restabelecê-la, quando a mesma for
violada.
Visando uma melhor organização da segurança pública o artigo 144 da carta
constitucional atribui funções específicas para cada um dos seis órgãos elencados
como responsáveis pela segurança pública. Tais funções que serão detalhadas no
próximo tópico são desempenhadas pelo critério de interesse, ou seja, os assuntos
17
de interesse nacional estão sujeitos ao policiamento da União e os assuntos de
interesse regional sujeitam-se à polícia estadual; e os assuntos de interesse locais
são tratados pela polícia municipal.
1.2 A polícia militar e suas atribuições
Para discorrer sobre a polícia e necessário que se saiba o significado deste
termo. Nas palavras de Marco Antônio Azkoul (1998, p. 7).
A polícia remonta os primórdios da civilização, uma vez que tipos
atividades assemelhadas revelam que o homem, ao abandonar a
vida isolada das cavernas, consequentemente formou as primeiras
comunidades e sentiu de destacar os mais fortes e jovens para a
defesa dos primeiros grupos sociais. [...] Polícia do grego politéia" é
um conjunto de leis ou regras impostas ao cidadão, com a finalidade
de assegurar a moral, a ordem e a segurança pública.
No Brasil, a criação da polícia se iniciou na época da colonização, quando D.
João III adotou o sistema de "capitânias hereditárias," delegando a Martins Afonso
de Souza a carta régia para criar o sistema judiciário e um serviço para manter a
ordem pública. Naquele momento ficaram os meirinhos sob um juramento com o
dever de polícia subordinados aos juízes (AZKOUL, 1988).
Com a promulgação da Constituição Brasileira de 1988, o legislador
constitucional elencou atribuições distintas dentre as várias polícias existentes no
Brasil, conforme redação do artigo 144. São elas, Polícia Militar, Polícia Civil, Polícia
Federal, Polícia Rodoviária Federal e Polícia Ferroviária Federal, além das Guardas
Municipais, criadas pelos municípios.
Artigo 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos
seguintes órgãos:
I- polícia federal;
II- polícia rodoviária federal;
III- polícia ferroviária federal;
IV- polícias civis;
V- polícias militares e corpos de bombeiros militares.
18
O Estado, diante das forças de segurança elencadas no artigo 144 da
CF/88, atribui para a polícia federal e polícias civis as funções de polícia judiciária.
Ou seja, estes são os órgãos da segurança com a função de apurar as infrações
penais e a sua autoria através da investigação policial. Sem relação de
subordinação quanto a órgão ou instituição do poder, a polícia judiciária auxilia o
poder judiciário, por meio da coleta de provas e do esclarecimento da autoria e da
materialidade do crime.
As atribuições das Polícias Militares estão elencadas no artigo 144, § 5º, que
determina ser incumbência destas instituições “a polícia ostensiva e a preservação
da ordem pública.” Logo no § 6º do mesmo dispositivo constitucional, estabelece que
as polícias Militares subordinam-se aos governadores dos seus respectivos estados.
Também o Decreto Federal 88.777/83 que regulamenta as polícias militares
e corpos de Bombeiros no Brasil, menciona as atribuições das polícias militares
quando determina em seu art. 2º, número 27, que:
O policiamento ostensivo é ação exclusiva das Polícias Militares em
cujo emprego o homem ou fração de tropa engajados sejam
identificados de relance, quer pela farda quer pelo equipamento, ou
viatura, objetivando a manutenção da ordem pública. São tipos desse
policiamento, a cargo das Polícias Militares ressalvadas as missões
peculiares das Forças Armadas, os seguintes:
- ostensivo geral, urbano e rural;
- de trânsito;
- florestal e de mananciais;
- rodoviário e ferroviário, nas estradas estaduais;
- portuário;
- fluvial e lacustre;
- de radiopatrulha terrestre e aérea;
- de segurança externa dos estabelecimentos penais do Estado.
A Brigada Militar do Rio Grande do Sul, instituição estadual que atua de
forma ostensiva e que é responsável pela preservação da ordem pública,
incolumidade das pessoas e do patrimônio é uma das forças da segurança pública
elencadas na Constituição Estadual, no Titulo IV – que trata da ordem Pública – e no
art. 124 dispõe:
Art.124 - A segurança pública, dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem
19
pública, das prerrogativas da cidadania, da incolumidade das
pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - Brigada Militar;
II - Polícia Civil;
III - Instituto-Geral de Perícias
Por força do disposto no parágrafo 7º, do art. 144 da Constituição Federal, a
Constituição Estadual gaúcha, ratifica em seu art. 125 que uma lei específica
disciplinará a organização, estrutura, o funcionamento dos órgãos responsáveis pela
segurança pública no nível do Estado.
Art. 125 - A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos
órgãos responsáveis pela segurança pública, de maneira a
assegurar-lhes a eficiência das atividades.
No que tange a organização básica da Brigada Militar do Estado, a lei
Estadual nº 10.991 de 18 de Agosto de 1997, traz nos artigos 1º e 2º sua atuação no
tempo, sua organização militar, sua missão específica e sua vinculação ao território
gaúcho:
Art. 1º - A Brigada Militar, Polícia Militar do Estado do Rio Grande do
Sul, é uma Instituição permanente e regular, organizada com base na
hierarquia e na disciplina, destinada à preservação da ordem pública
e à incolumidade das pessoas e do patrimônio.
Artigo 2º - A Brigada Militar vincula-se, administrativa e
operacionalmente, à Secretaria de Estado responsável pela
Segurança Pública no Estado do Rio Grande do Sul.
As atribuições da Brigada Militar encontram-se descritas no rol de incisos do
art. 3º da referida lei, onde juntamente com o corpo de bombeiros militar estão
representados em uma mesma instituição.
Art. 3º - Compete à Brigada Militar:
I - executar, com exclusividade, ressalvada a competência das
Forças Armadas, a polícia ostensiva, planejada pela autoridade
policial-militar competente, a fim de assegurar o cumprimento da lei,
a manutenção da ordem pública e o exercício dos poderes
constituídos;
II - atuar preventivamente, como força de dissuasão, em locais ou
área específicas, onde de presuma ser possível a perturbação da
ordem pública;
III - atuar repressivamente, em caso de perturbação da ordem
pública e no gerenciamento técnico de situações de alto risco;
IV - exercer atividades de investigação criminal militar;
20
V - atuar na fiscalização e controle dos serviços de vigilância
particular no Estado;
VI - executar o serviço de prevenção e combate a incêndio;
VII – Planejar, organizar, fiscalizar, controlar, coordenar, instruir,
apoiar e reconhecer o funcionamento dos serviços civis auxiliares de
bombeiros;
VIII - realizar os serviços de busca e resgate aéreo, aquático e
terrestre no Estado;
IX - executar as atividades de defesa civil no Estado;
X - desempenhar outras atribuições previstas em lei.
XI – planejar, estudar, analisar, vistoriar controlar, fiscalizar aprovar e
interditar as atividades, equipamentos, projetos e planos de proteção
e prevenção contra incêndios, pânicos, desastres e catástrofes em
todas as edificações, instalações veículos, embarcações e outras
atividades que ponham em risco a vida, o meio ambiente e o
patrimônio, respeitada a competência de outros órgãos;
XII – realizar a investigação de incêndios e sinistros;
XIII – elaborar e emitir resoluções e normas técnicas para disciplinar
a segurança contra incêndios e sinistros;
XIV – ativar e autorizar a instalação de sistemas ou centrais de
alarmes privados contra incêndios, nos órgãos de Polícia Militar
(OPM) de Bombeiros, mediante a cobrança de taxas de serviços não
emergenciais, determinadas na Lei 10.987, de 11 de agosto de 1997,
aplicando-se-lhes as penalidades previstas em Lei.
Parágrafo único - São autoridades políciais-militares o ComandanteGeral da Brigada Militar, os Oficiais, e as Praças em comando de
fração destacada, no desempenho de atividade policial-militar no
âmbito de suas circunscrições territoriais.
Neste sentido, a Brigada Militar exerce praticamente funções de polícia
administrativa, sendo responsável pelo policiamento ostensivo, preventivo, e pela
manutenção da ordem pública, nos mais diversos setores da comunidade gaúcha.
Inclusive quando setores do estado não conseguem cumprir com suas obrigações a
Brigada Militar o passa a exercer. Caso típico é o serviço de custódia nas casas
prisionais, onde o órgão encarregado é a Susepe.
Para realização de tais atividades, historicamente, realizou-se uma
preparação baseada no disciplinamento militar. Devido a isso os policiais eram
treinados com técnicas utilizadas para o combate, para a guerra, para o extermínio
do inimigo, que na prática cotidiana da atividade policial era, em verdade, o cidadão.
Com esta forma de preparação, era difícil separar prática policial da ação de
violência, e isso fez com que, nem sempre, a segurança pública fosse entendida
como direito e dever da cidadania (MARIANTE. 1972).
21
Com a efetivação da democracia no Brasil, a polícia militar, embora seja
considerada força auxiliar das forças armadas, necessitou reestruturar-se para
compatibilizar a atividade policial com as políticas públicas constituídas e para que
pudesse atender aos fins sociais a que se propõe o Estado Brasileiro, que como
Estado Democrático e Social de Direito, passou a fundamentar-se nas idéias de
dignidade humana e da cidadania.
Ao longo da história da Brigada Militar verificou-se que ocorreram mudanças
significativas na formação dos profissionais de segurança pública. A Brigada
precisou atender às novas exigências, voltadas ao atendimento e à proteção ao
público, atentando para que os direitos assegurados pela Constituição não fossem
violados.
Na formação dos profissionais da Brigada Militar, estes recebem instrução
baseada na hierarquia e disciplina como militares, e um profundo ensinamento das
legislações vigentes para que saibam como agir diante das missões que lhe são
atribuídas como profissionais da segurança pública.
Atualmente, a Brigada Militar do Estado do Rio Grande do Sul conta com um
efetivo de cerca de 26.300 homens, que é insuficiente para a crescente demanda.
Isso faz com que os policiais tenham jornada de trabalho excessiva, que vai alem
daquela recomendada para este tipo de profissionais. Logo, o serviço perde em
qualidade uma vez que exige muito preparo psicológico, pois não são raras às vezes
quando decisões devem ser tomadas em frações de segundos e que, se são mal
decididas podem implicar em perda de uma vida, seja do profissional ou do infrator.
Dados (ABANF. 2013). Associação Beneficente Antonio Mendes Filho.
