PODER JUDICIÁRIO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DE SÃO PAULO ACÓRDÃO/DECISÃO MONOCRATICA REGISTRADO(A) SOB N° ACÓRDÃO *01825416* Vistos, DIRETA DE relatados e discutidos INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI estes n° autos de AÇÃO 154.726-0/2-00, da Comarca de SÃO PAULO, em que é requerente GOVERNADOR DO ESTADO DE SAO PAULO sendo requeridos PREFEITO DO MUNICÍPIO DE CASA BRANCA,PRESIDENTE DA CÂMARA MUNICIPAL DE CASA BRANCA: ACORDAM, Estado de São em Orgão Especial Paulo, proferir a do Tribunal de Justiça do seguinte decisão: "JULGARAM PROCEDENTE A AÇÃO. V.U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão. O RUY CAMILO CANGUÇU julgamento teve a participação dos Desembargadores (Presidente), LUIZ TÂMBARA, MUNHOZ SOARES, SOUSA LIMA, DE ALMEIDA, CELSO LIMONGI, VIANA SANTOS, IVAN SARTORI, MAURÍCIO FERREIRA LEITE, OSCARLINO MOELLER, PALMA BISSON, RIBEIRO DOS SANTOS, ARMANDO DE TOLEDO, JOSÉ SANTANA, DEBATIN CARDOSO, PAULO TRAVAIN E DAMIÃO COGAN. São Paulo, 18 de junho de 2008. RUY CAMILO Presidente MARIO DEV.IENNE FERRAZ Relator JOSÉ REYNALDO, Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 1 5 4 . 7 2 6 - 0 / 2 - 0 0 - Comarca de São Paulo. Requerente: Governador do Estado de São Paulo. Requerido: Prefeito do Município de Casa Branca e Outro. Voto n° 1 4 . 1 3 3 . AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. Lei n° 2 739, de 4 de novembro de 2005, que "Proíbe a construção, ampliação ou a implantação de novas instalações de presídios, casas de custódia, Febems ou dependências de cumprimento de pena privada de liberdade na zona urbana e rural do município de Casa Branca " Invasão da competência, concorrente, da União, Estados e Distrito Federal, para legislar sobre direito penitenciário, urbanist/co e de proteção a infância e a juventude, bem como da competência residual dos Estados, em matéria de segurança pública Autonomia do município que e limitada, ante a supremacia do Estado e, sobretudo, da União Violação a dispositivos da o Carta Política Federal e, em especial, aos artigos 1 , 111, 139, "caput", 144 e 278, VI, todos da Constituição do Estado de São Paulo inconstitucionalidade Ação julgada procedente para declarar a da lei impugnada Vistos. 1. O Governador do Estado de São Paulo ajuizou esta ação direta de inconstitucionalidade, com pedido de medida liminar, pretendendo desde logo a s u s p e n s ã o dos efeitos e, a final, a declaração de inconstitucionalidade d a Lei Municipal n° 2 739, de 04 de novembro de 2 0 0 5 , do Município de C a s a Branca, que "Proíbe a Construção de Novos Presídios, Casas de Custódia, Febems ou Dependências de Pena Privada da Liberdade na Zona Urbana e Rural do Município de Casa Branca " (íl. 11). Alega, em resumo, que a lei combatida contém vício de origem, porquanto invadiu esfera de Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 1 Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial reservada a competência da União, Estados e Distrito Federal sobre direitos penitenciários, de proteção à infância e à juventude, e urbanísticos, ao editar norma que proíbe a construção, ampliação e implantação de novas instalações de presídios, casas de custódia, Febems e dependências próprias de cumprimento de pena privativa de liberdade na zona urbana e rural do mencionado município, pois agride, de forma desabrida, o dever do Estado de preservação da segurança pública, impedindo-se de executar sua política penitenciária. Sustenta afronta aos artigos I o , "capuf, 22, I, 24, inciso I, e seus §§ I o e 2 o , c c. 30, VIII, e 144, "capuf, todos da Constituição Federal e artigos I o e 139, "capuf, e 144, todos da Carta Política Estadual (fls. 2/10). A medida liminar foi concedida por este Relator, suspendendo, com efeito "ex nunc", a vigência e eficácia da lei atacada, até julgamento desta ação (fls. 13/ 14). Notificada, a Câmara Municipal prestou as informações requisitadas, defendendo a constitucionahdade da lei em questão (fls. 24/28), enquanto que o Prefeito Municipal deixou transcorrer uin albis" o prazo para se manifestar (fl. 45). O despacho inicial dispensou manifestação do Procurador-Geral do Estado porque a inicial vem assinada por ele, juntamente com o Governador do Estado. A ilustrada Procuradona-Geral de Justiça opinou pela procedência do pedido (fls. 35/44) É a síntese do necessário. A < \ Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 2 Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial 2 . A matéria relativa à edição de leis pelos municípios, proibindo a construção, ampliação e implantação de novos presídios, cadeias públicas, u n i d a d e s d a Febem ou de o u t r o s estabelecimentos penais d e s t i n a d a s ao c