Atualmente a estrutura hierárquica da Brigada Militar possui dois quadros,
com base na lei complementar Nº 10.990 de 18 de Agosto de 1997, que trata do
Estatuto dos Servidores Militares da Brigada Militar. O quadro dos oficiais formado
pelos Coronéis que é o posto mais alto dentro da corporação, seguido do de
Tenente-Coronel e Major, Capitão e 1º Tenente. Sendo os integrantes do último
posto
mencionado,
considerados
oficiais
subalternos.
O
segundo
quadro,
22
considerado de nível médio, é formado por praças e pelos postos de 1º Sargento, 2º
Sargento, 3º Sargento em extinção e Soldados.
O policial militar está sujeito a normas mais rígidas, visto que o militarismo é
pautado por normas rigorosas e baseado em dois pilares fundamentais que mantêm
viva a instituição Brigada Militar: a hierarquia e a disciplina. Por meio da hierarquia, é
feita a distribuição e o escalonamento das funções executivas diversas; e por meio
da disciplina é feito o controle do desempenho das funções e da conduta interna dos
policiais, responsabilizando-os pelas faltas cometidas. Entre as demais normas da
instituição militar, que tratam da Hierarquia e Disciplina, aplica-se aos militares
infratores, o Decreto estadual nº 43.245/2004 que é o Regulamento Disciplinar da
Brigada Militar do estado do Rio Grande do Sul.
Diante da questão de hierarquia, Hely Lopes Meireles (1989, p. 100) diz que:
“Pela hierarquia se impõe ao subalterno a estrita obediência das ordens e instruções
legais superiores e se define a responsabilidade de cada um.”
Em função do pilar da disciplina, o militar está sujeito às sanções advindas
de transgressões disciplinares que caso venha cometer. Sanções administrativas
impostas que muitas vezes funcionam como uma penalização em função do desvio
de conduta ou transgressão disciplinar.
Atualmente é apontado pela assessoria dos Direitos Humanos da Brigada
Militar que, ainda existem questões que devem ser revistas para que se tenha uma
Brigada Militar melhor preparada para acompanhar a evolução da sociedade. A
instituição policial deve continuar evoluindo, deve extirpar os resquícios ditatoriais e
preparar seus recursos humanos voltados ao atendimento, dos anseios da
sociedade e não preparar ou tratar seus integrantes como se estes fossem
máquinas de um mundo aparte, prontos apenas para reprimir ou matar. Pois, o
policial militar é fruto da sociedade e também deve ser tratado como humano com
direitos e garantias.
Além das responsabilidades administrativas o servidor policial militar poderá
ser responsabilizado penalmente nos Tribunais da Justiça comum conforme a
23
súmula 172 do STJ, bem como na justiça militar que julga os crimes de competência
militar. Ainda, diante da responsabilidade cível este poderá ser alcançado de forma
regressiva quando se exige esta reparação por parte do estado. Logo, o § 2° do art.
35 da Lei Complementar n° 10.990/97 estabelece que a responsabilidade disciplinar
do servidor da Brigada Militar, é independente das responsabilidades civil e penal.
Presente em toda parte do Estado, a Brigada Militar não se limita a policiar,
para garantir a segurança e o bem-estar da sociedade gaúcha, mesmo com a
limitação de recursos humanos ou logísticos. Para isso, conta com as unidades de
policiamento
ostensivo,
rodoviário,
ambiental,
aéreo,
operações
especiais,
atendimento a turistas, bombeiros, entre outros. É neste sentido que a presença
brigadiana diuturnamente em todo o Estado é lembrada nas palavras de Helio Moro
Mariante (1972, p. 284-285) quando diz que:
[...] Profissionais plenamente conscientes de suas obrigações,
auxiliares indormidos dos poderes executivo, legislativo e judiciário e
da sociedade gaúcha, sem distinções de credo político ou religioso,
por mais dura que seja a missão que lhes é confiada, sempre estão a
postos, com o supremo objetivo do bem estar comum, mesmo que,
para a consecução deste, tenham de por em risco a própria vida, o
que acontece não raramente.
Ainda em relação às atribuições da Brigada Militar, Jesus (2004, p. 121) diz:
A Brigada Militar, em suas atribuições constitucionais e legais, no
atual contexto social, de criminalidade e violência altíssimas, passa a
ser indispensável para o estabelecimento da ordem e da segurança
pública, pois, nos mais longínquos e inóspitos lugares do estado, lá
está um policial militar, onde, muitas vezes, é a única e presente
autoridade à disposição da comunidade nas vinte quatro horas do
dia. No entanto, nenhuma de suas missões será realizada a contento
se o governo não assumir e estabelecer, com firmeza, as suas
políticas no tocante à segurança pública, [...]
Neste sentido verifica-se que a Brigada Militar é indispensável com sua
atribuição constitucional no contexto social do nosso estado, para que se mantenha
a ordem e a segurança pública.
1.3 Poder de polícia
24
Quando o Estado, por meio de seus agentes, buscar restringir, limitar ou
frear a ação do particular em nome do interesse público, com o objetivo de buscar o
bem estar social, estará investido de poder de polícia. Por meio deste, o Estado
busca a compatibilização do interesse público com o interesse particular. Assim o
poder de polícia serve como fundamento para todas as modalidades de intervenção
do Estado sobre o particular, exceto a desapropriação.
O conceito de poder de polícia, que é bem amplo, foi positivado no
ordenamento jurídico brasileiro através do artigo 78 da lei nº 5172, de 25 de outubro
de 1966. Mais conhecido por Código Tributário Nacional (CTN):
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração
pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade,
regula a prática de ato ou a abstenção de fato, em razão de interesse
público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes,
à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades
econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder
Público, à tranqüilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos
direitos individuais ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia
quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei
aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de
atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio
de poder.
Para ser válido, e na visão dos doutrinadores do direito administrativo, o
poder de polícia deve obedecer aos limites estabelecidos pelos princípios da
razoabilidade e da proporcionalidade. Sendo que este último é de fundamental
importância, pois exige que os direitos individuais sejam apenas restritos na medida
considerada indispensável para a satisfação do interesse público.
Segundo Hely Lopes Meirelles (2000, p. 122):
O poder de policia é a faculdade de que dispõe a administração
pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades
e direitos individuais em beneficio da coletividade ou do próprio
estado. Em linguagem menos técnica, podemos dizer que o poder de
polícia é o mecanismo de frenagem de que dispõe a administração
pública para conter os abusos do direito individual.
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O poder de polícia significa, portanto, uma limitação, um condicionamento ao
exercício dos direitos do cidadão. Ele se faz necessário para permitir a vida em
sociedade, de modo a garantir que as pessoas não abusem dos seus direitos.
A polícia administrativa é encontrada em vários setores da administração
pública, e pode atuar sobre bens, direitos e atividades, sendo que quando houver
um desrespeito à legislação esta irá atuar com o poder de polícia que detém. Já a
polícia judiciária incide sobre pessoas, portanto quando ocorrer um ilícito penal quem
deve atuar é a polícia judiciária.
Nestes termos são os ensinamentos de Jesus (2004, p. 80):
O objeto da Polícia administrativa é a propriedade e a liberdade,
enquanto o da polícia judiciária é a pessoa. A polícia administrativa
predispõe-se a impedir ou paralisar atividades anti-sociais, enquanto
a judiciária preordena-se à apuração de infrações penais. Por fim, a
Polícia administrativa rege-se por normas administrativas, e a
judiciária, por normas processuais, como auxiliar da justiça.
A maioria dos doutrinadores defende a ideia de Hely Lopes Meirelles (2002
p. 127) que define ser, “Poder de Polícia é a faculdade de que dispõe a
Administração Pública para condicionar e restringir o uso e gozo de bens, atividades
e direitos individuais, em beneficio da coletividade ou do próprio Estado.” E assim,
esse poder é inerente a toda a administração.
O poder de polícia, por ser atividade exclusiva do Estado, é exercido na área
administrativa e na área judiciária, a primeira de caráter preventivo, a segunda de
caráter repressivo, sendo que este poder não pode ser delegado a particulares. Mas
é possível sua outorga a entidades de Direito Público da Administração Indireta.
1.4 O poder de polícia no âmbito da Brigada Militar
Buscando entender a atuação da polícia como encarregada de manter a
ordem pública, faz-se necessário analisar como esta pode atuar e valer-se do poder
de polícia para desenvolver suas atividades sem depender diretamente do poder
judiciário.
26
O Estado, que é uma formação social do homem, adquire uma formação
jurídica, para organizadamente, por meio de normas jurídicas, atender o bem
comum. Para atingir os fins a que se destina o Estado, em sua administração,
precisa garantir a segurança da organização social, o que faz por meio da polícia
conforme os ensinamentos de Azkoul (1998, p. 03) quando diz que:
[...] a polícia como atividade da administração pública em beneficio
do individuo, coletividade e do próprio Estado. Tudo com a máxima
subordinação ao ordenamento jurídico. Assim sendo não
conseguimos dissociar a segurança pública exercida pelos órgãos
policiais como um dos elementos constitutivos do próprio Estado e
também na sua razão teleológica ou finalistica que é, senão outra, a
do bem comum e o respeito á vida e a dignidade da pessoa humana.
José Cretella Júnior (1972, p. 229) em seus ensinamentos observa que:
Ao passo que a polícia é algo em concreto, é um conjunto de
atividades coercitivas exercidas na prática dentro de um grupo social,
o poder de polícia é uma facultas, faculdade, um possibilidade, um
direito que o Estado tem de através da polícia que é uma força
organizada, limitar as atividades nefastas dos cidadãos, (...) O poder
de polícia legitima a ação da polícia e sua própria existência.
Com relação ao poder de polícia, Álvaro Lazzarini (1999, p. 103) discorre
que todo policial militar investido na função possui o poder de polícia para preservar
a ordem pública, quando menciona que:
Polícia Ostensiva é atribuição com extensão ampla, abrangendo
todas as fases do poder de polícia, onde o militar estadual no
exercício de sua autoridade pública, identificada de relance, quer
pela farda, quer pelo equipamento, ou viatura, visa ilidir condutas
ilícitas, protegendo a integridade de pessoas, bens e serviços.
Jesus (2004, p. 80) quando discorre sobre o poder de polícia da polícia, diz
que:
Para poder realizar suas atividades de polícia, com o exercício do
poder de polícia, a administração pública possui a policia
administrativa (polícia militar) e a polícia judiciária a (polícias civil e
federal). A administrativa tem por missão a ordem pública em geral.
Ela tende, no âmbito da segurança pública, principalmente, prevenir
27
os delitos e as desordens, embora algumas vezes seus agentes ajam
repressivamente.
O policial militar deve ser conhecedor da lei em nível adequado para
desempenhar suas funções, uma vez que age em nome do Estado. Assim, é
obrigação do policial conhecer a natureza jurídica de sua autoridade, para que sua
ação esteja respaldada nos princípios administrativos elencados no artigo 37 da
Carta Magna.
Investido na sua função o policial militar representa o Estado. Seus atos
devem ser autorizados pela lei para legitimar o poder diferencial que possui em
relação ao cidadão comum. Pois, o poder de polícia legítima a sua ação dentro dos
princípios, conforme nos ensina Lazzarini (1999, p. 203):
A Polícia é a realidade do Poder de Polícia, é a concretização
material deste, isto é, representa em ato a este. O Poder de Polícia
legitima a ação e a própria existência da Polícia. Ele é que
fundamenta o poder da polícia. O Poder de Polícia é um conjunto de
atribuições da Administração Pública, indelegáveis aos particulares,
tendentes ao controle dos direitos e liberdades das pessoas, naturais
ou jurídicas, a ser inspirado nos ideais do bem-comum e incidentes
não só sobre elas, como também em seus bens e atividades.
As atividades desenvolvidas pela Brigada Militar são atualmente de grande
relevância em função da constante transformação econômica e social, que exigem
um órgão responsável para que os direitos do cidadão brasileiro sejam garantidos.
Um grande avanço conquistado pela Brigada Militar, com o seu poder de
polícia, foi a lavratura do Termo Circunstanciado, criado pela Lei Nº. 9099/95, e
posteriormente alterado pela lei nº 10.259/2001, conquista esta que trouxe para a
Brigada Militar do Rio Grande do Sul o status de pioneira entre as polícias militares
do Brasil a confeccionar este tipo de documento. Embora tenha gerado certo atrito
entre a polícia judiciária e a administrativa, quem saiu ganhando foi a população
gaúcha, que passou a contar com a possibilidade de buscar satisfazer parte de seus
anseios de forma mais célere e menos burocrática.
Questionou-se muito a sua legalidade quanto ao órgão competente, até que
o Supremo Tribunal Federal, ao se posicionar a respeito do assunto através do
28
julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) 2862, proposta pelo ex
Partido da República (PR), julgou por unanimidade a improcedência do pedido,
reconhecendo que os policiais militares são autoridades competentes para
elaboração do Termo Circunstanciado.
A Brigada Militar, assim como as demais polícias militares, atua por meio de
ações predominantemente coercitivas. Isto se faz necessário para que o objetivo da
ação seja positivo e possa satisfazer a necessidade de atuar do Estado, o qual deve
visar a satisfação do interesse público. Esta é a ideia de Meirelles (2000, pg. 130)
quando diz que “o poder de policia seria inane e ineficiente se não fosse coercitivo e
não estivesse aparelhado de sanções para os casos de desobediência à ordem legal
da autoridade competente.”
Diante da atuação da Brigada Militar muitas vezes se discute o uso da força
alegando que esta foi usada de forma indiscriminada e que tal atitude estaria ao
alcance do chamado abuso de autoridade. Sabe-se que o uso da força muitas vezes
se faz necessário numa ocorrência policial. Porem esta deve ter limites para situar a
ação dentro da legalidade. Conforme o risco a força poderá variar da simples
presença policial, como inibidor do delito, até o uso da arma de fogo, em último caso,
como força letal.
É importante que o policial tenha este amparo do uso da força para
desempenhar sua função, porem esta deve ser usada com critérios, conforme a
força de agressividade do oponente ou suspeito da ação policial. Neste sentido
algumas precauções são fundamentais para justificar o uso da força. É importante
que esta força seja usada de forma gradativa e que seja proporcional a necessidade
de atendimento da ocorrência.
O policial investido na sua função deve ser um controlador das tensões que
possam abalar o equilíbrio social, e deverá agir dentro da legalidade e fazer somente
o que a lei lhe permite ou lhe respalde. Isto é fundamental, visto que tem respaldo de
autoridade (autorização), para em nome do Estado até mesmo tirar a vida de um
cidadão, quando estiver agindo em legitima defesa. O policial estará legitimado a
29
matar quando para defender a sua vida ou a vida de terceiros, quando estas estão
na iminência de serem ceifadas.
Diante da vasta legislação que regula os atos da administração pública e
seus agentes, é possível sintetizar que o agir conforme os diplomas legais não é
uma faculdade do policial militar, mas sim um dever, pois o poder de policia que
detém nunca respalda a ação violenta, ilegítima e criminosa de quem tem o dever de
manter a ordem, e a tranquilidade social. Também, o uso da força quando
necessário e respaldado pelo poder de polícia, não pode ser confundido com a
violência, sendo que a violência enseja ilegitimidade, arbitrariedade que configura
abuso de autoridade pelo qual o agente público poderá ser responsabilizado nas
esferas administrativa, penal e cível.
O crime de abuso de autoridade possui rito próprio e caracteriza-se pelo
excesso praticado pela autoridade no exercício da função, cuja responsabilidade
administrativa, civil e penal é regulamentada pela lei n. 4.898/65. No abuso de
autoridade a representação do ofendido não é condição de procedibilidade da ação,
pois esta é uma ação penal pública, e o órgão do ministério público possui a
legitimidade na promoção da ação penal pelo crime de abuso de autoridade.
Neste sentido, as condutas praticadas por policiais militares que se
desvirtuam de suas funções constitucionais, quais sejam "a preservação da ordem
pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio," elencadas no art. 144,
"caput" da Constituição Federal são incompatíveis com a Nova Ordem Constitucional
brasileira.
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2- O ABUSO DE AUTORIDADE NO ÂMBITO DA BRIGADA MILITAR
No decorrer do tempo a administração pública, no que tange a Brigada
Militar, passou por diversos estágios com a missão de garantir a proteção da
sociedade e realizar a segurança pública. Mas, todavia o uso do poder é
indiscutivelmente um tema que ainda gera polêmica quando defrontado pelo agente
público. Pois infelizmente permaneceu um ranço, e o sistema de lei e ordem ainda
não é o que se almeja e o que a sociedade espera.
Neste sentido, busca-se uma instituição que esteja comprometida em uma
constante adequação para com o ideal que a sociedade almeja. Regulando suas
ações baseado na lei, e banindo as ações obscuras que desvirtuam os preceitos
constitucionais do Estado Democrático de Direito, elencados no art. 37, caput, da
constituição Federal de 1988. Ou seja, o poder administrativo concedido a
autoridade Pública deve ter limites certos e deverá obedecer a forma legal para sua
utilização.
Quando ocorre um excesso por parte do servidor público militar, ele estará
abusando do poder que lhe é atribuído, visto que ele não tem carta branca para o
cometimento de arbitrariedades e para agir fora do amparo da lei. Assim, em caso
de abuso de autoridade o servidor deve ser responsabilizado estando sujeito as
sanções previstas na lei 4.898/1965 que regula o direito de representação e o
processo de responsabilidade administrativa, civil e penal, nos casos de abuso de
autoridade.
2.1 O abuso de autoridade segundo a Lei 4.898/65
A Constituição Federal Brasileira de 1988, para garantir a consolidação dos
direitos e garantias constitucionais por ela previstas, recepcionou a lei 4898/1965
que regula o direito de representação e o processo de responsabilidade
administrativa, civil e penal, nos casos de abuso de autoridade. Garantindo neste
prisma o direito do cidadão de peticionar aos poderes públicos para defender-se
contra ilegalidades ou abusos de poder, cometido pelo agente público que atua em
nome do Estado.
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Com base nesta lei, deverá o interessado peticionar a autoridade superior
Civil ou Militar que tiver atribuição legal para apurar e sancionar o agente que
incorreu no excesso de poder, ou então direcionar a petição ao Ministério Público
que representará no processo-crime contra o agente infrator, conforme previsto no
artigo 2º desta lei:
Art. 2º O direito de representação será exercido por meio de petição:
a) dirigida à autoridade superior que tiver competência legal para
aplicar, à autoridade civil ou militar culpada, a respectiva sanção;
b) dirigida ao órgão do Ministério Público que tiver competência para
iniciar processo-crime contra a autoridade culpada.
Parágrafo único. A representação será feita em duas vias e conterá
a exposição do fato constitutivo do abuso de autoridade, com todas
as suas circunstâncias, a qualificação do acusado e o rol de
testemunhas, no máximo de três, se as houver.
A vítima pode ser qualquer pessoa física ou jurídica, capaz ou não, sendo
que o acusado responderá alem do abuso, também pelas peculiaridades
processuais de cada vítima. Quando houver concurso do crime de abuso de
autoridade com o de homicídio o agente quando militar será julgado perante o
Tribunal de Júri, como já sumulado pelo STJ.
O abuso de autoridade é marcado pela dupla subjetividade passiva. Ou seja,
o sujeito passivo mediato que é o estado, e o imediato que é o cidadão. E por ter um
grande efeito reprovável, só admite o elemento subjetivo doloso, não existindo a
forma culposa. Neste condão o crime de abuso de autoridade, no dizer de Damásio
Evangelista de Jesus (2001, p. 13), só pode ter como elemento subjetivo o dolo:
Reclama um ânimo próprio, que é o elemento subjetivo do injusto:
vontade de praticar as condutas sabendo o agente que está
exorbitando do poder. Esse elemento se liga a culpabilidade e à
antijuricidade. Não se trata de dolo especifico, em face de não
encontrarmos frente àquele fim ulterior, extrínseco ao fato.
O abuso de autoridade existe quando o agente age ou se omite com o
propósito de atingir liberdades individuais de forma indevida. Em geral ocorre em
razão de vingança ou de prepotência do agente Público, que não raras vezes, torna
32
esta conduta rotineira, numa espécie de vicio, realizado em torno do seu interesse
ou sentimento particular e não por interesse da defesa social.
O art. 3º e 4º da lei 4898/65 trás um rol exemplificativo de situações que
configuram o abuso de autoridade, dentre as quais pode se destacar a conduta
descrita na alínea “i” do art. 3º que trata da, “a incolumidade física do individuo” um
item relevante por ser polêmico e de notória abordagem pelos meios de
comunicação.
Necessário e importante destacar que não se pode confundir o uso da
violência coercitiva que é legitimado pela lei, da violência coercitiva ilegítima que não
tem função social. Pois, o Estado deve estar autorizado ao uso da força para quando
a resistência a ordem for ilegítima. Neste prisma, nem toda violência praticada por
funcionário público, incumbido na função será caracterizada como abuso de
autoridade.