u m p r i m e n t o de p e n a privativa de liberdade, não é nova e em diversas o p o r t u n i d a d e s j á foi e x a m i n a d a por este Colendo Órgão Especial, que sobre o t e m a vem decidindo invariavelmente pela flagrante inconstitucionalidade de atos normativos desse jaez. Com efeito, não vinga a alegação de que, ao editarem n o r m a s d e s s a natureza, os municípios estão a exercer s u a a u t o n o m i a prevista n a Constituição Federal p a r a legislar sobre a ocupação de seu solo, porquanto prevalece, n e s s e s c a s o s , a competência concorrente do Estado p a r a disciplina versando direito penitenciário, urbanístico e de proteção à infância e à j u v e n t u d e , bem como residual, p a r a dispor sobre matéria atinente à s e g u r a n ç a pública. Em lapidar decisão d e s t a Corte, d a lavra do eminente e culto Desembargador Mohamed Amaro, que merece ser transcrita, se observou: "De início, cabe sobrelevar que a Constituição Federal, ao fixar a competência das entidades federativas, considera a extensão e o interesse em torno das diversas matérias, atribuindo à União, aquelas de interesse mais geral, ou melhor dizendo, as de interesse nacional, aos Estados, as de interesse regional, e, aos Municípios, aos de interesse local, como está dito expressamente, por sinal, no artigo 30, inciso I A esse respeito, é evidente que, por interesse local se deve entender o interesse predominantemente local, visto que, como muito bem ressaltou MAURÍCIO BALESDENT BARREIRA -, não existe interesse que, a rigor, não seja também local fm Direito Municipal Aplicado, Lw. Del Rey Ed., 1977, pág. 169) (TJSP - Adin n. 72.577-0/3 - Órgão Especial - Rei Des. DANTE BUSANA - j . 10.4 2002 - Un). Falece, conseqüentemente, ao Município, poder constitucional decorrente, - Ação Direta de Inconstituaonahdade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 3 Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial diversamente do que se verifica com os Estados do Município, como se proclamou, Estado quando e sobretudo ê limitada, pública alguma no campo Estado' (CF., art municipais, visa disciplinar não cometeu da segurança 'destinadas ã proteção a política de Cumpre destacada apenas de seus de competências como bens, serviços e responsabilidade tendo em vista as peculiaridades do princípio federativo, responsabilidade cumprir, federal, de e organizar a segurança primária devidamente, o exercício poderá ensejar acerca dessa da e o oportunidade que, para c pôr termo a grave comprometimento ed , Malheiros, pág. 659) Diante dessa digressão, ao Governador construir instalação do Estado, de presídios, afenr cadeias ilação que se tira ê que a legislação arbitrariamente, Penitenciário, matérias prerrogativas Urbanísticos, reservadas, União, Estados Constituição Estados brasileiro. E tanto é de atividade da fortalecimento do sistema pública e segurança unidade se não a sua a intervenção da ordem (JOSÉ AFONSO DA SILVA, ín Curso de Direito Constitucional matéria dessa nos termos do artigo 34, inciso III, da Carta Política, que dá, como um dos objetivos, cabe, guardas instalações, cada regionais como, aliás, é da tradição Cabe, pois, aos Estados, de do entre a União e os Estados pública Federação, 'dever a constituição o princípio de que o problema competência que a responsabilidade Distrito Federal, subsistindo é de do segurança lembrar a lei' (CF, art 144, § 8o) Há, em verdade, uma repartição tanto (..). Pelo que se aos Municípios, pública, 144), reservando-lhes conforme dispuser matéria, 381/382). à criança e adolescentes. nova ordem constitucional autonomia da União (JOSÉ NILO DE CASTRO, ín Direito a referida lei municipal e de proteção A ante a supremacia Municipal Positivo, 1999, 4a ed , Del Rey, págs depreende, federados e unidades e de Proteção de modo concorrente, reservada, (CF, art Segue-se, de modo o 25, § I ).( .) Dúvida ao as áreas dos e à à competência 8a de Logo, a restringir, Direitos Juventude, legislativa da no artigo 24, I e XV, da pois, que a segurança residual, haverá da FEBEM à Infância e Distrito Federal, como consagrado Federal onde municipal questionada, invadiu Positivo, dúvida não resta de que e estabelecer estaduais, pública' à competência não resta pública constitui legislativa de que o dos legislador Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 4 Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial municipal, em apreço, extravasou de seu âmbito de competência legislativa, incorrendo a supra menciona lei, em flagrante inconstitucionalidade, ante a sua incompatibilidade formal com os artigos 24, incisos I (direitos penitenciário e urbanístico) e XV (proteção à infância e ã juventude), e 25, § Io (segurança