Para elucidar o exposto acima cita-se o entendimento de Waldemar César
da Silveira, (apud Freitas 1999, p.54) quando este diz;
(...) a violência contra as pessoas na execução de leis ou imposições
de justiça é legítima, na medida onde ela seja necessária. Sem o
emprego da força, a lei e a justiça se tornariam impotentes e
desarmadas. De sorte que a acusação deve estabelecer, contra o
funcionário que usou voluntariamente de violência, não somente a
existência do fato material que lhe imputado, mas também sobre a
ilegitimidade desse fato, porque se o emprego da violência é sempre
ilegítimo por parte dos particulares, não o é sempre por parte dos
funcionários.
Ao lançarmos os olhos ao art. 3º da lei em comento, verifica-se que este
dispositivo no caput, nos traz a ideia do que é abusar do poder quando a autoridade
agir ou se omitir na função pública, por meio da expressão “qualquer atentado.” Logo
esta expressão genérica não deve ser interpretada de forma tão abrangente para
que ao bem jurídico tutelado não falte a taxatividade, que é essencial para a
definição da conduta criminosa, respaldando o principio da legalidade.
33
Fernando Capez (2004, p. 9) nos traz este entendimento, quando crítica a
definição genérica dizendo:
A reserva legal impõe que a descrição da conduta criminosa seja
detalhada e especifica, não coadunando com tipos genéricos,
demasiado abrangentes. O deletério processo de generalização
estabelece-se com utilização de expressões vagas e sentido
equivoco, capazes de alcançar qualquer comportamento humano e
por conseguinte, aptas a promover a mais completa subversão no
sistema de garantias da legalidade. De nada adianta exigir a prévia
definição da conduta na lei se fosse permitida a utilização de termos
muito amplos, tais como:”qualquer conduta contrária aos interesses
nacionais”, “qualquer vilipêndio à honra alheia”, ou “qualquer
atentado...”. A garantia, nesses casos, seria meramente formal, pois,
como tudo pode ser enquadrado na definição legal, a insegurança
jurídica e social, seria tão grande como se lei nenhuma existisse. Por
essa razão, o dispositivo em foco não prima pela clareza, nem pelo
adequado cumprimento das exigências constitucionais derivadas da
reserva legal. Apesar de vago e impreciso, entretanto, o tipo acabou
não sendo reconhecido inconstitucional pela jurisprudência nem pela
doutrina.
Não são raras às vezes em que a atuação da Brigada Militar se dá de forma
distorcia, em que esta age com excesso quando do atendimento do conflito a ser
pacificado. Muitas vezes, ao desempenhar de forma coercitiva o poder de polícia
que a ampara em agir para garantir o restabelecimento da ordem social, ocorrem
abusos, pois como o conflito é inerente ao ser humano, as divergências também
surgem principalmente em relação aqueles que resistem à atuação do Estado, o que
permite que se confunda o uso da força coercitiva legitimada com a violência não
legitimada.
A conduta da autoridade para configurar o abuso deve ter a tipicidade
elencada na lei, configurando o excesso, o não estar autorizado em lei, sendo lícita
toda a atuação realizada nos limites estabelecidos pela lei. Neste sentido deverá o
agente público responder pelos excessos tipificados nos art.3º e 4º da lei 4.898/65,
que dispõe:
Art. 3º. Constitui abuso de autoridade qualquer atentado:
a) à liberdade de locomoção;
b) à inviolabilidade do domicílio;
c) ao sigilo da correspondência;
d) à liberdade de consciência e de crença;
e) ao livre exercício do culto religioso;
34
f) à liberdade de associação;
g) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício do voto;
h) ao direito de reunião;
i) à incolumidade física do indivíduo;
j) aos direitos e garantias legais assegurados ao exercício
profissional.
O art. 4º em seu dispositivo, de forma objetiva e detalhada informa com
clareza as situações em que acontece o crime de abuso de autoridade. Não
restando dúvidas para interpretação genérica. Ou seja:
Art. 4º Constitui também abuso de autoridade:
a) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem
as formalidades legais ou com abuso de poder;
b) submeter pessoa sob sua guarda ou custódia a vexame ou a
constrangimento não autorizado em lei;
c) deixar de comunicar, imediatamente, ao juiz competente a prisão
ou detenção de qualquer pessoa;
d) deixar o Juiz de ordenar o relaxamento de prisão ou detenção
ilegal que lhe seja comunicada;
e) levar à prisão e nela deter quem quer que se proponha a prestar
fiança, permitida em lei;
f) cobrar o carcereiro ou agente de autoridade policial carceragem,
custas, emolumentos ou qualquer outra despesa, desde que a
cobrança não tenha apoio em lei, quer quanto à espécie quer quanto
ao seu valor;
g) recusar o carcereiro ou agente de autoridade policial recibo de
importância recebida a título de carceragem, custas, emolumentos ou
de qualquer outra despesa;
h) o ato lesivo da honra ou do patrimônio de pessoa natural ou
jurídica, quando praticado com abuso ou desvio de poder ou sem
competência legal;
i) prolongar a execução de prisão temporária, de pena ou de medida
de segurança, deixando de expedir em tempo oportuno ou de
cumprir imediatamente ordem de liberdade.
Da leitura do art.4º pode-se, em síntese, concluir que falta de observação de
formalidades legais por parte da autoridade pública, no conteúdo que trata da
privação da liberdade do individuo configura a tipicidade do crime de abuso de
autoridade.
A lei Nº 4.898/65 teve sua força reconhecida pelo constituinte de 1988
quando este positivou, no texto da Constituição as garantias de liberdade
mencionadas nos artigos acima. Ao assegurar os direitos de liberdade do cidadão, o
art. 5º da Constituição Federal de 1988, recepcionando integralmente a lei,
35
proporcionando uma evolução social no que se refere ao respeito a liberdade e
dignidade humana. Assim, por meio destas ferramentas busca fortificar a atuação do
Estado para o interesse da coletividade sem os resquícios de atuação obscura,
negativa e arbitrária, tão comuns em Estados de Exceção ou em Estados
autoritários.
Para melhor compreensão desta evolução da norma constitucional,
interessa-nos reportar as seguintes garantias de liberdade trazidas pelo texto da
constituição no art. 5º, e cuja violação por parte dos agentes públicos representam
formas de abuso de autoridade, quando;
O art. 5º, em seu inciso II, preconiza a liberdade de autodeterminação,
determinando que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa
senão em virtude de lei.” No inciso XV está estabelecido o direito a liberdade de
locomoção no território nacional em tempos de paz, podendo qualquer pessoa, nos
termos da lei, nele entrar, permanecer e dele sair com seus bens.
No inciso LIII do referido artigo está determinado que ninguém será privado
de sua liberdade e de seus bens sem o devido processo legal. Trata-se de uma
importante garantia aos direitos de liberdade uma vez que exige que a supressão ou
restrição desta deverá se dar após o devido processo legal. Já no inciso LXI do
mesmo artigo está determinado que ninguém será preso, salvo em flagrante delito
ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente. No caso
de haver prisão, determina o inciso LXII, que esta deverá ser informada
imediatamente ao Juiz competente e à família do preso ou qualquer pessoa por ele
indicada.
Também deriva do direito de liberdade, o direito a privacidade de domicílio,
previsto inciso XI: “a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém podendo nela
penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou
desastre, ou para prestar socorro ou durante o dia, por determinação judicial.” Outra
importante proteção ao direito de liberdade encontra-se do art. 5º, XII, que assegura
ser inviolável “o sigilo de correspondência e das comunicações telegráficas, de
dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas
36
hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou
instrução processual penal.”
Todos estes preceitos constitucionais relativos à proteção da liberdade,
colocados no capítulo relativo aos direitos individuais foram motivados pelo período
dos governos militares, em que eram comuns as ofensas as liberdades individuais,
como prisões ilegais, invasões de domicílio, negativa de informações, negativa de
assistência de advogado e da família, incomunicabilidade de pessoas presas, entre
outros. Aquele período histórico, marcado pelo emprego abusivo da força estatal,
vários direitos de liberdade foram violentamente agredidos, o que deu ensejo a
consagração de inúmeras garantias no texto da constituição.
Se observarmos a história do país, é possível concluir que muitos foram os
caminhos já percorridos para que tivéssemos uma norma reguladora sobre o
excesso de ação do Estado sobre seu povo, e a positivação dos direitos de
liberdade na Constituição representou um grande avanço para a proteção da
dignidade da pessoa humana e para a limitação da atuação do Estado em suas
atividades, especialmente aquelas relacionadas aos órgãos de segurança pública.
Neste sentido para a caracterização do abuso de autoridade, é necessário
que a ação ou omissão tenha como sujeito ativo um agente que exerça qualquer
função pública, percebendo remuneração ou não. Pois o crime do abuso de
autoridade é crime próprio, conforme previsto no art. 5º da lei 4898/65. Esta é uma
condição fundamental para a averiguação da responsabilidade administrativa civil e
penal, por parte daquele que deixou de observar uma conduta mínima exigível para
proteção dos direitos e garantias individuais dentro de um Estado de direito. Senão
vejamos o texto literal do art. 5º da lei em comento: “Considera-se autoridade, para
os efeitos desta lei, quem exerce cargo, emprego ou função pública, de natureza
civil, ou militar, ainda que transitoriamente e sem remuneração.”
Para Meirelles (2000, p.380) a função pública é
[...] a atribuição ou conjunto de atribuições que a Administração
confere a cada categoria profissional, ou comete individualmente a
37
determinados servidores para a execução de serviços eventuais,
sendo comumente remunerada atreves de pro labore.
Celso Antônio Bandeira de Mello (2003 p. 233) em sua explicação define a
expressão cargo público dizendo que;
cargos são as mais simples e indivisíveis unidades de competência a
serem expressadas por um agente, prevista em numero certo, com
denominação própria, redistribuídas por pessoas jurídicas de Direito
público e criadas por lei.
Em suma, as pessoas que englobam diretamente ou indiretamente a
administração pública, devem ter como espelho a legislação que norteia a legalidade
dos atos, para uma eficiência e satisfação do interesse público.
2.2 A responsabilidade penal, civil e administrativa decorrente do abuso de
autoridade
O conceito de agentes públicos emerge diretamente do âmbito do direito
Administrativo. Deste modo não é possível falar em autoridade pública sem adentrar
o campo do direito administrativo que está diretamente ligado por meio da
administração pública, regulando o agir do servidor, da autoridade que deve
desenvolver a sua função voltada ao interesse da coletividade.
Neste sentido o art. 37 da Constituição estatui que:
A administração pública direta, indireta ou fundacional, de qualquer
dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos
Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e, também, ao seguinte:
Isto significa que os servidores da administração pública desde o ingresso
na carreira pública devem pautar sua conduta pelo mais absoluto respeito a
legalidade instituída, observando rigidamente os Princípios Constitucionais. Pois os
seus direitos e deveres, devido à função pública que exercem, são norteados
diretamente pela ordem constitucional, a qual confere a administração pública o
dever de apurar as infrações e aplicar as devidas penalidades aos servidores
públicos que estão sujeitos à disciplina administrativa.
38
Diante do conhecimento de falta praticada por servidor, a administração tem
o dever de instaurar o procedimento adequado para que seja apurada a
irregularidade e quando for o caso, aplicar a sanção cabível que poderá ser de
natureza civil, penal e administrativa. Sendo possível um só ato ensejar a
responsabilidade nas três esferas.
O art. 6º da lei 4.898/65 prevê que quando a autoridade agir com abuso,
logo estará sujeito às sanções de natureza administrativa, civil e penal. O parágrafo
primeiro do referido artigo estabelece as sanções administrativas que podem ser
advertência, repreensão, suspensão do cargo até 180 dias, destituição de função,
demissão e ou então, demissão a bem do serviço público.
O procedimento administrativo obrigatoriamente deverá ser instaurado
através de uma Portaria, sendo que a responsabilidade administrativa é
independente da responsabilidade civil e da criminal. Porém a decisão do juízo
criminal penal deverá prevalecer fazendo neste sentido coisa julgada na área cível e
na esfera administrativa, conforme disposição do art. 935 do Código Civil. In verbis:
Art. 935- A responsabilidade civil é independente da criminal, não se
podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou sobre quem
seja o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no
juízo criminal.
Diante da dupla subjetividade passiva do crime, ou seja, o Estado e a vítima
direta, que será o terceiro, exige-se a condição de agente público investido na
função por parte do sujeito ativo, conforme definido no art. 5º da Lei 4898/65. Visto
que, pela função que exerce representa uma ação do Estado. E neste sentido,
Freitas, (1999 p. 89) diz que:
[...] não é imprescindível que o indivíduo seja funcionário público,
necessário é que exerça uma função pública, a qual é qualquer
atividade que realiza fins próprios do estado, ainda que exercida por
pessoas estranhas á Administração Pública ou gratuitamente.
A responsabilidade civil elencada no parágrafo 2º do art. 6º da lei 4.898/65
tem por base normativa o Código Civil que prevê em seu art. 186 que "aquele que,
39
por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar
dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito." Deverá por
obrigação repará-lo. E diante do crime de abuso de autoridade, o ilícito civil se
caracteriza com a ação ou omissão antijurídica que podem atingir a ordem material
ou moral, onde o dano reflete contra o Estado ou contra terceiros.
Quando o lesado é o Estado, este será apurado pela própria administração
através de um processo administrativo, em que o servidor que cometeu o dano terá
o direito da ampla defesa e do contraditório que são garantias constitucionais. Logo,
quanto aos danos causados a terceiros civis, o Estado responderá objetivamente
independente da culpa ou dolo. Mas o Estado poderá buscar esta reparação por
meio da ação regressiva contra o servidor causador do dano.
As sanções de natureza criminal, estabelecidas no parágrafo 3º do diploma
específico, se baseiam nos arts. 42 a 56 do Código Penal, sendo possível aplicação
de: multa, detenção por 10 dias a 6 meses, e perda do cargo e inabilitação para o
exercício de qualquer outra função pública pelo prazo de até 3 anos.
2.3 A competência para julgamento do crime de abuso de autoridade – Súmula
172 do STJ
Uma questão que ainda nos dias atuais provoca polêmica é a questão
relativa à competência para processar e julgar os crimes praticados com abuso de
autoridade, quando o agente está no exercício da função por militar. Questiona-se
se este seria de competência da Justiça Comum ou da Justiça Militar,
Com o objetivo de assegurar a tutela Jurídica da Hierarquia e da Disciplina,
a Justiça Militar brasileira, atua com rigor sendo uma de suas principais
características a severidade de suas penas. Fato este, que a leva a constantes
acusações de afronta à nova ordem Constitucional de 1988, tendo, inclusive, alguns
dispositivos de sua ordem normativa sido declarados inconstitucionais pelo Supremo
Tribunal Federal.
40
Seja de nível estadual ou federal a Justiça Militar, também é conhecida
como Justiça Castrense, que é um adjetivo que se refere a casa militar ou
acampamento militar. Deriva do latim castrorum, onde no período romano os
homens eram julgados sumariamente quando cometiam falhas nas batalhas.
(Barroso Filho, 1999).
A Justiça Militar Estadual atua conforme a competência definida pelo art. 125
§3º e §4º da CF/88, e está presente nos Estados onde o número de militares for
maior de vinte mil homens. Com a emenda Constitucional 45, a Justiça Militar atua
por meio de conselhos, que são formados por um Juiz de Direito o qual será o
presidente e quatro oficiais Militares, que, depois de recebida a denúncia, o JuizAuditor militar providencia a instalação do conselho de justiça. Vejamos:
§ 3º A lei estadual poderá criar, mediante proposta do Tribunal de
Justiça, a Justiça Militar estadual, constituída, em primeiro grau,
pelos juízes de direito e pelos Conselhos de Justiça e, em segundo
grau, pelo próprio Tribunal de Justiça, ou por Tribunal de
Justiça Militar nos Estados em que o efetivo militar seja superior
a vinte mil integrantes.
§4º Compete à Justiça Militar estadual processar e julgar os militares
dos Estados, nos crimes militares definidos em lei e as ações
judiciais contra atos disciplinares militares, ressalvadas a
competência do júri quando a vítima for civil, cabendo ao tribunal
competente decidir sobre a perda do posto e da patente dos oficiais e
da graduação das praças.
§ 5º Compete aos juízes de direito do juízo militar processar e julgar,
singularmente, os crimes militares cometidos contra civis e as ações
judiciais contra atos disciplinares militares, cabendo ao Conselho de
Justiça, sob a presidência de juiz de direito, processar e julgar os
demais crimes militares.
O militar que comete crime inerente à função militar, ressalvado os crimes
dolosos contra a vida, em regra deve ser submetido à Justiça Militar, para que seja
processado e julgado neste tribunal em razão da função que exerce, a qual se
baseia sobre o principio da hierarquia e disciplina, basilares do militarismo.
Sobre a competência de julgar os crimes de abuso de autoridade praticados
por servidor militar a muitos anos discutia-se nos tribunais superiores sobre a
competência, e até mesmo a natureza jurídica do crime de abuso de autoridade
41
cometido por policial militar no exercício da função, pois, a legislação militar é
omissa a cerca do tema
Diante da omissão da legislação militar, os tribunais superiores foram
provocados, e o Superior Tribunal de Justiça se manifestou em várias ocasiões,
sendo seu posicionamento sumulado através da Súmula 172 do STJ, in verbis:
STJ Súmula nº 172 - 23/10/1996 - DJ 31.10.1996
Competência - Militar - Abuso de Autoridade - Processo e
Julgamento. Compete à Justiça Comum processar e julgar militar por
crime de abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço.
Após a superação da questão quanto ao tribunal competente é importante
destacar que diante do excesso cometido e havendo concurso material de crimes,
como por exemplo, um abuso de autoridade e uma lesão corporal é perfeitamente
cabível ao militar ser processado e julgado no Tribunal Militar pela lesão, e o crime
de abuso de autoridade perante a Justiça Comum. Este é o entendimento expresso
no julgado do STJ que assim determinou:
Compete à Justiça Comum processar e julgar militar por crime de
abuso de autoridade, ainda que praticado em serviço, e não para por
aí: "Policiais militares denunciados perante a Justiça Comum e
Militar. Imputações distintas. Competência da primeira para o
processo e julgamento do crime de abuso de autoridade, não
previsto no Código Penal Militar, e da segunda para o de lesões
corporais, porquanto os mesmos se encontravam em serviço de
policiamento. Unidade de processo e julgamento excluída pela
incidência do art. 79, I, do CPP" (STJ – RT, 663/347).
Nesta senda, conclui-se com o entendimento jurisprudencial de que compete
à Justiça Comum, justiça ordinária estadual conhecer e julgar o militar que comete
crime de abuso de autoridade contra cidadão civil capitulado na lei 4.898/65. Este
entendimento é fundamentado com base de que não há previsão legal deste crime
na legislação penal Militar (Código Penal Militar). E ainda, a lei que regula o
processo de responsabilização dos crimes de abuso de autoridade, dispõe que este
crime será julgado pela Justiça Comum.
Diante da definição de competência da Justiça Comum, aplicam-se, quanto
a competência jurisdicional o art. 69 e seguinte do Código de Processo penal, que
determinam que para definição da competência deve-se levar em conta,
42
sucessivamente: o lugar da infração, o domicílio do réu, a natureza da infração, a
distribuição, a conexão ou continência, a prevenção e a prerrogativa de função.
Art. 69. Determinará a competência jurisdicional:
I - o lugar da infração:
II - o domicílio ou residência do réu;
III - a natureza da infração;
IV - a distribuição;
V - a conexão ou continência;
VI - a prevenção;
VII - a prerrogativa de função.
Diante do exposto, é possível concluir, que enquanto não se elabore
disposição em contrário pelo Poder Legislativo, o militar que praticar crime de abuso
de autoridade contra um civil, no exercício da função, deverá ser submetido à Justiça
Comum
para
ser
processado
e
julgado,
observando-se
as
ressalvas
e
especificidades da legislação militar brasileira.
2.4 As garantias individuais, os limites do poder de policia e o abuso de
autoridade no âmbito da Brigada Militar
Inicialmente a sociedade primitiva resolvia seus conflitos de forma direta,
entre as partes, pela força. Essa forma, além de se caracterizar essencialmente pela
violência, seja de um indivíduo ou do grupo, muitas vezes acabava pelo extermínio
ou expulsão do adversário. Isso deixava em permanente alerta a todos, pois, não
tinham um amparo imparcial, nem uma análise se sua causa era justa. Ficavam a
mercê de um confronto, onde a lei era determinada pelo mais forte.