pública), da Constituição Federal, e ainda, incompatibilidade material com os artigos Io, 111, 139, caput, 144 e 278, inciso VI, da Constituição Estadual, dispositivos que servem de fundamento para conseqüente desconstituição da questionada Lei Complementar" (Adin n° 73.011-0/0-00, j . em 11.06.2003, v.u.) E como afirmado, a j u r i s p r u d ê n c i a d e s t a Corte vem, sistematicamente, afastando a restrição ou proibição indevida oposta pelos Municípios, quer p a r a o perímetro u r b a n o , quer em todo o território municipal, p a r a a c o n s t r u ç ã o de presídio, c a s a s de albergado, u n i d a d e s da Febem ou outro estabelecimento penal destinado ao c u m p r i m e n t o de p e n a privativa de liberdade, como se observa de decisões assim e m e n t a d a s : "Ação direta de inconstitucionalidade Lei Municipal que proíbe a construção de presídio e cadeia pública no perímetro urbano da cidade Violação dos artigos 1 °, 5o, parágrafo Io, 111, 139, 143, "caput", e 144 da Constituição do Estado de São Paulo. Ação Procedente" (Adin n° 4 7 . 9 7 7 . 0 / 1 , relator Des. Hermes Pinotti, j . em 04.11.1998, v.u.) e "INCONSTITUCIONALIDADE DE LEI MUNICIPAL - Aprovação da lei municipal que veda aos órgãos técnicos do Executivo aprovar construção de presídios na área territorial do município - Projeto de iniciativa de vereador, vetado pelo Chefe do Executivo, mas promulgado pela Câmara Municipal - violação dos artigos 139, caput, e 5o da Constituição Paulista - Ação procedente " (Adin n° 0 3 8 . 4 1 9 . 0 / 5 - 0 0 , rei. Des. Álvaro Lazzarini, j . e m 1 8 . 0 3 . 1 9 9 8 , v.u). De se observar, por oportuno, que o último precedente mencionado se reporta a u m a lei do próprio município de C a s a Branca, que a despeito do que j á fora decidido, insiste n a edição de lei inconstitucional sobre a matéria, t r a n s m u d a n d o o seu . v Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 5 Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial c o m a n d o normativo, que a n t e s era de vedar aos órgãos técnicos do Executivo a aprovação d a construção de presídios em seu território para, agora, vedar p u r a e simplesmente a construção, ampliação e instalação de presídios e outros estabelecimentos p e n a i s e u n i d a d e s d a Febem em seu território. A questão a t m e n t e ao sistema prisional é importante para o Sistema d a S e g u r a n ç a Pública, q u e n o s t e r m o s do artigo 139 d a Constituição do Estado de São Paulo, é da responsabilidade de todos, inclusive, assim, q u a n t o ao s i s t e m a prisional, do município brasileiro, que n ã o pode, portanto, opor entraves à s u a implementação, bem observou ÁLVARO LAZZARINI ("Estudos de Direito Administrativo", 1996, editora Revista dos Tribunais/Escola Paulista da Magistratura, São Paulo, p. 139). Por derradeiro, impende ressaltar, como se a n o t o u n a inicial, que "o Estado federado tem a totalidade de seu território repartida entre as unidades municipais, de sorte que, se a exemplo do Município em foco, os demais que compõem o Estado bandeirante se propuserem a obstar a construção e instalação de presídios em seu âmbito territorial, o Estado de São Paulo (e também a União) ficará absolutamente impedido de executar sua política penitenciária e de garantir a segurança pública, posto que em seu próprio território não existirão estabelecimentos prisionais" (fl. 7, item 16), o que, c o n v e n h a se, n ã o teria o menor cabimento. Clara, portanto, a indevida violação a o s artigos I , 111, 139, "caput', 144 e 2 7 8 , VI, todos d a Constituição do E s t a d o de São Paulo. o Considerado que a s leis e atos normativos municipais e e s t a d u a i s contrários à Constituição do E s t a d o estão s u b m e t i d o s ao controle do respectivo Tribunal de J u s t i ç a , por força 7 - Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 6 Poder Judiciário Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo Órgão Especial do previsto no artigo 125, § 2 o , d a Constituição Federal e artigo 90 d a Constituição do Estado de São Paulo, c u m p r e a este colegiado reconhecer a inconstitucionalidade da lei atacada, decretando-se a procedência do pedido formulado n a inicial 3 . Destarte, por m e u voto, julgo procedente o pedido para declarar a inconstitucionalidade da Lei n° 2 . 7 3 9 , de 4 de novembro de 2 0 0 5 , do Município de Casa Branca, c o m efeito retroativo (ex tunc), oficiando-se à s u a C â m a r a Municipal, p a r a os devidos fins, bem como ao Senhor Governador do Estado, ao qual se d a r á conhecimento desta decisão. MARIO DEVIENNE - Relator - Ação Direta de Inconstitucionalidade n° 154 726-0/2-00 da Comarca de São Paulo - Voto n° 14 133 7