Essa estrutura evoluiu, na busca de segurança e equilíbrio nas relações
primitivas, quando surgiu o Estado como o centralizador do poder de polícia,
cabendo somente a ele exercer a violência para fins de controle social. A sociedade
é submetida ao poder do Estado, que se torna o responsável pela segurança e a
organização social. E Celso Antonio Bandeira de Mello, ao abordar a função do
Estado (2003 p. 27) nos traz este entendimento quando diz que
[...] a função pública, no Estado democrático de Direito, é a atividade
exercida no cumprimento do dever de alcançar o interesse público,
mediante o uso dos poderes instrumentalmente necessários
conferidos pela ordem jurídica.
43
Os conflitos, as transgressões das regras sociais são inevitáveis, e o Estado
por meio de seus órgãos desenvolve um controle sobre a organização social,
enfocando o resultado positivo em proveito da coletividade, sob pena de, na falta de
controle, a sociedade se tornar uma terra de ninguém, onde a segurança e a
garantia da justiça não prevaleçam. Diante desta necessidade de controle surgem as
instancias formais formadas pela polícia, o judiciário, o sistema penitenciário etc. e
do outro lado o sistema informal formado pela família, escola, clube, a opinião
pública, igreja etc. E pela regra é que a instância formal atuando quando a instancia
informal falhar dentro da estrutura social. Este também é o ensinamento de João
Ricardo Wanderlei Dornelles (2003 p. 20)
De qualquer forma, o modelo social que se implantou a partir dos
anos oitenta do século XX utiliza novos instrumentos e estratégias de
controle social com mecanismos defensivos da ordem, resultando em
um modelo desintegrador que produz uma sensação de insegurança
e medo.
A ordem social, segundo este paradigma neoconservador, se
neutraliza, de acordo com as necessidades impostas pela nova
forma de acumulação de capital, reproduzindo relações sociais
compatíveis e funcionais com o novo modelo. É justamente aqui que
os novos mecanismos de controle social são formulados e passam a
ser aplicados.
Para Stanley Cohen, por controle social pode-se entender um
conjunto de meios pelos quais uma sociedade responde aos
indivíduos ou grupos sociais que, de alguma maneira, colocam em
risco a ordem estabelecida. [...]. Ainda segundo o autor Stanley
Cohen, o controle social pode se expressar como uma parte do
aparato coercitivo do Estado ou como parte oculta da polícia social.
Dessa maneira, os mecanismos do controle social buscam a
acomodação das ações para a manutenção e reprodução de uma
determinada ordem social.
Como regulador do controle social, o estado por meio dos órgãos
competentes busca a contenção de impulsos e tendências prejudiciais ao bem
comum, atribuiu um poder discricionário ao órgão da polícia para ter uma maior
garantia de obter resultado positivo neste controle. Mas este controle social não é
invenção da sociedade moderna, e sim, deste os tempos em que o ser homem
iniciou sua organização em grupos, onde se busca equilibrar os impulsos individuais,
adequando-os aos interesses do grupo todo, recebendo apenas um formato variável
ao longo do tempo, a exemplo do mencionado por Dornelles.
44
O Estado como patrocinador do controle social possui legislação reguladora
para o êxito da vida em sociedade. Legislação esta que confere a todo ser humano a
titularidade de direitos e que se transformam num bem jurídico que deve ser
respeitado. E quando houver ofensa a esse bem jurídico o Estado deve agir para
corrigir de forma educativa e restabelecer a ordem social. Ou seja, o Estado chama
para si o poder/dever de agir através da polícia competente, conforme o §5º art. 144
da Constituição Federal, atuando de forma imparcial e impondo as regras/decisão a
qual as partes devem adequar-se dentro da legalidade e de forma pacífica buscar o
convívio social. Em outras palavras Lazzarini (1989, p. 235-236) nos ensina que:
[...] no tocante à preservação da ordem pública, às polícias militares
não só cabe o exercício da polícia ostensiva na forma
retroexaminada, como também a competência residual de exercício
de toda atividade policial de segurança pública não atribuída aos
demais órgãos. A competência ampla da Polícia Militar na
preservação da ordem pública, engloba, inclusive, a competência
específica dos demais órgãos policiais, no caso de falência
operacional deles, a exemplo de greves ou outras causas, que os
tornem inoperantes ou ainda incapazes de dar conta de suas
atribuições, funcionando, então, a Polícia Militar como verdadeiro
exército da sociedade. Bem por isso as Polícias Militares constituem
os órgãos de preservação da ordem pública para todo o universo da
atividade policial em tema da ‘ordem pública’ e, especificamente, da
‘segurança pública’.
Logo, para que haja uma harmonia entre o Estado e a Sociedade é
necessário que cada parte se comprometa com suas responsabilidades. Ou seja. as
instâncias formais não funcionam sem a participação positiva da instancia informal.
Neste sentido buscamos este entendimento nas palavras de Ana Sofia
Schmidt De Oliveira (1998 p. 157) onde diz que:
Sem um diálogo entre as diversas instâncias formais e informais,
sem uma crítica e autocrítica constante, sem buscar enxergar o todo,
o nosso sistema penal e a policia dentro dele vão continuar
combatendo a criminalidade que eles próprios reproduzem e
reproduzindo a criminalidade que pretendem combater. Se dá para
acreditar na polícia é porque dá para acreditar no homem e não na
arma que ele carrega.
Em respeito às garantias individuais, a ação da Brigada Militar sempre se
legítima quando sua intervenção se pautar nas garantias e observados os direitos
45
fundamentais dos cidadãos, vinculando sua ação num ordenamento que concretize
a plenitude de direitos postulados em um Estado Democrático de Direito.
Como já mencionado compete a Brigada Militar como símbolo coercitivo do
Estado preservar a ordem pública, e como instância formal, assegurar o exercício
dos direitos outorgados ao cidadão. Diante do exercício de suas atribuições, a
Brigada Militar possui o poder de polícia, que a autoriza a empregar a força
necessária para o restabelecimento da paz e da tranqüilidade pública limitando
neste sentido os direitos daqueles que contrariem a ordem legal estabelecida.
Os servidores militares no desempenho das suas funções encontram-se
atrelados aos limites da lei. Embora suas atividades possuam aspectos
discricionários, que são fundamentais para o exercício das funções de segurança
pública, o seu ato de polícia que é um ato administrativo não pode ser praticado com
excesso ou desvio de poder, sob pena de ser invalidado pela justiça, alem de ser
responsabilizado pelo excesso nas esferas civil administrativa ou penal. Sobre isso,
Hely Lopes Meirelles (2000 p.104) ensina que
O excesso de poder ocorre quando a autoridade competente para
praticar o ato vai além do permitido e exorbita no uso de suas
faculdades administrativas. Excede, portanto, sua competência legal
e, com isso, invalida o ato, porque ninguém pode agir em nome da
Administração fora do que a lei lhe permite. O excesso de poder
torna o ato arbitrário, ilícito e nulo.
A atuação da Brigada Militar se justifica pelas garantias constitucionais
existentes uma vez que a sociedade sofre quando as regras sociais não são
cumpridas. Neste caso os órgãos responsáveis da segurança pública não poderão
ser omissos, reestabelecendo a ordem e a paz social e o desenvolvimento do
estado, empregando quando necessário a força, a coação administrativa. E como os
demais órgãos da administração pública, a Brigada Militar igualmente se sujeita as
regras do art. 37 da Constituição Federal, que trata dos princípios da legalidade,
impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência, princípios estes que regem a
administração pública.
46
Nesta senda, toda vez que o servidor militar atuar de forma contrária as suas
atribuições o sujeitará a pratica de abuso de sua autoridade, algo que não contribui
para o combate a violência e a diminuição da criminalidade. Expondo a sociedade
ao risco da insegurança, algo contrário do que a sociedade precisa e espera do
policial que deve ser atuante, mas sempre respeitando os direitos e as garantias
assegurados ao cidadão.
A sociedade busca na Brigada Militar o apoio necessário para o exercício
dos direitos e garantias que lhe são conferidos pela Constituição Federal. Em
resposta a Brigada Militar deverá assegurar o direito à vida, à liberdade, à
propriedade, à segurança, por meio de servidores preparados e capacitados para
exercerem suas funções, de forma positiva ao interesse da sociedade.
Mas, infelizmente, assim como nas demais áreas, ainda existem na Brigada
Militar do Estado do Rio Grande Do Sul, servidores Militares que se desvirtuam de
suas funções constitucionais, e praticam o abuso e o desrespeito à lei, manchando a
instituição. Diante desta realidade de violência e de abusos praticados por
servidores da Brigada Militar somente a lei não será ferramenta suficiente para sanar
os vícios, mas também se faz necessária uma melhor preparação e capacitação dos
profissionais, para que os mesmos exerçam suas funções em prol da cidadania,
observando o principio da dignidade humana. Se o Brasil intitula-se como um Estado
Democrático de Direito que tem por base o princípio da dignidade da pessoa
humana, deve ser este o foco da preparação dos militares estaduais da Brigada
Militar.
Mas como mudar uma cultura autoritária dos servidores se a própria
administração se usa de irregularidades em seus atos administrativos que, muitas
vezes se mostram contrários à ordem constitucional? Pode-se citar como exemplo
de arbitrariedade a aplicação do regulamento disciplinar (RDBM) instituído pelo
Decreto Estadual 43.245/2004. Em função do princípio da reserva legal, não pode o
poder executivo disciplinar por meio de decreto, questões relativas ao regulamento
disciplinar, o qual versa sobre garantias e direitos fundamentais. Logo a competência
é exclusiva do Poder Legislativo que o deverá fazer por meio de lei.
47
Não são raras às vezes em que superiores hierárquicos se utilizam do
RDBM para punir seus subordinados por não gostar daquele, ou para satisfazer um
ato de vontade e assim assegurar seu poder de comando com prepotência e
arbitrariedade. E são vários os dispositivos do regulamento disciplinar que garantem
a submissão dos subordinados aos caprichos dos superiores, mesmo que essa
ordem não contribua para uma evolução social, ou dignidade da administração.
Para melhor ilustrar esta inconstitucionalidade buscamos embasamento
legal no próprio art. 5º, inc. LXI da Constituição Federal:
LXI- ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem
escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente, salvo
nos casos de transgressão militar ou crime propriamente militar,
definidos em lei.
Não bastasse a inconstitucionalidade quanto à origem do Decreto
43.245/2004, seu conteúdo gera muita polêmica quando a administração se baseia
nos basilares da hierarquia e disciplina, na solução de atos administrativos
disciplinares que nem sempre respeitam os direitos e garantias fundamentais
elencados na Constituição Federal.
É imperativo que a autoridade Militar desperte para a aplicação da
Constituição e de seus princípios e garantias, buscando um Regulamento Disciplinar
compatível com a ordem jurídica vigente, a qual esteja ancorada, convictamente no
Estado Democrático de Direito. Pois a instituição Brigada Militar não é uma área
onde a constituição não vigora.
Enquanto as mudanças desejadas não acontecem, temos que quando
ocorre a prática do abuso de autoridade por parte de servidor militar, previsto na Lei
no 4.898/65, este é severamente punido por meio da legislação vigente. E não são
raros os casos em que servidores foram responsabilizados e que ensejou a sua
demissão do quadro de servidores militares, após o devido processo legal, pois suas
atitudes desrespeitaram os direitos do cidadão, as prerrogativas individuais ou as
liberdades públicas elencadas na ordem constitucional e nas leis, que são os limites
do poder de polícia conferido a instituição Brigada Militar.
48
Neste sentido é valido de forma contributiva, os ensinamento de Lazzarini
(1998 p. 21) quando este observa que:
A não observância dos limites aos quais está sujeito o poder de
polícia, é não observar os direitos do cidadão, é não observar as
prerrogativas individuais, é não observar os dispositivos
constitucionais e as leis, e o desvio da missão reservada aos agentes
policiais conduz a prática do abuso de autoridade.
O crime de abuso de autoridade tem como função principal resguardar os
direitos
constitucionais
de
liberdade,
integrantes
da
cidadania
contra
as
arbitrariedades cometidas por servidores militares, devendo o Estado agir de forma
imparcial e severa para extirpar estas mazelas que prejudicam a administração
pública e a sociedade como um todo.
Entre as condutas que, rotineiramente, configuram o abuso de autoridade
dentre as elencadas nos arts. 3º e 4º da lei 4.898/65, o servidor militar está mais
propenso a realizar as ações elencados nas letras “b” (à inviolabilidade de domicílio),
e letra “i” (à incolumidade física do indivíduo), por serem estas mais próximas da
função que exerce o militar estadual. O policial militar no exercício de sua função,
em algumas situações, se torna mais suscetível ao cometimento do excesso, por
atuar, cotidianamente em situações de conflito e de violência que, em geral, geram
extrema tensão ou agressividade. Mas é necessário que o mesmo esteja preparado
para atuar de forma racional e proporcional, pois ao agir de forma arbitrária acaba
praticando o capitulado crime de abuso de autoridade previsto pela lei 4.898/65 e em
nada contribuiu para o estabelecimento da paz social.
Como se viu anteriormente o atentado à inviolabilidade de domicílio do art.
3º, letra “b”, tipifica o abuso de autoridade, visto que a casa é inviolável sem o
consentimento do morador, salvo nas hipóteses previstos na ordem constitucional do
art. 5º XI da Constituição Federal que assim estatui:
Art. 5º- Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer
natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes
no País [...], nos termos seguintes:
[...]
49
XI - a casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo
penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante
delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por
determinação judicial;
Não são poucos os casos em que servidores militares despreparados agem
na emoção ou na prepotência e cometem este delito, conforme jurisprudências dos
nossos Tribunais de Justiça, o que gera desgaste para a administração pública, que
tinha a função de reestabelecer a ordem, e acabou inflando a desordem. Vejamos:
Ementa: Delitos de abuso de autoridade (atentado a inviolabilidade
do domicílio e a incolumidade física do individuo) atribuídos a
policiais militares e delito de lesão corporal. Positivada ofensa à
integridade corporal da vítima, o atentado a incolumidade física
(abuso de autoridade) cometido por policial militar e absorvido pelo
delito de lesão corporal, com incidência da agravante do art. 61, II,
"f", do C. Penal. Competência da Justiça Militar para julgamento do
delito de lesão corporal por policiais militares no exercício de suas
funções, por não admitida conexão ou continência, conforme regra
do art. 79, I, CPP, e da Justiça Comum para julgamento do delito de
abuso de autoridade por atentado a inviolabilidade do domicílio.
Nulidade do processo, desde o recebimento da denúncia, quanto ao
fato que constitui, em tese, delito de lesão corporal, por
incompetência absoluta da Justiça Comum quanto ao delito militar.
Condenação mantida quanto ao delito de abuso de autoridade, com
redução dos apenamentos. (Apelação Crime Nº 694066697, Terceira
Câmara Criminal, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Aristides
Pedroso de Albuquerque Neto, Julgado em 08/09/1994)
O atentado à incolumidade física do indivíduo previsto no art. 3º, letra “i” da
lei nº 4898/65 é um crime marcado pela prepotência, pelo desrespeito a cidadania,
em que o servidor se faz valer de um autoritarismo ilegal e arbitrário para com a
vítima. Neste delito quando resultar em lesão no indivíduo, o servidor militar estará
diante de um concurso de crimes, levando o infrator as sanções judiciais conforme
jurisprudências dos tribunais que já enfrentaram este tipo de crime que ocorre com a
ação desproporcional do servidor militar, e que gera muita polêmica na sociedade.
Ementa: processual penal. Conflito de competência. Em se tratando
de concurso de infrações- lesão corporal e abuso de autoridade
praticada por policial militar, competente e a justiça comum para a
analise do abuso de autoridade, visto que tal delito não esta previsto
no código penal militar. A justiça militar caberá a analise do crime de
lesões corporais. Por outro lado, não ha o que se falar em absolvição
do delito de abuso de autoridade pelo de lesões, mormente quando
aquele esta fundamentando, também, em atentado a inviolabilidade
50
de domicilio. Deram provimento ao recurso a fim de que fosse
recebida a denuncia quanto ao delito de abuso de autoridade,
ficando com a justiça militar o exame do crime de lesão corporal.
(recurso crime nº 70000141945, terceira câmara criminal, tribunal de
justiça do RS, relator: José Domingues Guimarães Ribeiro, julgado
em 07/10/1999)
Convém destacar, por fim, que não é toda lesão que configura o crime, é
necessário que haja a ação desproporcional com a necessidade.
2.5 Violência policial e o papel da polícia militar no Estado Democrático de
Direito
Como se viu até aqui, a Polícia Militar é um dos órgãos encarregados da
segurança pública que integra o braço repressivo do Estado. Deste modo a mesma
está autorizada a utilizar a violência de forma legítima, quando necessário para o
cumprimento de suas funções. Mas a violência legítima deve estar ancorada na
função prevista na lei sem violar os direitos e garantias do cidadão. Todavia não é
essa a realidade absoluta da polícia brasileira que, em muitos casos, age com
excesso, demonstrando uma postura de autoritarismo herdada de culturas
totalitárias que, muitas vezes, é aceita e aplaudida pela sociedade.
A violência policial, que consiste no uso intencional de força desproporcional
e desnecessária, gera graves violações à cidadania, bem como aos direitos do
homem, fragilizando o Estado Democrático de direito, tornando o sistema de justiça
e segurança muito vulnerável. E essa violência deixa transparecer a ineficácia do
sistema policial vigente. Preciso, portanto que o Estado e sociedade reformulem seu
sistema de polícia, para que se tenha uma organização estatal voltada a garantir a
ordem e paz social dentro dos preceitos constitucionais.
Diante do aumento da conflitividade e da violência e frente a precariedade
de políticas públicas de inclusão e de afirmação plena da cidadania, atribui-se aos
órgãos de segurança, exclusivamente, a responsabilidade pela resolução dos
conflitos sociais. Frente ao quadro preocupante da sensação de insegurança somase outra mazela social, que é a dificuldade de uma grande parte da população não
ter acesso a renda, para seu sustento e de sua família e que inflam o perfil daqueles
que buscam por meio do ilícito amenizar esta falta de renda.
51
Cabe destacar também a cobrança cada vez maior da sociedade, que
necessita e pressiona para que a polícia traga soluções rápidas para os atos
considerados criminosos, que demonstre a sensação de vitória do bem sobre o mal.
Neste contexto a atuação violenta e/ou abusiva da polícia é vista como a melhor
saída para o controle do crime e da violência na sociedade.
Dentre seus objetivos, convém destacar que a Brigada Militar deve estar
preparada para a solução dos conflitos, por meio da uma mediação que é um
remédio imprescindível numa sociedade que está cada vez mais carente de
pacificação em função da propagação de uma cultura conflitiva. Percebe-se,
contudo, que o diálogo está cada vez mais sendo posto de lado e o individualismo
toma lugar do coletivismo. A solução de conflitos, realizada de forma consensual,
tem abrangido um grande número de indivíduos de forma eficaz, face à construção
dos caminhos a serem trilhados de forma conjunta pelas partes.
Neste sentido buscamos demonstrar a importância da pacificação nas
palavras de Cintra, Grinover, Dinamarco (2003, p. 25-26):
[...] vai ganhando corpo a consciência de que, se o que importa é
pacificar, torna-se irrelevante que a pacificação venha por obra do
Estado ou por outros meios, desde que eficientes. Por outro lado,
cresce também a percepção de que o Estado tem falhado muito na
sua missão pacificadora, que ele tenta realizar mediante o exercício
da jurisdição e através de formas do processo civil, penal ou
trabalhista.
A incorporação de uma filosofia da mediação na atuação da Brigada Militar,
pode contribuir para o rompimento com posturas violentas e arbitrárias, dentro de
uma lógica de inclusão e de paz social. Pois com a mediação é o vínculo afetivo
entre as partes conflitantes, que interfere na racionalidade. Neste sentido buscamos
os ensinamento de Marcos Rolin (2006 p. 73) que nos contribui dizendo:
De fato, em um Estado Democrático de Direito, a polícia não pode se
furtar a desempenhar um papel de mediador entre vários interesses
muitas vezes conflitantes. A sensibilidade necessária para este tipo
de abordagem pode ser decisivo para a afirmação de um novo
52
equilíbrio social, mesmo que provisório como convém a uma
democracia.
A competência do mediador é fundamental para o êxito da solução do
conflito. E como indivíduo que desempenha a função de mediador o servidor militar
deve possuir uma qualificação para exercê-la. Daí decorre a necessidade de se
buscar um novo método de formação dos profissionais que atuam na segurança
pública, especialmente os policiais militares, que atuam cotidianamente junto a
sociedade. Marcos Rolin (2006 p. 96) destaca que parte da ineficiência policial é
devido a falta de profissionais preparados e, capazes de medir o grau de ação que
deverão desenvolver, conduzindo as partes para que consigam visualizar o
problema, a fim de que consigam também encontrar a solução com celeridade e
economia evitando muitos litígios judiciais.
Na verdade, quando tratamos do trabalho policial estamos nos
referindo a uma das funções mais complexas e difíceis que há, cujo
desempenho exige um grau de especialização e conhecimentos
seguramente bem superior a várias outras atividades laborais
contemporâneas que, já há muito tempo, só podem ser exercidas por
profissionais de nível superior. Entretanto, como sabemos, na maior
parte dos países o ingresso nas polícias não depende de formação
de nível superior. Quando essa exigência é feita – e apenas para
algumas funções policiais –, o que se tem é o pré-requisito de um
diploma universitário, quase sempre de formação específica em
direito ou, mais amplamente, na área de ciências humanas. Para ser
policial, então, não se exige formação superior em segurança
pública, uma condição tão rara quanto as oportunidades de
especialização oferecidas na área.
José Lauri Bueno de Jesus (2008 p. 127) nos ensina dizendo:
É certo que a polícia militar precisa ser eficaz naquilo que lhe cabe, e
para isso, deve e necessita melhorar muito, e também sair de uma
situação genérica de capital humano pouco qualificado para alcançar
o patamar de profissões especializadas, pois sua contribuição no
processo ocorre, favoravelmente, pela qualidade dos serviços
prestados e não pela quantidade de pessoal distribuído nas ruas.
Neste novo modelo, também é necessário o comprometimento da sociedade
e do Estado para que o sistema funcione, para que cada indivíduo assuma seu
papel com responsabilidade e entenda que a segurança pública engloba a todos.
Esta responsabilidade coletiva deriva do comando constitucional, quando no art. 144
53
caput da Constituição Federal menciona que; “A segurança pública dever do estado,
direito e responsabilidade de todos.”
José Lauri Bueno de Jesus (2008 p. 127) aponta o entendimento de que é
preciso mudar a cultura da segurança pública quando diz que:
A sociedade, ao cobrar somente da polícia o controle da
criminalidade e violência, vê, nessa instituição, um certo despreparo.
Entretanto, na verdade, ela (sociedade) não quer preocupar-se com
as verdadeiras causas que motivam a insegurança. Isto se deve à
cultura do uso da polícia para sustentar a elite econômica e política
que começou deste a chegada dos portugueses ao Brasil.
Não há mais espaço para posturas individualistas, e não se pode continuar
atribuindo a função de segurança pública como responsabilidade exclusiva da
polícia. Pois de nada adianta termos um aparato policial implacável se tivermos uma
cultura social voltada a infringir as regras e se os fatores que originam a violência
não forem enfrentados. Para ilustrar melhor esse entendimento, valem as palavras
de Ana Sofia Schmidt De Oliveira (1998 p. 157) quando aborda a idéia da
participação de todos no convívio social.
O crime é um problema da comunidade e tem que ser resolvido na
comunidade. É problema de todos e não da policia. Uma comunidade
que não se interessa pelo problema do crime, que pensa que sua
segurança será maior na medida que for maior o número de
criminosos atrás das grades, que não consegue desenvolver
sentimentos de solidariedade, que permanece indiferente, que só se
manifesta para criticar a ineficiência das instâncias formais, é cruel,
hipócrita, e merece a taxa de criminalidade que tem.
Se as relações sociais sofrem constantes adequações e alterações, é
porque cada indivíduo possui o seu espaço, onde deve desempenhar a sua função
social para que o conjunto social num todo esteja em harmonia. Quando alguma
parte não desempenha bem o seu papel no conjunto, surge um conflito. E quando
estes conflitos contrariam as normas surge o Estado através do órgão coercitivo
para que se restabeleça a ordem harmônica.
O policial que se precisa na atualidade é aquele servidor que está
capacitado, para desempenhar o papel de terceiro imparcial e conduzir os conflitos
54
de modo a favorecer o diálogo entre as partes conflitantes a fim de construírem em
conjunto a solução pacífica. Ou seja, embora tenha atuação coercitiva o servidor
deve se valer de virtudes positivas como; ser paciente, inteligente, criativo, confiável,
humilde, objetivo, hábil na comunicação e ser imparcial com relação ao conflito e ao
resultado, virtudes estas, que o respaldam na lei, moral e eticamente quanto a sua
atuação. Deve procurar trabalhar num prisma que visa o comprometimento de cada
parte com sua responsabilidade conforme seu comprometimento no conflito gerado,
que certamente elevará o nível de satisfação da sociedade.
55
CONCLUSÃO
Para manter a sociedade organizada, garantindo o acesso a direitos
fundamentais à todos, o Estado assumiu competências que são fundamentais para o
alcance das expectativas propostas. E nesta organização, compete ao Estado
garantir a proteção dos direitos individuais e assegurar ao seu povo o pleno
exercício da cidadania.
Como o conflito e as transgressões das regras sociais são uma questão
inevitável, o Estado desenvolveu um sistema de controle sobre a organização social,
na busca de resultados positivos em proveito da coletividade. As instâncias de
controle social são fundamentais, pois na falta delas a sociedade se tornaria uma
terra de ninguém, onde a segurança e a garantia da justiça não prevaleceriam
Diante desta necessidade de controle surgem as instancias formais formadas pelas
polícias, o judiciário, sistema penitenciário etc. e do outro lado o sistema informal
formado pela família, escola, clube, a opinião pública, igreja etc. Em geral as
instâncias formais atuam quando as instâncias informais falham dentro da estrutura
social.
Entre as forças que integram a segurança pública estão as Polícias Militares,
que são forças auxiliares das forças armadas, as quais têm por função primordial o
policiamento ostensivo, atuando na prevenção da criminalidade e auxiliando o Poder
Judiciário para que os infratores da lei sejam responsabilizados, além de garantir a
preservação da ordem pública, buscando assegurar as garantias individuais, no
âmbito dos Estados e do Distrito Federal.
56
Para que a polícia possa atingir seus objetivos o Estado lhe atribuiu poderes
ou prerrogativas especiais de Direito Público, onde se destaca o poder de polícia,
uma vez que, sua atividade se realiza em prol do interesse público, restringindo
assim,
direitos
individuais,
caracterizando-se
pela
discricionariedade,
auto-
executoriedade e pela coercibilidade.
A administração Pública deve estar comprometida buscando agir pelo
interesse da coletividade, se sobrepondo ao particular, regulando suas ações
baseado na lei, e banindo as ações obscuras que desvirtuam os preceitos
constitucionais do Estado Democrático de Direito, elencados no art. 37, caput, da
Constituição Federal de 1988. Ou seja, o poder administrativo concedido a
autoridade pública deve ter limites certos e deverá obedecer a uma forma legal de
utilização.
Como Estado Democrático Constitucional de Direito, onde a dignidade da
pessoa humana é um valor fundamental constitucional, para uma eficácia dos
princípios constitucionais, deverá a administração pública controlar e inibir qualquer
ato atentatório aos direitos individuais. E neste sentido, a lei que trata do abuso de
autoridade, é uma ferramenta que objetiva a proteção material, e que norteia a
correta atividade do agente público e a defesa das garantias individuais. Dando ao
crime de abuso de autoridade um rito próprio visto que se caracteriza pelo excesso
praticado pela autoridade no exercício da função, cuja sanção poderá implicar em
responsabilidade administrativa, civil e penal conforme regulamentado pela lei n.
4.898/65.
Em função da gravidade constitucional lesiva compete à justiça comum atuar
no feito, ainda que praticado por servidor militar. Pois diante da omissão da
legislação militar, a súmula 172 do STJ, atribuiu a competência à justiça comum
processar e julgar o militar que no exercício da função praticar crime de abuso de
autoridade. A representação não depende do ofendido, pois como é uma ação penal
pública incondicionada esta tem como titular da ação o representante do Ministério
Público. Ainda, é pacífico o entendimento do judiciário, que quando em concurso
material de crimes, o crime de abuso de autoridade será julgado na justiça comum e
o outro na justiça castrense.
57
Para a caracterização do abuso de autoridade, é necessário que a ação ou
omissão tenha como sujeito ativo um agente que exerça qualquer função pública,
percebendo remuneração e estabilidade ou não. Exigência esta, que é condição
fundamental para a averiguação da responsabilidade administrativa civil e penal, por
parte daquele que deixou de observar uma conduta mínima exigível para proteção
dos direitos e garantias individuais dentro de um estado de direito.
Diante da atuação da Brigada Militar muitas vezes se discute o uso da força
alegando que esta foi usada de forma indiscriminada e que tal atitude estaria ao
alcance do chamado abuso de autoridade. Sabe-se que o uso da força muitas vezes
se faz necessário numa ocorrência policial. Porem esta deve ter limites para
respaldar a ação dentro da legalidade. Conforme o risco pode a força poderá variar
da simples presença policial, como inibidor do delito, até o uso da arma de fogo, em
último caso, como força letal.
O agir conforme os diplomas legais não é uma faculdade do policial militar,
mas sim um dever, pois o poder de polícia que detém nunca respalda a ação
violenta, ilegítima e criminosa de quem tem o dever de manter a ordem, e a
tranquilidade social. Também, o uso da força não pode ser confundido com a
violência, sendo que a violência enseja ilegitimidade, arbitrariedade que configura
abuso de autoridade pelo qual o agente público poderá ser responsabilizado nas
esferas administrativa, penal e cível.
O Militar que comete crime inerente à função militar, ressalvado os crimes
dolosos contra a vida, em regra deve ser submetido à justiça Militar, para que seja
processado e julgado neste tribunal em razão da função que exerce como Militar, a
qual se baseia na tutela jurídica da hierarquia e disciplina. Embora com acusações
de afronta à nova ordem constitucional, atua com rigor e severidade na aplicação de
sanções aos servidores que nela são processados e julgados.
A violência policial, que consiste no uso intencional e desproporcional da
força, que gera graves violações inevitáveis à cidadania, bem como aos direitos do
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homem, fragilizando o Estado Democrático de direito, torna o sistema de justiça e
segurança muito vulnerável.
Precisamos uma nova estrutura e um maior comprometimento da sociedade
e do Estado para que o sistema funcione, onde cada indivíduo assuma seu papel
com responsabilidade e entenda que a segurança pública engloba a todos. Pois a
segurança pública, pela ordem constitucional é uma responsabilidade de todos.
Nesse contexto, o policial que se precisa na atualidade é aquele servidor
que está capacitado para desempenhar o papel com todas as virtudes que se possa
exigir na sua profissão e assim, assegurar os direitos de cidadania.
59
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